O Rito de Memphis-Misraim é uma junção de dois ritos: o de Memphis, constituído em 1815, e o de Misraim, constituído em 1788. A fusão foi realizada, em 1881, por Giuseppe Garibaldi, que foi o primeiro Grão-Mestre Geral da Obediência.
O Rito de Misraim surgiu em Veneza em 1788, quando um grupo ligado a uma seita protestante antitrinitária (dos “Sociniens”), solicitou uma patente de constituição a Cagliostro, que se encontrava em Trento. O grupo desejava, todavia, trabalhar de acordo com o Rito Templário e não com o ritual mágico-cabalístico de Cagliostro. Este, somente lhes deu a luz Maçónica, com os três primeiros Graus da Maçonaria Britânica e os Graus superiores da Maçonaria alemã, de marcante tradição templária.
Misraim é o plural de egípcio, mas o Rito Egípcio só lhe transmitiu a personalidade obediencial. A partir de 1788, o Rito espalhou-se rapidamente por Nápoles, Génova e Milão, chegando a França em 1810, tendo-se ali desenvolvido bastante, sob a protecção do Rito Escocês, já que à sua frente, se encontravam nomes ilustres do Escocismo francês. Sendo absolutamente anticlerical e antimonarquista, foi dissolvido por obra da política da Restauração (Restauração é a época que se estende desde o restabelecimento dos Bourbons, em 1814, até à sua queda, em 1830, com os reinados de Luis XVIII e Carlos X). Clandestino durante dezoito anos, restaurado em 1838, novamente dissolvido em 1841, novamente saído da clandestinidade em 1848, o Rito de Misraim caminhou para a fusão com o Memphis, em 1881.
O Rito de Memphis foi constituído pelos Maçons que participaram na Campanha do Egipto, com Napoleão Bonaparte. A maior parte dos membros desta missão eram Maçons dos antigos Ritos Iniciáticos: Rito Primitivo, Rito Hermético, Irmãos Africanos, Philalètes (alusivo à ilha de Philae, e no Alto Egipto, antigamente consagrada à deusa Isis), além de muitos do Grande Oriente de França. Tendo descoberto, no Cairo, uma sobrevivência gnóstico-hermética e, depois, no Líbano, a Maçonaria drusa, que remontava aos Maçons operativos e que tinha acompanhado os Templários, seus protectores, os Maçons que acompanhavam Bonaparte decidiram renunciar à filiação Maçónica vinda, anteriormente, da Grande Loja de Londres, juntando-se num novo Rito, que nada devia a Inglaterra, então a grande inimiga da França. E assim nasceu o Rito de Memphis, em Montauban, 630 quilómetros ao sul de Paris, em 1815. Da mesma maneira que o Rito de Misraim reuniu os jacobinos com saudade da república e os carbonários, o Rito de Memphis juntou os soldados da antiga Grande Armada e os bonapartistas fiéis. O Grande Oriente, todavia, ainda monarquista, na sua maioria, obtém a dissolução do Rito, embora esta não tenha durado, pois ele ressurgiu em 1826, sob a égide do mesmo Grande Oriente. Dissolvido novamente em 1841, tornou-se clandestino só reaparecendo em 1848, com a república; novamente dissolvido em 1850, reaparece em 1853, unindo-se ao Grande Oriente em 1862, até à sua união com o Rito de Misraim em 1881.
A partir de 1881, o rito passou a ser de Memphis-Misraim, tendo esta unificação sido realizada por Garibaldi, o grande Maçon e carbonário, herói do Novo e Velho Mundo, iniciado no Brasil, mais precisamente no Rio Grande do Sul na Loja “Asilo da Virtude”. Isto não é de estranhar, pois no século XIX, os Ritos de Misraim e Memphis foram as duas Obediências onde se recrutaram os Carbonários que fariam, em 1870, a unificação da Itália: Garibaldi, Mazzini e Cavour entre os principais Herdeiros e depositários das velhas Obediências iniciáticas do século XVIII. O Rito de Misraim representava-as em 90 Graus e o de Memphis em 95; o Rito de Memphis-Misraim, em decorrência disto, ficou com 95 graus.
Estes 95 graus, todavia, devem ser considerados como um simples caminho onde se encontram os velhos Graus Maçónicos que não são mais praticados e não como uma escala de valores. Na realidade, os acordos de 1863 com o Grande Oriente da França e de 1896 com a Grande Loja Simbólica Escocesa (futura Grande Loja de França) apoiam-se apenas nos 33 graus clássicos do Rito de Perfeição, seguido pelo Escocês Antigo e Aceito. As Oficinas superiores do Rito de Memphis-Misraim praticam, obrigatoriamente, os seguintes Graus: 90º (Mestre Eleito dos Nove), 18º (Cavaleiro Rosa-Cruz), 30º (Cavaleiro Kadosh), 32º (Príncipes do Real Segredo) e 33º (Soberano Grande Inspector Geral); os graus 66º, 90º e 95º são honoríficos e concedidos aos velhos Maçons, como recompensa pelo seu valor e a sua fidelidade. Os demais graus são facultativos e deixados ao critério dos obreiros dos graus superiores.
Hoje, o Rito de Memphis-Misraim está espalhado por diversos países, principalmente da América do Sul e Central (Argentina, Chile, Bolívia, Venezuela, Colômbia, Haiti), mas também na Europa (França, Itália, Suíça, Bélgica, Países Baixos), além da Austrália. Ele perpetua as tradições de fidelidade aos princípios democráticos e às ciências iniciáticas. É deísta, mas sem qualquer intransigência, adoptando a definição da “Religião Maçónica”, definida pelas Constituições de Anderson, de 1723, a qual consiste na “moral geral das pessoas honestas”.
Disposição e decoração do Templo
A disposição do templo é como em todas as outras Lojas. No Oriente, todavia, atrás do Venerável, um Painel representa uma Porta de marfim e ouro, fechada e sem uma fechadura aparente, flanqueada por duas colunas de estilo egípcio, entre as quais está, em parte, estendido um véu transparente azul celeste, ou azul turquesa, cobrindo uma parte da porta. Acima da porta está o Delta, com um ponto no meio.
No centro do templo há um grande rectângulo (como o Tapete de outros ritos), com lajes brancas e negras, num total de cento e oito casas; sobre este rectângulo, em três dos ângulos, estão três colunas, dispostas em esquadria, com base para o Ocidente, com um foco de luz sobre cada uma delas . No centro deste rectângulo, há uma pequena mesa, representando um fragmento de Obelisco egípcio, sobre a qual se encontra o Livro da Sabedoria, um foco de luz e um incensório, ou caçoula para queimar perfumes. Os perfumes têm a seguinte composição: 3 partes de pó de incenso, 2 partes de pó de mirra, 1 parte de pó de benjoim e 1/2 parte de açúcar em pó.
As mesas dos oficiais são recobertas de tecido azul turquesa, debruado na cor violeta. Sobre a mesa do Venerável há um candelabro de três braços, enquanto que sobre a mesa de cada vigilante há um candelabro com um só foco de luz. Os Aprendizes tomam lugar na coluna “J”, como nos Ritos Moderno e Adonhiramita.
A Câmara de Reflexão é muito simples: há apenas um crânio humano verdadeiro, um castiçal com uma vela acesa, material de escrita, uma mesa, banco sem encosto e uma caçoula com brasas, sobre as quais é queimado pó de mirra, com perfume dos funerais antigos.
Paramentos
Os Aprendizes e Companheiros usam avental branco, aqueles com a abeta levantada e estes com a abeta abaixada: o avental dos Companheiros poderá ter cordão que o prende na cor violeta. Os mestres usam aventai branco com orla azul turquesa e com três rosetas da mesma cor, formando os três ângulos de um triângulo equilátero (um na abeta e dois no corpo do avental). Os oficiais usam, à tiracolo, uma faixa azul turquesa, com orla violeta. O Venerável e os Ex Veneráveis usam a mesma faixa, mas com orla dourada. Todos os obreiros, em Loja, usam luvas brancas.
Algumas Particularidades Ritualísticas
Os Obreiros entram de acordo com a hierarquia de Graus e Cargos: os Aprendizes à frente, seguidos dos Companheiros, Mestres, Oficiais, Visitantes (que sejam Mestres) e, finalmente, o Venerável, com o Mestre de Cerimónias abrindo o cortejo.
Quando da verificação se todos os presentes são Maçons, todos os Obreiros se viram para o Oriente (isto deve acontecer em qualquer rito) e os Vigilantes passam em revista os Irmãos da sua Coluna, cruzam-se diante do Oriente e tornam-se a cruzar no Ocidente, quando voltam aos seus lugares; à sua passagem, os obreiros colocam-se, um após outro, à ordem.
Os três focos de luz das colunas do rectângulo central são acesos pelo Experto e pelo Mestre de Cerimónias; o Mestre de Cerimónias também acende o foco sobre o obelisco. O 1º Vigilante acende a sua luz na coluna da Força e o 2º Vigilante na da Beleza, enquanto que o Mestre de Cerimónia leva ao Venerável, uma vela acesa naquela do obelisco, para que ele acenda o candelabro de três braços. Finalmente, o Mestre de Cerimónias aviva as brasas da caçoula dos perfumes.
É o Venerável Mestre que abre, em qualquer lugar (como no Rito de York), o Livro da Sabedoria, colocando, sobre ele, o Esquadro e o compasso na posição do Grau e, sobre estes dois instrumentos, a Régua.
A bateria é feita como nos Ritos Moderno e Adonhiramita, por dois golpes seguidos e um mais espaçado: 0 – 0 — 0. Na abertura e no encerramento dos Trabalhos, a bateria é tripla, acompanhada da aclamação.
A aclamação é: Liberdade! Igualdade! Fraternidade! Huzzé! Huzzé! Huzzé!.
Na Cerimónia de Iniciação também ocorre o desnudar parcial do candidato e a retirada dos seus metais.
As três viagens são como o Rito Moderno, com o Experto representando, respectivamente, o pai (Meu filho, vinde comigo), o mestre (meu discípulo, (acompanhai-me) e o amigo (meu amigo, apoie-se em mim) do candidato, em cada uma das três fases da existência humana.
Não há a Cerimónia da Taça Sagrada de outros Ritos. Todavia, no início da cerimónia é dado, para que o candidato beba, um copo com a Bebida do Esquecimento (que é uma infusão fria de espinheiro-alvar), enquanto que, próximo do final, antes do juramento e de lhe ser dada a luz, o candidato é convidado a ingerir a Bebida da Memória (que é uma infusão de genciana). Nesta parte, o Venerável explica, depois da Bebida do Esquecimento, que se fez do candidato um corpo morto, sem vontade própria, a Bebida da Memória fará dele um Maçon activo, um verdadeiro Filho da Viúva.
Depois do compromisso, o Mestre de Cerimónias perfura, com a ponta de uma espada, o Testamento Filosófico do Recipiendário, que estava em poder do Venerável, e queima-o numa das chamas do altar, enquanto o Venerável explica que “a palavra humana altera-se e apaga-se, mas aquilo que é confiado ao fogo, perdura eternamente”.
Quando a Luz é dada ao neófito, a Estrela Flamejante fulgura durante um breve instante. A Estrela simboliza a “Senhora do Ocidente”, ou seja, a Isis antiga, e brilha na cerimónia de recepção dos três Graus Simbólicos, mas de maneira diferente em cada uma delas.
No final de cada Sessão é formada a Cadeia de União Fraternal e, antes dela, há a cerimónia do Beijo de Paz com os obreiros de pé e à ordem, o Venerável abraça o Irmão que está imediatamente à sua direita e o Beijo da Paz circula do Norte ao Ocidente, do Ocidente ao Sul, para voltar através do Irmão que está mais próximo da sua esquerda (há um ritual abreviado, onde esta passagem é abolida).