sexta-feira, 6 de outubro de 2023

A Demanda do Graal

Se alguma coisa marcou e se destacou, desde a alva ao ocaso da Idade Média, determinando decisivamente a mentalidade espiritual e religiosa dos que nela viveram[1], foi sem dúvida a Lenda do Graal transbordada da Lenda Arturiana, que oficialmente entrou na Literatura Ocidental, no século XII, através do cronista e poeta francês Chrétien de Troyes (c. 1130 – c. 1190), autor, dentre outros títulos, de Érec et Énide (c. 1170), Lancelot ou le Chevalier da la Charrette (c. 1175-1181) e Perceval ou le Conte du Graal (c. 1182-1190), obras escritas em langue d´oil (o francês romanizado do Norte)[2], a mesma utilizada pelo cluniense São Bernardo de Claraval para redigir a Regula Vitae (Regra de Vida) da Ordem do Templo (1128), por exemplo.

Chrétien de Troyes tomou a primazia, encabeçou um corpo de poetas e cronistas de seu tempo na divulgação da Matéria da Bretanha que marcou o Ciclo Arturiano, fortemente efabulado por maravilhamentos aventurescos na constante órbita da Quête du Graal, a Demanda do Graal, a Taça Sagrada dotada de propriedades miraculosas com que o Espírito Santo a bafejava assim a dando por Eucarística, portanto, na feição cristianizada, decerto tomada da celta anterior, druida, do “caldeirão da abundância” de Dagda e do “caldeirão mágico” de Ceridwen.

Esse autor francês e os seus ilustres pares criaram uma novelística francamente heterodoxa recambiando para o Hermetismo mais puro e transcendente que marcou decisivamente a mentalidade espiritual e religiosa da Baixa Idade Média (séculos X-XV), tendo esse efabulamento se inspirado em factos históricos reais anteriores ocorridos durante o final do império romano na Ilha Britânica, sobretudo em Gales, e no Norte de França, na Bretanha, com personagens que deveras existiram mas que eles transpuseram, por via do romance e da parábola com grande engenho, para aventuras iniciáticas no terreno da mais pura heterodoxia a que Portugal não foi alheio[3], como veremos mais adiante, desde Afonso Henriques e o seu “Porto-Graal” a D. Nuno Álvares Pereira, o “Galaaz do Carmelo”[4].

Pois bem, a Alta Idade Média (séculos V-IX) fez do Cálice Sagrado motivo de Iluminação Espiritual que diversos autores e autoras desse período registaram em fólios e pergaminhos, a maioria de profissão religiosa de acolhimento mosteiral, que nos períodos paleocristão (visigótico) e moçarábico (sob regime árabe) serviram para a pregação às assembleias de fiéis catequisando-as pela moral e o instigo à perfeição interior. É assim que em 1151 aparece a Scivias (do latim Scivi vias Domini, “Conhece os Caminhos do Senhor”), obra ilustrada constando das visões espirituais da monja beneditina alemã Hildgard von Bingen (1098-1179)[5], claramente inspiradora dessa outra do século XIII, de autor anónimo, A Demanda do Santo Graal, sendo o famoso Manuscrito de Heidelberg, que Chrétien de Troyes toma como referência principal e funde lendas celtas e germânicas, bretãs, irlandesas e ibéricas, a maioria de fonte oral, tomando por base justificativa o Antigo Testamento[6].

Da Matéria da Bretanha destacam-se três títulos que cedo marcaram decisivamente a “mentalidade mágica” portuguesa: Livro de José de Arimateia, Demanda do Santo Graal e História de Vespasiano, esta atribuída a Jafel, sobrinho de José de Arimateia, onde descreve com vivacidade a conversão ao cristianismo do imperador romano Vespasiano e de seu filho Tito. A restante novelística da Matéria da Bretanha seria igualmente traduzida – inicialmente, a partir do século XII português, graças ao labor cisterciense, sobretudo dos copistas de Santa Maria de Alcobaça – desde o início do reino e sobretudo no reinado de D. Dinis, cuja difusão ampla influenciou a demais literatura místico-cavaleiresca e até o onomástico português da época (vulgarizando-se na fidalguia lusa os nomes de Tristão, Iseu, Lançarote e outros)[7], tornando-se a corte portuguesa o centro da vida cultural peninsular.

D. Dinis revestiu-se de Hermetismo e até nos aparatos de seus trajes palacianos ele transparece, como se revela na espada retirada de seu túmulo em 24 de Outubro de 2022, no convento das bernardas de S. Bernardo e S. Dinis de Odivelas. Trata-se de uma espada de aparato, não de uma espada de combate. Além de apresentar restos das cores originais dos esmaltes na empunhadura e guarda-mão de prata, sendo a lâmina de ferro, está decorada por medalhões mostrando figuras zoomórficas e mitológicas que remetem para o simbolismo do Hermetismo medieval. Delas destaco: leão = valentia, coragem, ânimo; cão atrás de lebre = destreza, arte no manejo da lâmina; serpe no guarda-mão = protecção contra o mal, contra a má sorte no guerrear; três losangos na empunhadura = Santíssima Trindade; lucernas = clareza, lucidez.

Com essa matéria se constituiu a chamada Demanda Portuguesa, que pôs em relevo Portugal logo ao seu início, quando Matilde (Mahaut), filha de D. Afonso Henriques, desposou, em 1183, Filipe de Alsácia, conde de Flandres, o qual lhe forneceu um livro contendo a história do Graal que teria contribuído para a construção do Perceval, obra inacabada de Chrétien de Troyes por morte deste[8]. O tema do Graal é, pois, conhecido entre os portucalenses desde muito cedo, possivelmente desde o conde D. Henrique de Borgonha nos seus contactos com o Islão erudito em Sintra (Al-Shantara) e noutros lugares do nosso futuro país sob ocupação árabe. Também os santões e visionários do Islão ibérico, sobretudo os de corrente sufi caracterizados pela sua mística e erudição nos textos sagrados, deram relevo ao Santo Vaso (Saint Vaisel) como sinónimo de libações paradisíacas e sinal supremo de ascenso à Morada da Sabedoria (Bayt al-Hikmah)[9]. Nisto reside a origem das posteriores “cortes de amor” portuguesas[10], que juntou o amor cortês (palaciano) ao amor divino (monástico), pela prosa e a trova, exaltando a transcendência da coyta, ou seja, da “dor do amor”, onde a Mulher tomou papel destacado por via de firme e profundo entendimento hermético[11].

O certo é que aparece em anagrama o nome “Porto-Graal” em vários sinais rodados afonsinos nas cartas de doação e/ou de aforamento reais pelo nosso primeiro rei, como a de Sintra, a do Reguengo de Colares e a de Ceras, o que dispõe Portugal como Peanha ou o Trono do Graal, geograficamente na “cabeça da Europa inteira”, no dizer de Fernando Pessoa em sua Mensagem.


Esse documento assinalado na foto provém do original em latim depositado na Torre do Tombo (gaveta 7, maço 3, n.º 8. Com relação sucessora na Leitura Nova, Liv. 53 (Livro de Mestrados), f. 19 v, coluna 2, transcrito sumariamente na Reforma das Gavetas, Liv. 10, f. 142 v), Lisboa, foi reproduzido na Monumenta Henricina (1960-1974) e refere-se ao Castelo de Cera ou Ceras na carta de doação desse por D. Afonso Henriques, “Rex I Portucalensis”, à Ordem do Templo, englobando as terras que iam até Tomar e esta. A mesma carta, lavrada em Fevereiro de 1159, dentro da política de concórdia com arbítrio papal (Adriano IV, expedindo a bula Justis potentium sideriis) terá servido, segundo o professor Luís de Albuquerque (Monumenta Henricina, vol. 15, p. 10, Coimbra, 1974), para doar a mesma Tomaris ao Templo, que aí instalaria a sua Casa-Mãe em seguimento a Cera, Ceras ou Cellas, penúltima Casa-Mãe da Ordem dos Cavaleiros Pobres de Cristo e do Templo de Jerusalém (Ordini Milites Pauperes Christi Templi Hierusalem) em Portugal.


O sinal rodado afonsino possui três leituras afins à grafia nos seus três círculos, interligando-se pela pontuação cimeira – hermética (PORTO-GR(A)AL), teológica (CUM FILII SUI, “com o seu Filho”, relação cristológica de Deus-Rei-País), nobiliárquica/militar (REX ALFONSUS, “Rei Afonso”, o I de Portugal assim aclamado no campo de lide de Ourique por templários e portucalenses, após a sua vitória militar no Gharb islâmico e já antes, pré-batalha, sagrado por Cristo, como descreve a miraculosa tradição hagiográfica[12]).

Em 1990 identifiquei essa carta como a da doação de Tomar à Ordem do Templo, e agora fica clareado o por que: abrange todo o espaço primitivo do concelho tomarense, portanto, Ceras e Tomar incluídos, em troca do espaço escalabitano[13]. Assim, o documento é carta de doação concelhia e não apenas da mingueza geográfica de um castelo e terras em volta do mesmo, antes indo mais além dele, ficando a poderosa Santarém sob o domínio militar-económico e até pastoral da religião da Ordem Religiosa e Militar de Santiago. Nesse acto de fina diplomacia geopolítica, Afonso I evitou conflitos entre espatários e templários e vedou as ambições diocesanas do Cabido de Lisboa, ao pôr essas terras ricas na posse da freiria militarizada que delas se ocupou demográfica, política e economicamente.

Assim se chega ao âmago da questão: quem era Artur, um rei mítico ou um personagem histórico? Quem era Merlin, conselheiro daquele, um mago, um druida ou simples figura de ficção? O que era a távola redonda em redor da qual se reuniam periodicamente doze cavaleiros para contar as suas aventuras paladinas, e se uma e outros existiram de facto? Finalmente, o que é o Graal?

Historicamente, mesmo não pondo em dúvida a sua existência, o facto é que a figura do rei Artur foi mitificada posteriormente. O primeiro registo do seu nome remonta a Nennius, monge galês, na sua Historia Brittonum (“História dos Bretões”), escrita por volta do ano 810, onde Artur aparece não como rei mas como dux bellorum, isto é, um general ou chefe militar[14], que após a retirada dos romanos de Inglaterra chefiou os bretões insulares contra os invasores saxões vindos da Germânia, actual Alemanha, e que usurparam o trono, tendo obtido grandes vitórias militares em doze batalhas sucessivas, segundo conta o bispo S. Gildas ou Gildásio (c. 516-570) em De Excidio et Conquestu Britanniae, escrito cerca do ano 547. Ambos os autores dão Artur como chefe cristão devoto da Virgem e da Santa Cruz, o que sugere a sua conversão à Igreja galesa, cercado já por certo número personagens como Ambrosius, Mordred e Merlin (Merlinus), o que é repetido por Bede ou Beda, o Venerável, monge da Nortúmbria dos Anglos na sua História Eclesiástica do Povo Inglês (Historia Ecclesiastica gentis Anglorum), escrita por volta do ano 731. A mitificação e maravilhamento de Artur só aparece no século XII na crónica de Godofredo de Monmouth, Historia Regum Britanniae (História dos Reis da Bretanha), redigida cerca de 1136. Ele é dado como filho de Uther Pendragon (Pendraco, em latim, “pequeno dragão”), rei dos bretões que teria vivido nos anos de 410 a 495, tendo o seu filho Arthur Pendragon sido chefe e caudilho no século VI. Vários poemas galeses medievais também citam Artur no mesmo sentido, como o Y Gododdin, apesar deste não poder ser datado com precisão por descrever eventos do século VI e conter linguagem dos séculos IX e X, sendo a cópia que sobreviveu do século XIII. Por fim, tem-se a crónica escrita em latim nos fins do século X, Annales Cambriae (Anais de Gales), nome pela qual a obra é conhecida referindo-se a Cambria, forma latinizada de Gales (em galês, Cymru). Nela aparece duas referências a batalhas onde o caudilho bretão lutou contra os invasores anglo-saxões: a Batalha do Monte Badon (Badonicus mons), datada de 516 ou 518, em que “Artur carregou uma cruz sobre os ombros” e os “bretões foram vencedores” (episódio que D. Afonso Henriques trasladaria para a batalha mirífica de Ourique onde, vencedor dos “sete reis mouros”, seria aclamado rex, rei de “Porto-Graal”, diga-se de passagem), e a Batalha de Camlann (mitificada Camelote), ocorrida em 537 ou 539, onde “Artur e Mordred tombaram mortalmente”, pai e filho que se mataram um ao outro no confronto, segundo as lendas.

Artur vem a representar a passagem e estruturação da sociedade rural celta à urbana cristianizada, geográfica, política e juridicamente livre, independente com o seu poder temporal ou real próprio, recém-saído do subjugo anglo-romano. Isto seria figurado pelo urso, animal totémico sinalético do mesmo poder temporal assegurado pelas armas, pela casta militar (kshatriya, em sânscrito).

Quanto à figura sobrenatural de Merlin, Merlim ou Merilim, que é topónimo de localidade em Braga, aparecendo na Galiza com a forma Merlin, a verdade é não surgiu no Ciclo Arturiano, pela primeira vez, pela mão de Godofredo de Monmouth, ainda que este o tenha maravilhado na sua Vita Merlini (“Vida de Merlin”), escrita em 1150, dando-o como Merlin Calidonius, tendo uma irmã e uma esposa mas sem menção a seus pais, que outros autores dizem ter sido gerado por anjos, e por isso foi um grande mago e profeta, além de sábio conselheiro do rei Artur[15]. Já antes, no final do século VI, no poema galês Afallenau ele é identificado ao bardo Myrddin, e assim ficou em vários outros poemas dessa época – ora como bardo, ora como druida – preservados no manuscrito conhecido como Livro Negro de Camarthen (em galês, Llyfr du Caerfyrddin), escrito por Teulyddog de Camarthen cerca de 1250. É chamado “negro” por causa da sua encadernação escura. Merlin também aparece referido em poemas do início do século X, como o Armes Prydein e o já citado Y Gododdin.

As crónicas dizem que quando nasceu, no lugar de Caer-Fyrddin (Carmarthen), foi-lhe dado o nome de Emrys, depois adaptado ao galês Myrddin que Godofredo latinizou Merlinus, donde derivou Merlin. A lenda conta que viveu perto da montanha de Dinas Emyris, em Gales, onde existia o castelo do rei saxão Vortigern, e que dentro da montanha viviam num lago subterrâneo dois dragões, um branco e outro vermelho. Combatiam-se um ao outro trazendo as populações aterrorizadas. Então, Merlin profetizou a morte de Vortigern e representou o dragão branco como sendo os saxões e o dragão vermelho como os bretões. De facto, o dragão vermelho empurrou o dragão branco para as nuvens onde desapareceu derrotado, tal qual Vortigern pereceu às mãos de Ambrósio Aureliano que ocupou o trono usurpado, sendo sucedido por seu filho Uther Pendragon e depois pelo filho deste, Arthur Pendragon. Este pendragon é o dragão vermelho que até hoje drapeja na bandeira do País de Gales.

Merlin é a representação da religião primitiva celta, portanto, um druida (do celta druwjd, “sábio”), que estabeleceu a ligação entre a religião e a cultura autóctones e a cristianização nascente deixada pelos romanos já convertidos. Essa função era assinalada pelo javali totémico, sinal de autoridade espiritual assegurada pela casta sacerdotal (brahmane, em sânscrito). Por isso, Merlin foi conselheiro de Artur e lhe reconheceu as funções legítimas no trono, assim se confirmando a eleição tradicional do poder temporal pela autoridade espiritual.

Vem depois a famosa távola ou mesa redonda que possuía propriedades mágicas, dizem as lendas que Artur a herdara de Ambrósio (Ambrosius Aurelianus, em latim, Emrys Wledig, em galês). Thomas Malory, protestante e romancista inglês do século XV, associou o ainda visível anfiteatro romano de Caerleon à távola redonda, na sua obra publicada em Londres em 1485, A Morte de Artur: Rei Artur e as Lendas da Távola Redonda. A sua identificação certamente teve por fonte o Itinerarium Cambriae de Gerard de Wales, de 1191, que diz sobre Caerleon: “Aqui os embaixadores romanos tiveram audiência na corte do grande rei Artur”.

Duvido da autenticidade da identificação, mesmo sabendo que sítios arqueológicos de interesse histórico foram depois adaptados pelos autores da Matéria da Bretanha e do Ciclo Arturiano ao imobiliário móvel e imóvel que os compõe, hoje aproveitados para turismo rendoso. Parece-me ser mais viável a informação transmitida por Paulo Pereira[16]:

“Para mais, o grupo nuclear da lenda arturiana parece ter uma inquestionável relação com a astronomia simbólica, com Artur fazendo as vezes de Sol e os restantes doze cavaleiros dispostos em seu redor substituindo-se ao zodíaco. Esta partição em “doze segmentos” da Távola Redonda parece ser, também, uma manifestação da antiga tradição da organização grega e etrusca do território em doze partes, distribuídas por doze tribos ou amphictionies. O simbolismo polar do mito é também considerável, se tivermos em linha de conta que o nome de Artur provém de arctus, que quer dizer urso, ligando-se desta feita à constelação da Ursa Maior, cuja cauda indica uma das estrelas mais brilhantes do céu, a estrela Arcturo, no Norte polar. O urso pode ser, efectivamente, o símbolo da casta guerreira (o javali seria o símbolo da casta sacerdotal). Os lugares portugueses com relações toponímicas com a Ursa ou Ossa parecem ser uma tradução local, em Portugal, mas também antiga, destes mitos que adquirem contornos arquetípicos e universais, o mesmo acontecendo com probabilidade nos lugares denominados Arco (corruptela de arctus).”

A Távola Redonda é assim transposta para o simbolismo do Zodíaco repartido em doze partes ou signos, um para cada cavaleiro sinalético de uma das doze batalhas arturianas e por conseguinte uma das doze tribos bretãs. A távola, tábua ou mesa redonda era assim para todos ficarem em pé de igualdade na hora de comunicarem os seus conhecimentos e experiências. Ficaria como símbolo místico de irmandade reunida em volta da Santa Copa postada no centro da távola, esta assim fazendo as vezes de altar – feita de carvalho, árvore indicativa de templo para os antigos druidas e igualmente para os primitivos padres galeses – e igualmente de mesa de ágape, a refeição mística em comunidade, inicialmente onde se celebrava a eucaristia do pão e do vinho, o que faz volver ao sentido de ara.

Com efeito, o tema da Távola Redonda instituiu-se como um dos mais significativos instrumentos ideológicos da Cavalaria, isto é, da igualdade de tratamento entre os cavaleiros, como “pares”, e a obliteração das regras de precedência. A forma redonda seria associada na Idade Média à Mesa da Última Ceia, apesar de alguma iconografia medieval a representar como rectangular. Para a tradição celta a forma redonda era privilegiada, como demarcação sacralizada, sabendo-se que os chefes celtas usavam mesas redondas nos banquetes, e as próprias casas das citânias apresentavam forma circular[17].

Ressalve-se que o tema literário arturiano bretão seria adaptado pelos cronistas de Cister em Portugal à idiossincrasia portuguesa[18], o que de bom grado a coroa e a corte acolheu desde a primeira hora, ficando registado no chamado Códice Português [19]. Inclusive é dito, em óbvia exaltação nacional desde a primeira hora, que o tema graalístico saiu do nosso país para a Bretanha, a partir da região de Sintra, posto esta ser lugar consignado na Tradição desde os evos arturianos, chegando mesmo a instalar aí o cavaleiro Ector ou Heitor de Maris, filho do rei Ban de Benoic e da rainha Helena, pai adoptivo de Artur.

Os doze paladinos do rei Artur, além do seu significado astronómico, poderiam muito bem ser os principais chefes-de-campo do dux bellorum nas campanhas contra os anglo-saxões. Depois, por via do romance assente no simbolismo hermético da Baixa Idade Média, seriam transformados em Massenia ou Cavalaria Espiritual irmanada em torno do Saint Vaisel, pomo da Demanda da Iluminação assinalada por doze provações equivalente a outros tantos graus iniciáticos, portanto, constituída como Ordem Iniciática, esotérica ou fechada, ainda assim vindo a influenciar decisivamente a Regra de Cavalaria, mormente em Portugal, como descreve Fernão Lopes na sua Crónica de D. João I, por que se impôs a disciplina castrense e transformou o guerrear numa ciência militar.

A Regra de Cavalaria dos Cavaleiros do Santo Graal, o seu código de conduta, segundo Thomas Malory[20] possuía os sete pontos seguintes:

Demandar a perfeição humana
Agir com rectidão nas acções
Respeitar os semelhantes
Amar os seus familiares
Ter piedade com os enfermos
Ter doçura com as crianças e mulheres
Ser justo e valente na guerra e leal na paz

Conforme as versões, a Távola Redonda teria inicialmente apenas 12 membros, depois passando a 24 e chegando até a 150. Nas versões portuguesas do tema os nomes dos cavaleiros são precedidos do título de nobreza Dom, mantendo o Sir nas versões britânicas. Mas, por que o Dom antes do nome próprio?

Dom (do latim dominus, em português “senhor, dono ou mestre”), ou no feminino Dona, é um pronome de tratamento concedido a monarcas, príncipes, infantes e nobres portugueses, espanhóis, ibero-americanos e italianos; a bispos católicos, abades e sacerdotes beneditinos, cartuxos e trapistas, sempre seguido do prenome. No caso da nobreza, é transmitido apenas pela descendência varonil directa, a não ser quando a mãe seja chefe da casa dinástica.

O título de Dom (ordinariamente escreve-se abreviado D.) sempre teve um enorme relevo em Portugal. Só por concessão régia, tradição que durou muitos séculos, um nobre podia usar esse título. Não obstante a origem restrita, Dona tornou-se um tratamento de reverência usado para anteceder o nome de uma senhora que se respeita. Neste caso, usa-se o axiónimo com inicial minúscula (dona). Seja qual for o uso, ordinário ou aristocrático, dom e dona devem anteceder o prenome, mas não o sobrenome para o qual é mais adequado o uso de senhor ou senhora.

Com base nas evidências escritas das colónias fenício-hebraicas em Espanha (Tarsis) desde a época do rei Salomão (ou mesmo antes), e com vários influxos de emigração durante a destruição do primeiro e do segundo Templo de Jerusalém, e com as deportações em massa na época do imperador Adriano, é considerado como mais provável que o espanhol Don derive do hebraico Adon (“senhor, mestre”), título usado pelos hebreus, Aba, da mesma forma que Sir é utilizado na língua inglesa.

Voltando aos doze cavaleiros originais da Távola Redonda, eles seriam:

0. Artur
1. Heitor
2. Caio
3. Parsifal
4. Lancelote
5. Ivano
6. Galvão
7. Galaaz
8. Tristão
9. Garete
10. Gerantio
11. Boro
12. Badevere

Isso em português, que no bretão os nomes naturalmente diferem e a sua lista aumenta acompanhando as minúcias e acréscimos de versão para versão, assim dispostos por ordem alfabética:

Arthur Pendagron (Pendragão), Rei; Accolon de Gália (Acolon, Acolão); Aglovale; Agravain (Agraveine); Bedivere (Bedwyr, Belovedye); Boors, o Exilado (Bors, Bohort, Bohor); Breunor; Cador; Calogrenant; Caradoc (Karadoc); Colgrevance; Constantine (Constantino); Cordo, o Bobo; Daniel; Dinadan; Gaheris (Guerrehet); Galahad (Galaaz); Galehaut; Gareth (Gaheriet, Garete); Gauvain (Gawain, Galvão); Geraint (Gerantio, Erec); Gingalain; Girflet (Jauffré); Hector de Maris (Heitor, Ector); Hoel; Hunbalt; Ivain (Ywain, Ivaine, Ivano); Ivain, o Bastardo; Kay (Cai, Caius, Caio); Lamorak; Lancelot du Lac (Lancelote, Lançarote, Launcelot do Lago); Leodegrance (Leodegrans, Léodagan); Lionel (Leonel); Lucan; Meleagant; Mordred (Mortret); Morholt; Palamedes; Pelleas (Peleia); Pellinore;  Perceval (Peredur, Percival, Parzifal, Parsifal); Safir (Safrão); Sagramor (Sagremor); Tor (Thor, Toro); Tristan (Tristão); Uriens (Urião).

Esses personagens da Demanda vieram a ser aureolados de encantamento e transcendência no romanceiro francês e britânico dos séculos XII-XIII, época em que entraram em literatura portuguesa pelo afã cisterciense que juntou a Vulgata e Post-Vulgata do Ciclo do Graal numa versão singular[21] ao instalar a Demanda (Quête) no território nacional e associar os paladinos arturianos a personagens reconhecidos da nossa História. Tudo, num jogo de palavras, anagramas e narrativas com duplo sentido, disposto no campo da pura heterodoxia dos saberes herméticos com que deram aso a mitos fundacionais centrados no tema do Santo Graal[22], promovendo a passagem da celtização à cristianização do mesmo por via dos lais, crónicas e cronicões, o que levou o romantista Albert Beguin a interpretá-lo como exclusivo objecto cristão[23]:

“Representa ao mesmo tempo e substancialmente Cristo que morreu pelos homens, o Vaso da Ceia Sagrada (graça divina concedida por Cristo aos discípulos) e finalmente o Cálice da Missa, contendo o verdadeiro Sangue do Senhor. A Mesa em que repousa o Vaso é, pois, a Pedra do Santo Sepulcro, a Mesa dos Doze Apóstolos, e por fim o Altar da Missa quotidiana. Estas três realidades, a Ceia, a Eucaristia e a Crucificação, são inseparáveis e o Graal é a sua Revelação, dando através da comunhão o conhecimento da pessoa de Cristo e a participação no seu sacrifício redentor.”

Indo também nessa direcção, o enciclopedista M. de Riguer adiantou[24]:

“Konrad Burdach relaciona o cortejo do “Graal” com a grande entrada da missa chamada de São João Crisóstomo na liturgia bizantina. Nesta há uma procissão solene aberta pelos que levam candelabros com velas acesas, seguidos pelo presbítero com o cálice (que corresponde ao “Graal”), o diácono com o hostiário (que corresponde ao prato de prata) e o celebrante com a lâmina chamada a Santa Lança, com a qual se fere antes, simbolicamente, a hóstia eucarística.”

Eis aí a razão de associar o nome Santo Graal, Saint Greal, San Grial ao Sangue Real, motivo maior do Rito Eucarístico em cuja celebração se transubstancia o vinho no sangue contendo o Ser de Cristo, o Avatara ou “Manifestação da Divindade” revelada na Pomba do Espírito Santo.

A palavra Graal é familiar das gregas kratale e kratêr, donde saíram as provençais graalz e grazale, esta última significativa de “prato”, do latim gradalis, “prato gradual”, isto é, servido gradualmente ou por diferentes vezes, até chegar às derivações “grato” (gratu) e “agradar” (placere). Vária iconografia arturiana medieval vai nesse sentido ao representar na távola o servir aos comensais “pratos graduais”.

Essa é a explicação laica e profana para a religiosa e espiritual do que significa realmente o “prato” (grazale): será a patena (termo latino), pequeno prato um pouco convexo que se coloca sobre a taça (graal) onde se deposita a hóstia ou pão, que após consagrado na missa ou no ritual solene irá, pelo Mistério da Transubstanciação proferido pelo Logos ou Palavra que sujeita Thanatos como Morte, tornar-se o Corpo de Cristo, Corpus Dei. É esta razão do Rito do Santo Graal ser Eucarístico (Eu-Crístico) mais que tudo.

Por outro lado, os cronistas do Ciclo do Graal (Chrétien de Troyes, Robert de Boron, Wolfram d´Eschenbach, etc.) dão-no ora como Taça, ora como Livro, ora como Pedra, associando-o ao útero iniciático da Mulher e da Terra, nesta associada ao sentido de Paraíso Terreal – o Mundo Jina das escrituras esotéricas, igualmente afim aos Lugares Santos[25], Loca Sancta, onde o Céu e a Terra vêm a se encontrar e unir – o que de certa maneira o vaso alquímico (tesaurus, na linguagem medieval) também representa.

Nesse sentido, os cronistas medievais permitiram entender o Graal como uma pedra atestada pelo termo celta gar ou kar, “pedra”, mais al ou el, deus”, portanto, Pedra de Deus, ademais correspondendo à interpretação que Wolfram d´Eschenbach (1170-1220) lhe dá no poema épico Parzival (escrito provavelmente entre 1200 e 1210) onde lhe chama lapsit exilis, isto é, lápis, “pedra”, excelis, “elixir”, no que corresponde então à Pedra Filosofal (sinónima de realização espiritual acompanhando a humana) nessa interpretação claramente esotérica do trobar clus de Eschenbach, decisivamente destacando o Hermetismo cristão.

O Graal como Pedra tomaria tanto a feição de ara ou altar, onde se realizam as mais místicas e alquímicas transformações interiores, como de Lugar Santo elevado ou destacado como Mons Salvat, “Monte Salvo”, “Monte da Salvação”, onde se construiria o Castelo do Santo Graal para guardar no seu interior a sua relíquia sagrada guardada por Titurel e uma companhia de castos, santos e sábios cavaleiros, e que se situaria numa montanha junto ao mar (maris) nos confins da Europa, segundo o mesmo Wolfram d´Eschenbach retomando as narrativas anteriores da Matéria da Bretanha, cujo Exílio do Graal ficou assinalado na Post-Vulgata pela Estoire del Saint Graal de Robert de Boron, vertida na tradução portuguesa sob o título Livro de José de Arimateia, manuscrito único[26].

Apesar de muitos autores situarem o Castelo do Santo Graal em Monserrate na Catalunha, na vizinha Espanha, o facto é que ele não é o ponto final da Europa e nem fica junto ao mar. Essa localização geográfica cabe exclusivamente a Sintra, em Portugal, a qual tem o lugar de nome Monserrate, além daquele outro Monte Salvo. Sobre isto, diz Mário Roso de Luna[27]: “A Mestra (Helena Petrovna Blavatsky) pressentia o futuro ocultista da nossa Raça e elogiava o Centro Iniciático ibérico “situado numa floresta oculta da Península”. Será esse Retiro, oculto e ignorado por todos, o famoso Castelo do Santo Graal ou Montsalvat, a quem Wagner, o colosso musical de Bayreuth, consagra inteiramente o seu sublime Parsifal, dispondo-o quer “abaixo dos Pirenéus”, quer nos confins – leia-se “confins ocultistas” – da Espanha cristã com a Espanha árabe?…”

Como Livro o Graal – assinalado no Gradual, livro contendo os itens musicais da missa, assim o diferenciando do Missal onde estão escritos os textos recitados – contém em seu significado a Tradição Primordial, a sabedoria oral e o conhecimento escrito. Robert de Boron, no Livro de José de Arimateia, diz que “Jesus Cristo ensinou a José de Arimateia as palavras secretas que ninguém pode contar nem escrever sem ter lido o Grande Livro no qual elas estão consignadas, as palavras que são pronunciadas no momento da consagração do Graal”[28]. De facto, em Le Grand Graal, de autor anónimo no Pseudo-Boron, o Graal é identificado ao Livro escrito por Cristo, cuja leitura só pode entender ou iluminar quem está nas graças de Deus, porque o Livro tem um terrível poder: “As verdades de fé que este Livro contém não podem ser pronunciadas por língua mortal, sem que os quatro elementos sejam agitados. Se isso acontecesse realmente, os céus diluviariam, o ar tremeria, a terra afundaria e a água mudaria de cor”.

Agir em contrário é transformar a demanda em devassa, como se nota nas especulações empíricas dos teóricos de livraria para quem o Graal é apenas expressão de “conseguir o impossível” sem que se lhe dê forma física, ou então algo a ver com a interiorização mística afim a vagos estados d´alma que se pretendem representar exteriormente no objecto-relíquia, sem que haja mais e cujo vácuo deixa as portas abertas à dúvida, à suspeição, ao desânimo e à desistência. Deveria saber-se que tudo quanto haja no plano espiritual existe no plano material, e vice-versa, por conseguinte, também o Graal existe, não é simples efabulação poética medieval chegada ao presente; descrer dessa “literatura inútil” é coisa de efabuladores impenitentes portando-se como “a raposa na latada não conseguindo alcançar o cobiçado cacho de uvas”, da lenda moral de La Fontaine.

Mas não só na literatura ficou registada a tradição do Santo Graal, porque ela também se apresenta na pintura e na escultura, como igualmente na ópera, no teatro e no cinema. O tema está universalizado.

Aqui chegados, posso afirmar que por detrás do véu das lendas efabuladas que são mais que mitos de fundação, está a milenar Ordem do Santo Graal cuja féerie o Ciclo Arturiano encomiou, usando a parábola e a alegoria com tamanha destreza e subtilidade que os textos acabam valorizados só pela sua composição literária imaginosa, muito raramente, seja por ateísmo e/ou complexos intelectuais, pelos simbolismos que contêm indicando conhecimentos heterodoxos do domínio do Hermetismo medieval que pautou a mentalidade “mágica” da época e abriu as portas da Renascença.

Simbolismos como esse da Távola e o Graal, distintos, o que dá dois corpos por igual distintos de cultores na mesma Irmandade do Santo Graal: a dos Templários, encarnada por Merlim e representada por Galaaz (prefiguração do Cristo), “o cavaleiro que encontrou o Graal”, e a dos Tributários, assinalada por Artur e prefigurada por Lancelote, “o melhor cavaleiro do mundo”.

MERLIM E GALAAZ:
TEMPLÁRIOS (CASTA SACERDOTAL) – RITO DO GRAAL

ARTUR E LANCELOTE:
TRIBUTÁRIOS (CASTA GUERREIRA) – TÁVOLA REDONDA

Como o Santo Graal seja de natureza tríplice, a ver com a mudança interior de um e todos os cavaleiros, na mais fina e ortodoxa disciplina que é a Regra da Ordem, valores contendo a esperança de futuro melhor cabendo a toda a civilização, tem-se:


Transformar a vida-energia em vida-consciência vem a ser a meta da verdadeira Iniciação, nisto se centrando no coração que no corpo humano é expressivo do Graal-Consciência, sendo que na odisseia arturiana vários dos seus principais personagens vêm a representar a demanda sem devassa desse supremo estado de Ser do humano em divino. Esta é a grande aventura.


Isso vai de encontro ao que o Professor Henrique José de Souza (1883-1963), fundador da Sociedade Teosófica Brasileira, proferiu no seu Livro do Graal (1950), obra reservada:

“A palavra Graal é uma forma pela qual se define iniciaticamente a manifestação do “Esplendor Celeste” na Terra. O mistério do Santo Graal, num aspecto mais particularizado, vemo-lo ligado à tradição oculta do Cristianismo. Neste ele foi mantido através de duas Ordens Secretas e sob os símbolos da Cruz, como instrumento de sacrifício, do sangue do mesmo sacrifício resultante, e das lágrimas de Maria, como expressão viva da dor. As duas Ordens referidas foram a do Santo Graal e a dos Monges-Construtores em conexão com aquela e auxiliada pela de S. Francisco, as quais mantiveram durante séculos o Rito do Santo Graal.”

Finalmente, reportando-me ao libreto da ópera Parsifal, de Richard Wagner, aquele pergunta: “O que é o Graal?” Tendo respondido o cavaleiro Gurnemanz:

– Não sei responder-te.
Porém, se fores guiado por ele
Não te será oculta a verdade…
Nenhum caminho conduz até ele,
E procurá-lo é inútil…
Salvo se ele mesmo for o guia.

NOTAS

[1] Vários autores, Splendeurs et Rayonnement du Moyen Age, obra apresentada por Marcel Brion, da Academia Francesa. Editions Pygmalion/Gérard Watelet, Paris, 1986.

[2] Chrétien de Troyes, Obras completas, edição e tradução sob a direção de Daniel Poiron. “Bibliothèque de la Pléiade”, Editions Gallimard, Paris, 1994. Chrétien de Troyes, Romances da Távola Redonda. Editora Martins Fontes, São Paulo, 1998.

[3] Almir de Campos Bruneti, A Lenda do Graal no contexto heterodoxo do Pensamento Português. Sociedade de Expansão Cultural, Lisboa, 1974.

[4] Josué Pinharanda Gomes, S. Nuno de Santa Maria – Nuno Álvares Pereira. Editora Zéfiro, Sintra, 2009.

[5] Régine Pernoud, Hildgard de Bingen: a consciência inspirada do século XII. Tradução Eloá Jacobina. Editora Rocco, Rio de Janeiro, 1996.

[6] Anónimo, A Demanda do Santo Graal – O Manuscrito de Heidelberg. Organização e tradução de Marcus Baccega. Editora Hedra, São Paulo, 2015.

[7] Poesia e prosa medievais. Selecção, introdução e notas por Maria Ema Tarracha Ferreira. Biblioteca Ulisseia de Autores Portugueses, Lisboa, 1988.

[8] Maria Gabriela Buescu, Perceval e Galaaz, cavaleiros do Graal. Biblioteca Breve, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, Lisboa, 1991.

[9] Pierre Ponsoye, El Islam y el Grial. Ediciones de la Tradicion Unanime, Barcelona, 1984.

[10] Sampaio Bruno, Os Cavaleiros do Amor. Guimarães Editores, Lisboa, 1960.

[11] Vitor Manuel Adrião, Portugal, Mística e Mistério (Identidade e Património), cap. XI, “Corte de Amor na Cardiga”. Espiral Editora, Lisboa, 2022.

[12] O texto do Milagre de Ourique, que constitui o codicilo espiritual de Portugal, aparece publicado pela primeira vez nos Diálogos de Vária História de Pedro de Mariz, em 1597, que frei Bernardo de Brito viria a inserir na Crónica de Cister, livro III, capítulo II, Alcobaça, 1602, posteriormente reproduzido por frei António Brandão na Monarquia Lusitana, III Parte, livro X, capítulo V, Lisboa, 1632.

[13] Vitor Manuel Adrião, Portugal Templário (Vida e Obra da Ordem do Templo). Euedito, Lisboa, Janeiro de 2020.

[14] Amélia Pereira Hutchinson, European Relations of Portuguese Arthurian Literature. University of Manchester, England, 1984.

[15] Geoffrey of Monmouth, The Life of Merlin (Vita Merlini). University of Wales Press, England, 1973.

[16] Paulo Pereira, Lugares Mágicos de Portugal – Paraísos Perdidos e Terras Prometidas. Círculo de Leitores, Rio de Mouro, Novembro/Dezembro de 2004.

[17] Maria Gabriela Buescu, ob. cit.

[18] Note-se, por exemplo, a produção, já em 1567, de um texto português intitulado Memorial das Proezas da Segunda Távola Redonda. Trata-se de uma novela de Cavalaria da autoria de Jorge Ferreira de Vasconcelos, que diz tê-la escrito “fundado na mais alta matéria que confiado no próprio engenho”. O seu personagem principal é o rei Sagramor (“Amor Sagrado”), nome frequentemente utilizado quer na obra de Chrétien de Troyes, quer na Demanda do Santo Graal, texto editado pela Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, 2005.

[19] Heitor Megale, A Demanda do Santo Graal – das origens ao Códice Português. Ateliê, São Paulo, 2008.

[20] Thomas Malory (1405-1471), A Morte de Artur, três volumes. Assírio & Alvim, Lisboa, 1991, 1992, 1993.

[21] Albert Pauphilet, Étude sur la Queste del Saint Graal. Honoré Champion, Paris, 1968.

[22] Karen Pratt, The Cistercians and the Queste del Saint Graal. Reading Medieval Studies, t. XX, pp. 69-96, London, 1995.

[23] Albert Beguin, La Quête du Saint Graal. Yves Bonnefoy, Paris, 1958.

[24] M. de Riguer, artigo Grial (Leyenda del), em Enciclopedia de la Biblia, t. III, pp. 950-951. Ed. Garriga, Barcelona, 1969.

[25] Thiago José Borges, A tradição dos ‘Loca Sancta’: sacralização e representação dos espaços sagrados no Ocidente medieval cristão (séculos VIII-XV). Universidade de Brasília – Instituto de Ciências Humanas, Brasília, 2017.

[26] Trata-se do manuscrito 643 depositado na Torre do Tombo, parcialmente editado por Ivo de Castro, Livro de José de Arimateia, estudo e edição do código ANTT 643 (tese policopiada). Faculdade de Letras, Lisboa, 1984. Existe ainda a edição diplomática de Henry Hare Carter, The Portuguese Book of Joseph of Arimathea. Paleographical edition. The University of North Carolina Press, Chapel Hill, 1967.

[27] Mário Roso de Luna, Uma Mártir do século XIX – Helena Petrovna Blavatsky. Editorial Pueyo, Madrid, 1924. Ainda a tradução que fiz desta obra, com introdução e notas pessoais, publicada pela Espiral Editora, Lisboa, 2018.

[28] Estará o autor a referir-se aos misteriosos Registos Akáshicos? Mas o que são estes? Para responder terei de recorrer aos conhecimentos iniciáticos da Sabedoria das Idades. Eles também são chamados de Memória da Natureza e Livro do Kamapa. Sendo Akasha o Éter, dos quatro tipos do mesmo – escuso dar os seus nomes sânscritos para não complicar o entendimento – o mais rarefeito é o 4.º Éter Reflector, assim chamado por reflectir, como se fosse uma espécie de negativo fotográfico, os pensamentos, emoções e actos do Plano Físico denso. Expressa o 4.º Plano Psicomental (Kama-Manásico) e por isso mesmo, por sua natureza bioplástica, reflecte os mesmos pensamentos e emoções gerados durante as multivariadas actividades humanas (literárias, artísticas, musicais, etc.) que ficam impressas no Éter ou Akasha como Registos Imperecíveis. São os 4.º e 3.º Éteres, Reflector e Luminoso, que contêm a memória mental, enquanto os 2.º e 1.º Éteres, Vital e Químico, detêm a memória cerebral. Quando a consciência humana age com noção extrafísica, é porque a memória cerebral acompanha a mental, ou seja, os quatro Éteres estão unidos e não há interrupção na consciência imediata, seja a dormir, seja a projectar-se fora do corpo, mas isto exige longa e rigorosa disciplina sob a direcção de um Adepto Vivo e dos seus Ensinamentos Iniciáticos.






terça-feira, 12 de setembro de 2023

Jâmblico - Eudæmonia, ou o verdadeiro sucesso


O último assunto que resta para discussão é em relação ao verdadeiro sucesso. Você colocou problemas intrincados com relação a isso, a saber: primeiro, observações sobre certos assuntos; depois, questões de dúvida; e depois disso, questionamento. Por conseguinte, colocaremos suas perguntas em sua ordem, cada uma delas, e responderemos a elas no devido tempo em referência a elas.

Tu perguntas “se não existe outro caminho para o verdadeiro sucesso além dos deuses”. Que caminho diferente para cima pode haver, “inteiramente à parte dos deuses” que seja razoável? Pois se a essência e a perfeição de todo bem estão contidas nos deuses, e seu poder e autoridade primários estão conosco (sacerdotes), e com aqueles que são igualmente possuídos pelas divindades superiores, e entraram genuinamente em união com eles – e em suma, se a fonte e o fim do bem são seriamente perseguidos: nesse caso, estão presentes de acordo, o Espetáculo da Verdade e a iniciação no conhecimento espiritual. E com o conhecimento dos deuses, a volta para nós mesmos e o conhecimento de nós mesmos. seguir juntos.


DIVERSAS DECLARAÇÕES CRÍTICAS.

Sem nenhum propósito, portanto, você propõe a dúvida “se é necessário prestar atenção às opiniões humanas”. Para que lazer tem a pessoa cuja mente e pensamento estão com os deuses para olhar para baixo em busca da aprovação dos seres humanos? Nem no que segue tu falas com o propósito: “se a Alma não forma de vez em quando grandes concepções”. Pois que princípio de criações fantasiosas tem lugar naqueles que têm um ser real? Não é a faculdade da imaginação em nós a formadora da eidola? Mas quando a vida espiritual está perfeitamente ativa, não há nada da imaginação desperta. A verdade em sua essência não coexiste com os deuses? Pelo menos, não está estabelecido com princípios racionais harmoniosamente? É em vão, então, que tu e outros sussurram tais coisas.

No entanto, essas coisas sobre as quais certos padres saltimbancos e adivinhos caluniam aqueles que ministram na adoração dos deuses, e tu falaste da mesma maneira – não são de forma alguma relacionadas com a teologia e a teurgia genuínas. Mas se, de alguma forma, certas coisas de tal caráter brotam como excrescências ao lado dos saberes das coisas boas, como as más artes brotam com outras artes, esses mesmos saberes são realmente mais combatidos por eles do que qualquer outra coisa. Pois o que é mau é mais hostil ao bem do que ao que não é bom.


A RESPEITO DO PRESENTIMENTO NATURAL.

Desejo depois disso examinar curiosamente outras observações que deturpam a presciência divina. Tu comparas com ela “outros métodos para obter premonições do que acontecerá”. Pois para mim, embora uma certa aptidão da natureza ajude a significar o que está para acontecer, assim como a presciência de terremotos, ou ventos, ou tempestades acontece com os animais, não parece digno de nossa veneração. Pois tal faculdade inata de adivinhar acompanha a agudeza dos sentidos – ou simpatia, ou alguma outra comoção das faculdades naturais, e não tem nada sobre isso de adoração e sobrenatural. Nem se alguém, por raciocínio humano ou observação sistemática, determinar dos sintomas as coisas de que os sinais são indicativos, como os médicos da sístole do pulso prognosticam uma febre próxima, ele de modo algum me parece possuir algo honroso e bom. Pois ele também se propõe a isso humanamente e infere logicamente por nossa faculdade de raciocínio em relação às coisas que confessam ocorrer na ordem da natureza e faz seu diagnóstico não muito longe da ordem corpórea das coisas. Assim, se há em nós alguma percepção natural do futuro, a faculdade se mostra claramente na atividade como em tudo o mais, mas ao tê-la nada de muito feliz é possuído. Pois o que pode haver das qualidades implantadas em nós pela natureza no reino da existência gerada que seja um benefício genuíno, perfeito e eterno? e infere logicamente por nossa faculdade de raciocínio em relação a coisas que confessam ocorrer na ordem da natureza e ele faz seu diagnóstico não muito longe da ordem corpórea das coisas. Assim, se há em nós alguma percepção natural do futuro, a faculdade se mostra claramente na atividade como em tudo o mais, mas ao tê-la nada de muito feliz é possuído. Pois o que pode haver das qualidades implantadas em nós pela natureza no reino da existência gerada que seja um benefício genuíno, perfeito e eterno? e infere logicamente por nossa faculdade de raciocínio em relação a coisas que confessam ocorrer na ordem da natureza e ele faz seu diagnóstico não muito longe da ordem corpórea das coisas. Assim, se há em nós alguma percepção natural do futuro, a faculdade se mostra claramente na atividade como em tudo o mais, mas ao tê-la nada de muito feliz é possuído. Pois o que pode haver das qualidades implantadas em nós pela natureza no reino da existência gerada que seja um benefício genuíno, perfeito e eterno?


A DOAÇÃO DIVINA.

Somente o dom divino da adivinhação, portanto, sendo conjugado com os deuses, nos confere a vida divina e, igualmente, tornando-nos participantes da presciência divina e dos pensamentos divinos, nos torna verdadeiramente divinos. Faz com que sejamos genuinamente possuidores do bem, porque o pensamento mais abençoado dos deuses abunda em todo bem. Portanto, “aqueles que possuem o dom de adivinhar”, não, como você supõe, “preveja e não seja realmente bem-sucedido”, pois toda presciência divina é aparentemente boa. Tampouco “prevêem eventos futuros e não sabem como fazer uso adequado da previsão para si mesmos”. Ao contrário, com a presciência, eles recebem a própria beleza e a ordem que são ao mesmo tempo verdadeiras e decentes, e há com isso o que é proveitoso. Pois os deuses lhes dão também o poder de se proteger contra calamidades terríveis do reino da natureza: e quando é necessário exercitar a coragem e a incerteza do futuro contribui para isso, eles mantêm ocultas as coisas que devem ser, para para melhorar a alma. No entanto, quando a incerteza não traz nenhuma ajuda para este fim, e a presciência é vantajosa para as almas, para salvá-las e conduzi-las para cima,


O CAMINHO PARA O VERDADEIRO SUCESSO.

Mas por que estou prolongando esses discursos? Já mostrei abundantemente antes, pelas muitas explicações que fiz neles, a superioridade da inspiração sobre a adivinhação humana. Melhor, portanto, é o que você pede de nós: “Para deixar claro para você o caminho para o sucesso, e em que consiste a essência dele.” Pois a partir disso a verdade deve ser encontrada, e todas as dificuldades podem ser facilmente resolvidas de uma só vez. Digo, portanto, que a pessoa divina dotada de intuição, tendo, em uma condição anterior de ser, sido participante da unidade, pelo espetáculo dos deuses, chega posteriormente a outra alma (ou condição psíquica) que é ajusta-se ao ideal humano de figura, e através disso se envolve no vínculo da Necessidade e do Destino. Agora, então, é necessário considerar como ele pode ser solto e libertado de suas amarras. Não há outro caminho, exceto o conhecimento dos deuses. Pois o ideal ou sucesso é a percepção do Bem, assim como o ideal do mal passa a ser o esquecimento do que é bom e o engano em relação ao que é ruim. O primeiro, portanto, se une à natureza divina: mas o último, um destino inferior, é inseparável do mortal. A primeira busca as essências inteligíveis pelos caminhos sagrados: mas a segunda, desviando-se dos primeiros princípios, se entrega à medição dos ideais do ambiente corpóreo. O primeiro é o conhecimento do Pai: mas o último é o afastamento dele e o esquecimento de Deus, o Pai, primeiro em Essência e suficiente para si mesmo. O primeiro preserva a vida genuína e a traz de volta ao seu Pai, mas o último traz o homem que governa no reino da existência gerada para o mundo que nunca é permanente, mas sempre mutável.

Que, então, este caminho superior para o verdadeiro sucesso, que é a realização espiritual da união das almas com a natureza divina, seja conhecido por ti. Mas o dom sacerdotal e teúrgico do verdadeiro sucesso é chamado de Porta para o Criador do Universo, ou Suprema Bondade. Em primeiro lugar, possui o poder da castidade da alma que é muito mais perfeita do que a castidade do corpo: depois, a preparação do entendimento para a participação e visão do Bem e sua libertação de tudo de caráter contrário: e depois destes, a unidade com os deuses, os doadores de todas as coisas boas.


RETORNO DA ALMA À DIVINDADE.

Depois que a disciplina teúrgica une a alma individualmente com os vários departamentos do universo e com todos os poderes divinos que a permeiam, então ela conduz a alma ao Criador do mundo, a coloca sob sua responsabilidade e a liberta de tudo. pertencente ao reino da matéria, unindo-o com a Única Razão Eterna (Logos).

O que estou dizendo é isto: Que une a alma individualmente ao Uno, Pai de si mesmo, auto-movente. Aquele que sustenta o universo, espiritual, que ordena todas as coisas, que o conduz à verdade suprema, ao absoluto, ao eficiente e outros poderes criativos de Deus: estabelecendo assim a alma teúrgica nas energias, nas concepções e qualidades desses poderes. Em seguida, insere a alma em todo o Deus Demiúrgico.

Isto, com os Sábios Egípcios, é o fim do “Retorno” como ensinado nos Registros Sagrados.


EM RELAÇÃO AO “BEM”.

O próprio Bem, eles consideram de um lado como Divindade absoluta; o Deus subsistindo antes do pensamento: mas por outro como humano, que é uma unidade com ele. Bitys explicou isso nos Pergaminhos Hermaicos. Isso, portanto, não é “passado” pelos sacerdotes egípcios, como você sugere, mas é transmitido por eles em um estilo digno do ser divino. Nem os teurgos “invocam a Mente Divina” em relação a “assuntos triviais”, mas, por outro lado, é em relação a assuntos relativos à purificação da alma, sua libertação e salvação. Nem eles “se ocupam diligentemente com coisas que são difíceis: mas sem utilidade para os seres humanos”;mas, ao contrário, são as mais proveitosas de todas para a alma. Tampouco são impostas por um daemon “Vagante”, que em todos os casos não apenas lutou com sucesso com a natureza demoníaca enganosa, mas também se exaltou ao reino da mente e da divindade.


De despedida

A essas muitas coisas te respondemos como melhor pudemos em relação às dúvidas e dificuldades que descobriste em relação à divina arte da adivinhação e da teurgia. Resta agora ao fim destes discursos que rogo aos deuses que concedam a mim e a ti, a imutável salvaguarda das verdadeiras concepções: e também para implantar em nós para sempre a verdade eterna, e nos fornecer uma participação de concepções mais perfeitas. em relação aos seres divinos: pois neles a consumação mais abençoada de todas as coisas boas é colocada diante de nós, e a confirmação da amizade sincera que agora existe entre nós.


FIM


Jâmblico - O Daemon Pessoal


Vamos, então, esforcemo-nos agora, na medida do possível, para endireitar o complicado problema em relação ao daemon pessoal, que também é tema de várias objeções. Assim, portanto, para falar claramente, o tratamento do sujeito em relação ao daemon pessoal é duplo, teúrgico e técnico: um evocando-o das categorias acima, e o outro dos períodos visíveis no mundo da existência gerada. O primeiro não faz uso da arte de lançar presépios, mas o segundo se dedica a tais atividades. O primeiro presta homenagem ao daemon mais geralmente como superior à província da natureza, mas o último especificamente como pertencente ao reino da natureza como um todo. Por isso, pareces ter trazido estranhamente a mais perfeita performance sagrada para considerar como um mero assunto humano,


MODO DE QUESTIONAMENTO CRITICADO.

Então, você me parece ter cortado aqui apenas uma parte muito pequena da afirmação em relação ao daemon pessoal. Pois é costume daqueles que trabalham segundo as regras da arte da vaticinação em relação ao momento do nascimento convocá-lo de uma forma prescrita dos decanos e nascentes das constelações do zodíaco e igualmente das estrelas; o sol também e a lua, e dos Ursos e igualmente de todos os elementos, e do mundo. Não é justo para ti dividir uma parte muito pequena do assunto, “o Senhor da Casa”, e fazer perguntas simplesmente a respeito disso.

Aqui, por sua vez, você pergunta em relação a um único assunto em consideração (o daemon pessoal), “como o Senhor da Casa o designa: de acordo com qual propósito, ou qual qualidade de emanação, ou vida, ou poder, vem de isso para nós.” Você também colocou a questão em relação ao “cálculo de natividades, se ele (o daemon) realmente existe ou não”, e em relação à descoberta do Senhor da Casa, “se é impossível ou possível”.Que importância têm essas questões sobre a dominação, em relação ao daemon? Pois é evidente que nosso conhecimento de como ele existe não faz diferença em relação a questões como sua essência e causa. Pois no que diz respeito às coisas que têm origem no reino da natureza, ainda que não saibamos, acontece da mesma forma, que todas e cada uma delas têm sua própria estabilidade de essência no universo. Assim, portanto, enfrentaremos suas dificuldades em geral; mas direcionaremos nossa atenção especificamente para o que tu pedes e nos esforçaremos em relação a eles para te dar as soluções.


DESTINO E O DAEMON PESSOAL.

Tu também declaras que “a pessoa que aprendeu o esquema de sua natividade, e assim conhecendo seu próprio daemon, está liberada do destino, é verdadeiramente favorecida pela divindade”. Tu não me pareces, no entanto, estar dizendo essas coisas completamente em harmonia, nem consigo mesmo, nem com a verdade. Pois se o daemon nos foi atribuído a partir do esquema da natividade, e podemos encontrá-lo a partir disso, como somos libertados do destino através do conhecimento de que o daemon nos foi dado de acordo com o destino? Mas se, como tu declaras, somos realmente libertados da necessidade através do daemon, como isso nos foi concedido pelo destino?

Por isso, as coisas agora pronunciadas por ti não apenas conflitam consigo mesmas, mas também estão em desacordo com a verdade; vendo que o daemon pessoal não chega a todos pelo esquema de sua natividade peculiar. Por outro lado, sua origem, que a seguir exporemos, era mais antiga que esta. Se, portanto, o demônio que desce fosse contemplado sozinho daquela fonte, o indivíduo que obtivesse um conhecimento do demônio de sua natividade de modo algum seria feliz ou afortunado. Quem, de fato, se neste caso fosse permitido a ele, para que ele pudesse cumprir as atribuições do destino, consentiria em receber o daemon como um guia para a libertação do destino? No entanto, isso me parece parte da teoria a respeito do daemon, e ser o último do tipo, mas que toda a sua essência é ignorada em silêncio por tal modo de investigação. No entanto, essas coisas, embora sejam incorretamente declaradas, não são, no entanto, totalmente estranhas ao assunto.

As dúvidas, no entanto, que você traz em sua ordem, em relação à “enumeração dos Cânones”, e em relação à “habilidade em calcular natividades”, que eles estão “além da compreensão”, não nos envolvem em nenhuma controvérsia em relação aos assuntos diante de nós. Pois se essas artes são cognoscíveis ou além da compreensão, ainda assim a aura ou emanação das estrelas traz o daemon para nós, quer nós mesmos estejamos cientes disso ou não. A divina arte oracular, entretanto, pode nos ensinar em relação às estrelas quanto ao que é mais verdadeiro, e, de qualquer forma, não precisamos da enumeração dos cânones, ou da arte de adivinhar.


ASTROLOGIA EXPLICADA.

Se, no entanto, for necessário, ao dispensar esses assuntos, dizê-lo, você não me parece certo no que afirma, a saber: que é impossível para a perícia em observações astrais equivaler a qualquer conhecimento real, pois há há grande desacordo em relação a ele, e porque Chæremon ou alguém falou contra ele.” De fato, por este modo de argumento o raciocínio estará além da compreensão. Têm dezenas de milhares de pessoas disputando, e as questões de dúvida neles têm sido inumeráveis. Por isso, costumamos dizer, em oposição àqueles que gostam de disputar, que as coisas contraditórias criam dissensão mesmo nas coisas que são realmente verdadeiras, e que as falsidades não estão sozinhas em lutar umas com as outras. Assim, também, em relação à ciência matemática [astrologia], podemos não apenas afirmar que ela é verdadeira, mas também que aqueles que a ela erram contradizem, não sabendo nada a respeito das coisas que são realmente verdadeiras. Isso acontece, porém, não apenas em relação a esta ciência, mas também em relação a todas as ciências que são entregues dos deuses aos seres humanos. Pois como o tempo está sempre passando, eles são muitas vezes misturados com muito que é de origem mortal, e o caráter divino do conhecimento torna-se grandemente obliterado. No entanto, está verdadeiramente dentro e, embora escassa, essa evidência segura da verdade é, no entanto, eficaz para sua preservação. Quando os signos da medição das revoluções dos divinos são claramente evidentes diante dos olhos, quando indicam de antemão os eclipses do sol e da lua, as entradas do sol nos signos do zodíaco e as saídas deles, e os nasceres e opores simultâneos da lua com os das estrelas fixas, a prova da visão real é manifestada de acordo com a previsão. Além disso, as observações dos corpos celestes que foram preservadas ao longo de todo o período, tanto pelos caldeus essa evidência segura da verdade é, no entanto, eficaz para sua preservação. Quando os signos da medição das revoluções dos divinos são claramente evidentes diante dos olhos, quando indicam de antemão os eclipses do sol e da lua, as entradas do sol nos signos do zodíaco e as saídas deles, e os nasceres e opores simultâneos da lua com os das estrelas fixas, a prova da visão real é manifestada de acordo com a previsão. Além disso, as observações dos corpos celestes que foram preservadas ao longo de todo o período, tanto pelos caldeus essa evidência segura da verdade é, no entanto, eficaz para sua preservação. Quando os signos da medição das revoluções dos divinos são claramente evidentes diante dos olhos, quando indicam de antemão os eclipses do sol e da lua, as entradas do sol nos signos do zodíaco e as saídas deles, e os nasceres e opores simultâneos da lua com os das estrelas fixas, a prova da visão real é manifestada de acordo com a previsão. Além disso, as observações dos corpos celestes que foram preservadas ao longo de todo o período, tanto pelos caldeus as entradas do sol nos signos do zodíaco, e saídas deles, e os nasceres e opores simultâneos da lua com os das estrelas fixas, a prova da visão real é manifestada de acordo com a previsão. Além disso, as observações dos corpos celestes que foram preservadas ao longo de todo o período, tanto pelos caldeus as entradas do sol nos signos do zodíaco, e saídas deles, e os nasceres e opores simultâneos da lua com os das estrelas fixas, a prova da visão real é manifestada de acordo com a previsão. Além disso, as observações dos corpos celestes que foram preservadas ao longo de todo o período, tanto pelos caldeus e por nós mesmos, testemunhamos juntos a verdade desta Ciência.

Demonstrações mais conhecidas do que essas poderiam ser exibidas, se o discurso tivesse sido principalmente sobre esses assuntos. No entanto, como são supérfluos e não pertencem ao reconhecimento do daemon, é apropriado que eu os deixe de fora e passe para assuntos mais apropriados do que estes.


O DAEMON PESSOAL NÃO DESCOBERTO PELA ASTROLOGIA.

Em sua epístola, você faz esta declaração: “A suposição do Senhor da Casa (ou Senhores da Casa, se houver mais de um) pertencente a uma natividade, é quase confessada pelos próprios astrólogos como além de prova absoluta; e ainda. é a partir dessa suposição, dizem eles, que é possível determinar o próprio daemon pessoal. Como o conhecimento do Senhor da Casa pode ser reconhecido por eles como além da compreensão, quando eles entregam métodos claros em relação à sua descoberta, e também ensinam completamente os princípios elementares para a determinação dos assuntos em disputa; uns cinco, outros mais e outros menos? No entanto, para que possamos ir além disso, passemos a examinar uma questão de maior importância, os atributos contingentes de ambos os lados da questão. Pois, se é possível descobrir o Senhor da Casa pertencente à natividade, o daemon que foi atribuído a partir dele também é cognoscível; e se o assunto está fora de alcance, então, de acordo com essa hipótese, não o conhecemos. No entanto, como há um Lord of the House, há também um daemon que foi designado por ele. O que impede, então, que, embora possa ser realmente difícil descobri-lo através do cálculo da natividade, possa ser fácil percebê-lo por meio da divinação sagrada ou da teurgia?

Em suma, o daemon não é atribuído apenas pelo Senhor da Casa, mas, por outro lado, há muitas origens para ele mais universais do que pelo Senhor da Casa. Ainda assim, porém, tal método introduz um procedimento artificial e humano em relação ao daemon pessoal. Portanto, nessas dificuldades que você sugeriu, não há nada saudável.


VERDADEIRA CONTA DO GUARDIAN DAEMON.

Se, no entanto, for necessário revelar a você a verdadeira doutrina em relação ao daemon pessoal, deixe-me dizer o seguinte: não é de uma parte do céu, nem de qualquer elemento individual dos objetos visíveis, que ele nos é atribuído. Mas há do mundo inteiro e dos vários tipos de vida nele, e dos vários tipos de corpo pelos quais a alma desce ao reino da existência gerada, uma porção atribuída, toda nossa, dividida entre nós para cada um dos qualidades distintivas em nós, cuja distribuição é feita de acordo com a disposição dominante de cada indivíduo.

Este daemon, portanto, está presente como exemplar antes que as almas desçam ao reino da existência gerada. Assim que a alma o escolhe para líder o daemon imediatamente se encarrega de completar seus dotes vitais e, quando desce ao corpo, une-o ao corpo e se torna o guardião de seu princípio vital comum. Ele também dirige a vida privada da alma, e quaisquer que sejam as conclusões a que possamos chegar por inferência e raciocínio, ele mesmo nos comunica os princípios. Pensamos e fazemos exatamente as coisas que ele nos traz por meio do pensamento. Ele guia os seres humanos assim continuamente até que através da sagrada disciplina teúrgica obtenhamos um deus para ser guardião e líder da alma. Pois então ele dá lugar ao superior, ou entrega a superintendência, ou torna-se sujeito, como um tributário, a ele, ou de alguma outra forma é servo dele como a um suserano.


UM GUARDIAN DAEMON APENAS PARA UM INDIVÍDUO.

A partir desses fatos, posso responder facilmente à sua próxima pergunta. Pois o daemon pessoal não “preside regiões específicas em nós”, mas simplesmente tudo ao mesmo tempo. Ele permeia cada princípio sobre nós, da mesma maneira que foi atribuído a todas as ordens [de inteligência] no universo. Pois também te parece apropriado observar o seguinte: “Que há daemons colocados sobre departamentos específicos do corpo, um sobre a saúde, um sobre a figura e outro sobre os hábitos corporais, formando um vínculo de união entre eles, e aquele é colocado como superior sobre todos eles em comum.” Isso mesmo você deve considerar como prova de que a autoridade sobre tudo em nós é investida em um daemon sozinho. Assim, não é correto definir”um demônio como guardião do corpo, outro da alma e outro da mente.” Pois se a pessoa viva é um indivíduo e o demônio múltiplo que é colocado sobre ele, a noção é absurda. Certamente os poderes dominantes em todos os lugares são únicos e não aqueles que são governados. Mas é ainda mais absurdo se os muitos daemons que governam departamentos especiais não são semelhantes, mas devem ser classificados separadamente uns dos outros.

Você também declara que existem personagens contraditórios entre eles, dizendo que “alguns daemons são bons e outros ruins”. Demônios maus não têm nenhuma atribuição como guardiões, e eles nunca são classificados em oposição aos bons, como uma parte contra outra, como se tivessem igual importância.


O DAEMON GUARDIÃO NÃO É UMA “PARTE DA ALMA”.

Tendo abandonado esses pontos sucessivamente, você passa rapidamente para a conjectura da filosofia (grega); ainda em relação ao daemon pessoal tu derrubas toda a hipótese. Pois se o demônio é “uma parte da alma”, como, por exemplo, o espiritual ou o inteligível, e “aquele que tem uma mente imbuída de bom senso é o verdadeiramente favorecido”, não haverá outra ordem de seres , divino ou demoníaco, assumindo autoridade sobre a alma humana como sendo superior a ela. Em vez disso, haverá partes especiais da alma, ou algum poder existindo separadamente supremo sobre as muitas formas de vida dentro de nós; e estes, não como aliados por natureza, mas como tendo sido separados como superiores em sua natureza a toda a nossa substância.


VÁRIOS DAEMONS GUARDIAN.

Depois disso, você lembra outra declaração em relação ao daemon pessoal, a saber: que “algumas pessoas prestam culto a dois, e outras a três desta classe”. Isso, no entanto, é tudo errôneo. Pois a classificação das causas superiores que se colocam sobre nós, em vez de incluí-las em uma, é uma maneira falaciosa de proceder, e se afasta completamente da unidade que domina tudo. A doutrina que distribui o daemon em partes do corpo, ou no governo do corpo, reduz sua liderança a um ponto muito pequeno. Que necessidade, em tal caso, para aqueles que nutrem tal opinião, de considerar os ritos sagrados, o primeiro princípio deles sendo infundado?

Há, portanto, um daemon guardião pessoal para cada um de nós. Não é correto supor que seja comum a todos, ou que seja comum, mas apenas que está presente em cada indivíduo como se fosse seu. Pois uma distribuição a todas as espécies e a diversidade existente no reino da matéria não admitem a união e a identidade de coisas essencialmente incorpóreas.

Por que, então, o daemon “é invocado por todos com uma forma comum de invocação”? É porque sua invocação é feita através de uma divindade; o Senhor dos daemons que desde o início atribuiu a cada um seu daemon pessoal. Mesmo agora, também nos ritos sagrados, ele dá a conhecer a todos e a cada um seus daemons pessoais, de acordo com seu próprio propósito. Pois sempre no arranjo teúrgico, os secundários são invocados através das divindades superiores. No que diz respeito aos demônios, portanto, um líder comum dos cosmocratas, no que diz respeito à natividade, envia para cada um e todos, seu daemon pessoal. Assim, quando o daemon pessoal está presente, ele dá a conhecer sua própria adoração e ensina o modo apropriado pelo qual ele deve ser invocado.


SOBRE A INVOCAÇÃO DE DAEMONS GUARDIAN.

Esse arranjo também é aceitável para os daemons. Uma parte é semelhante aos daemons que são invocados: outra descende das categorias mais antigas: e a terceira faz uma ação conjunta de ambas as outras. Portanto, não compare as invocações dos deuses com as dos homens, nem as coisas que não devem ser ditas com as que podem ser contadas; e não compare as coisas que são anteriores a toda limitação e todo modo indefinido, com aquelas que foram definidas pelos homens ou com arranjos indefinidos. Pois essas coisas que nos pertencem não têm nada em comum com aquelas que são totalmente superiores a nós em toda a sua raça e ordem e governam toda a nossa essência e natureza.

No entanto, aqui especialmente, os maiores fracassos ocorrem aos homens quando, da fraqueza humana, eles inferem alguma coisa em relação à tutela dos daemons: e quando com coisas triviais, dignas de nada, e em partes, eles formam um julgamento de seres que são grandes, notáveis e perfeitos.

Isso respondemos a você em relação ao daemon pessoal, além do que foi dito antes.

Jâmblico - Perguntas Propostas


Passaremos agora sobre esses assuntos, pois tu dizes que desejas que “declaremos claramente o que os Teósofos Egípcios acreditam ser a Primeira Causa: seja a Mente ou, acima da Mente: e se uma só ou subsiste com outra ou com várias outras: incorpóreos ou encarnados, e se o mesmo que o Criador do Universo (Demiurgos) ou anterior ao Criador: também se todas as coisas têm sua origem de um ou de muitos: se eles também têm conhecimento a respeito da Matéria Primal, ou de que natureza eram os primeiros corpos: e se a Matéria Primal não foi originada ou foi gerada.”

Antes de mais nada, vou dizer-te a razão pela qual nos manuscritos dos antigos Escribas do Templo, muitas e várias opiniões são oferecidas a respeito dessas coisas, e também por que entre as pessoas muito hábeis que ainda estão vivas, a explicação não é dada em termos simples. Digo, então, que como existem muitas essências e estas diferentes, os inumeráveis principados destes estando em diferentes ordens, foram transmitidos, diferentes por diferentes sacerdotes antigos.

Assim, como descreve Seleuco, Hermes expôs os princípios universais em dois mil rolos, ou como Manetho afirma, explicou-os completamente em trinta e seis mil quinhentos e vinte e cinco tratados. Os diferentes escritores antigos, no entanto, estando em conflito uns com os outros, em muitos lugares deram interpretações diferentes em relação à essência particular. É necessário, no entanto, verificar a verdade em relação a todos eles, e então apresentá-la a você de forma concisa, conforme for possível.

Primeiro, então, dê-me sua atenção em relação a este assunto sobre o qual você primeiro perguntou.


DEUS PRIMEIRO: DEUS O CRIADOR.

Antes das coisas que realmente são, mesmo os primeiros princípios de todas as coisas, está um Ser Divino, anterior até mesmo ao primeiro Deus e Rei, permanecendo imóvel na solidão de sua própria unidade absoluta. Pois nem a Inteligência nem qualquer outro princípio se misturam com ele, mas ele é estabelecido um exemplo do Deus autogerado, autoproduzido e unigênito, o Uno verdadeiramente Bom. Pois ele é algo Absolutamente Grande e Supremo, a Fonte de todas as coisas e raiz dos primeiros ideais que subsistem na Mente Suprema. Então, deste, o Deus suficiente em si mesmo fez resplandecer: e, portanto, ele é autogerado e autossuficiente. Pois ele é o Princípio e Deus dos Deuses, uma unidade procedente do Uno, subsistindo antes da essência, e o princípio da essência. Pois dele procedem o ser e a essência; e ele é chamado de acordo com Noëtarch, chefe do reino do pensamento.

Estes, então, são os princípios mais antigos de todas as coisas. Hermes os coloca diante dos deuses do Éter, do Empíreo e das regiões celestes.


MUITOS NOMES DE DEUS – FORMAÇÃO DA MATÉRIA.

De acordo com outro arranjo, porém, Hermes coloca o Deus Emêph como líder das divindades celestes, e declara que ele é a própria Mente, perceptiva de si mesma e convertendo as percepções em sua própria substância. Mas ele coloca como anterior a essa divindade, o Uno sem partes específicas, que ele afirma ser o primeiro exemplar e a quem ele chama de Eikton. Nele estão a Primeira Mente e a Primeira Inteligência, e ele é adorado somente pelo Silêncio. Além destes, porém, há outros líderes que presidem à criação das coisas visíveis. Pois a Mente Criativa, guardiã da Verdade e da sabedoria, chegando ao reino da existência objetiva e trazendo à luz o poder invisível das palavras ocultas é chamado na língua egípcia, AMON (o Arcano): mas como completar tudo de maneira genuína sem engano e com habilidade, Phtha. Os gregos, no entanto, assumem que Phtha é o mesmo que Hephestos, dando sua atenção apenas à arte criativa. Mas como dispensador de benefícios, ele é chamado Osíris:  e por causa de seus outros poderes e energias, ele também tem outras denominações.

Assim, há também com os egípcios outra soberania de todos os princípios elementares em relação ao reino da geração e das forças neles. Quatro deles são considerados masculinos e quatro femininos. Essa soberania eles atribuem ao Sol. Há também outro império de produção universal em torno do domínio da existência objetiva, que eles dão à Lua. Então, marcando o céu em duas partes, ou quatro, ou doze, eles colocam governantes sobre as partes, mais ou menos, conforme o caso, e sobre todas elas colocam aquele que é o Senhor Supremo. Assim, o sistema dos sacerdotes egípcios em relação aos Primeiros Princípios, estendendo-se de cima para os extremos mais distantes, começa no Uno e passa para a multidão: os muitos sendo guiados e dirigidos por um e o indefinido reino da natureza sendo colocado sob uma medida definida de autoridade, mesmo da causa suprema de todas as coisas. E o Deus produziu a Matéria, separando a materialidade do lado inferior da essencialidade; que sendo cheio de vida, o Criador o tomou e formou a partir dele as esferas simples e impassíveis. Mas o último dele ele organizou em corpos que estão sujeitos a geração e dissolução.


RESUMO DOS ENSINAMENTOS.

Esses assuntos já foram amplamente discutidos, e nos livros que você menciona como tendo encontrado por acaso, a solução de suas dúvidas é clara. Pois aqueles que foram apresentados como os Livros de Hermes contêm doutrinas herméticas, embora muitas vezes sejam apresentadas na forma de falar peculiar aos filósofos (gregos). Pois eles foram traduzidos da língua egípcia por homens que eram hábeis em filosofia. Mas Chæremon e outros, se houver algum, que trataram das causas primárias em relação ao mundo, também explicam os últimos princípios. Tantos quantos observações a respeito dos planetas, do Zodíaco, dos decanos, dos horóscopos e dos “Mighty Leaders”, assim chamados, dar a conhecer a distribuição dos governantes aos seus respectivos domínios. As particularidades mencionadas nos calendários constituem uma parte muito pequena do arranjo hermaico, e aquelas relativas às estrelas (ou asterismos) ou às fases, ou ocultações, ou ao aumento ou diminuição da Lua, estão entre as últimas coisas. nas delineações de causas pelos sábios egípcios.

Os sacerdotes egípcios não “explicam tudo como relacionado a objetos naturais”. Ao contrário, eles distinguem a vida da alma, e também o princípio espiritual, da própria Natureza, não apenas em relação ao universo, mas também em relação a nós mesmos. Considerando firmemente estabelecido que a Mente, e igualmente a faculdade de raciocínio, têm existência por si mesmas, eles afirmam que as coisas que nascem são criadas. Da mesma forma, eles colocam o Criador como Primeiro Ancestral daqueles no reino da existência gerada, e reconhecem o poder que dá vida antes do céu e subsiste no céu. Eles também apresentam a Mente Pura como acima do mundo, e também o Uno sem partes específicas no mundo universal, e outro que é distribuído entre todas as esferas.

Eles não contemplam de forma alguma essas coisas apenas com a faculdade de raciocínio, mas também ensinam que, por meio da teurgia sacerdotal, o aspirante pode ascender ao mais alto e mais universal, e aquelas condições estabelecidas superiores ao Destino, a Deus o Criador (Demiurgos): nem se apegar ao reino da matéria, nem se apoderar de nada além da observação de um tempo próprio.


PRELÚDIO PARA OUTRAS EXPLICAÇÕES.

Hermes também aponta o mesmo caminho. Bitys, um profeta, explicou-o ao rei Amasis, tendo-o encontrado inscrito em hieróglifos no santuário mais recôndito de Sâis, no Egito. Ele também divulgou o nome do deus que se estende por todo o mundo.

Há também, no entanto, muitos outros arranjos em relação às mesmas coisas. Por isso tu não me pareces certo em dizer que com os sacerdotes egípcios todas as coisas são levadas de volta às categorias físicas. Pois em seu sistema, os princípios são muitos e dizem respeito a muitas essências. Há também potentados supermundanos que também adoravam pelo rito sacerdotal. Para mim, portanto, essas coisas parecem fornecer pontos de partida comuns para a solução de todas as questões restantes. Mas como não devemos deixar nenhum deles sem exame, vamos adicioná-los a esses problemas, e também martelá-los de todos os lados para que possamos ver onde você conjectura que há algo de errado.


AS DUAS ALMAS DO HOMEM.

Tu também afirmas “que muitos egípcios atribuem ao movimento das estrelas o que quer que nos aconteça “. Mas qual é o fato deve ser explicado a ti por muitos dos conceitos hermaicos.

Pois o homem, como afirmam esses escritos, tem duas almas. Um é da Primeira Inteligência e é participante do poder do Criador, mas o outro é dado das revoluções dos mundos do céu, aos quais a alma que vê Deus retorna.

Sendo essas coisas condicionadas dessa maneira, a alma que vem dos mundos para nós segue (e é afetada por) os circuitos periódicos desses mundos. Mas a alma que está em sua qualidade mental superior do mundo da Inteligência, é superior ao movimento do mundo da existência gerada e através disso ocorre tanto a desvinculação do destino quanto o progresso ascendente para os deuses do Mundo da mente. A disciplina teúrgica (ou iniciação), na medida em que conduz para cima até o Incriado, é completada por uma vida desse tipo.


LIBERTAÇÃO DO DESTINO.

Essa condição, portanto, sobre a qual tu duvidas, não existe, a saber: “Que todas as coisas estão presas nos laços indissolúveis da Necessidade, que eles chamam de Destino”. Pois a alma tem um princípio próprio que conduz ao reino da Inteligência, e não apenas se mantém distante das coisas do mundo da existência gerada, mas também a une ao que é, até mesmo à natureza divina.

Nem “ligamos o Destino com os deuses que adoramos nos templos e com imagens esculpidas, como sendo desvinculadores do Destino. No entanto, os deuses “desvinculam o Destino”, mas são as últimas e mais baixas naturezas que descendem deles e estão em estreita relação aliança com a gênese do mundo e com o corpo, que completam o Destino. Com razão, portanto, realizamos aos deuses todos os ritos sagrados para que eles nos libertem dos males que nos sobrevêm do destino, como eles sozinhos, pelo poder moral da persuasão, têm domínio sobre a necessidade.

No entanto, todas as coisas no mundo da Natureza não são controladas pelo Destino. Ao contrário, há outro princípio da alma que é superior a todo o reino da natureza e da existência gerada. Por ela podemos nos unir aos deuses, elevar-nos acima da ordem estabelecida do mundo e igualmente participar da vida eterna e da energia dos deuses do mais alto céu. Através deste princípio somos capazes de nos libertar. Pois quando as melhores qualidades em nós estão em atividade, e a alma é exaltada àqueles seres superiores a si mesma, então ela se separa completamente de tudo o que a mantinha firme no reino da existência gerada, mantém-se distante das naturezas inferiores, trocas uma vida pela outra, e se entrega a uma ordem diferente, abandonando inteiramente a primeira.


A LIBERTAÇÃO MAIS EXPLICADA.

Por que, então (pode-se perguntar), não é possível liberar a si mesmo através dos deuses que giram no céu (os planetas regentes), considerá-los como Senhores do Destino, e também como amarrando nossas vidas com laços que não devem ser dissolvidos?

Talvez não haja nada que impeça isso mesmo. Embora os deuses possuam inúmeras essências e poderes em si mesmos, também são inerentes a eles muitas diferenças e contradições impraticáveis. Não obstante, é lícito afirmar tanto quanto isto: que em cada um dos deuses, especialmente naqueles que são visíveis (no céu), há princípios de essência que são do mundo da Inteligência; e que através destes, ocorre a liberação para as almas da existência gerada no mundo.

Mas, embora houvesse duas classes de seres divinos restantes, os deuses que habitam o mundo e aqueles além, haverá liberdade para as almas através dos deuses acima do mundo. Essas coisas são contadas mais precisamente no “Tratado sobre os Deuses” — como por exemplo, quem são os restauradores e quais são seus poderes; e também como eles se libertam do destino, e por quais caminhos sagrados para cima; também de que qualidade é o arranjo do reino mundano da natureza, e como a energia moral absolutamente perfeita o governa? Daí a passagem que você repetiu do poema homérico – “até os próprios deuses estão cedendo”, é uma profanação proferir. Pois as apresentações no Culto Sagrado nos tempos antigos eram prescritas por leis que eram puras e espirituais. Aqueles que estão em condições inferiores são liberados por uma ordem e poder superiores; e quando nos afastamos de condições inferiores, passamos a uma distribuição melhor. Não é efetuado, embora contrário a qualquer ordenança sagrada que tenha existido desde os tempos antigos, de maneira a implicar que os deuses possam ser alterados (em disposição ou propósito) por ritos sagrados realizados posteriormente. Pelo contrário, desde a sua primeira descida até o presente, Deus enviou as almas para que voltassem novamente a ele. Nunca, portanto, ocorre uma mudança por tal progresso ascendente, nem as descidas das almas, e sua ascensão ocasionam conflito violento. Pois como a existência gerada e todas as coisas aqui estão unidas em todos os pontos pela essência espiritual, assim também no arranjo das almas, a liberação das condições da existência gerada está de acordo com a diligência daqueles ao redor do reino da existência gerada.

Invocações e Evocações: Vozes Entre os Véus

Desde as eras mais remotas da humanidade, o ser humano buscou estabelecer contato com o invisível. As fogueiras dos xamãs, os altares dos ma...