Um grimório, segundo a definição dos dicionaristas contemporâneos, é um livro que apresenta fórmulas, orientações e procedimentos utilizados por magos e feiticeiros. Costuma se referir a livros de conteúdo aparentemente indecifrável e de discurso incerto ou confuso. O termo utilizado na língua portuguesa advém do vocábulo francês grimoire e tende a ser interpretado como uma espécie de corruptela da palavra francesa grimmaire (gramática). Pode-se dizer que a gramática latina era – e ainda é – ininteligível para o povo, o que nos leva a supor razoavelmente que o termo grimório designe um livro cujo entendimento se reserva aos poucos indivíduos que possuem as chaves fundamentais para a compreensão dos segredos manifestados em suas páginas e que estejam habituados com sua estrutura e linguagem. O estudo basilar do vocábulo nos remete aos étimos nas palavras gregas γραμμα (gramma), γραμματα (grammata) e γραμματευς (grammateus); que por sua vez se referem às letras e aos registros escritos (gramma), aos conjuntos de palavras e às gramáticas propriamente ditas (grammata) e aos escribas e professores eruditos capazes de transmitir o conhecimento (grammateus).
É certo que a produção de livros como empreendimento econômico – mesmo que em pequena escala – teve início somente a partir de 1455 com a invenção do processo de impressão de Johannes Gutenberg que utilizava tipos móveis de metal. Os livros produzidos antes desse período eram resultado de extensos processos artesanais muito elaborados e onerosos que impediam a rápida multiplicação e a divulgação da arte literária, tais obras são atualmente conhecidas como incunábulos.
O movimento literário francês conhecido como Bibliothèque Bleue (Biblioteca Azul), originado na região de Troyes no início do século XVII e que se estendeu até a metade do século XIX, foi um fator proeminente na disseminação dos grimórios e dos livros associados à magia pelo mundo. O gênero Bibliothèque Bleue era caracterizado especialmente por livros produzidos em larga escala com impressões de baixa qualidade destinados a disseminar entretenimento para as poucas pessoas que sabiam ler. Por vezes, o papel utilizado nas impressões das capas possuía uma coloração azulada, o que resultou na denominação da forma literária. Os livros eram produzidos pelas casas editoriais e vendidos a preços relativamente acessíveis. Os títulos eram bastante diversificados e abrangiam temas como culinária, guias práticos para os mais diversos fins, catecismos, livros de orações, astrologia e, evidentemente, os grimórios, os livros de magia, feitiços e encantamentos. Obras como Le Dragon Rouge, Le Grand Grimoire, La Grande Danse Macabre, Le Secret des Secrets de la Nature, Les Jugements Astronomiques des Songes, Malleus Malleficarum, La Vie du Fameux Gargantua, De la Démonomanie des Sorciers, Gremoire du Pape Honorius, Grimorium Verum, Les Véritables Clavicules de Salomon, Grand e Petit Albert, Enchiridion Leones Papae, Discours des Sorciers, dentre muitas outras, foram impressas repetidamente e muitos exemplares desse período sobreviveram até nossos dias.
A xilogravura, técnica de impressão gráfica feita a partir de moldes de madeira entalhados em relevo, foi amplamente difundida na ilustração dos volumes característicos desse gênero literário. As belas imagens de volumes como Das Buch Belial, Le Grand Grimoire, Malleus Malleficarum e Compendium Maleficarum tornaram-se célebres e figuram em milhares de livros relacionados à magia.
Os grimórios sempre estiveram rodeados por uma intensa bruma mítica, envoltos a mistérios diversos sob uma aura obscura de franco diabolismo. Aos mais conhecidos reputam-se lendas, superstições e confusos anátemas. Em tempos já considerados modernos, possuir um grimório poderia ser um indício de que o proprietário mantém laços ou pactos com os poderes das trevas e com os demônios.
Owen Davies, em sua obra Grimoires – A History of Magic Books, menciona que em 1804, mesmo ano em que Napoleão supostamente se proclamou imperador, houve um julgamento contra um homem que possuía um exemplar do Grand Grimoire. O réu afirmava que tocar o livro seria o suficiente para convocar a presença do diabo. Um oficial do governo abriu e tocou o livro em público para demonstrar o absurdo proclamado e o demônio não apareceu, por fim, o acusado incriminou o próprio oficial do governo, a ele atribuindo poderes sobrenaturais capazes de silenciar Satã.
No final do século XIX surgiram no Brasil os primeiros livros que se aproximavam da aura mítica dos grimórios tradicionais. Atribuídos a São Cipriano,a Nostradamus e uns poucos anônimos, espalharam-se rapidamente e ainda hoje estão sob a névoa supersticiosa do sobrenatural e do oculto.
Muitos dos volumes atribuídos a Cipriano não passam de excertos retirados de grimórios antigos e livros medievais de magia, salvas algumas poucas e raras exceções. Aos livros de São Cipriano atribuem-se poderes de resistir ao fogo, de aproximar deliberadamente os poderes das trevas (mesmo contra a vontade do leitor), de infligir danação aos seus proprietários e mais algumas caricatas e grotescas peripécias. Alguns desses tomos brasileiros possuem caráter mais jocoso do que esotérico, as diversas corruptelas, os crassos erros de tradução, a dilapidação das xilogravuras e as tentativas burlescas de reproduzir figuras como a de Baphomet, por exemplo, beiram à zombaria.
Através de esforços combinados entre importantes bibliotecas, reconhecidas universidades e empresas multinacionais de informação, é possível consultar e ler o conteúdo integral de quase todos os grimórios que tiveram edições impressas desde o século XVI. É relativamente fácil e simples realizar buscas pela Internet e encontrar títulos originais escaneados em bibliotecas digitais hospedadas por grandes plataformas. Esse acesso à informação e aos registros históricos facilitou profundamente às editoras esotéricas meios de publicarem traduções dos mais diversos grimórios e livros sobre magia cujos direitos autorais se extinguiram e que agora pertencem ao domínio público.
Muitos foram os elementos que concorreram para impulsionar a notoriedade dos grimórios: a ignorância das massas, mesmo dos indivíduos que inocentemente procuram algum esclarecimento nas vias do ocultismo e da magia prática; o desejo que algumas pessoas nutrem para encontrar caminhos menos árduos para driblarem as dificuldades e problemas com os quais não têm aptidão ou vontade verdadeira para solucionar; em tempos mais antigos, a falta de assistência dos poderes e do estado aliadas à falta de condições mínimas para se sustentar a vida e manter a saúde; a ânsia para satisfazer à luxúria e à concupiscência irreprimíveis; a ganância pelo dinheiro; a sede pelo poder e pela influência sobre as pessoas e sobre o povo; a curiosidade pelo oculto e pelo desconhecido esotérico imaginário. Em menor número estão os indivíduos que laboram seriamente nas sendas sinistras da tradição, pessoas que buscam sinceramente pelas chaves ocultas re-veladas em antigos alfarrábios, indivíduos dispostos a encontrarem suas próprias verdades, rompendo os grilhões que impedem o atravessar dos véus da ilusão, sacrificando o que há de mais sagrado em busca da própria evolução. A obra que ora apresentamos ao leitor pretende expor as maneiras fundamentais de aplicação prática dos segredos contidos nos principais grimórios na via de consecução mágica sinistra. Revelando as chaves dos segredos do inferno, pretendemos indicar meios que permitam ao leitor aumentar seu campo de experiências seguindo os antigos sinais e as fórmulas obscuras dos tomos proibidos.