terça-feira, 2 de maio de 2023

Mitos Herméticos

É fato conhecido que a ignorância costuma andar de mãos dadas com a pretensão. São justamente as pessoas que menos conhecem um assunto que se apresentam como doutas e se põem a falar dele da maneira mais irresponsável. Foi com certo espanto que tomamos conhecimento da matéria publicada no Correio Popular de 27 de abril, intitulada Contra a Astrologia. Nosso espanto não se deve ao fato de ser a Astrologia atacada por um cientista; nestes nossos mais de quarenta anos de atividade profissional como astrólogos, estamos acostumados a travar debates de alto nível com figuras do meio universitário. O motivo de nosso espanto é que já há muitos anos não víamos argumentos tão infantis, levianos, superados e inconsistentes.


Nosso articulista começa dizendo que a Astrologia “não possui qualquer base racional de funcionamento”. Acaso não será racional estudar as relações existentes entre o homem e a natureza? Ou entre a terra e o cosmos? Ou entre a vida e o ambiente que nos rodeia? Pois é exatamente isto que se faz em Astrologia. Seu método é baseado em cálculos matemáticos e posições astronômicas verdadeiras e seus resultados avaliados mediante correlações estatísticas. Ousaria o articulista afirmar que a Ecologia não possui uma base racional? Não constitui um dos apanágios da nossa era a consciência de que estamos, enquanto espécies viventes, absolutamente vinculados, por estreitas e mútuas relações, ao ambiente do nosso planeta? Não estamos nós na Terra o tempo todo sujeitos a poderosas radiações cósmicas, capazes de provocar mutações genéticas e mesmo profundas alterações – positivas e negativas – na constituição dos organismos vivos? Apresentando-se como biomédico, é espantoso que o articulista do Correio Popular ignore as recentes descobertas a respeito das consequências sobre a nossa vida, advindas do rompimento da camada de ozônio – até porque foram objeto de intenso noticiário, mesmo na imprensa popular. E não são apenas radiações solares que nos atingem. Uma quantidade incrível de energias desconhecidas – e, diga-se de passagem, muito mal explicadas pelo meio científico – estão a provocar transformações sensíveis na vida terrestre. Qualquer biólogo as reconhece hoje, mas até bem pouco tempo atrás, a ciência oficial as ignorava, talvez por serem demasiado sutis, talvez porque não havia ainda descoberto um método, nem desenvolvido aparelhagem capaz de detectá-las. Sucederá o mesmo um dia com as energias que a Astrologia já conhece há milênios, e cujas leis estabeleceu com profunda seriedade e impressionante exatidão, embora não possa ainda explicar a sua natureza.


É fato que as pessoas se divertem com a leitura de horóscopos diários, publicados pela imprensa. Também é fato que muitos leem a coluna da Astrologia como quem se recreia com palavras cruzadas, sabendo que as previsões aí escritas raramente batem com a realidade. Mas é preciso esclarecer que horóscopos diários são, em 98% dos casos, escritos por jornalistas, não por astrólogos. E, afora o simbolismo e a linguagem típica, tais matérias nada têm de Astrologia, não passando de folclore repetitivo e superficial, destinado a ministrar inofensivos conselhos e mensagens de otimismo. Assim, criticar a Astrologia baseando-se nas matérias jornalísticas da imprensa diária equivale a julgar toda a Medicina através de uma receita médica prescrita, digamos, por um vidraceiro.


Acontece que a Astrologia não é ainda uma profissão regulamentada, de modo que qualquer pessoa, sem preparo algum para o assunto, pode se auto-intitular astróloga, ganhar espaço numa revista e publicar asneiras. Mas o articulista não se limita a atacar a Astrologia que chamamos folclórica. Ele menciona “estudos científicos feitos por astrônomos” – como se astrônomos pudessem ter alguma autoridade para julgar uma ciência tão diferente da deles como, por exemplo, é a Psicologia em relação à Botânica! Quais astrônomos e quais estudos, o autor se esquece de citar. Mas, para nos atermos ao nosso exemplo, seria recomendável que o psicólogo estudasse botânica uns bons anos numa universidade antes de aventurar-se a publicar pareceres técnicos sobre o trabalho de um Linnaeus ou de um Liebig. Quando se sabe que é preciso dedicar no mínimo 20 anos à pesquisa da Astrologia – o mesmo tempo que um médico leva para obter alguma experiência profissional, ou um biólogo para formar suas próprias teorias sobre uma especialidade qualquer – só podemos considerar levianos e irresponsáveis os comentários do tipo que vemos nesse artigo.


Mas, suponhamos que tais “estudos” possam ser feitos por alguém que nunca estudou a matéria – como, é óbvio, é o caso deste nosso “articulista de ciência”. O mínimo que se exige é isenção de ânimo e honestidade intelectual, qualidades que o autor carece desenvolver. Ele propõe a seguinte pesquisa: tomar um grupo de 100 pessoas nascidas no mesmo dia e na mesma hora – deveríamos acrescentar no mesmo local, coisa que o articulista parece ignorar ser necessário para cumprir a função da pesquisa proposta – uma condição bastante difícil, senão impossível, de preencher, uma vez que, mesmo numa cidade grande como Tóquio ou Nova York, será realmente um prodígio reunir 100 pessoas nascidas no mesmo instante. Mas, adianta ele, já sabedor, de antemão, dos resultados: “veremos que pouca coisa existe em comum entre tais pessoas”. Segundo ele, “meras coincidências, diz ele, que se diluirão ao se tratar de pessoas oriundas de culturas distintas ou pontos opostos do planeta”.


Repetimos, em Astrologia – a científica, não a folclórica – é preciso que as pessoas tenham a mesma data, a mesma hora e o mesmo lugar do nascimento – se queremos comparar personalidades ou destinos. Acontece que pesquisas deste gênero, e muitas outras, já foram feitas – está claro que não pelo nosso articulista, nem pelos astrônomos que ele menciona, mas não nomeia. Mais de uma vez, aliás, em diferentes países, e por verdadeiros cientistas, dispostos a avaliar sem preconceitos e sem subterfúgios o resultado que surgisse, ainda que contrário a suas convicções anteriores. E todas essas pesquisas, sem exceção, concluíram que as semelhanças de personalidade e de fatos da vida eram absolutamente marcantes e indiscutíveis.


E para corroborar o que acabamos de afirmar, citaremos o mesmo autor que o articulista menciona, Michel de Gauquelin. Em 1950, Gauquelin – não um fisiólogo, como quer nosso articulista, mas um psicólogo – começou a interessar-se pela pesquisa da Astrologia não para defendê-la, mas para combatê-la. Baseou-se em levantamentos estatísticos feitos por Leon Lasson e Paul Choisnard, onde se colocava em teste a tradicional afirmação dos astrólogos de que os planetas significadores de determinadas profissões se colocariam nos ângulos – ascendente, descendente, zênite e nadir – da carta astrológica do nascimento: Marte para os atletas e militares, Vênus para os artistas, Saturno para os cientistas, Júpiter para os políticos. Gauquelin levantou nada menos que 25 mil horóscopos de eminentes figuras europeias, entre campeões, generais, artistas laureados, políticos famosos, etc., tentando demonstrar que a distribuição dos respectivos planetas significadores seria igual para todos, o que provaria que tudo se devia ao acaso. Qual não foi sua surpresa – e seu desagrado – ao descobrir que a estatística, muito ao contrário do que ele esperava, provava que os astrólogos tinham razão. Nos mapas de 3.142 líderes militares, Marte aparecia nos ângulos 634 vezes, quando, pelo acaso, deveriam ser apenas 535. A probabilidade de que tal distribuição anômala se devesse ao acaso era da ordem de um para um milhão. Nos mapas de 1.485 atletas, Marte apareceu nos ângulos 327 vezes – o acaso daria 253. Probabilidade: um para 500 mil. E assim por diante.


Gauquelin publicou em diversos livros seus resultados e a polêmica com os cientistas acadêmicos seus colegas, que, aliás – numa postura típica, mas profundamente anticientífica – diziam preferir deixar de crer na Estatística, a crer na Astrologia. Recomendamos a sua leitura ao nosso articulista, para que compreenda melhor com que rigor científico se deve fazer uma pesquisa sobre Astrologia antes de poder julgá-la. Gauquelin levantou ainda o mapa de 15 mil casais e seus filhos, a fim de testar a hereditariedade de posições astrológicas, encontrando novamente correlações estatísticas importantes, muito além do admitido para resultados devidos ao acaso. Para informação do articulista, e de seus leitores, Françoise, a esposa, colaboradora e coautora das pesquisas do Sr. Gauquelin, e emérita estatística, esteve, há alguns anos, hospedada em nossa casa, após participar de um Congresso de Astrologia. Tivemos oportunidade de conhecer de perto suas ideias sobre a matéria, assim como as provas que o casal reuniu em 30 anos de pesquisas.


O casal avaliou o desempenho de dezenas de astrólogos de várias épocas e países, não apenas um “famoso astrólogo francês” de que fala nosso articulista. Comparou estudos psicológicos de profissionais sérios, não de pessoas ignorantes do povo, ansiosas apenas por verem um retrato favorável na sua carta astrológica. E demonstrou de maneira inequívoca que uma pesquisa idônea leva à confirmação da Astrologia – nunca à sua refutação. Para concluir, vamos responder às “perguntas embaraçosas” que sua revista dos Céticos nos propõe:


1ª) A probabilidade de que 1/12 da população tenha o mesmo tipo de dia depende de fatores cósmicos que atingem uma região ou mesmo o planeta como um todo; assim toda a cidade de Kobe sofreu com o terremoto que a atingiu há alguns anos. O mundo todo sofreu com a 2ª Grande Guerra – embora em diferentes medidas, conforme o país. Mas um bom astrólogo pode identificar, com excelente precisão, dentro de uma população conhecida, quais pessoas terão uma dor de barriga num determinado dia. Entretanto, é importante que se diga, a Astrologia é uma ciência qualitativa, e não quantitativa. Podemos prever muita chuva para um dado período – mas não pretendemos dizer quantos milímetros de chuva cairão.


2ª) O momento da concepção também é estudado, e fornece indicações interessantes quanto à formação do feto. O senhor biomédico deveria estudar essa matéria, aprenderia muito com ela. No entanto, o momento da concepção raramente é conhecido com precisão, o biomédico deve saber bem disso. E quando a criança nasce, e respira, implanta-se nela o horóscopo do nascimento. Antes de respirar, sua vida depende totalmente da mãe. A Astrologia lida com a carta astral de alguém que já afirmou sua independência vital. Quanto às crianças prematuras, ocorre o mesmo que com as de tempo normal, ou com as de tempo excedido de gestação: só vale o momento da primeira respiração.


3ª) Antes da descoberta de Urano, Netuno e Plutão, o mundo era consideravelmente mais limitado. Os assuntos que eles regem na Astrologia não existiam na consciência dos homens, e não fazia qualquer diferença que existissem ou não, que fossem ou não colocados nos horóscopos das pessoas. De que serviria Urano num mundo que não conhecia a eletricidade, as máquinas, e os aviões – assuntos que ele domina? E para que se usaria Plutão numa Terra que desconhecia a bomba atômica, o petróleo e os computadores – coisas controladas pela influência deste planeta?


4ª) A influência dos astros não depende da sua distância. A influência deles é possivelmente da mesma natureza que a luz, mas isso ainda é uma hipótese. Sabemos, quase com certeza, que não se trata de influência gravitacional, pelo menos não somente ela, portanto a “matemática gravitacional” do nosso articulista não se aplica. A ciência descobrirá um dia como tudo se processa, assim como descobriu as ondas hertzianas, os raios gama, o ultra-violeta e o efeito Kyrlian.


5ª) A Astrologia considera, sim senhores, as outras estrelas, além do nosso Sol. Temos excelente estatística sobre sua influência, especialmente em casos de cegueira, mortes por acidente, profissões, naufrágios, ganhos em loteria e muitas outras coisas. Entretanto, confessamos não ter por enquanto qualquer estudo sobre a influência de outras galáxias. Talvez por falta de informações mais precisas dos astrônomos quanto à sua localização. Sugestão anotada!


6ª) Por que os astrólogos não ficam milionários, embora possam prever o futuro? Cremos que os bons e autênticos astrólogos se dedicam à sua prática da mesma forma e com os mesmos propósitos que todos os verdadeiros cientistas: por idealismo, por amor à ciência, não por dinheiro, de modo que apenas sobrevivem com o seu trabalho. Mas, parece-nos bastante óbvia a resposta à pergunta mais pueril de todas: saber prever não significa necessariamente poder alcançar, nem poder evitar alguma coisa. De resto, repetimos que nossa ciência é qualitativa. Prevemos tendências, não números, nomes, endereços nem fatos inevitáveis.


A seguir, daremos uma lista de 10 cientistas e pensadores laureados com o Prêmio Nobel, e que estudaram Astrologia e a apoiaram de modo explícito e mesmo público: Alexis Carrel (Medicina, 1912); Arrhenius (Química, 1903); Herman Hesse (Literatura, 1946); Maeterlinck (Literatura, 1911); R. Kipling (Literatura, 1907); Wolfgang Pauli (Física, 1945); Romain Roland (Literatura, 1915); Theodore Roosevelt (Paz, 1906); R. Tagore (Literatura, 1913); e Albert Einstein (Física, 1921). Há também dois Prêmios Pulitzer: John O’Neill (1937) e Norman Mailer (1969). Isso para não mencionar obras, tratados, cartas e documentos provando que estudaram profundamente e pesquisaram sistematicamente Astrologia: Copérnico, Galileu, Isaac Newton – que além de astrólogo era alquimista e ocultista, facetas desconhecidas de um cientista autêntico, que só é famoso como físico e matemático – Kepler, Tycho Brahe e Bode. Todos astrônomos!


Dentre os modernos astrônomos, citamos: M. L. Filipoff -do Observatório da Argélia- Charles Nordmann – do Observatório de Paris – e Bernard Lovell – Observatório de Jodrel Bank, em declaração publicada no Sunday Times de Londres, em março de 1963. Teria nosso articulista a coragem de afirmar que esses homens eram ou são cientistas medíocres, que suas descobertas são duvidosas ou que seus trabalhos ficam invalidados porque eles estudaram, acreditaram e se dedicavam à prática da Astrologia? Diria que Isaac Newton era um supersticioso, um ingênuo, um charlatão? Que Einstein – a quem devemos um dos mais comoventes testemunhos escritos em defesa da Astrologia – era um tolo, metido numa “atividade fraudulenta”?


Para finalizar, brindamos os leitores com uma expressiva declaração do astrônomo John O’Neill, Prêmio Pulitzer e editor de ciência do New York Herald Tribune, em carta dirigida ao astrólogo Sydney Omarr: “Falo como cientista que não se desviou da absoluta fidelidade aos mais altos padrões da evidência em apoio da verdade. Desvio-me, isto sim, da atitude comum de cientistas ao depositar mais confiança na observação direta da Natureza do que nos livros de texto das autoridades humanas. A Astrologia é um dos mais importantes campos para a pesquisa científica, em nossos dias, e um dos mais negligenciados. A Astrologia, propriamente definida, é a ciência do relacionamento do homem com seu ambiente celeste. É o conhecimento organizado e acumulado do efeito sobre o homem das forças que atingem a Terra, vindas do espaço circundante. Nada há de não científico, absolutamente, no fato de se realizarem pesquisas nesse campo, e não existe estigma algum que se lhe possa associar na mente de qualquer cientista ou leigo. Os cientistas não podem olhar do alto a Astrologia, antes terão de levantar os olhos para alcançar os horizontes mais elevados que os astrólogos reservaram para eles. Os ataques à Astrologia, sem prévia e extensa investigação feita por pessoas competentes, devem de agora em diante ser vistos como prática antiquada, nada científica, intimamente relacionada com a caça aos feiticeiros, e devem ser corretamente diagnosticados como sintomas de paranoia profissional da parte dos indivíduos atacantes”.


Astrologia e Livre-Arbítrio

“ASTRA INCLINANT, NON NECESSITANT”

OS ASTROS INCLINAM, MAS NÃO OBRIGAM

Tenho visto algumas vezes alunos iniciantes de Astrologia tomados por uma vaga dúvida, uma ponta de ceticismo em relação a essa ciência. A dúvida é um aguilhão que impulsiona o autêntico pesquisador em direção ao conhecimento, e, até certo ponto, ela deve ser considerada um sintoma saudável da alma que está em busca da verdade. Entretanto, ao escavar bem fundo essa dúvida, tenho identificado muitas vezes um desejo recôndito de que não existisse a realidade astrológica, para garantir mais amplamente aquilo que convencionamos chamar “livre-arbítrio”.


Quando o estudante afinal se convence de que não há saída e os fatos científicos se impõem aos seus olhos com toda a força e evidência da verdade irrecorrível, surge inevitavelmente a indagação: mas, se a Astrologia é um fato, será que nós somos um mísero e indefeso joguete dos astros, e tudo que nos acontece é fruto de ângulos planetários? Seremos bonecos cujas ações, longe de ser o produto de uma vontade própria, são apenas o resultado de uma posição astronômica no espaço naquele instante longínquo em que nascemos? Nosso amor próprio, nosso orgulho humano se revoltam contra tal ideia. Nada mais chocante do que acreditar durante toda uma vida que sempre fizemos o que desejávamos, e descobrir um dia que mãos invisíveis teciam nosso destino e haviam movimentado a cada instante os cordéis da nossa vontade. A crise filosófica em que esse raciocínio necessariamente nos submerge, além de nosso sentimento de angústia e rebelião, se tornam ainda mais profundos quando nos detemos a observar a realidade à nossa volta e descobrimos aquilo que só podemos qualificar de terrível injustiça cósmica: ricos e pobres, nobres e miseráveis, felizes e infelizes, sadios e doentes, puros e sórdidos, perfeitos e mutilados, lutadores e parasitas, coexistindo lado a lado, evidenciando uma outra realidade interna, essa produzida pela visão exclusiva e privilegiada do astrólogo – a dos horóscopos individuais – igualmente cheia de disparidades e contrastes. É claro que idêntica consideração filosófica se impõe àquele que não possui a bagagem do astrólogo. Essa mesma realidade de contrastes nos é apresenta à vista diariamente e não deixa de nos conduzir a uma incômoda dúvida sobre a bondade infinita do nosso criador, na qual desejamos por força acreditar e que nos foi ensinada em quase todas as doutrinas religiosas.


Mas a visão do astrólogo mostra algo mais: mostra qualquer coisa que soa a inevitável e a irrevogável. É nesse momento que a crise chega a um impasse: duvidar da Astrologia – e há um ponto em que isso já não é mais possível – ou da justiça divina – e isso significa derrubar um alicerce no qual nosso inconsciente está solidamente ancorado, de uma forma ou de outra. Resta a posição materialista de que não existe Deus e, portanto, não há lugar para considerações sobre “bondade” ou “justiça” divinas. Existem horóscopos individuais “felizes” e “infelizes” e isso encerraria a questão. Não deixa de ser uma posição cômoda como doutrina filosófica, mas obviamente não responde à indagação básica, que é a do determinismo versus livre-arbítrio.


Para aqueles que buscam uma explicação transcendente, há a resposta dos espiritualistas: tudo o que somos hoje é produto de nossos próprios atos passados, em vidas anteriores – a Lei do Karma ou da Causa e Efeito. A bondade divina se manifesta nas múltiplas oportunidades que nos confere o universo para redimir nossos erros e aprender com as novas experiências oferecidas em cada encarnação, e assim progredir na senda da verdade, até alcançarmos o Nirvana. Todo sofrimento é justo, pois resulta de uma má ação cometida por nós mesmos. Todo benefício é igualmente justo, uma vez que nos advém de um mérito passado. Nosso horóscopo individual, de acordo com esse raciocínio, nada mais é, portanto, que o “saldo” de nossas ações passadas, e a nossa “contracorrente” herdada do conjunto das encarnações anteriores.


Essa posição espiritualista nos reconcilia com o Criador, e nos permite voltar a crer na sua bondade e justiça – embora ainda possamos indagar por que é que Ele nos deixou um dia incorrer no primeiro erro, o que causou todos os outros e nos prendeu tão irremediavelmente à roda triturante das reencarnações. E a resposta a isso talvez pudesse ser “porque ele nos deu livre-arbítrio para optar entre o bem e o mal e, naquele dia, nós infelizmente optamos pelo mal”. Mas, redarguimos, não poderíamos agir mal senão em função de uma potencialidade para o mal! E essa potencialidade para o mal não nos adviria do nosso próprio horóscopo “infeliz”? E se nascemos com tal horóscopo “infeliz”, isso não tinha que ser necessariamente a consequência de um erro anterior?!


Há certamente um sofisma neste raciocínio, na presumida potencialidade para o mal: ela existe não apenas no horóscopo “infeliz”, mas também no “feliz”. E assim a pergunta se alonga para muito mais além e teríamos que questionar sobre o porquê da existência do mal em si. Mas isso pertence ao campo da Metafísica, não mais da Astrologia. Ainda que a explicação espiritualista nos deixe em paz novamente com o Criador, ela não resolve, à primeira vista, a questão do livre-arbítrio, de acordo com a visão astrológica. De certa forma, a proposta reencarnacionista nega o livre-arbítrio quando nos leva a concluir que nosso horóscopo é fruto inevitável de nossas ações passadas. Isso seria o mesmo que dizer: uma vez estabelecido o horóscopo de nascimento – “feliz” ou “infeliz” – tudo que nele está prometido, agradável ou desagradável, terá necessariamente que se realizar, para que nossas “dívidas” passadas sejam pagas e os méritos “cobrados” aos que nos deviam – “Perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos àqueles que nos ofenderam”. Não seria uma forma de pedir a abreviação dessa espécie de “vendetta” cósmica?


Por esse raciocínio, no entanto, notamos que a inevitabilidade do nosso destino transcende os limites do horóscopo, que corresponde à nossa atual encarnação, e se estende aos futuros horóscopos que herdaremos. As “dívidas” atuais são pagas, os méritos são “cobrados” e o “saldo” resultante se transfere para a encarnação futura, segundo um horóscopo que lhe corresponde em número e medida, e assim sucessivamente. Mas a resposta reencarnacionista certamente não nega o livre-arbítrio. Pelo contrário, o exalta. Ela nos diz que as circunstâncias da vida – nós traduziremos por “as condições astrológicas do nascimento” – nos colocam diante de certas escolhas, e são essas escolhas que irão determinar a espécie de vida – nós diremos “o horóscopo” – futura que teremos.


De fato, a inevitabilidade não está na escolha que fazemos, mas nas condições astrológicas que a puseram diante de nós – e estas sim são fruto de nossos atos passados. A forma de nossa escolha é livre e ditada unicamente pela nossa vontade. E ela que determina as “flutuações” do nosso “saldo” kármico, calcando os pratos da balança para cima ou para baixo. Em suma, movimentamos a nossa conta bancária do “céu”, acumulando reservas para as vidas futuras ou dilapidando as já existentes, de acordo com as ações presentes, que são opções livres diante de fatos inevitáveis. Não resta dúvida de que, colocada desta forma, a explicação espiritualista nos satisfaz muito mais amplamente do que qualquer teoria materialista. Ela torna compatível um aparente determinismo com o nosso conceito de justiça e adapta a visão astrológica a parâmetros filosóficos muito mais aceitáveis para o espírito racional. Resta ainda, porém, explicar de que maneira as circunstâncias astrológicas inevitáveis, pois que já estão estabelecidas quando nascemos, se colocam diante de nós para escolha – essa voluntária – e qual seria na verdade o nosso grau de liberdade nessa escolha, dado que esta mesma não poderia estar livre das próprias circunstâncias astrológicas que as produziram.


A Transmutação Astrológica


Se, em determinado período da vida estamos sob um influxo cósmico que a Astrologia qualifica como Quadratura de Saturno – o que deve ser traduzido como um período muito difícil, desagradável, duro, cheio de privações e adiamentos, perdas e sofrimentos, pela natureza maléfica do planeta e do ângulo em questão – a tradição nos ensina que uma série de acontecimentos nos aguarda, todos relacionados com a natureza própria do planeta Saturno, além de outras considerações que nos remetem a cada caso individual – tais como a casa onde se localiza o planeta, as casas regidas por ele, etc. Para simplificar, vamos enumerar apenas cinco das consequências prováveis dessa quadratura: morte de um parente idoso; fratura de um osso; um mau negócio imobiliário; uma profunda depressão psíquica e debilidade física; ou uma situação de grande isolamento e privação das condições normais de conforto.


Certamente, nenhuma dessas opções nos parece atrativa. Por nossa vontade, evitaríamos todas elas. Saturno, porém, exige seu imposto, é preciso satisfazê-lo, pois em Astrologia, não existe “sonegação”. Muita gente optará por pagar esse “imposto” no plano físico: uma fratura, uma doença, uma depressão lhe parecerão mais baratas que a perda de um ente querido. Outros preferirão uma perda financeira. Outros pagarão o imposto na íntegra, sofrendo nos cinco itens. Uma questão que depende do grau de evolução individual ou do nível em que se encontra a “dívida” atual em termos kármicos.


Está claro que, na imensa maioria dos casos, essa “opção” é absolutamente inconsciente. Há um fluxo de energia proveniente da vontade íntima que sopra na direção dos acontecimentos que o indivíduo mais necessita experimentar, a título de evolução espiritual. Ou sopra na direção que seu super consciente exige como “cobrança” kármica. São mecanismos complexos que somente os interessados no campo esotérico chegam a estudar. De qualquer forma, existe uma opção possível, e está entre os vários planos de vivência de um aspecto ou posição astrológica – seja no mapa de nascimento, seja nas progressões e trânsitos durante a vida. Como nos ensina Hermes Trismegisto, “existem vários planos de causalidade, porém, nada escapa à lei”. Creio que esta frase resume o que se pode dizer de mais importante em matéria de livre-arbítrio. Podemos “jogar” entre os vários planos causais, mas não podemos simplesmente fugir a um aspecto ou influência, qualquer que seja.


Quais serão esses “planos de causalidade”? Podemos enumerar cinco deles, os mais comuns em nossa vida terrestre: lº) plano físico; 2°) emocional; 3º) social; 4º) profissional e 5º) simbólico. O plano físico é o preferido da maioria das pessoas. É através da saúde que mais frequentemente resgatamos nosso karma. No exemplo do aspecto de Saturno, que mencionamos há pouco, é uma fratura, que nos imobiliza numa camada de gesso, ou uma doença prolongada, que nos amarra a um leito de hospital. No plano emocional, é uma depressão, que nos subtrai a alegria de viver, nos afasta dos amigos e da família e nos obriga a passar por tratamentos penosos. Pode ser também uma dor moral, um medo, uma preocupação, uma pesada responsabilidade que nos assusta e rouba nossa paz de espírito.


No plano social, a influência se dilui entre pessoas de nosso convívio – a família, os amigos, os colegas de estudo e trabalho. Saturno cria distancia, esfria relacionamentos, separa e chega a destruir vidas ao nosso redor. Pouco poder de decisão nos compete neste plano, já que nele dependemos de terceiros, e, mesmo que façamos nossa parte para evitar as piores consequências, nada podemos fazer a respeito da vontade alheia. O plano profissional é, em parte, um desdobramento do social, mas merece algumas considerações especiais. Na nossa atividade profissional cotidiana, vivemos aspectos astrológicos através de clientes, por exemplo. É como uma “transferência” da força do aspecto para outras pessoas. Assim, ao invés de sofrermos nós uma fratura, atendemos um cliente que acaba de ter uma. Ao invés de termos uma perda financeira, recebemos no escritório um cliente que faliu.


A vivência neste plano é particularmente reconhecível nas atividades que podemos denominar “sacerdotais”, ou seja, naquelas em que se subentende um aconselhamento ou prestação de socorro. É o caso, por exemplo, dos médicos, psicólogos, psiquiatras, enfermeiros, assistentes sociais, sacerdotes e astrólogos, é claro. Finalmente, o plano simbólico é o mais sutil. Em nossos sonhos e pesadelos “descarregamos” os medos, angústias, preocupações e desejos reprimidos. Ao sonharmos com uma guerra, por exemplo, vivemos um aspecto negativo de Marte; sonhando com cemitério, campos devastados, desertos e pragas domésticas, “gastamos” um Saturno negativo. E assim por diante.


A vivência simbólica é mais frequente do que pensamos nesta Era Moderna. Após a invenção do cinema e dos jogos computadorizados, abriu-se para nós mais uma opção de “descarga” de aspectos negativos. Assistimos a um filme de guerra e, quanto mais violento, mais o planeta Marte se declara satisfeito; vemos um filme de Kung-Fu, e Plutão – quem sabe também Marte, Saturno, Netuno e Urano, todos juntos! – ficam em paz conosco. Um drama de amor – quanto mais lacrimal, melhor – e aí gastamos a dor que nos produziria Vênus num drama autêntico. Um bom videogame simula com perfeição um combate aéreo – quem sabe lá gastamos o risco de um acidente de verdade!


O segredo da vivência simbólica é a transferência do sofrimento físico para um plano intelectual ou emocional, não raro tão ou até mais intenso ainda do que seria o drama físico, só que compactado num pequeno espaço de tempo – o tempo que dura o filme ou o jogo. Se medíssemos as lágrimas derramadas por alguns telespectadores durante um só capítulo de certas novelas, é provável que superem as que dispenderiam numa separação conjugai. Ou se aferíssemos a pulsação e os batimentos cardíacos de um garoto enquanto mede forças com seu videogame, certamente entenderíamos a descarga de energia que isso representa para Urano ou Marte em mau aspecto.


Aos artistas, o reino dos símbolos destinou uma válvula especial para cada mau aspecto: pinte para si mesmo um quadro triste, e lá se vai a quadratura de Saturno, transformada nas tintas de uma paisagem melancólica; componha uma marcha militar, e Marte se gratifica com ela; escreva uma poesia nostálgica, e Vênus se delicia; escave na pedra a escultura de um pequeno monstro, e Plutão desejará levá-la para sua coleção particular. Não há mau aspecto de Saturno com Plutão que resista a uma carreira como a de Steven Spielberg, o grande cineasta da atualidade, cujas criações cinematográficas jamais deixam de registrar cenas horripilantes, em que baratas, escorpiões e serpentes disputam espaço com cadáveres em putrefação, alimentos repulsivos, tripas arrancadas à mão e gente esmagada, devorada ou triturada aos pedacinhos. Spielberg – que, não por acaso, possui em seu mapa natal uma conjunção Saturno-Plutão – é uma verdadeira panaceia para descarregar aspectos que tragam desastres terríveis. Consciente ou inconscientemente, este cineasta usa em sua criação tudo aquilo que poderia ocorrer com ele na vida diária. Outro exemplo interessante disso está em Van Gogh, outra vítima do mau aspecto Saturno-Plutão, que passou a vida a pintar cenas de miséria humana; ou Victor Hugo, com o mesmo aspecto, que teve uma enorme produção literária, mas cuja obra mais famosa foi exatamente a que retrata as mais tristes cenas da exploração humana: “Os Miseráveis”.


Percebemos por estes exemplos uma das possibilidades de usar nosso livre-arbítrio: podemos transferir a vivência dos aspectos astrológicos de um plano para outro. Como já dissemos, essa transferência é inconsciente na maioria dos casos. Mas pode tornar-se consciente quando a pessoa conhece Astrologia, identifica ou prevê os aspectos que a afetam e assume a responsabilidade de desviar a força do aspecto para outra direção. Em geral, basta a vontade forte para promover a transferência. Entretanto, é sempre útil empregar um ponto de apoio, como um filme, uma novela, o jogo certo ou a criação artística, pois não deixam de ser formas mágicas de defender-se dos aspectos nefastos.


Neste capítulo sobre as vivências simbólicas, cabe ainda citar as do gênero cerimonial, que são em geral aplicadas de forma programada, intencional. É o caso das ordens iniciáticas, como a Maçonaria e a Rosacruz. Em ambas, tal como nas antigas cerimônias do Egito, determinados ritos simulam a morte do candidato à iniciação nos mistérios. Foram criadas com a finalidade de preparar o candidato para o verdadeiro momento da sua morte, mas também para fazê-lo sofrer a morte simbólica para a vida profana, e seu renascer para uma nova vida de iniciado.


No Egito – e ainda hoje nas lojas maçônicas mais preocupadas com a perpetuação dos antigos segredos – tais cerimônias desencadeavam enorme força mágica, onde mantras especiais e uma poderosa egrégora se somavam para produzir no profano um formidável impacto. Exatamente a força desse impacto era capaz de “descarregar” as energias negativas de sua existência profana, e, de quebra, resolvia os maus aspectos astrológicos que pudessem abreviar indevidamente o curso de sua vida.


Conheci certa vez uma senhora que passava por um período crítico na vida. Sua convivência em família era problemática, tinha conflitos com o marido, a atividade profissional ia mal, tudo estava naufragando. Desejou morrer, porém, não lhe passava pela ideia suicidar-se, fosse por sua formação religiosa, fosse porque tinha filhos menores para criar. Mas, tendo algum conhecimento quanto aos ritos simbólicos, preparou para si mesma um “funeral”. Sozinha em casa, e, em absoluto segredo, cercada por quatro velas acesas, deitou-se na cama, cobriu-se com um pano negro e, através de uma prática que lhe era familiar, entrou em “alfa”, programando-se para retornar dali a algumas horas. Voltou à vigília consideravelmente aliviada das tensões e muito mais preparada para enfrentar suas dificuldades. A pequena cerimônia serviu-lhe, portanto, às mil maravilhas para descarregar os pesados problemas que vivia.


Tão poderoso foi seu singelo ritual solitário, do qual se absteve de falar com qualquer pessoa da família, que, na manhã seguinte, a filha menor, com quem tinha uma ligação mais afetuosa, entrou correndo em seu quarto, tomada de prantos convulsivos, e gritando: “Mamãe, mamãe, eu sonhei que você tinha morrido!”. A sua “morte cerimonial” tinha sido gravada tão fortemente na memória astral – ou akasha, como se diz em sânscrito – que sua filha foi capaz de captar a imagem em sonhos.


É assim, através de mensagens que impregnam dimensões mais sutis, que se opera a “descarga” dos aspectos que ameaçam a pessoa nos planos mais grosseiros. Os sacerdotes e os grandes iniciados das antigas ordens de magos conheciam o processo pelos quais tais mensagens melhor se gravam na memória da natureza – e do candidato aos mistérios – de forma que a própria aura, assim como os corpos mais sutis da pessoa, ficavam assinalados com a experiência. Assim, poderiam ser reconhecidos por outro mago, ainda que muitas vidas se tivessem passado. Na verdade, a vivência “teatralizada” funciona como se a experiência tivesse ocorrido de fato na vida da pessoa. Pelo menos, para fins astrológicos, o processo é muito eficiente.


Citando mais uma vez Hermes Trismegisto, sua primeira lei nos ensina que o todo – ou o universo – é mental. É como dizer que tudo que existe à nossa volta e que nos parece tão sólido, opaco e pesado, não passa de energia pura – apenas um pouco mais condensada. Curiosamente, em uma de suas peças pouco conhecidas, A Tempestade, Shakespeare nos diz algo bem semelhante: “0 mundo é feito da mesma matéria de que se fazem os sonhos”. Sendo assim, o universo é como uma imensa máquina de videogame, com cenários virtuais muito aperfeiçoados, e nós não passamos de pequenos personagens igualmente virtuais, que lutam, trabalham, estudam, sofrem, amam, têm filhos, guerreiam e morrem.


Da mesma forma que nos nossos sofisticados programas para jogos de vídeo, os personagens lutam, enfrentam obstáculos, tentam salvar sua pele e a da amada princesa, enfrentam adversários impiedosos, e, conforme nossa habilidade em lidar com a máquina, sobrevivem ou morrem. “Ganham-se” vidas adicionais, de acordo com méritos previamente estipulados nas regras do jogo, ou se “perdem”, conforme as mesmas regras. No próximo jogo, com uma nova vida, os mesmos personagens voltam a enfrentar outras dificuldades, e assim por diante. No imenso holograma cósmico, somos suas minúsculas partes, cópias idênticas do todo, dotados da mesma inteligência e do mesmo poder – embora pouco conscientes disso. Michael Talbot, no livro O Universo em Forma de Holograma já prenunciava a descoberta científica moderna dessa visão de Hermes. Estaremos, em nossos inocentes joguinhos para adolescentes, tentando imitar o holograma cósmico?


Se o universo é um grande cenário virtual, guiado por forças intangíveis, e manipulado segundo regras previamente traçadas – regras secretas que os astrólogos descobriram como funcionam, e que, tais como Cassandra, proclamam aos quatro ventos, mas quase nunca são ouvidos – é possível entender por que se pode transferir de um plano para outro as influências do nosso horóscopo. Faz parte desse grande jogo “ganhar vidas” ou vantagens – se cumprirmos rigorosamente certas condições – como faz também parte perdê-las e sofrer castigos, no caso de infringirmos as normas prescritas. Ou seja, prolongamos nossa vida terrestre e angariamos algum tipo de prêmio sempre que obedecemos a regras específicas. Abreviamo-la e sofremos derrotas quando deixamos de segui-las.


De alguma forma, coube sempre aos sacerdotes de todas as eras enunciar tais regras, sendo que o prêmio se colocava sempre para além da morte. Daí o papel das religiões – elos feitos para “religar” o homem às suas origens e aos segredos do universo. Como vimos, as escolas iniciáticas da vertente hermética foram bem mais longe do que isso, ensinando aos seus discípulos a verdadeira natureza do Grande Jogo Cósmico.


Uma conclusão se impõe sobre tudo isso: o livre-arbítrio é tanto maior quanto mais alto o grau de consciência do indivíduo em relação a esse Jogo Cósmico. A Astrologia, regida por Urano, o primeiro dos planetas não visíveis a olho nu em nosso Sistema Solar, é também a primeira das chaves para a descoberta das leis do universo. Aquele que estudá-la e aplicá-la em prol de seu autoconhecimento e nas previsões de seu próprio futuro, conseguirá superar inúmeros obstáculos, que a outros parecerão impossíveis, e saberá como viver, em esferas muito mais refinadas, os aspectos de dor e sofrimento por que teria de passar normalmente.


Ao iniciado, outras chaves mais secretas se apresentarão como recursos extraordinários para transcender a dimensão grosseira dos mundos material e emocional: a segunda chave é a Kriya-Yoga, regida por Netuno – segundo planeta não visível – e a terceira é a Alquimia, governada por Plutão – o terceiro planeta não visível. As três chaves são dadas aos mortais como instrumentos para superar o karma, reduzindo o número de reencarnações obrigatórias. No Jogo Cósmico, são “prêmios extra” conquistados através de méritos muito especiais, méritos que se adquirem levando uma vida austera, renunciando a prazeres frívolos e dedicando-se ao serviço do próximo e da humanidade. Tais são, em síntese, as regras desse jogo. Entretanto, mesmo conhecedor de vários destes recursos, há momentos em que o domínio de nosso destino fica realmente ameaçado. É quando os acontecimentos estão nas mãos de terceiros – estes sem qualquer acesso ao conhecimento das regras do jogo.


No exemplo anterior, a influência de Saturno poderia, entre outras consequências, trazer a doença e até a morte de uma pessoa querida – geralmente idosa – como o pai ou a mãe. Mas, como persuadir certos velhinhos obstinados de que já passaram da idade de subir em telhados para limpar as calhas? Como convencê-los de que precisam tomar os remédios nas horas certas, mesmo quando já se sentem curados? E assim, alguns de nossos aspectos nefastos são vividos de maneira bem desagradável, sem que tenhamos tempo de intervir. Estes fatos servem para nos mostrar que está razoavelmente em nosso poder modificar o karma pessoal, mas que o de outrem geralmente foge à nossa competência. Há poucos exemplos de que alguém conseguiu alterar o destino de outra pessoa. É o caso de mães que salvam a vida de um filho – seja por um gesto heroico, seja pelo poder de orações – ou de amantes apaixonados, quando o heroísmo e a abnegação igualmente entram em cena.


Nestes casos, de imediato se percebe a intervenção de três fatores, todos dotados de um incrível poder mágico e transformador: o amor, o sacrifício e a fé. Não é raro que, para salvar o filho, se dê em troca a vida da mãe – o mesmo ocorrendo entre os amantes. Assim é a norma do jogo: você pode salvar outra vida, contanto que entregue a sua. Às vezes, a simples disposição de dar a vida em troca de outra é suficiente para resgatá-la. Em ambas as possibilidades, o amor foi o preço inestimável pago para se obter o prêmio da outra vida. Aprendemos aqui uma regra de ouro do Grande Jogo: o amor – não o amor passional ou possessivo, mas o amor-doação, o amor capaz do sacrifício maior – é uma das formas de redenção, talvez a mais poderosa de todas. A fé é outra força redentora, mas, como diz São Paulo, nada vale se não houver amor.


Falemos um pouco sobre o livre-arbítrio quando se trata do mapa astral de um criminoso ou de um viciado. Há mapas simplesmente “terríveis”, dos quais um astrólogo deduzirá com facilidade acontecimentos trágicos e alta cota de dor e sofrimento. Diríamos talvez que tais indivíduos, com tendências notáveis para o vício ou o crime, tiveram pouca chance de evitar seu triste destino, pelo mapa astral que lhes coube. Mas, o mesmo mapa astral, violento e terrível, pode ser encontrado em indivíduos cuja vida foi inteiramente dedicada ao benefício da humanidade, e que deixaram uma obra magnífica para a posteridade. No entanto, eles encontraram um destino trágico, com perseguições, prisão, tortura, mutilação, perda de tudo e de todos que lhes foram caros, e finalmente morreram nas piores circunstâncias.


Citemos o caso de Giordano Bruno, o grande iniciado do século XV, que, após permanecer preso por sete anos, sofrendo as mais terríveis torturas, morreu na fogueira da Inquisição; de Ludwik Zamenhof, o criador do esperanto, cuja família foi assassinada e os bens confiscados pelos nazistas; de Jan Amós Comenius, um dos mais admiráveis educadores de todos os tempos, cuja família também foi assassinada, a casa e a preciosa biblioteca foram queimadas, e que morreu no exílio; o célebre sábio e alquimista Sendivogius, preso e torturado até a morte; ou William Wallace, o herói libertador da Escócia, cuja vida foi objeto de um filme recente, Coração Valente – perseguido, traído, a esposa assassinada, e, por fim, barbaramente torturado e decapitado; ou Mahatma Gandhi, iniciado, sábio e libertador da Índia, um dos maiores homens da Terra, preso a maior parte de sua vida, perseguido e brutalmente assassinado. Seus mapas astrológicos certamente mostram o destino trágico que tiveram. Mas suas vidas foram limpas, suas obras, beneméritas e suas almas, abnegadas.


Ao nascer, o homem recebe uma pequena coleção de instrumentos de trabalho: um recebe uma machadinha, uma régua, uma pá. Outro ganha um martelo, um lápis, uma faca. O primeiro vai usar a machadinha para cortar lenha, a régua para desenhos arquitetônicos, a pá para plantar árvores. O segundo vai usar o martelo para arrombar janelas alheias, o lápis para contar o dinheiro que roubou, a faca para matar. Antes de nascer escolhemos os instrumentos de trabalho com os quais viremos ao mundo. Esta é a parte que não poderemos mudar. Durante a vida, porém, recebemos a liberdade de optar pelo uso que faremos desses instrumentos. É neste setor que mais podemos exercitar o livre-arbítrio. Inclusive, eventualmente, por nosso mérito, aplicação e inteligência, talvez consigamos criar nós mesmos alguns novos instrumentos, ou aperfeiçoar os que já temos. Podemos ainda melhorar o uso daqueles que recebemos sem um “manual de instruções”.


Resta abordar a interessante questão do livre-arbítrio a nível coletivo. Conta-se que um grande astrólogo persa previu um terremoto em sua cidade. Deu-se o trabalho de avisar a todos no lugar que haveria um imenso desastre, e que muitos morreriam se não abandonassem suas casas. Os habitantes apenas riram dele, ninguém saiu de casa. Fiel aos seus prenúncios, o astrólogo foi à praça da cidade, aguardar o terremoto. Já tarde da noite, começou a nevar e a fazer um frio intenso. Temeroso de morrer ali mesmo, de frio, ele acabou por recolher-se de volta à sua casa, onde um fogo acolhedor o esperava. Sua previsão se cumpriu: veio o terremoto, a cidade foi bastante destruída, muitos morreram, incluindo o nosso pobre astrólogo.


É muito raro que alguém dê ouvidos às profecias dos astrólogos, mesmo quando são acertadas. Nosso astrólogo persa não foi o único a prever corretamente os terremotos. Outro, mais moderno, Alfred Pearce, previu com exatidão de dia, diversos tremores nos Estados Unidos, publicando suas previsões num almanaque popular. Ninguém lhe deu crédito a ponto de deixar a cidade, exatamente como ocorreu com o colega persa. Felizmente, não houve danos terríveis, e com certeza os habitantes acharam boa a decisão de ficar em casa. Se já é bastante difícil para um indivíduo mudar seu destino através de algum trabalho ou sacrifício, pode-se imaginar como será mudar o de uma cidade ou nação inteira. Seria preciso mobilizar a opinião pública numa direção que talvez seja completamente contrária às suas tendências naturais. E, mais provavelmente, acharão demasiado incômodo mudar seus hábitos para seguir um “profeta” qualquer, ainda que já muitas vezes ele tenha mostrado ser eficiente. Já houve tempo em que os governantes se deixavam assessorar por astrólogos – ou eram eles mesmos versados nesta ciência, e o próprio povo conhecia dela o suficiente. O povo seguia as orientações e as mais sérias decisões eram tomadas sob a égide da Astrologia. Mas a tendência atual é deixar acontecer.


Há duas formas pelas quais se pode abrandar, senão resguardar-se de todo da influência nefasta de certos aspectos. Ambas nos remetem para o terreno da Alquimia. Uma delas é a confecção de talismãs astrológicos, baseados no trânsito de um planeta benéfico, como Júpiter ou Vênus, sobre o mapa astral de um determinado indivíduo, num momento cósmico especialmente calculado. Serão válidas somente para aquele indivíduo em questão, e para mais ninguém, e poderão servir como um autêntico para-raios em relação a aspectos nefastos do mapa natal, ou de passagens transitórias da pessoa durante um período da vida. Poucas pessoas são capazes de calcular corretamente tais talismãs, e muitos charlatães, atribuindo-se “poderes mágicos” comercializam medalhas protetoras – um mercado fácil para vítimas ingênuas. Mas sabemos como a medalha autêntica pode realmente defender a pessoa contra um mau aspecto. Produzida em metal apropriado, emana sutilmente uma influência inspiradora. A outra forma de defesa requer um grande esforço pessoal e muita sabedoria. Representa a verdadeira saída transcendental para aqueles que não aceitam as formas grosseiras de “pagamento” dos impostos dos astros.


Somos unânimes em considerar pouco criativos, e nada construtivos, os tributos que Saturno nos oferece à escolha. Afinal, qual a utilidade prática de uma fratura? Ou da perda de um imóvel? De uma dor de dente? A influência astrológica está aí, essa não podemos evitar, como não podemos impedir que chova. Mas, não seria possível evitar de nos molharmos? Haveria um meio de proteger-nos da influência de Saturno, qualquer coisa parecida com um guarda-chuva antiplanetário?


Conta-se que Hitler chegou a construir um abrigo subterrâneo, coberto com uma placa metálica muito espessa – não para protegê-lo das bombas, mas para servir como anteparo contra influências astrológicas nefastas. Talvez ele tivesse tido alguma indicação sobre as medalhas que mencionamos. Certamente, ninguém poderia defender-se de modo tão tosco e simplista. Influxos astrológicos são de natureza sutil e precisam ser tratadas com outro gênero de providências.


 Esse guarda-chuva antiplanetário efetivamente existe. Apenas requer que cada um de nós o construa com seu próprio esforço, sua energia, prudência, sabedoria, discernimento e paciência. É exatamente nesse momento que a capacidade individual de transmutação entra em cena. Que coisas positivas, boas, construtivas e agradáveis são governadas pelo mesmo Saturno? Citemos algumas: o trabalho profundo da mente, a pesquisa séria de uma teoria filosófica, a ciência, as lides agrícolas, o esforço digno e paciente para descobrir as origens de um mistério qualquer da natureza, o autoconhecimento, o cultivo da força de vontade, a construção lenta e minuciosa de um plano de futuro, de uma ideia, de um sonho que alimentamos há muito tempo.


Uma obra perene, ou a reconstrução de algo que no passado foi destruído pela nossa imprudência ou ignorância. A realização de uma tarefa que noutra época nos pareceu pouco compensadora, ou demasiado difícil, ou tediosa, mas que sabemos necessária e adiada. Ou colocar na devida ordem coisas velhas, abandonadas, esquecidas e desorganizadas, que há anos atiramos no sótão e cujo peso um dia fará o teto desabar. São opções sadias e benéficas que Saturno nos propõe, por que não aceitá-las? Acaso darão mais trabalho que um osso quebrado ou uma crise suicida? Talvez assim pareça, para alguns, à primeira vista, mas aqueles que aceitarem o desafio e assumirem voluntária e prazerosamente esse lado positivo, poderão saborear, como um delicioso manjar, o gosto de uma vitória íntima, uma batalha ganha sobre nós mesmos – e sobre as poderosas forças vindas do espaço, e sentirão como a pesada nuvem de Saturno, com seu imposto inexorável, se desvanecerá por si, deixando apenas um rastro de satisfação, uma consciência de poder e de saber que faz o homem crescer internamente e sentir-se mais perfeito, mais sábio e mais próximo do Criador.


Ao fim da quadratura avaliamos o seu saldo, e, com surpresa, descobrimos que criamos qualquer coisa de maravilhoso, que deixamos uma semeadura fértil, cujos frutos colheremos por muitos anos; que gerações seguidas nos recordarão com gratidão por uma obra admirável que legamos, e que um tempo de resignação e esforço dedicado levantou todo um edifício sólido, durável e belo, que nos abrigará da intempérie e mostrará seu valor e utilidade futura. Enfim, diremos que a tarefa não foi assim tão penosa, e, além de tudo, nos deixou mais ricos de alguma forma. Tal como Tom Sawyer, o famoso personagem de Mark Twain, aprenderemos que caiar um muro não era afinal uma punição, e nem sequer um trabalho, mas uma atividade simples, onde a alma sem preconceito poderia encontrar alegria e até mesmo certo encanto. É assim, apenas com uma nova disposição de espírito, que o chumbo de Saturno se transforma no ouro solar. Como nos ensina o velho Hermes: “A verdadeira transmutação é uma arte mental”.


O Zodíaco Sideral

Uma novidade de 3.500 anos


Um sábio de nome Parâshara, que nasceu na índia cerca de 1.500 anos antes da Era Cristã, é autor de alguns dos mais antigos estudos sobre a saúde humana do ponto de vista astrológico, e de cálculos documentados da distância do equinócio à estrela Revati – Zeta Piscium – ponto de partida do Zodíaco Hindu. Sua preocupação em fazer esse cálculo mostra o conhecimento, que já possuía, à época, sobre o movimento precessional. No mundo ocidental, esse conhecimento data do século II a.C., quando o astrônomo e matemático grego Hiparco, além de avançar nas ideias sobre a precessão, afirmou que o Sol possuía uma órbita circular, da qual a Terra não era o centro. Nada, portanto, sustenta a pretensão de alguns modernos astrônomos de terem descoberto “recentemente” a precessão e muito menos a afirmação de que os astrólogos desconhecem o fenômeno e que continuam a considerar a Terra como centro do universo, pois tanto Hiparco como Parâshara e outros astrônomos hindus – como Mihira, Narâda, Garga e Ranavira – eram astrólogos.


A ideia do Zodíaco de Constelações, que a chamada Escola Sideralista quer que seja o único a ser usado, não é nova. Uma vasta literatura e uma estatística pelo menos milenar mostra até que ponto os astrólogos acharam útil esse sistema. Os hindus ainda hoje o aproveitam. Mas, nem os hindus, nem os astrólogos ocidentais chegaram ao absurdo de descartar o Zodíaco Trópico – dos signos – em favor do das constelações. Todos usam simultaneamente ambos os sistemas, aos quais se deve juntar ainda o sistema do Zodíaco Terrestre – das casas – baseado na trajetória diária aparente do Sol. Um astrólogo inteligente e eclético deve saber reunir as vantagens e as informações dos três Zodíacos, dando a cada um deles a importância que merece. O grave e insuperável defeito do referencial das constelações é não refletir os fenômenos vitais mais importantes da Terra, quais sejam as estações do ano.


Assim, pelos novos signos siderais, Áries, o mais perfeito símbolo do brotar da primavera, do calor que retorna, do ardor dos acasalamentos, da ressurreição da vida após o longo inverno, do Hemisfério Norte, vai cair nas águas do degelo, no frio úmido do mês final das neves – um quadro tão evidente e próprio de Peixes! Ora, a Astrologia é exatamente a ciência que pretende, através de uma simbologia peculiar, captar o sincronismo existente entre os fenômenos terrestres e o ambiente cósmico que nos circunda, descobrindo as leis que o regem e os ciclos que nos conectam ao universo. Qualquer sistema que destrua esse sincronismo será tudo menos Astrologia. A maioria das escolas astrológicas ocidentais da atualidade – e entre elas a sideralista, que nada mais é que uma micro corrente – são unânimes em atribuir às constelações a virtude de influenciar as civilizações como um todo, durante o correr de eras inteiras – como exemplo temos a Era de Peixes, Era de Aquário, etc. – proporcionando a cada longo período um sutil colorido com formas peculiares de comportamento e de visão filosófico-religiosa. Elas estudam também, e especialmente, a influência primordial das estrelas ditas “fixas” dessas constelações.


A ciência astrológica conta sua idade por milênios, e toda a prática e estatística de mais de 2000 anos provam que, tanto no plano individual como no coletivo, são elementos atuantes os signos zodiacais com início no ponto vernal, onde quer que ele se encontre. Tirante a influência sobre as longas eras da humanidade, o sistema sideralista se mostra irracional e impraticável, como adiante se prova. O absurdo da tentativa sideralista começa com a adoção de um sistema de referência móvel com relação ao nosso calendário e ao ano trópico, quando tudo o que se espera de um sistema de referência é que seja o mais fixo possível, justamente para que cumpra o papel de ponto de partida.


Assim, daqui a 72 anos, todas as criaturas nascidas no dia 22 de abril – data aceita pela União Internacional de Astronomia como início da constelação de Áries – passarão à regência de Peixes. Mais 72 anos depois, e também as pessoas nascidas a 23 de abril serão piscianas, e assim por diante. Por outro lado, como se faz tanta questão de usar as constelações como referencial, é preciso ser fiel ao quadro geral que elas impõem, ou seja, descobrir que influências próprias determinam astrologicamente – e que não serão necessariamente idênticas às dos signos zodiacais. Isto não se fez na Escola Sideralista, que usa exatamente os mesmos tipos caracterológicos do Zodíaco universalmente adotado, limitando-se a deslocá-los no tempo e no espaço. Ainda para sermos fiéis ao verdadeiro quadro das constelações, seria preciso dividir seu ciclo de acordo com as dimensões que cada constelação apresenta, e não, comodamente – e ilogicamente – de 30 em 30 graus, como fazem os sideralistas modernos. Assim, se há uma constelação de 44º de arco, como é o caso da Virgem, há uma outra de apenas 20º, como Câncer – e os respectivos signos sidéreos deveriam obedecer o mesmo critério de duração em dias. Há, além disso, a Constelação de Ophiucus, que passou em nossos dias a ter o Sol cruzando sua órbita anual por causa do movimento Precessional, e que então deveria ser incluída entre os “novos signos”. Ela ficaria entre Escorpião – reduzido a 7 dias, ou 9 graus de arco – e Sagitário, que teria mais ou menos 30º.


Mas, outros problemas são criados se utilizarmos o referencial das constelações; além de não terem um tamanho uniforme, não estão distribuídas numa sequência espacial perfeita. Suas áreas se interpenetram, de forma que há zonas onde na verdade se encontram duas constelações, como é o caso de Peixes com Aquário e de Virgem com Libra, sendo que Denébola, a segunda estrela mais brilhante da constelação do Leão, está vários graus para dentro da constelação da Virgem. Quando o Sol transita por certos graus dessas faixas, cruza duas constelações simultaneamente; a qual das duas pertence o indivíduo que nasce com o Sol nesses lugares? Como se isso não bastasse, há zonas do Zodíaco que não têm constelação alguma, dentre as que tradicionalmente são admitidas como pertencentes ao Zodíaco. É o caso de alguns graus entre Touro e Gêmeos, entre Gêmeos e Câncer, entre Câncer e Leão. São os “vazios” do Zodíaco, e as pessoas nascidas nessas faixas decerto precisam recorrer a um outro sistema solar que lhes dê o consolo de terem uma constelação de nascimento.


Com todas essas incongruências, o Sistema Sideralista, alardeado no Brasil com um sensacionalismo muito distante do procedimento científico que deve pautar o trabalho de um verdadeiro astrólogo – e importado como a última palavra em matéria de Astrologia no mundo – se apresenta na verdade como um “aleijado impraticável” e, sobretudo, ineficiente para os fins que se propõe e para as pretensões de exclusividade que apregoa. As influências visíveis e sentidas continuam a situar-se no Zodíaco Trópico, o dos nossos velhos signos tradicionais. Todos os arianos se encontram na descrição típica do velho Carneiro Zodiacal, mas qual deles se achará na pele do seu novo signo, Peixes? A superposição dos três Zodíacos permite estabelecer o autêntico horóscopo individual, com toda a multiplicidade incrível e riquíssima de possíveis combinações, que tem condições de refletir veridicamente sobre a infinidade de tipos humanos existentes. O sistema sideralista, ao contrário, com seu Zodíaco único, revela uma imaginação paupérrima, semelhante à da corrente folclórica da Astrologia, tão ao gosto da imprensa diária, com seus 12 tipos fixos, monótonos e invariáveis – em completo desacordo com a realidade humana.