sexta-feira, 6 de outubro de 2023

A Demanda do Graal

Se alguma coisa marcou e se destacou, desde a alva ao ocaso da Idade Média, determinando decisivamente a mentalidade espiritual e religiosa dos que nela viveram[1], foi sem dúvida a Lenda do Graal transbordada da Lenda Arturiana, que oficialmente entrou na Literatura Ocidental, no século XII, através do cronista e poeta francês Chrétien de Troyes (c. 1130 – c. 1190), autor, dentre outros títulos, de Érec et Énide (c. 1170), Lancelot ou le Chevalier da la Charrette (c. 1175-1181) e Perceval ou le Conte du Graal (c. 1182-1190), obras escritas em langue d´oil (o francês romanizado do Norte)[2], a mesma utilizada pelo cluniense São Bernardo de Claraval para redigir a Regula Vitae (Regra de Vida) da Ordem do Templo (1128), por exemplo.

Chrétien de Troyes tomou a primazia, encabeçou um corpo de poetas e cronistas de seu tempo na divulgação da Matéria da Bretanha que marcou o Ciclo Arturiano, fortemente efabulado por maravilhamentos aventurescos na constante órbita da Quête du Graal, a Demanda do Graal, a Taça Sagrada dotada de propriedades miraculosas com que o Espírito Santo a bafejava assim a dando por Eucarística, portanto, na feição cristianizada, decerto tomada da celta anterior, druida, do “caldeirão da abundância” de Dagda e do “caldeirão mágico” de Ceridwen.

Esse autor francês e os seus ilustres pares criaram uma novelística francamente heterodoxa recambiando para o Hermetismo mais puro e transcendente que marcou decisivamente a mentalidade espiritual e religiosa da Baixa Idade Média (séculos X-XV), tendo esse efabulamento se inspirado em factos históricos reais anteriores ocorridos durante o final do império romano na Ilha Britânica, sobretudo em Gales, e no Norte de França, na Bretanha, com personagens que deveras existiram mas que eles transpuseram, por via do romance e da parábola com grande engenho, para aventuras iniciáticas no terreno da mais pura heterodoxia a que Portugal não foi alheio[3], como veremos mais adiante, desde Afonso Henriques e o seu “Porto-Graal” a D. Nuno Álvares Pereira, o “Galaaz do Carmelo”[4].

Pois bem, a Alta Idade Média (séculos V-IX) fez do Cálice Sagrado motivo de Iluminação Espiritual que diversos autores e autoras desse período registaram em fólios e pergaminhos, a maioria de profissão religiosa de acolhimento mosteiral, que nos períodos paleocristão (visigótico) e moçarábico (sob regime árabe) serviram para a pregação às assembleias de fiéis catequisando-as pela moral e o instigo à perfeição interior. É assim que em 1151 aparece a Scivias (do latim Scivi vias Domini, “Conhece os Caminhos do Senhor”), obra ilustrada constando das visões espirituais da monja beneditina alemã Hildgard von Bingen (1098-1179)[5], claramente inspiradora dessa outra do século XIII, de autor anónimo, A Demanda do Santo Graal, sendo o famoso Manuscrito de Heidelberg, que Chrétien de Troyes toma como referência principal e funde lendas celtas e germânicas, bretãs, irlandesas e ibéricas, a maioria de fonte oral, tomando por base justificativa o Antigo Testamento[6].

Da Matéria da Bretanha destacam-se três títulos que cedo marcaram decisivamente a “mentalidade mágica” portuguesa: Livro de José de Arimateia, Demanda do Santo Graal e História de Vespasiano, esta atribuída a Jafel, sobrinho de José de Arimateia, onde descreve com vivacidade a conversão ao cristianismo do imperador romano Vespasiano e de seu filho Tito. A restante novelística da Matéria da Bretanha seria igualmente traduzida – inicialmente, a partir do século XII português, graças ao labor cisterciense, sobretudo dos copistas de Santa Maria de Alcobaça – desde o início do reino e sobretudo no reinado de D. Dinis, cuja difusão ampla influenciou a demais literatura místico-cavaleiresca e até o onomástico português da época (vulgarizando-se na fidalguia lusa os nomes de Tristão, Iseu, Lançarote e outros)[7], tornando-se a corte portuguesa o centro da vida cultural peninsular.

D. Dinis revestiu-se de Hermetismo e até nos aparatos de seus trajes palacianos ele transparece, como se revela na espada retirada de seu túmulo em 24 de Outubro de 2022, no convento das bernardas de S. Bernardo e S. Dinis de Odivelas. Trata-se de uma espada de aparato, não de uma espada de combate. Além de apresentar restos das cores originais dos esmaltes na empunhadura e guarda-mão de prata, sendo a lâmina de ferro, está decorada por medalhões mostrando figuras zoomórficas e mitológicas que remetem para o simbolismo do Hermetismo medieval. Delas destaco: leão = valentia, coragem, ânimo; cão atrás de lebre = destreza, arte no manejo da lâmina; serpe no guarda-mão = protecção contra o mal, contra a má sorte no guerrear; três losangos na empunhadura = Santíssima Trindade; lucernas = clareza, lucidez.

Com essa matéria se constituiu a chamada Demanda Portuguesa, que pôs em relevo Portugal logo ao seu início, quando Matilde (Mahaut), filha de D. Afonso Henriques, desposou, em 1183, Filipe de Alsácia, conde de Flandres, o qual lhe forneceu um livro contendo a história do Graal que teria contribuído para a construção do Perceval, obra inacabada de Chrétien de Troyes por morte deste[8]. O tema do Graal é, pois, conhecido entre os portucalenses desde muito cedo, possivelmente desde o conde D. Henrique de Borgonha nos seus contactos com o Islão erudito em Sintra (Al-Shantara) e noutros lugares do nosso futuro país sob ocupação árabe. Também os santões e visionários do Islão ibérico, sobretudo os de corrente sufi caracterizados pela sua mística e erudição nos textos sagrados, deram relevo ao Santo Vaso (Saint Vaisel) como sinónimo de libações paradisíacas e sinal supremo de ascenso à Morada da Sabedoria (Bayt al-Hikmah)[9]. Nisto reside a origem das posteriores “cortes de amor” portuguesas[10], que juntou o amor cortês (palaciano) ao amor divino (monástico), pela prosa e a trova, exaltando a transcendência da coyta, ou seja, da “dor do amor”, onde a Mulher tomou papel destacado por via de firme e profundo entendimento hermético[11].

O certo é que aparece em anagrama o nome “Porto-Graal” em vários sinais rodados afonsinos nas cartas de doação e/ou de aforamento reais pelo nosso primeiro rei, como a de Sintra, a do Reguengo de Colares e a de Ceras, o que dispõe Portugal como Peanha ou o Trono do Graal, geograficamente na “cabeça da Europa inteira”, no dizer de Fernando Pessoa em sua Mensagem.


Esse documento assinalado na foto provém do original em latim depositado na Torre do Tombo (gaveta 7, maço 3, n.º 8. Com relação sucessora na Leitura Nova, Liv. 53 (Livro de Mestrados), f. 19 v, coluna 2, transcrito sumariamente na Reforma das Gavetas, Liv. 10, f. 142 v), Lisboa, foi reproduzido na Monumenta Henricina (1960-1974) e refere-se ao Castelo de Cera ou Ceras na carta de doação desse por D. Afonso Henriques, “Rex I Portucalensis”, à Ordem do Templo, englobando as terras que iam até Tomar e esta. A mesma carta, lavrada em Fevereiro de 1159, dentro da política de concórdia com arbítrio papal (Adriano IV, expedindo a bula Justis potentium sideriis) terá servido, segundo o professor Luís de Albuquerque (Monumenta Henricina, vol. 15, p. 10, Coimbra, 1974), para doar a mesma Tomaris ao Templo, que aí instalaria a sua Casa-Mãe em seguimento a Cera, Ceras ou Cellas, penúltima Casa-Mãe da Ordem dos Cavaleiros Pobres de Cristo e do Templo de Jerusalém (Ordini Milites Pauperes Christi Templi Hierusalem) em Portugal.


O sinal rodado afonsino possui três leituras afins à grafia nos seus três círculos, interligando-se pela pontuação cimeira – hermética (PORTO-GR(A)AL), teológica (CUM FILII SUI, “com o seu Filho”, relação cristológica de Deus-Rei-País), nobiliárquica/militar (REX ALFONSUS, “Rei Afonso”, o I de Portugal assim aclamado no campo de lide de Ourique por templários e portucalenses, após a sua vitória militar no Gharb islâmico e já antes, pré-batalha, sagrado por Cristo, como descreve a miraculosa tradição hagiográfica[12]).

Em 1990 identifiquei essa carta como a da doação de Tomar à Ordem do Templo, e agora fica clareado o por que: abrange todo o espaço primitivo do concelho tomarense, portanto, Ceras e Tomar incluídos, em troca do espaço escalabitano[13]. Assim, o documento é carta de doação concelhia e não apenas da mingueza geográfica de um castelo e terras em volta do mesmo, antes indo mais além dele, ficando a poderosa Santarém sob o domínio militar-económico e até pastoral da religião da Ordem Religiosa e Militar de Santiago. Nesse acto de fina diplomacia geopolítica, Afonso I evitou conflitos entre espatários e templários e vedou as ambições diocesanas do Cabido de Lisboa, ao pôr essas terras ricas na posse da freiria militarizada que delas se ocupou demográfica, política e economicamente.

Assim se chega ao âmago da questão: quem era Artur, um rei mítico ou um personagem histórico? Quem era Merlin, conselheiro daquele, um mago, um druida ou simples figura de ficção? O que era a távola redonda em redor da qual se reuniam periodicamente doze cavaleiros para contar as suas aventuras paladinas, e se uma e outros existiram de facto? Finalmente, o que é o Graal?

Historicamente, mesmo não pondo em dúvida a sua existência, o facto é que a figura do rei Artur foi mitificada posteriormente. O primeiro registo do seu nome remonta a Nennius, monge galês, na sua Historia Brittonum (“História dos Bretões”), escrita por volta do ano 810, onde Artur aparece não como rei mas como dux bellorum, isto é, um general ou chefe militar[14], que após a retirada dos romanos de Inglaterra chefiou os bretões insulares contra os invasores saxões vindos da Germânia, actual Alemanha, e que usurparam o trono, tendo obtido grandes vitórias militares em doze batalhas sucessivas, segundo conta o bispo S. Gildas ou Gildásio (c. 516-570) em De Excidio et Conquestu Britanniae, escrito cerca do ano 547. Ambos os autores dão Artur como chefe cristão devoto da Virgem e da Santa Cruz, o que sugere a sua conversão à Igreja galesa, cercado já por certo número personagens como Ambrosius, Mordred e Merlin (Merlinus), o que é repetido por Bede ou Beda, o Venerável, monge da Nortúmbria dos Anglos na sua História Eclesiástica do Povo Inglês (Historia Ecclesiastica gentis Anglorum), escrita por volta do ano 731. A mitificação e maravilhamento de Artur só aparece no século XII na crónica de Godofredo de Monmouth, Historia Regum Britanniae (História dos Reis da Bretanha), redigida cerca de 1136. Ele é dado como filho de Uther Pendragon (Pendraco, em latim, “pequeno dragão”), rei dos bretões que teria vivido nos anos de 410 a 495, tendo o seu filho Arthur Pendragon sido chefe e caudilho no século VI. Vários poemas galeses medievais também citam Artur no mesmo sentido, como o Y Gododdin, apesar deste não poder ser datado com precisão por descrever eventos do século VI e conter linguagem dos séculos IX e X, sendo a cópia que sobreviveu do século XIII. Por fim, tem-se a crónica escrita em latim nos fins do século X, Annales Cambriae (Anais de Gales), nome pela qual a obra é conhecida referindo-se a Cambria, forma latinizada de Gales (em galês, Cymru). Nela aparece duas referências a batalhas onde o caudilho bretão lutou contra os invasores anglo-saxões: a Batalha do Monte Badon (Badonicus mons), datada de 516 ou 518, em que “Artur carregou uma cruz sobre os ombros” e os “bretões foram vencedores” (episódio que D. Afonso Henriques trasladaria para a batalha mirífica de Ourique onde, vencedor dos “sete reis mouros”, seria aclamado rex, rei de “Porto-Graal”, diga-se de passagem), e a Batalha de Camlann (mitificada Camelote), ocorrida em 537 ou 539, onde “Artur e Mordred tombaram mortalmente”, pai e filho que se mataram um ao outro no confronto, segundo as lendas.

Artur vem a representar a passagem e estruturação da sociedade rural celta à urbana cristianizada, geográfica, política e juridicamente livre, independente com o seu poder temporal ou real próprio, recém-saído do subjugo anglo-romano. Isto seria figurado pelo urso, animal totémico sinalético do mesmo poder temporal assegurado pelas armas, pela casta militar (kshatriya, em sânscrito).

Quanto à figura sobrenatural de Merlin, Merlim ou Merilim, que é topónimo de localidade em Braga, aparecendo na Galiza com a forma Merlin, a verdade é não surgiu no Ciclo Arturiano, pela primeira vez, pela mão de Godofredo de Monmouth, ainda que este o tenha maravilhado na sua Vita Merlini (“Vida de Merlin”), escrita em 1150, dando-o como Merlin Calidonius, tendo uma irmã e uma esposa mas sem menção a seus pais, que outros autores dizem ter sido gerado por anjos, e por isso foi um grande mago e profeta, além de sábio conselheiro do rei Artur[15]. Já antes, no final do século VI, no poema galês Afallenau ele é identificado ao bardo Myrddin, e assim ficou em vários outros poemas dessa época – ora como bardo, ora como druida – preservados no manuscrito conhecido como Livro Negro de Camarthen (em galês, Llyfr du Caerfyrddin), escrito por Teulyddog de Camarthen cerca de 1250. É chamado “negro” por causa da sua encadernação escura. Merlin também aparece referido em poemas do início do século X, como o Armes Prydein e o já citado Y Gododdin.

As crónicas dizem que quando nasceu, no lugar de Caer-Fyrddin (Carmarthen), foi-lhe dado o nome de Emrys, depois adaptado ao galês Myrddin que Godofredo latinizou Merlinus, donde derivou Merlin. A lenda conta que viveu perto da montanha de Dinas Emyris, em Gales, onde existia o castelo do rei saxão Vortigern, e que dentro da montanha viviam num lago subterrâneo dois dragões, um branco e outro vermelho. Combatiam-se um ao outro trazendo as populações aterrorizadas. Então, Merlin profetizou a morte de Vortigern e representou o dragão branco como sendo os saxões e o dragão vermelho como os bretões. De facto, o dragão vermelho empurrou o dragão branco para as nuvens onde desapareceu derrotado, tal qual Vortigern pereceu às mãos de Ambrósio Aureliano que ocupou o trono usurpado, sendo sucedido por seu filho Uther Pendragon e depois pelo filho deste, Arthur Pendragon. Este pendragon é o dragão vermelho que até hoje drapeja na bandeira do País de Gales.

Merlin é a representação da religião primitiva celta, portanto, um druida (do celta druwjd, “sábio”), que estabeleceu a ligação entre a religião e a cultura autóctones e a cristianização nascente deixada pelos romanos já convertidos. Essa função era assinalada pelo javali totémico, sinal de autoridade espiritual assegurada pela casta sacerdotal (brahmane, em sânscrito). Por isso, Merlin foi conselheiro de Artur e lhe reconheceu as funções legítimas no trono, assim se confirmando a eleição tradicional do poder temporal pela autoridade espiritual.

Vem depois a famosa távola ou mesa redonda que possuía propriedades mágicas, dizem as lendas que Artur a herdara de Ambrósio (Ambrosius Aurelianus, em latim, Emrys Wledig, em galês). Thomas Malory, protestante e romancista inglês do século XV, associou o ainda visível anfiteatro romano de Caerleon à távola redonda, na sua obra publicada em Londres em 1485, A Morte de Artur: Rei Artur e as Lendas da Távola Redonda. A sua identificação certamente teve por fonte o Itinerarium Cambriae de Gerard de Wales, de 1191, que diz sobre Caerleon: “Aqui os embaixadores romanos tiveram audiência na corte do grande rei Artur”.

Duvido da autenticidade da identificação, mesmo sabendo que sítios arqueológicos de interesse histórico foram depois adaptados pelos autores da Matéria da Bretanha e do Ciclo Arturiano ao imobiliário móvel e imóvel que os compõe, hoje aproveitados para turismo rendoso. Parece-me ser mais viável a informação transmitida por Paulo Pereira[16]:

“Para mais, o grupo nuclear da lenda arturiana parece ter uma inquestionável relação com a astronomia simbólica, com Artur fazendo as vezes de Sol e os restantes doze cavaleiros dispostos em seu redor substituindo-se ao zodíaco. Esta partição em “doze segmentos” da Távola Redonda parece ser, também, uma manifestação da antiga tradição da organização grega e etrusca do território em doze partes, distribuídas por doze tribos ou amphictionies. O simbolismo polar do mito é também considerável, se tivermos em linha de conta que o nome de Artur provém de arctus, que quer dizer urso, ligando-se desta feita à constelação da Ursa Maior, cuja cauda indica uma das estrelas mais brilhantes do céu, a estrela Arcturo, no Norte polar. O urso pode ser, efectivamente, o símbolo da casta guerreira (o javali seria o símbolo da casta sacerdotal). Os lugares portugueses com relações toponímicas com a Ursa ou Ossa parecem ser uma tradução local, em Portugal, mas também antiga, destes mitos que adquirem contornos arquetípicos e universais, o mesmo acontecendo com probabilidade nos lugares denominados Arco (corruptela de arctus).”

A Távola Redonda é assim transposta para o simbolismo do Zodíaco repartido em doze partes ou signos, um para cada cavaleiro sinalético de uma das doze batalhas arturianas e por conseguinte uma das doze tribos bretãs. A távola, tábua ou mesa redonda era assim para todos ficarem em pé de igualdade na hora de comunicarem os seus conhecimentos e experiências. Ficaria como símbolo místico de irmandade reunida em volta da Santa Copa postada no centro da távola, esta assim fazendo as vezes de altar – feita de carvalho, árvore indicativa de templo para os antigos druidas e igualmente para os primitivos padres galeses – e igualmente de mesa de ágape, a refeição mística em comunidade, inicialmente onde se celebrava a eucaristia do pão e do vinho, o que faz volver ao sentido de ara.

Com efeito, o tema da Távola Redonda instituiu-se como um dos mais significativos instrumentos ideológicos da Cavalaria, isto é, da igualdade de tratamento entre os cavaleiros, como “pares”, e a obliteração das regras de precedência. A forma redonda seria associada na Idade Média à Mesa da Última Ceia, apesar de alguma iconografia medieval a representar como rectangular. Para a tradição celta a forma redonda era privilegiada, como demarcação sacralizada, sabendo-se que os chefes celtas usavam mesas redondas nos banquetes, e as próprias casas das citânias apresentavam forma circular[17].

Ressalve-se que o tema literário arturiano bretão seria adaptado pelos cronistas de Cister em Portugal à idiossincrasia portuguesa[18], o que de bom grado a coroa e a corte acolheu desde a primeira hora, ficando registado no chamado Códice Português [19]. Inclusive é dito, em óbvia exaltação nacional desde a primeira hora, que o tema graalístico saiu do nosso país para a Bretanha, a partir da região de Sintra, posto esta ser lugar consignado na Tradição desde os evos arturianos, chegando mesmo a instalar aí o cavaleiro Ector ou Heitor de Maris, filho do rei Ban de Benoic e da rainha Helena, pai adoptivo de Artur.

Os doze paladinos do rei Artur, além do seu significado astronómico, poderiam muito bem ser os principais chefes-de-campo do dux bellorum nas campanhas contra os anglo-saxões. Depois, por via do romance assente no simbolismo hermético da Baixa Idade Média, seriam transformados em Massenia ou Cavalaria Espiritual irmanada em torno do Saint Vaisel, pomo da Demanda da Iluminação assinalada por doze provações equivalente a outros tantos graus iniciáticos, portanto, constituída como Ordem Iniciática, esotérica ou fechada, ainda assim vindo a influenciar decisivamente a Regra de Cavalaria, mormente em Portugal, como descreve Fernão Lopes na sua Crónica de D. João I, por que se impôs a disciplina castrense e transformou o guerrear numa ciência militar.

A Regra de Cavalaria dos Cavaleiros do Santo Graal, o seu código de conduta, segundo Thomas Malory[20] possuía os sete pontos seguintes:

Demandar a perfeição humana
Agir com rectidão nas acções
Respeitar os semelhantes
Amar os seus familiares
Ter piedade com os enfermos
Ter doçura com as crianças e mulheres
Ser justo e valente na guerra e leal na paz

Conforme as versões, a Távola Redonda teria inicialmente apenas 12 membros, depois passando a 24 e chegando até a 150. Nas versões portuguesas do tema os nomes dos cavaleiros são precedidos do título de nobreza Dom, mantendo o Sir nas versões britânicas. Mas, por que o Dom antes do nome próprio?

Dom (do latim dominus, em português “senhor, dono ou mestre”), ou no feminino Dona, é um pronome de tratamento concedido a monarcas, príncipes, infantes e nobres portugueses, espanhóis, ibero-americanos e italianos; a bispos católicos, abades e sacerdotes beneditinos, cartuxos e trapistas, sempre seguido do prenome. No caso da nobreza, é transmitido apenas pela descendência varonil directa, a não ser quando a mãe seja chefe da casa dinástica.

O título de Dom (ordinariamente escreve-se abreviado D.) sempre teve um enorme relevo em Portugal. Só por concessão régia, tradição que durou muitos séculos, um nobre podia usar esse título. Não obstante a origem restrita, Dona tornou-se um tratamento de reverência usado para anteceder o nome de uma senhora que se respeita. Neste caso, usa-se o axiónimo com inicial minúscula (dona). Seja qual for o uso, ordinário ou aristocrático, dom e dona devem anteceder o prenome, mas não o sobrenome para o qual é mais adequado o uso de senhor ou senhora.

Com base nas evidências escritas das colónias fenício-hebraicas em Espanha (Tarsis) desde a época do rei Salomão (ou mesmo antes), e com vários influxos de emigração durante a destruição do primeiro e do segundo Templo de Jerusalém, e com as deportações em massa na época do imperador Adriano, é considerado como mais provável que o espanhol Don derive do hebraico Adon (“senhor, mestre”), título usado pelos hebreus, Aba, da mesma forma que Sir é utilizado na língua inglesa.

Voltando aos doze cavaleiros originais da Távola Redonda, eles seriam:

0. Artur
1. Heitor
2. Caio
3. Parsifal
4. Lancelote
5. Ivano
6. Galvão
7. Galaaz
8. Tristão
9. Garete
10. Gerantio
11. Boro
12. Badevere

Isso em português, que no bretão os nomes naturalmente diferem e a sua lista aumenta acompanhando as minúcias e acréscimos de versão para versão, assim dispostos por ordem alfabética:

Arthur Pendagron (Pendragão), Rei; Accolon de Gália (Acolon, Acolão); Aglovale; Agravain (Agraveine); Bedivere (Bedwyr, Belovedye); Boors, o Exilado (Bors, Bohort, Bohor); Breunor; Cador; Calogrenant; Caradoc (Karadoc); Colgrevance; Constantine (Constantino); Cordo, o Bobo; Daniel; Dinadan; Gaheris (Guerrehet); Galahad (Galaaz); Galehaut; Gareth (Gaheriet, Garete); Gauvain (Gawain, Galvão); Geraint (Gerantio, Erec); Gingalain; Girflet (Jauffré); Hector de Maris (Heitor, Ector); Hoel; Hunbalt; Ivain (Ywain, Ivaine, Ivano); Ivain, o Bastardo; Kay (Cai, Caius, Caio); Lamorak; Lancelot du Lac (Lancelote, Lançarote, Launcelot do Lago); Leodegrance (Leodegrans, Léodagan); Lionel (Leonel); Lucan; Meleagant; Mordred (Mortret); Morholt; Palamedes; Pelleas (Peleia); Pellinore;  Perceval (Peredur, Percival, Parzifal, Parsifal); Safir (Safrão); Sagramor (Sagremor); Tor (Thor, Toro); Tristan (Tristão); Uriens (Urião).

Esses personagens da Demanda vieram a ser aureolados de encantamento e transcendência no romanceiro francês e britânico dos séculos XII-XIII, época em que entraram em literatura portuguesa pelo afã cisterciense que juntou a Vulgata e Post-Vulgata do Ciclo do Graal numa versão singular[21] ao instalar a Demanda (Quête) no território nacional e associar os paladinos arturianos a personagens reconhecidos da nossa História. Tudo, num jogo de palavras, anagramas e narrativas com duplo sentido, disposto no campo da pura heterodoxia dos saberes herméticos com que deram aso a mitos fundacionais centrados no tema do Santo Graal[22], promovendo a passagem da celtização à cristianização do mesmo por via dos lais, crónicas e cronicões, o que levou o romantista Albert Beguin a interpretá-lo como exclusivo objecto cristão[23]:

“Representa ao mesmo tempo e substancialmente Cristo que morreu pelos homens, o Vaso da Ceia Sagrada (graça divina concedida por Cristo aos discípulos) e finalmente o Cálice da Missa, contendo o verdadeiro Sangue do Senhor. A Mesa em que repousa o Vaso é, pois, a Pedra do Santo Sepulcro, a Mesa dos Doze Apóstolos, e por fim o Altar da Missa quotidiana. Estas três realidades, a Ceia, a Eucaristia e a Crucificação, são inseparáveis e o Graal é a sua Revelação, dando através da comunhão o conhecimento da pessoa de Cristo e a participação no seu sacrifício redentor.”

Indo também nessa direcção, o enciclopedista M. de Riguer adiantou[24]:

“Konrad Burdach relaciona o cortejo do “Graal” com a grande entrada da missa chamada de São João Crisóstomo na liturgia bizantina. Nesta há uma procissão solene aberta pelos que levam candelabros com velas acesas, seguidos pelo presbítero com o cálice (que corresponde ao “Graal”), o diácono com o hostiário (que corresponde ao prato de prata) e o celebrante com a lâmina chamada a Santa Lança, com a qual se fere antes, simbolicamente, a hóstia eucarística.”

Eis aí a razão de associar o nome Santo Graal, Saint Greal, San Grial ao Sangue Real, motivo maior do Rito Eucarístico em cuja celebração se transubstancia o vinho no sangue contendo o Ser de Cristo, o Avatara ou “Manifestação da Divindade” revelada na Pomba do Espírito Santo.

A palavra Graal é familiar das gregas kratale e kratêr, donde saíram as provençais graalz e grazale, esta última significativa de “prato”, do latim gradalis, “prato gradual”, isto é, servido gradualmente ou por diferentes vezes, até chegar às derivações “grato” (gratu) e “agradar” (placere). Vária iconografia arturiana medieval vai nesse sentido ao representar na távola o servir aos comensais “pratos graduais”.

Essa é a explicação laica e profana para a religiosa e espiritual do que significa realmente o “prato” (grazale): será a patena (termo latino), pequeno prato um pouco convexo que se coloca sobre a taça (graal) onde se deposita a hóstia ou pão, que após consagrado na missa ou no ritual solene irá, pelo Mistério da Transubstanciação proferido pelo Logos ou Palavra que sujeita Thanatos como Morte, tornar-se o Corpo de Cristo, Corpus Dei. É esta razão do Rito do Santo Graal ser Eucarístico (Eu-Crístico) mais que tudo.

Por outro lado, os cronistas do Ciclo do Graal (Chrétien de Troyes, Robert de Boron, Wolfram d´Eschenbach, etc.) dão-no ora como Taça, ora como Livro, ora como Pedra, associando-o ao útero iniciático da Mulher e da Terra, nesta associada ao sentido de Paraíso Terreal – o Mundo Jina das escrituras esotéricas, igualmente afim aos Lugares Santos[25], Loca Sancta, onde o Céu e a Terra vêm a se encontrar e unir – o que de certa maneira o vaso alquímico (tesaurus, na linguagem medieval) também representa.

Nesse sentido, os cronistas medievais permitiram entender o Graal como uma pedra atestada pelo termo celta gar ou kar, “pedra”, mais al ou el, deus”, portanto, Pedra de Deus, ademais correspondendo à interpretação que Wolfram d´Eschenbach (1170-1220) lhe dá no poema épico Parzival (escrito provavelmente entre 1200 e 1210) onde lhe chama lapsit exilis, isto é, lápis, “pedra”, excelis, “elixir”, no que corresponde então à Pedra Filosofal (sinónima de realização espiritual acompanhando a humana) nessa interpretação claramente esotérica do trobar clus de Eschenbach, decisivamente destacando o Hermetismo cristão.

O Graal como Pedra tomaria tanto a feição de ara ou altar, onde se realizam as mais místicas e alquímicas transformações interiores, como de Lugar Santo elevado ou destacado como Mons Salvat, “Monte Salvo”, “Monte da Salvação”, onde se construiria o Castelo do Santo Graal para guardar no seu interior a sua relíquia sagrada guardada por Titurel e uma companhia de castos, santos e sábios cavaleiros, e que se situaria numa montanha junto ao mar (maris) nos confins da Europa, segundo o mesmo Wolfram d´Eschenbach retomando as narrativas anteriores da Matéria da Bretanha, cujo Exílio do Graal ficou assinalado na Post-Vulgata pela Estoire del Saint Graal de Robert de Boron, vertida na tradução portuguesa sob o título Livro de José de Arimateia, manuscrito único[26].

Apesar de muitos autores situarem o Castelo do Santo Graal em Monserrate na Catalunha, na vizinha Espanha, o facto é que ele não é o ponto final da Europa e nem fica junto ao mar. Essa localização geográfica cabe exclusivamente a Sintra, em Portugal, a qual tem o lugar de nome Monserrate, além daquele outro Monte Salvo. Sobre isto, diz Mário Roso de Luna[27]: “A Mestra (Helena Petrovna Blavatsky) pressentia o futuro ocultista da nossa Raça e elogiava o Centro Iniciático ibérico “situado numa floresta oculta da Península”. Será esse Retiro, oculto e ignorado por todos, o famoso Castelo do Santo Graal ou Montsalvat, a quem Wagner, o colosso musical de Bayreuth, consagra inteiramente o seu sublime Parsifal, dispondo-o quer “abaixo dos Pirenéus”, quer nos confins – leia-se “confins ocultistas” – da Espanha cristã com a Espanha árabe?…”

Como Livro o Graal – assinalado no Gradual, livro contendo os itens musicais da missa, assim o diferenciando do Missal onde estão escritos os textos recitados – contém em seu significado a Tradição Primordial, a sabedoria oral e o conhecimento escrito. Robert de Boron, no Livro de José de Arimateia, diz que “Jesus Cristo ensinou a José de Arimateia as palavras secretas que ninguém pode contar nem escrever sem ter lido o Grande Livro no qual elas estão consignadas, as palavras que são pronunciadas no momento da consagração do Graal”[28]. De facto, em Le Grand Graal, de autor anónimo no Pseudo-Boron, o Graal é identificado ao Livro escrito por Cristo, cuja leitura só pode entender ou iluminar quem está nas graças de Deus, porque o Livro tem um terrível poder: “As verdades de fé que este Livro contém não podem ser pronunciadas por língua mortal, sem que os quatro elementos sejam agitados. Se isso acontecesse realmente, os céus diluviariam, o ar tremeria, a terra afundaria e a água mudaria de cor”.

Agir em contrário é transformar a demanda em devassa, como se nota nas especulações empíricas dos teóricos de livraria para quem o Graal é apenas expressão de “conseguir o impossível” sem que se lhe dê forma física, ou então algo a ver com a interiorização mística afim a vagos estados d´alma que se pretendem representar exteriormente no objecto-relíquia, sem que haja mais e cujo vácuo deixa as portas abertas à dúvida, à suspeição, ao desânimo e à desistência. Deveria saber-se que tudo quanto haja no plano espiritual existe no plano material, e vice-versa, por conseguinte, também o Graal existe, não é simples efabulação poética medieval chegada ao presente; descrer dessa “literatura inútil” é coisa de efabuladores impenitentes portando-se como “a raposa na latada não conseguindo alcançar o cobiçado cacho de uvas”, da lenda moral de La Fontaine.

Mas não só na literatura ficou registada a tradição do Santo Graal, porque ela também se apresenta na pintura e na escultura, como igualmente na ópera, no teatro e no cinema. O tema está universalizado.

Aqui chegados, posso afirmar que por detrás do véu das lendas efabuladas que são mais que mitos de fundação, está a milenar Ordem do Santo Graal cuja féerie o Ciclo Arturiano encomiou, usando a parábola e a alegoria com tamanha destreza e subtilidade que os textos acabam valorizados só pela sua composição literária imaginosa, muito raramente, seja por ateísmo e/ou complexos intelectuais, pelos simbolismos que contêm indicando conhecimentos heterodoxos do domínio do Hermetismo medieval que pautou a mentalidade “mágica” da época e abriu as portas da Renascença.

Simbolismos como esse da Távola e o Graal, distintos, o que dá dois corpos por igual distintos de cultores na mesma Irmandade do Santo Graal: a dos Templários, encarnada por Merlim e representada por Galaaz (prefiguração do Cristo), “o cavaleiro que encontrou o Graal”, e a dos Tributários, assinalada por Artur e prefigurada por Lancelote, “o melhor cavaleiro do mundo”.

MERLIM E GALAAZ:
TEMPLÁRIOS (CASTA SACERDOTAL) – RITO DO GRAAL

ARTUR E LANCELOTE:
TRIBUTÁRIOS (CASTA GUERREIRA) – TÁVOLA REDONDA

Como o Santo Graal seja de natureza tríplice, a ver com a mudança interior de um e todos os cavaleiros, na mais fina e ortodoxa disciplina que é a Regra da Ordem, valores contendo a esperança de futuro melhor cabendo a toda a civilização, tem-se:


Transformar a vida-energia em vida-consciência vem a ser a meta da verdadeira Iniciação, nisto se centrando no coração que no corpo humano é expressivo do Graal-Consciência, sendo que na odisseia arturiana vários dos seus principais personagens vêm a representar a demanda sem devassa desse supremo estado de Ser do humano em divino. Esta é a grande aventura.


Isso vai de encontro ao que o Professor Henrique José de Souza (1883-1963), fundador da Sociedade Teosófica Brasileira, proferiu no seu Livro do Graal (1950), obra reservada:

“A palavra Graal é uma forma pela qual se define iniciaticamente a manifestação do “Esplendor Celeste” na Terra. O mistério do Santo Graal, num aspecto mais particularizado, vemo-lo ligado à tradição oculta do Cristianismo. Neste ele foi mantido através de duas Ordens Secretas e sob os símbolos da Cruz, como instrumento de sacrifício, do sangue do mesmo sacrifício resultante, e das lágrimas de Maria, como expressão viva da dor. As duas Ordens referidas foram a do Santo Graal e a dos Monges-Construtores em conexão com aquela e auxiliada pela de S. Francisco, as quais mantiveram durante séculos o Rito do Santo Graal.”

Finalmente, reportando-me ao libreto da ópera Parsifal, de Richard Wagner, aquele pergunta: “O que é o Graal?” Tendo respondido o cavaleiro Gurnemanz:

– Não sei responder-te.
Porém, se fores guiado por ele
Não te será oculta a verdade…
Nenhum caminho conduz até ele,
E procurá-lo é inútil…
Salvo se ele mesmo for o guia.

NOTAS

[1] Vários autores, Splendeurs et Rayonnement du Moyen Age, obra apresentada por Marcel Brion, da Academia Francesa. Editions Pygmalion/Gérard Watelet, Paris, 1986.

[2] Chrétien de Troyes, Obras completas, edição e tradução sob a direção de Daniel Poiron. “Bibliothèque de la Pléiade”, Editions Gallimard, Paris, 1994. Chrétien de Troyes, Romances da Távola Redonda. Editora Martins Fontes, São Paulo, 1998.

[3] Almir de Campos Bruneti, A Lenda do Graal no contexto heterodoxo do Pensamento Português. Sociedade de Expansão Cultural, Lisboa, 1974.

[4] Josué Pinharanda Gomes, S. Nuno de Santa Maria – Nuno Álvares Pereira. Editora Zéfiro, Sintra, 2009.

[5] Régine Pernoud, Hildgard de Bingen: a consciência inspirada do século XII. Tradução Eloá Jacobina. Editora Rocco, Rio de Janeiro, 1996.

[6] Anónimo, A Demanda do Santo Graal – O Manuscrito de Heidelberg. Organização e tradução de Marcus Baccega. Editora Hedra, São Paulo, 2015.

[7] Poesia e prosa medievais. Selecção, introdução e notas por Maria Ema Tarracha Ferreira. Biblioteca Ulisseia de Autores Portugueses, Lisboa, 1988.

[8] Maria Gabriela Buescu, Perceval e Galaaz, cavaleiros do Graal. Biblioteca Breve, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, Lisboa, 1991.

[9] Pierre Ponsoye, El Islam y el Grial. Ediciones de la Tradicion Unanime, Barcelona, 1984.

[10] Sampaio Bruno, Os Cavaleiros do Amor. Guimarães Editores, Lisboa, 1960.

[11] Vitor Manuel Adrião, Portugal, Mística e Mistério (Identidade e Património), cap. XI, “Corte de Amor na Cardiga”. Espiral Editora, Lisboa, 2022.

[12] O texto do Milagre de Ourique, que constitui o codicilo espiritual de Portugal, aparece publicado pela primeira vez nos Diálogos de Vária História de Pedro de Mariz, em 1597, que frei Bernardo de Brito viria a inserir na Crónica de Cister, livro III, capítulo II, Alcobaça, 1602, posteriormente reproduzido por frei António Brandão na Monarquia Lusitana, III Parte, livro X, capítulo V, Lisboa, 1632.

[13] Vitor Manuel Adrião, Portugal Templário (Vida e Obra da Ordem do Templo). Euedito, Lisboa, Janeiro de 2020.

[14] Amélia Pereira Hutchinson, European Relations of Portuguese Arthurian Literature. University of Manchester, England, 1984.

[15] Geoffrey of Monmouth, The Life of Merlin (Vita Merlini). University of Wales Press, England, 1973.

[16] Paulo Pereira, Lugares Mágicos de Portugal – Paraísos Perdidos e Terras Prometidas. Círculo de Leitores, Rio de Mouro, Novembro/Dezembro de 2004.

[17] Maria Gabriela Buescu, ob. cit.

[18] Note-se, por exemplo, a produção, já em 1567, de um texto português intitulado Memorial das Proezas da Segunda Távola Redonda. Trata-se de uma novela de Cavalaria da autoria de Jorge Ferreira de Vasconcelos, que diz tê-la escrito “fundado na mais alta matéria que confiado no próprio engenho”. O seu personagem principal é o rei Sagramor (“Amor Sagrado”), nome frequentemente utilizado quer na obra de Chrétien de Troyes, quer na Demanda do Santo Graal, texto editado pela Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, 2005.

[19] Heitor Megale, A Demanda do Santo Graal – das origens ao Códice Português. Ateliê, São Paulo, 2008.

[20] Thomas Malory (1405-1471), A Morte de Artur, três volumes. Assírio & Alvim, Lisboa, 1991, 1992, 1993.

[21] Albert Pauphilet, Étude sur la Queste del Saint Graal. Honoré Champion, Paris, 1968.

[22] Karen Pratt, The Cistercians and the Queste del Saint Graal. Reading Medieval Studies, t. XX, pp. 69-96, London, 1995.

[23] Albert Beguin, La Quête du Saint Graal. Yves Bonnefoy, Paris, 1958.

[24] M. de Riguer, artigo Grial (Leyenda del), em Enciclopedia de la Biblia, t. III, pp. 950-951. Ed. Garriga, Barcelona, 1969.

[25] Thiago José Borges, A tradição dos ‘Loca Sancta’: sacralização e representação dos espaços sagrados no Ocidente medieval cristão (séculos VIII-XV). Universidade de Brasília – Instituto de Ciências Humanas, Brasília, 2017.

[26] Trata-se do manuscrito 643 depositado na Torre do Tombo, parcialmente editado por Ivo de Castro, Livro de José de Arimateia, estudo e edição do código ANTT 643 (tese policopiada). Faculdade de Letras, Lisboa, 1984. Existe ainda a edição diplomática de Henry Hare Carter, The Portuguese Book of Joseph of Arimathea. Paleographical edition. The University of North Carolina Press, Chapel Hill, 1967.

[27] Mário Roso de Luna, Uma Mártir do século XIX – Helena Petrovna Blavatsky. Editorial Pueyo, Madrid, 1924. Ainda a tradução que fiz desta obra, com introdução e notas pessoais, publicada pela Espiral Editora, Lisboa, 2018.

[28] Estará o autor a referir-se aos misteriosos Registos Akáshicos? Mas o que são estes? Para responder terei de recorrer aos conhecimentos iniciáticos da Sabedoria das Idades. Eles também são chamados de Memória da Natureza e Livro do Kamapa. Sendo Akasha o Éter, dos quatro tipos do mesmo – escuso dar os seus nomes sânscritos para não complicar o entendimento – o mais rarefeito é o 4.º Éter Reflector, assim chamado por reflectir, como se fosse uma espécie de negativo fotográfico, os pensamentos, emoções e actos do Plano Físico denso. Expressa o 4.º Plano Psicomental (Kama-Manásico) e por isso mesmo, por sua natureza bioplástica, reflecte os mesmos pensamentos e emoções gerados durante as multivariadas actividades humanas (literárias, artísticas, musicais, etc.) que ficam impressas no Éter ou Akasha como Registos Imperecíveis. São os 4.º e 3.º Éteres, Reflector e Luminoso, que contêm a memória mental, enquanto os 2.º e 1.º Éteres, Vital e Químico, detêm a memória cerebral. Quando a consciência humana age com noção extrafísica, é porque a memória cerebral acompanha a mental, ou seja, os quatro Éteres estão unidos e não há interrupção na consciência imediata, seja a dormir, seja a projectar-se fora do corpo, mas isto exige longa e rigorosa disciplina sob a direcção de um Adepto Vivo e dos seus Ensinamentos Iniciáticos.