quinta-feira, 2 de junho de 2016

“O Tibete e a Teosofia”, testamento teosófico de Mário Roso de Luna


Dar testemunho da pessoa e obra de Mário Roso de Luna, pessoalmente considero subida honra a incumbência de tão grande tarefa para a qual esta pequena pena revela o que vai na mente do subscritor o qual, nos estreitos limites da condição humana mas sincero e dedicado à Causa que abraça, certamente dará o melhor de si em proveito de todos.

Primeiro que tudo e para situar quanto se seguirá, esboçarei em traços ligeiros um rápido esquisso biográfico do colosso humano pomo central destas linhas. Mário Raimundo António Roso de Luna nasceu em Logrosán, província de Cáceres, Espanha, em 15 de Março de 1872, filho de Don Roso y Bover (natural de Vinaroz, Castellon, nascido em 1839 e falecido em 1904) e de Dona Jacinta de Luna y de Arribas (nascida em 1831 e falecida em 1910). Casou com Trinidad de Luna (falecida em 7.1.1933) e tiveram dois filhos, Sara e Ismael. Mário Roso de Luna viria a falecer em Madrid em 8 de Novembro de 1931. A sua vida profícua de génio fez com que vivesse e fizesse o que muitos e comuns mortais talvez nem em dez vidas seguidas conseguissem.

Mário Roso de Luna foi advogado e astrónomo, paleontólogo, etnólogo, etc. Sabe-se que licenciou-se em Direito em 1890, doutorando-se em 1894; depois, em 1901, licenciou-se em Ciências Físico-Químicas; foi em Cavaleiro das Ordens de Isabel, a Católica, e Carlos II, e membro correspondente da Academia de História de Madrid e da Sociedade de Arqueologia da Bélgica.

Em 1893, a partir do seu observatório astronómico instalado em Logrosán, descobriu um cometa, que a Academia de Ciências de Paris inscreveu nos anais astronómicos com o nome de Cometa Roso. No ano seguinte publicou, grandemente aceite pela comunidade científica, a descrição de um dispositivo, prático e simples, com o nome de Kinetorizon automático, cuja aplicação facilita a qualquer pessoa, mesmo leiga no assunto, conhecer as constelações, ou melhor, o estado da esfera celeste em qualquer ocasião, o que lhe valeu ser premiado com medalha de ouro pela Academia Parisiense de Inventores.

Tornou-se notável no campo da Arqueologia, onde logo celebrizou-se pela sua descoberta da célebre estela gravada do início do primeiro milénio a. C., em Solana de Cabañas, Cáceres, oferecendo-a graciosamente ao Museu Arqueológico Nacional, descoberta que foi classificada por Emil Hübner como “um dos mais raros testemunhos hieroglíficos da pré-história céltica, análogo, por seu interesse e importância, aos da Argólida”. Do mesmo modo, descobriu em Solana, Santa Cruz e Logrosán antiquíssimas construções, que descreveu como citânias luso-ibéricas. Deu a conhecer ao mundo mais de cem lápides com inscrições romanas na província de Cáceres, e concorreu, com poderosos dados, para a ratificação do Itinerário Ravennate, como seja o das vias romanas ibéricas. Interpretou como inscrições pré-caldaicas várias pedras inscritas achadas em diversos lugares da Estremadura espanhola. Perante todas essas investigações e interpretações, a Sociedade de Arqueologia de Bruxelas nomeou-o membro correspondente.


Estela de Solana de Cabanas


Também por altura da sua estadia na capital francesa, em 1902, publicou o seu interessante ensaio pioneiro na Psicologia: Preparação ao Estudo da Fantasia Humana, sob o duplo aspecto da realidade e do sonho. Em Paris, desempenhou as funções de professor na cadeira de Língua e Literatura espanhola na Socièté pour la propagation des langues étrangères e outra cadeira na Mairie du Deuxiéme Arrondissement. Deu conferências na Sorbonne e em outros espaços académicos reputados, deixando sempre os auditórios enlevados e surpreendidos pela grandiosidade do seu talento.

Conhecido como o Mago Vermelho de Realização, Roso de Luna gostava de definir-se como “teósofo e ateneísta”. Foi, com efeito, membro importante do Ateneo Científico y Literario, instituição cultural privada fundada em 1835, radicada na Calle del Prado em Madrid, cujos antecedentes recuam aos liberais madrilenos do século XIX. Característica singular do Ateneu madrileno é nele terem singrado os maiores vultos da Maçonaria e da Teosofia dos finais do século XIX e da primeira metade do século XX, a ponto de ser considerado por muitos como “Ateneu Teosófico de Madrid”.

Foi aí que Mário Roso de Luna tomou contacto directo com a Maçonaria pela primeira vez, sendo iniciado em Sevilha em 8 de Janeiro de 1917 na Loja “Ísis e Osíris”, da qual era Venerável Mestre Diego Martínez Barrio, adoptando então o nome simbólico “Prisciliano”. Foi assim que se ligou ao Grande Oriente Espanhol, e no ano seguinte, 1918, sob a tutela da Grande Loja Simbólica Espanhola do Rito de Memphis e Misraim, o próprio Roso de Luna fundou em Miajadas, próxima de Logrosán, sua terra natal, uma Loja do Rito Simbólico. Ele alcançou ao Grau 33.º maçónico.

Nessa época, a maioria dos maçons madrilenos e estremenhos eram igualmente teosofistas, e à Sociedade Teosófica, fundada por Madame Helena Petrovna Blavatsky em 7 de Setembro de 1875 na cidade de Nova Iorque, E.U.A., Mário Roso de Luna estava filado através da Loja Teosófica de Londres, desde muito antes do seu ingresso na Maçonaria.

Polígrafo ímpar, viajante incansável, como teósofo Mário Roso de Luna realizou um infatigável trabalho de divulgação. Traduziu para o castelhano as obras de Helena Blavatsky, de quem se considerava discípulo fervoroso, e produziu uma longa série de livros próprios, agrupados na chamada Biblioteca de las Maravillas. Nos seus tomos, Roso de Luna aplicou a doutrina teosófica a múltiplos campos, como a musicologia (Beethoven, teósofo, Wagner, mitólogo e ocultista), a sexologia (Aberrações psíquicas do sexo), a mitologia árabe (As Mil e Uma Noites – O Véu de Ísis), os mitos pré-colombianos (A Ciência Hierática dos Mayas) e o folclore espanhol (O Livro que mata a Morte), e também sobre o totalitarismo (A Humanidade e os Césares), mostrando a sua anti militância no repugno de toda e qualquer forma de ditadura, fosse religiosa ou laica, demonstrando sempre a sua preocupação com as questões sociais, como ficou patente em 1905 quando fez o projecto de uma escola-modelo para a educação e ensino de crianças anormais.

A par disso, Mário Roso de Luna deixou um volumoso e profícuo trabalho publicado na imprensa da época, tanto como colaborador de jornais como editor próprio, onde além de divulgar as ancestrais ideias espirituais ao homem moderno, também expunha as recentes descobertas científicas e tecnológicas a favor da ideia de autorrealização individual e de progresso social.

Hoje, o seu nome e obra são homenageados e lembrados em várias partes de Espanha, seja no nome da Calle Mário Roso de Luna em Madrid, seja em Logrosán onde está instalado o Instituto de Estudos Mário Roso de Luna, estando o seu nome igualmente presente em uma calle de Cáceres, indo desde o Camino Llano até San Juan, e noutra em Mérida.

Seguindo as pisadas dos seus antepassados ilustres e afamados aventureiros que demandaram o Novo Mundo, a América, em busca de sucesso e fortuna, Roso de Luna iria igualmente singrar o caminho desse novo El Dorado, mas não em busca do ouro vulgar e sim como arauto ibérico da 7.ª sub-raça da actual 5.ª Raça-Mãe Ariana que, como Elo Dourado ou Raça Dourada (pela cor da pele bronzeada com laivos dourados no empalidecer do branco), terá a sua irrupção na América do Sul, propriamente no Brasil, em conformidade à marcha cíclica da civilização deslocando-se de Oriente para Ocidente no chamado Itinerário de Io ou da Mónada peregrina, como consta nos ensinamentos da Teosofia, a Sabedoria Divina ou a mesma Sabedoria Iniciática das Idades.

Assim, cumprindo o périplo de realização de conferências teosóficas na América do Sul em 1909, Mário Roso de Luna esteve na então capital do Brasil, Rio de Janeiro, de 7 a 13 de Março de 1910. A sua conferência realizou-se na Associação dos Empregados do Comércio e terá sido um êxito retumbante, como transpira da notícia publicada na Gazeta de Notícias de 9 desse mês: “A conferência do Dr. Mário Roso de Luna foi um sucesso. O auditório teve a deliciosa surpresa de ouvir um filósofo da mais vasta cultura, servida por um orador de rara eloquência e extrema simpatia”.

Entre os presentes contava-se um homem de sucessos espirituais, logo, iniciáticos, também ele famoso entre o público brasileiro, tendo servido esse evento como espécie de reencontro entre duas Grandes Almas cujos destinos ficariam doravante selados: Henrique José de Souza (1883-1963), baiano então residente no Rio, fundador da possivelmente primeira Loja Teosófica no Brasil.

Com efeito, o já então chamado Professor Henrique José de Souza teria fundado em 1905, logo após a transferência da sede-mãe da Sociedade Teosófica de Nova Iorque para Adyar, Estado de Madras, Índia, uma Loja Teosófica de nome Alcyone, na cidade de Salvador, capital do estado da Bahia, com dois companheiros, Teofredo Requião, quintanista de Medicina, e Marcolino Magalhães, empresário de comércio. Consta que a Loja foi devidamente legalizada tendo recebido a necessária Carta Constitutiva da Matriz da S.T., e que Henrique, então com 22 anos de idade, era o seu tesoureiro. Em 1907 afastou-se da Loja que ajudara a fundar, porém, sustentando a amizade com os ex-companheiros e sobretudo mantendo os estudos teosóficos.

Vem desses dias de 1910 a amizade estreita, quase ou mesmo familiar, entre Mário Roso de Luna e Henrique José de Souza, a qual solidificou-se ainda mais a partir de 1927 com o início da troca profícua de correspondência entre os dois, pois Roso de Luna procurava sempre manter o elo mental com o Professor Henrique através da escrita, relatando-lhe praticamente todas as suas passadas teosóficas. Quando escreveu pela primeira vez ao Professor, teve as seguintes palavras emocionadas:

“Jamais em minhas viagens de propaganda teosófica senti emoção mais profunda do que aquela convivida de 7 a 13 de Março no Rio de Janeiro! O tempo não apagou essa emoção! Se me for permitido, reencarnarei no Brasil – ao qual de coração pertenço! Com isso vos digo, pois me faltam palavras – daquelas com que se enganam os homens! Prefiro deixar à vossa esclarecida intuição!”

Isso em resposta à carta que lhe remeteu de Niterói, em 15 de Janeiro de 1927, o Professor Henrique José de Souza:

“Tenho a certeza absoluta que, na presente vida, o meu distinto Irmão jamais recebeu uma carta semelhante a esta. Porém, ILUMINADO como é, compreenderá melhor do que nenhum outro a grande razão de ser deste meu gesto, que exprime a obediência do discípulo à voz de seu MESTRE.

“Esse momento eu esperava há bastante tempo, a fim de entrar em contacto directo com um dos poucos “ÉDIPOS ou SIGFREDOS” saídos de uma certa Confraria Egípcia (como discípulos), vencedores, portanto, da “ESFINGE”.

“Talvez vos pareça ridícula a minha pretensão em querer afirmar que vos conheço mais do que pensais; e que, com amor e carinho fraternos, acompanho todos os vossos passos e gestos nesta vida, pois eles também representam os meus, como os de mais 3 outros abnegados companheiros.

“Actualmente, dirijo a Sociedade Dhâranâ nesta cidade, cujo nome sânscrito bem indica que somente um mercuriano poderia estar á sua frente (“a intensa e perfeita concentração em determinado objecto interno”, etc., como bem sabeis. Daí, só Mercúrio, a Inteligência, a Mente, etc., poder dirigir Dhâranâ).

“Como vós, sou um adepto fervoroso da grande Mestra H.P.B. e a prova disso está em que, nesta Sociedade, só são adoptados os seus ENSINAMENTOS (Doutrina secreta, Ísis sem Véu, etc., etc.) e os do seu único “interpretador” – Mário Roso de Luna.

“Completo 44 anos de idade em 15 de Setembro de 1927 (Mercúrio em Virgo) e… tenho a certeza que daí é que vai começar o meu verdadeiro papel na América do Sul (principalmente no Brasil) e – quem sabe? – com o concurso da LUA (Mário Roso de Luna).

“A nossa Sociedade já possuindo uma área de terreno para nela serem construídas a nossa sede, templo e demais dependências de educação física, mental e espiritual do nosso povo, é uma verdadeira PROMESSA ou ESPERANÇA FUTURA do compromisso tomado perante a nossa PÁTRIA verdadeira (o lugar onde residem os nossos MESTRES).

“Temos que demolir para reconstruir. Os desviados da Verdadeira Vereda apontada por H.P.B. representam o seu “verdadeiro papel” no fim da Idade Negra (Kali-Yuga), criando religiões novas quando o seu lema era: “Não há religião superior à VERDADE”.

“Uma nova Obra está sendo erguida no Mundo oculto, para que o grande Edifício de 50 anos não venha a ruir por terra.

“Vós sereis dos poucos que têm o papel importantíssimo de evitar a grande catástrofe.

“Consultai a vossa MENTE esclarecida e respondei-me, pois o grande momento já se aproxima a passos agigantados.

“Uma carta vossa será a mais bela das Esperanças, neste instante horrível para o Mundo.

“Empunhai a vossa lança, SIGFREDO, pois os tempos são chegados de nos unirmos, como 5 émulos fiéis do mesmo Senhor.

“Por hoje, basta. Aguardo a vossa resposta.”

Como se viu, Mário Roso de Luna respondeu. No ano seguinte, com a transferência do nome Dhâranâ – Sociedade Mental-Espiritualista (fundada em 1924) pelo Professor Henrique José de Souza para Sociedade Teosófica Brasileira (durando até 1969), seria conferido ao ilustre Adepto ibérico o Diploma da S.T.B. reconhecendo-o membro efectivo n.º 7 da mesma desde 21 de Outubro de 1928, conforme a litografia do documento abaixo cedido por Estevam Contijo, curador do acervo de Mário Roso de Luna.



Acerca do que fosse o papel oculto da missão de Mário Roso de Luna ante o quinto continente americano, sobretudo o Brasil, descreveu-o melhor do que ninguém o Professor Henrique José de Souza na mensagem que proferiu na Loja Morya da S.T.B., no Rio de Janeiro, em Novembro de 1931, prestando sentida homenagem póstuma ao seu grande Amigo e incomparável Teósofo ibérico:

“Nessa época (1909) – abandonando pátria e família, e sem medir sacrifícios outros – veio anunciar aos povos de origem ibero-americana, inclusive ao brasileiro, o papel que lhes competia de abrir uma nova página na História das Humanas Civilizações, por isso, os indissolúveis laços espirituais que os uniam entre si para a realização da mais sublime das profecias apregoadas desde tempos imemoriais, isto é, de “que seria nesta parte do Globo onde havia de surgir, em futuro não muito distante, um novo ciclo de Paz, Amor, Sabedoria e Justiça entre os homens!” E completou: “E para que o dealbar dessa aurora refulgente venha banhar a superfície da Terra, com os seus raios vivificantes e recompensadores das terríveis lutas e sofrimentos sustentados pelas gerações presentes e passadas, foi que se criou no Brasil a Sociedade Teosófica Brasileira – Eco ou repercussão do Verbo inspirado do Super-Homem que foi Mário Roso de Luna. E a prova disso está nestas suas palavras vindas em uma das constantes missivas com que nos honrava: “Agora, sim, já posso morrer tranquilo”…

“O sentido oculto da missão de Roso de Luna na Terra, é muito mais expressivo do que alguns pensam. Ele foi o que despertou a Consciência Ibero-Americana para “aquele amanhã resplandecente”, de que tanto falava nos seus escritos e conferências, isto é, o Advento da 7.ª Sub-Raça. Ou em outros termos: o arregimentador das Mónadas empenhadas em semelhante Trabalho, porém, esparsas ainda pelos países de origem ibero-afro-americana, por serem, de facto, a fusão, ou melhor, a primeira reacção racial por que as mesmas passaram, sem falar naquela do choque com os ramos autóctones dos países sul-americanos, ou as chamadas raças pré-colombianas. Daí, os seus consecutivos giros de conferências, até em possessões espanholas na África. Em resumo, como se disséssemos uma preparação de tais Mónadas a fim das mesmas poderem encarnar-se no lugar apropriado, onde se vai dar semelhante acontecimento no Mundo: o Sul-América!

“E para que outros não julguem ser essas nossas afirmativas oriundas de ficção, citaremos uma frase, entre muitas outras “expressivas” com que o polígrafo nos honrava em assídua correspondência: “Continuai sereno, porquanto a vitória está do nosso lado, que agimos com a Lei. Nada mais posso fazer senão o que já fiz em 1910, quando aí estive. Vós sabeis perfeitamente que o meu lugar é aqui, como o vosso é aí”.

“E logo em outra carta, referindo-se a uma entrevista com um dos próceres da Sociedade Teosófica de Adyar, quando foi procurado para lhe pedir que o apresentasse ao público do Ateneu, onde o mesmo senhor ia fazer uma série de conferências teosóficas: “Quando pensardes em Trabalho (referindo-se àquele em que estamos empenhados), lembrai-vos que há-de ser através das nossas organizações, porquanto de há muito que assumimos o pesado dever e altíssima honra de preparar a 7.ª Sub-Raça, enquanto eles outros com a 6.ª Não deve esquecer-se que, em todos os pontos, a Inglaterra tem muito a aprender connosco e não que nos ensinar, pois quando ela estava na barbárie no século IX nós já possuíamos a grande cultura hebraica e árabe.”

Se houve e há quem não entenda isso, tampouco aceite, certamente será por ser teosofista mas não teósofo, que é dizer, conhece e decora mas não sabe tampouco assimila, e mesmo isso quando acaso conhece… No que adianta o Professor Henrique José de Souza num seu texto lavrado em Maio de 1954: “Já o grande cientista e Teósofo espanhol, Dr. Mário Roso de Luna, teve ocasião de dizer: “O Teósofo não precisa dizer que é Ocultista, por já o ser de facto. Mas o Ocultista que não se disser Teósofo, não é nem uma coisa nem outra”. Por nosso lado, dizemos: teosofista é o estudante de Teosofia; Teósofo é aquele que conhece ou sabe Teosofia”.

A Teosofia vem assim reiterar que Mário Roso de Luna foi verdadeiro “Arauto da 7.ª Sub-Raça Ariana”, pelo que, em conformidade à Lei que a tudo e a todos rege, peregrinou para a “Nova Canaan” brasílica, situada em São Lourenço de Minas Gerais do Sul, carregando as falhas da Haste Lunar ou Oriental do Taurino Solar ou Mercuriano, como seja a Haste Ocidental do Y antropogónico onde o Ganges e o Nilo se encontram no Tejo e escoam Atlântico afora indo regar idealmente o Planalto Central do Brasil, onde hoje está a Brasília do sonho visionário de Dom Bosco; com tudo isso, Roso de Luna deu imediatamente ao Brasil o título de “Capital Espiritual da América do Sul”, e ao próprio Lugar Mercuriano ou Solar de São Lourenço de “Capital Espiritual do Mundo”. Isto mesmo é confirmado pelo Professor Henrique José de Souza na sua mensagem à Loja Morya em 1931: “Conhecedor de certo lugar no interior do Brasil, onde há dez anos teve início a Obra grandiosa em que estamos empenhados, Roso de Luna cognominou-o de “Capital Espiritual do Mundo”. Em sua última carta dizia: “Como me sentiria feliz se pudesse visitar a “Montanha Sagrada” (de São Lourenço), de que acaba de conviver com as suas potentíssimas vibrações… etc.”, vindo assim de encontro ao que afirmara ao público carioca em 1910:

“O País de Pinzón, Cabral, Lepe e Souza, por sua maior vizinhança com a Europa e África, por sua mescla de raças e por inúmeras outras razões, demonstra excepcionais características, dando-nos o direito de predizer que os seus destinos são semelhantes aos do Norte-América; que em cultura, no litoral, nada fica a dever à Europa; do mesmo modo que em belezas naturais, em espiritualidade, faz lembrar o berço do povo Ário, a Índia, como se no desenvolvimento dessa nobre raça – Ásia, Europa e desta à América – coubesse ao Brasil a glória de ser o remate e o epílogo daquele grande povo, com uma civilização fluvial e costeira igual à de todos os grandes rios chamados Ganges, Indo, Oxus, Iaxarte, Nilo, Tigre, Eufrates, Danúbio, Ródano, Reno, Mississipi, etc., cada um deles legando ao humano futuro um florão da sua coroa. Não resta a menor dúvida de que as bacias do Amazonas e do Prata, com o decorrer dos tempos, selarão nas suas ribeiras os destinos do Mundo.”

Posto tudo, restava a Mário Roso de Luna selar literariamente a transferência de valores espirituais e humanos do Oriente ao Ocidente, como seja o Ecce Occidens Lux em substituição do Ex Oriens Umbra. Assim o fez. Após ter escrito em trinta dias (verdadeiro milagre literário) as Aberraciones psíquicas del sexo (livro refutando o outro de Anatole France, prejudicial à saúde e evolução física e psicomental da Humanidade devido à má interpretação dada pelo escritor francês da célebre obra do conde de Gabalis), deu início ao seu último e valioso trabalho El Tibet y la Teosofia, parcialmente publicado na forma de artigos em sucessivos números da revista teosófica El Loto Blanco, de Barcelona, entre Junho de 1930 e Outubro de 1931. Foi o derradeiro testamento iniciático do colosso de Logrosán. A morte, respeitando a ideologia do jina ibérico sem par, permitiu-lhe levar até ao fim essa empresa, porquanto terminou-a alguns dias antes da sua partida deste mundo. Pressentindo-a, apressou-se a escrever ao Presidente da Sociedade Teosófica Brasileira anexando a preciosa dádiva desse seu último trabalho, na que seria a sua última missiva remetida de Madrid em 12 de Outubro de 1931 (Dia da Raça ou da Descoberta da América):

“Terminei, como lhe disse, os dez capítulos (sessenta ao todo) que me faltavam da obra El Tibet y la Teosofia e para que aprecie o que já foi publicado, envio-lhe todos os números do El Loto Blanco que figuram na minha colecção particular. Aqui, devido às actuais circunstâncias, ignoro quando ou como a mesma será publicada em livro. Porém, se lhe convier publicá-la, de qualquer maneira, na querida língua de Camões, pode agir com perfeita liberdade e sem condições.”



Ao que Henrique José de Souza apressou-se a responder em carta remetida de Niterói, em 29 de Outubro de 1931:

“Quanto à publicação de El Tibet y la Teosofia na “língua de Camões” seria verdadeiramente maravilhoso. Não sei como expressar a nossa gratidão por essa oferta tão generosa, principalmente quando diz: “obren com perfecta libertad y sin condiciones”. Essas poucas palavras definem o Homem elevado que você é! Beijo-lhe as mãos enternecidamente!… Não ouso propor-lhe a publicação do mesmo na nossa revista, pois é a única coisa que poderemos fazer neste momento, o que aliás só podia trazer vantagens para nós, isto é, “a nossa querida Raça”!… Como a revista é trimestral, faríamos tal publicação em um número maior de páginas, isto é, umas dez páginas, e desse modo, com uma paginação aparte da revista, ficariam isoladas de maneira que qualquer pessoa poderia retirá-las (as ditas páginas) e mandar encadernar a obra completa. Nesse caso, mandaríamos encadernar – por nossa vez – uns 50 exemplares e lhe enviaríamos ou venderíamos aqui por sua conta. Use da maior franqueza connosco! Somos escravos dos mesmos Ideais e sentimentos!”

Mário Roso de Luna já não pôde responder, partira deste mundo. Mas ficou O Tibete e a Teosofia, finalmente traduzido na “querida língua de Camões” pelo próprio Henrique José de Souza que enriqueceu-o com anotações pessoais, publicado em capítulos nos vários números da revista Dhâranâ, órgão oficial da S.T.B., ainda em 1931 e nos anos seguintes.

Por uma parte, a obra manifesta o desagrado de Roso de Luna por a Sociedade Teosófica de Adyar, durante a presidência da senhora Annie Besant ao lado do seu conselheiro inseparável, o senhor Charles Webster Leadbeater, ter se afastado dos ideais superiores da fundadora original Helena P. Blavatsky, ao querer pretender impor ao livre-pensamento que caracteriza todo o teósofo um teosofismo beato com a invenção do novo “messias” Jiddu Krishnamurti, desferindo machada quase mortal à S. T. que levou a sérias dissidências na mesma. Mário Roso de Luna era inteiramente fiel ao pensamento da Mestra H.P.B., não aceitava nem tolerava a ingerência de tão grande cegueira pietista absolutamente estranha à Sociedade. Desde 1920 que vinha protestando com a maior veemência junto dos órgãos dirigentes da S. T., sempre resultando debalde. Ainda assim tentou unir o Oriente ao Ocidente, em 1921, quando com uma dezena de teósofos madrilenos fundou o Ramo Teosófico Hespérida, destinado a estreitar e solidificar os vínculos de fraternidade e da originalidade do ensinamento teosófico com a Sociedade-Mãe em Adyar, e igualmente com o grupo teosófico dissidente dessa em Point Loma na Califórnia, dirigido pela entusiasta Katherine Tingley, sucessora de William Quan Judge, discípulo em vida de Helena Blavatsky e um dos fundadores originais da Sociedade Teosófica.

Parece que o Ramo Hespérida não conseguiu realizar os seus intentos, com isso marcando um maior afastamento de Roso de Luna da S. T. de Adyar. O facto é que em 1928 o grupo de teósofos em desacordo com as directrizes dessa, que costumava reunir-se no Café Gijón, em Madrid, acabou aliando-se a Mário Roso de Luna e a Eduardo Alfonso indo fundar uma organização filosófica-iniciática de cariz teosófico: a Schola Philosophicae Initiationis, em resposta aos desvios doutrinais da Sociedade Teosófica, especialmente no referente à proclamação de Jiddu Krishnamurti com o “Instrutor do Mundo”, facto de todo impossível por essa função ser exclusivamente a do Cristo Universal ao qual os mongóis, hindus e tibetanos chamam respectivamente de Chenrazi, Kalki-Avatara e Maitreya.

A nova Escola comprou um terreno em Manzanares el Real (província de Madrid) para construir um centro de estudos teosóficos avançados, batizado de A Casa do Filósofo. Também se constituíram três graus de conhecimento, “como corresponde a toda a Sociedade Iniciática e consequentemente aos três objectivos da Sociedade Teosófica, que no fundo não são mais do que os três graus iniciáticos de todas as Instituições análogas, que por não terem sido compreendidos e respeitados levaram a S. T. à desunião e à anarquia mental”, segundo Eduardo Alfonso. Portanto, a S.P.I. organizava-se da mesma maneira que fora organizada a S.T. em 1875: estrutura orgânica como na Maçonaria, e ensinamento orgânico como no Budismo (Esotérico, o da Maha-Yana ou “Grande Barca” que abrigou e norteou as mentes superiores do Norte da Índia e Oeste do Tibete). Era assim que os discípulos da S.P.I. seguiam um programa de estudos gradual e metódico compreendendo três graus ou etapas: a primeira, a dos estudos de Higiene e Moral; a segunda, a de Ciências e Naturalogia; a terceira, de Psicologia e Filosofia.


Inauguração da “Casa do Filósofo”, aparecendo em primeiro plano Mário Roso de Luna e Eduardo Alfonso

Por outra parte, O Tibete e a Teosofia demonstra o profundo conhecimento que Mário Roso de Luna possuía do Budismo Esotérico e do Exotérico (ou Hina-Yana, “Pequena Barca”, que é o confessional dominante sobretudo no Sul da Índia), ao par das tradições etnológicas e etnográficas, dos domínios filológicos comparativos, dos saberes iniciáticos do Oriente comparados aos do Ocidente, etc. É obra de Mestre, e Mestre dos Maiores ibéricos da chamada Linha Morya, é obra em cujo capítulo I o próprio Professor Henrique José de Souza deixa o seu comentário publicado na revista Dhâranâ (n.º 70 de Outubro a Dezembro de 1931):

“O território conhecido com o nome de Tibete (Thibet) possui um outro oculto, ou seja, o de País de Bod-Yul (daí a frase “língua de Bod”, para aquela que se fala em tal país). O verdadeiro significado de Tibete é “Telhado do Mundo”. Da palavra Bod-Yul provém Bhante-Yaul, ou o nome que se dá à famosa Fraternidade dos Irmãos da Grande Loja Branca do Himalaia. Por isso mesmo é que se conhece qualquer dos seus preclaros Membros como um Bhante-Yaul.

“O Planalto do Pamir – centro orográfico de toda a Ásia, donde partem as principais montanhas como Tian-Chan, Kuen-Lung, Karakorum, Himalaias, etc. – é o berço da Raça Ária – segundo Roso de Luna e outros sábios ocidentais. O célebre viajante chinês Hien-Sang denomina-o de Pamito, e os indígenas de Bami-duniah, que significa “Tecto ou Telhado do Mundo”. Não só é o mais elevado planalto do Mundo – onde floresceu há milénios a mais brilhante civilização de que nos falam as velhas tradições orientais – como também é o ponto misterioso escolhido pelos Adeptos para os seus “Retiros Privados”.

“Querendo dar uma prova mais cabal do verdadeiro significado da palavra Tibete, vamos buscá-la na misteriosa língua hebraica cuja Cabala fornece, aos que a sabem interpretar, um mundo de revelações em todas as questões da vida. Senão, vejamos: a palavra Tibete, se quiséssemos escrevê-la em hebreu, seria com as três seguintes letras: Thet, Iod (ou Jod, que é o mesmo) e Beth.

“Ora, Thet é a 9.ª letra e lâmina do Tarot, O Ermitão, O Adepto, etc., etc., cujas ideias a Cabala interpreta como: Sabedoria, Protecção, Circunspecção, etc. Hieroglificamente, é representada pelo Tecto ou Telhado. Quanto a Iod, é a 10.ª letra e lâmina do Tarot (A Roda da Fortuna), cujo hieróglifo antigo representava-a por um Índex (ideia de governo ou comando). 10 é ainda a 10.ª Sephiroth – Malkuth ou o “Reino”, etc. O Beth é a 2.ª letra e lâmina do Tarot (A Papisa). Hieroglificamente, é representada pela boca humana, como órgão da palavra. Do mesmo modo, significa: Casa, Santuário e toda a concavidade (gruta, garganta, furna, etc., etc.). Possuímos, portanto, material bastante para fazermos – em ligeira síntese – uma interpretação cabalística da palavra Tibete, como seja: Telhado do Mundo, Santuário do Mundo, Tecto ou Telhado protector do Mundo (tecto, em si, já possui a ideia de protecção, abrigo, etc., contra as chuvas e outras tormentas que possam afligir o Homem).

“Estendendo mais a nossa interpretação, encontramos: o Tibete é o Santuário do Mundo, onde se acham os Adeptos ou Super-Homens – Senhores da Palavra Sagrada (a Sabedoria dos Deuses, Teosofia, etc.) como Protectores, Defensores ou Guias da Humanidade. Mais ainda: o Tibete é o lugar sacrossanto onde se acha o “Governo Oculto do Mundo” (lembre-se o Iod, hieroglificamente representado por um Índex que dá a ideia de comando ou governo). Nem podia deixar de ser essa a interpretação – pouco importa que outros não a tivessem feito anteriormente – porquanto o Tibete é, de facto, “o berço das humanas civilizações”.

“E com isso se pode fazer uma pálida ideia do que possa ser o conteúdo da última obra do imortal Mário Roso de Luna, a qual chamamos – por nossa vez – de “telhado ou cumeeira do colossal edifício literário do grande génio do nosso século”.”

Indelevelmente, para sempre, O Tibete e a Teosofia finca a união do Oriente ao Ocidente com isso marcando o dealbar de um Novo Ciclo de Humanidade mais esclarecida mental e moralmente como certamente seria o ensejo derradeiro de Mário Roso de Luna, se não sempre presente ao longo das páginas da sua vida profícua de Arauto da Nova Aurora do Mundo, no crepúsculo dos Deuses a Oriente pelo amanhecer dos mesmos hoje mesmo, a Ocidente.

O Tibete e a Teosofia requer leitura demorada, pede reflexão, inquire o leitor sobre quem foi, seja e será impelindo-o a lembrar-se de que um dia também foi deus, em seu desterro na Terra disso se esqueceu mas, no alvor da consciência sublimada, novamente lembrará que é seu destino último ser humanamente divino e divinamente humano, na mais sublime das metástases avatáricas onde Deus se faz mais Deus e o Homem mais Homem.

Fonte:https://comunidadeteurgicaportuguesa.wordpress.com/2016/05/27/o-tibete-e-a-teosofia-testamento-teosofico-de-mario-roso-de-luna-por-vitor-manuel-adriao/