terça-feira, 2 de maio de 2023

Astrologia dentro da Maçonaria


Os Signos Zodiacais, assim como todos os mitos solares e agrários da Antiguidade, representam a morte e o renascimento anual da Natureza. Por isso, eles simbolizam o iniciado, desde que, como candidato, ele é encerrado na Câmara de Reflexão* – representado por Áries, passo inicial da renovação da natureza pelo Fogo, simbolizando o Fogo Interno, o ardor do candidato à procura da Luz – até o ápice de sua caminhada maçônica, quando recebe o Grau de Mestre – representado por Peixes, a total renovação da Natureza, a volta do Sol e da vida, pronto para mais um ciclo. Os Signos relacionados com o Grau de Aprendiz são: Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, Leão e Virgem. Simbolizam solidez, força, a ligação entre a terra e o céu. Os atuais Templos Maçônicos (Rito Escocês Antigo e Aceito) têm Doze Colunas que correspondem aos Signos do Zodíaco, e podem ser consideradas a base mental da Loja.

As Colunas, nos antigos cultos de fertilidade, podem aparecer como representação do órgão sexual masculino.

A palavra V.I.T.R.I.O.L., sigla formada pelas palavras da máxima hermética de origem alquímica “Visita Interiore Terrae Rectificandoque Invenies Ocultum Lapidem”. Segundo o Ir. José Castellani, a tradução para o português seria, visita o interior da terra e seguindo em linha reta, em profundidade, encontrarás a pedra oculta. Já segundo o Ir\Rubens Augusto Vieira, a tradução seria, visita o interior da terra e, retificando, encontrarás a pedra oculta. Ambos embora com palavras diferentes, concordam que a “pedra oculta” seria a “pedra filosofal”, que transmutaria os metais inferiores em ouro, mas a frase representa, também, a procura do “eu” interior, do mais recôndito valor espiritual do Homem.


Colunas Gregas


A Coluna simboliza limites, pois possui um eixo ou centro. As Três Colunas, das três ordens arquitetônicas gregas (Dórica, Jônica e Coríntia) são as que, simbolicamente, sustentam a Loja de Aprendiz, sendo, por isso, assimiladas ao Venerável Mestre e aos dois Vigilantes. Três das principais Colunas são representadas pelo Venerável Mestre e pelos Primeiro e Segundo Vigilantes. Há outra Coluna, totalmente invisível, que se eleva do Altar até o Grande Arquiteto do Universo. As Colunas colocadas na entrada da Loja representam as Colunas de Salomão: “Jaquim” (“ele firmará” – pilar da direita – tem esse nome por causa do sumo sacerdote que realizou a sagração dessa seção no Templo de Salomão) e “Booz” (“nele está a força” – pilar da esquerda – é assim denominado por causa de Booz, o bisavô de Davi, rei de Israel), construídas por Hiram Abiff. A unificação desses dois pilares representa “estabilidade”. A Coluna Dórica, a mais forte, sem base e com um capitel (cabeça da coluna) simples, mas de alta plasticidade é a personificação da Força do homem, sendo, por isso, assimilada pelo Primeiro Vigilante, responsável pela Coluna da Força. A Coluna Jônica, mais esbelta, com uma base e um capitel trabalhados, com quatro voltas é a representação da Sabedoria, sendo, portanto, assimilada pelo Venerável Mestre, personificação da Sabedoria. A Coluna Coríntia, com um capitel de maior sutileza plástica é a representação da Beleza, sendo assimilada pelo Segundo Vigilante, responsável pela Coluna da Beleza;


Rito Escocês Antigo e Aceito


Este Rito é uma das cerimônias mais difundidas na Maçonaria atualmente. É composto por Trinta e Três Graus. Ele foi formado ou extraído do Rito de Perfeição ou Rito de Heredon, que contava Vinte e Cinco Graus. A constituição dos Altos Graus é atribuída ao pensador escocês Andrew Michael Ramsay (1686-1743), sendo a base do Rito Escocês Antigo e Aceito. Ramsay protagonizou a criação deste Rito em solo francês, ocasião em que proferiu dois discursos de grande repercussão a respeito do assunto.

“Antigo”: porque é ex-operativo. “Aceito”: por serem seus membros aceitos ou iniciados, sem serem construtores.

A origem do Rito Escocês Antigo e Aceito é razão de muitas discussões.

Ao contrário do que se acredita, o Rito Escocês nada tem a ver com a Escócia, pois na época do aparecimento deste Rito, as Lojas da Escócia trabalhavam no Rito “Emulation Rite”. O Rito de York é praticado nos EUA. O “Emulation Rite” é praticado na Inglaterra e na Comunidade Britânica, como em toda a Grã-Bretanha.

O Rito Escocês surgiu na França, depois de lá ter sido introduzida a Maçonaria Inglesa, do Rito de “Emulation Rite”.

No final do século XVII, vários maçons escoceses fugiram para a França, em virtude de acontecimentos e convulsões sociais, que aconteceram nas Ilhas Britânicas. O tipo de cerimonial que praticavam ficou marcado como Ritual dos Escoceses ou Rito Escocês.

Foi a partir de 1732 que a primeira Loja desses maçons escoceses “Scottish Chalé” passou a funcionar em Bordeaux, um dos centros maçônicos mais antigos e influentes na França.


Hermetismo


Desde a Pré-História, o homem sempre teve a necessidade de desenvolver uma cultura mística. O medo do desconhecido e a necessidade de dar sentido ao mundo que o cercava, levaram o homem primitivo a criar sistemas de crenças e rituais “mágicos”. O homem buscava o significado dos fenômenos da Natureza e de sua própria existência.

O Período Pré-Histórico é o considerado sem documentação escrita. A Pré-História divide-se em Idade da Pedra, do Bronze e do Ferro. A Idade da Pedra divide-se em dois períodos: Paleolítico ou Idade da Pedra Lascada, e Neolítico ou Idade da Pedra Polida.

O Período Paleolítico, a etapa mais antiga da Pré-História, começou há cerca de dois milhões de anos e terminou há cerca de dez mil anos. Nessa época ocorreu uma importante evolução física entre os hominídeos: surgiram os primeiros homens modernos, isto é, os da espécie “homo sapiens” – evolução física acompanhada de evolução cultural correspondente ao tamanho de seus cérebros.

O Período Paleolítico ou da Pedra Lascada, divide-se em três etapas: Inferior, Médio e Superior. Seu desenvolvimento está ligado às quatro fases da Era Glacial, separadas por intervalos de clima temperado conhecidos como eras inter-glaciais.

No Paleolítico o homem divinizava as forças da Natureza.

Uma descoberta primordial do Período Paleolítico foi o fogo – depois disso, o homem passou a assar a carne e a cozinhar vegetais. Junto ao fogo os grupos de hominídeos se reuniam, protegiam-se do frio, dos ataques de predadores, e através da linguagem, desenvolviam suas crenças. Com a utilização do fogo, o ser humano, passou a ter mais controle em relação ao que acontecia à sua volta.

O homem chega ao Período Neolítico com maior desenvolvimento físico, intelectual e espiritual, como comprovam achados fósseis. Desenvolvia sua inteligência, sua linguagem verbal e a linguagem simbólica. Também adorava deusas que representavam a fecundidade, pois uma das principais preocupações do homem primitivo era a preservação da espécie.

No Neolítico o homem continuou divinizando as forças da Natureza, e muito provavelmente acreditava na vida após a morte, pela maneira como enterrava seus mortos: debaixo de grandes lajes de pedra suspensas, com suas roupas, armas, enfeites e oferendas.

O homem é o único animal com percepção clara da inevitabilidade de sua morte. A capacidade de prever (que aconteceu com a evolução dos lobos pré-frontais) teve como consequência a consciência da morte.  Essas cerimônias fúnebres que incluíam o sepultamento de alimentos e utensílios com o falecido sugerem não apenas a consciência da morte, mas também uma cerimônia ritual já desenvolvida para manter o morto na vida além da vida.

Com o tempo houve uma evolução e, à medida que o homem passou a organizar sua existência numa base mais racional, sentiu a necessidade de ir além das relações com as forças que povoavam o Universo: passou também a temer as ações do “ser superior” que “criara” todo aquele Universo. Assim nasceram as religiões – as religiões consistem em um corpo organizado de crenças que ultrapassa a realidade da ordem natural e tem por objeto o sagrado ou “sobrenatural”.


Hermes é um dos doze deuses do Olimpo, mensageiro dos deuses, correspondente ao deus Mercúrio dos romanos, filho de Zeus com Maia, uma das plêiades, filhas do gigante Atlas. Hermes criou a lira, cujo som encantou o deus Apolo, que trocou seu rebanho e o caduceu (bastão com duas cobras entrelaçadas e duas asas na parte superior) por ela. Ganhou também, de Apolo, o dom da profecia, obtido em troca da Flauta de Pã. Era protetor dos pastores e seus rebanhos, dos cavalos e animais selvagens. Mais tarde tornou-se deus dos viajantes, dos comerciantes e dos ladrões.


O Hermetismo baseia-se na figura de Hermes Trismegisto, que combinava aspectos do deus Hermes com os do deus egípcio Thot (deus da sabedoria, representado com a cabeça de íbis).

Maçonaria e Astrologia


Astrologia pode ser definida como um sistema simbólico que relaciona o macrocosmo (os Planetas) e o microcosmo (o indivíduo na Terra).


Os fenômenos da Natureza e os astros (Sol, Lua, Estrelas), sempre exerceram curiosidade, atração e respeito no homem primitivo. Os hominídeos do Paleolítico divinizavam as forças da Natureza. No período Neolítico, além da Natureza, os hominídeos criaram novos deuses, sempre relacionados ao universo que os envolvia. Com o advento da agricultura (cerca de dez mil anos atrás), o homem percebeu que a vida das plantas obedecia a um determinado ciclo, comandada pelos astros, no céu, e que havia um momento propício para arar, semear e colher. Eis aí, o nascedouro da Astrologia. Porém, há registros das fases da Lua inscritas em ossos, quinze mil anos atrás, na Mesopotâmia (terra entre os rios Tigre e Eufrates).


O estudo dos astros pode ter se iniciado na Mesopotâmia. A Caldéia era uma região ao sul da Mesopotâmia, principalmente na margem oriental do rio Eufrates, mas muitas vezes o termo é usado para se referir a toda a planície mesopotâmica. A Astrologia, possivelmente, teve origem na antiga Caldéia. Com seus conhecimentos astronômicos, os caldeus conheciam os planetas até Saturno. Conheciam muito bem as fases da Lua, prevendo com precisão os eclipses. Foram eles que, criaram os Doze Signos do Zodíaco. Os caldeus perceberam que determinadas épocas ou signos produziam certos traços de caráter, e com isso criaram toda a base da simbologia que hoje é a Astrologia.


A civilização mesopotâmica nasceu há cerca de quatro mil anos a.C. com o povo ubaida. Depois vieram os sumérios, com a escrita cuneiforme. Em 1350 a.C., tem início o Império Assírio, que controla a antiga Pérsia, Síria, Palestina e Egito. Os sumérios criaram o sistema sexagesimal que, facilitou operações matemáticas e o desenvolvimento da astronomia. Os egípcios adotaram esse sistema e, construíram obras arquitetônicas alinhadas às estrelas fixas, com precisão.


Por todos os séculos seguintes, os povos que viveram entre os rios Tigre e o Eufrates continuaram a registrar suas observações do céu.


Com a dominação do rei Ciro II da Pérsia, a região estabiliza-se. Os persas, no contato com os astrólogos da Mesopotâmia, introduziram a matemática no cálculo astronômico e astrológico – há um grande avanço com a regularização dos calendários, como consequência de um entendimento maior dos ciclos celestes.


Depois que Alexandre, O Grande, conquistou o Egito (331 a.C.), houve um destaque na historia da Astrologia. O período alexandrino foi rico na produção intelectual.


O avanço das tropas de Alexandre, fez com que o idioma grego se espalhasse como língua cultural. Assim, os métodos babilônicos anexados à Astrologia egípcia, puderam chegar, em idioma grego, à Índia. Mesmo após a dominação romana, a cultura era helenista.


Data do primeiro século d.C. o mais longo tratado astrológico – o autor é Doroteu de Sidon e o trabalho é o “Pentateuco”, um longo poema astrológico em cinco livros.


O imperador romano Adriano (117 d.C.) foi considerado o patrono da Astrologia e seu mapa natal chegou até nossos dias.


Cláudio Ptolomeu (100-170 d.C.?), egípcio de nascimento, cidadão romano e que escrevia em grego, foi o organizador de uma corrente representativa do conhecimento astrológico – escreveu o “Almagesto”.


No final do século II d.C., Antióquio de Atenas compila textos de astrólogos anteriores – uma das partes é o “Thesaurus”.


Em 313 d.C., o cristianismo torna-se a religião oficial, mas o paganismo ainda é tolerado.


Em 410 d.C., Roma caiu, com a chegada dos visigodos. Em 476 d.C. o Império Romano do Ocidente chegava ao fim.


A primeira fase do Império Bizantino vai de 324 a 640 d.C.


Os dias gloriosos da Astrologia terminaram oficialmente, em 357 d.C., com Constâncio.


Próximo ao ano 227, a região do atual Irã foi tomada pelos exércitos sassâmidas do persa Adachir I, que transformou o Zoroastrismo em religião do estado.


A Astrologia árabe foi uma extensão da tradição Astrológica grega e recebeu influências da Astrologia hindu.


Após a dominação árabe, a maior parte dos textos de astrologia persa foi destruída.


Na Idade Média os astrólogos eram chamados “mathematici”, pois a Astrologia era a aplicação mais importante da matemática. A prática da medicina era baseada na determinação astrológica do tratamento adequado, portanto os médicos também eram matemáticos Tycho Brahe. A Astrologia e a Astronomia eram, de início, um mesmo estudo. Tycho Brahe, por exemplo, nascido em 1546, era médico e astrônomo em Copenhague, mas também astrólogo do rei da Hungria.


A Astrologia era respeitada e, somente criticada por fatores intercorrentes: Dante Alighieri (maçom) expõe ao ridículo, no Inferno da “Divina Comédia”, os astrólogos Guido Bonatti (conselheiro de Guido de Médici) e Michael Scott, mas por  misturarem necromancia à Astrologia, abusando dos conhecimentos obtidos. Cecco d’Ascoli, professor de astrologia em Bolonha, foi queimado vivo na fogueira em 1327 não por ser astrólogo, mas por suas opiniões consideradas heréticas.


O Renascimento trouxe uma difusão da Astrologia, apoiada inclusive pelo papado.


Na Maçonaria, a presença da Astrologia é patente. Um exemplo são as Doze Colunas do Templo (Rito Escocês Antigo e Aceito), que correspondem aos Signos do Zodíaco. O Zodíaco é uma faixa celeste imaginária, que se estende entre oito a nove graus em cada lado da eclíptica e   que com esta coincide. Eclíptica é o caminho que o Sol, do ponto de vista da Terra, parece percorrer anualmente no céu. Essa faixa foi dividida em doze casas de trinta graus cada uma, e o Sol parece se mover um grau por dia.  Os Planetas conhecidos na Antiguidade (Mercúrio à Saturno) também faziam parte do Zodíaco, pois suas órbitas se colocavam no mesmo plano da órbita da Terra.  O Zodíaco então é dividido em Doze Signos, que são percorridos pelo Sol, uma vez por ano. Os Signos representam o aprendizado percorrido pelo maçom, desde sua iniciação na Ordem até o Grau de Mestre Maçom.


Nos Templos, (Rito Escocês Antigo e Aceito), cada uma das Doze Colunas, que representa uma das Constelações Zodiacais, sustenta simbolicamente a calota celeste e representa um mês do ano maçônico.


As Doze Colunas Zodiacais estão situadas no Ocidente, estando seis no lado Norte, onde têm assento os Aprendizes, e seis no lado sul, onde têm assento os Companheiros.


De um modo geral, essas Colunas simbolizam o caminho iniciático do Aprendiz, Companheiro e Mestre, resumido pelo “desbastamento da pedra bruta”, ou seja, o seu aperfeiçoamento moral e espiritual. As seis Colunas que estão no Norte, relacionam-se a essa caminhada do Aprendiz.


O início do aprendizado começa na Cerimônia de Iniciação, isto é, “a abertura da porta que autoriza o começo das passadas”.


Se olharmos horizontalmente para o céu no equador celeste, o limite do Universo são as Constelações. As Doze Colunas transmitem a ideia de que as leis do Universo chegam até nós pelo que representam os Signos Zodiacais e as Constelações.


Outro exemplo são as três colunas gregas Dórica, Jônica e Coríntia, que representam a Força, a Sabedoria e a Beleza correspondem a Ares (ou Hércules), Minerva e Vênus.


Os quatro elementos: Terra, Água, Ar e Fogo, que formam toda a Criação na Astrologia, fazem parte da simbologia maçônica.

Alguns autores traçam um paralelo entre os Três Graus Simbólicos e os Signos: Aprendiz: Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, Leão e Virgem; Companheiro: Libra; Mestre: Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes.


O maçom, em seu caminho iniciático, pode percorrer e aprender com as características de cada Signo do Zodíaco:


Áries: representado por Marte e pelo Fogo – é o fogo interior, a força que estimula o crescimento e o desenvolvimento;


Touro: representado por Vênus e pelo elemento Terra – é a matéria, na qual se dá a fecundação, a elaboração interior;


Gêmeos: representado por Mercúrio e pelo Ar – é a criatividade, a versatilidade, a engenhosidade e a vitalidade criadora;


Câncer: representado pela Lua e pela Água – é o aprendizado em relação à tenacidade e a cautela;


Leão: representado pelo Sol e pelo Fogo – é o emprego da razão com base crítica;


Virgem: representado por Mercúrio e pelo elemento Terra – é o emprego do espírito analítico;


Libra: representado por Vênus e o Ar – simboliza o equilíbrio entre os dois pólos, que são a construção e a destruição;


Escorpião: representado por Marte e a Água – simboliza emoções e sentimentos como o rancor e a obstinação;


Sagitário: representado por Júpiter e pelo Fogo – simboliza a mente aberta e o julgamento crítico;


Capricórnio: representado por Saturno e pelo elemento Terra – simboliza determinação e perseverança;


Aquário: representado por Saturno e pelo Ar – simboliza o sentimento humanitário e solidariedade;


Peixes: representado por Júpiter e pela Água – simboliza o desprendimento das coisas materiais.


O iniciante maçom, também pode observar como aprendizado, as características de cada Planeta:


Sol: Regente do signo de Leão. Simboliza a vida, marca o signo do nascimento. Símbolo de autoridade, de poder, de orgulho e de desenvolvimento.


Lua: Regente do signo de Câncer. Tal como o Sol, representa a vitalidade física e o grau de evolução, principalmente na área psíquica.


Mercúrio: Regente dos signos de Gêmeos e Virgem. Na mitologia grega e romana, Mercúrio é o mensageiro dos deuses do Olimpo. É o planeta da inteligência, da adaptabilidade, regendo a vida mental. Mercúrio marca a adolescência do ser humano.


Vênus: Regente dos signos de Touro e Libra. Vênus era a deusa do amor, da beleza e das artes.


Marte: Regente dos signos de Áries e Escorpião. Deus da guerra, Marte simboliza a energia, a vontade de empreender, a coragem, a ação, que pode chegar à violência. Potencial de agressividade, sobre o espírito de conquista. Rege a indústria, o fogo, o ferro.


Júpiter: Regente do signo de Sagitário (e, secundariamente, Peixes).  Pai e soberano dos deuses do Olimpo, Júpiter reina sobre as leis e a religião. É o planeta da autoridade, do êxito social e das honras, da burguesia. Com Mercúrio partilha o domínio sobre a razão e sobre o intelecto. Júpiter marca a idade madura do ser humano.


Saturno: Regente do signo de Capricórnio. Deus do Tempo, Saturno marca a velhice do indivíduo. Representa a paciência, a prudência, a meditação, espírito cientifico, e a solidão. Desempenha um papel na doença, na fatalidade, na ruína, no isolamento. Num sentido positivo, Saturno apoia os esforços de longa duração, o trabalho obstinado, a capacidade de organização.


Seguem-se os planetas de descoberta recente:


Urano: Regente do signo de Aquário. A descoberta deste planeta, no final do século XVIII, coincide com vários fatos históricos que perturbaram o mundo: Revolução Francesa, Guerra da Independência nos Estados Unidos, inicio da Revolução Industrial, etc. Urano é o planeta de todas as mudanças. Rege o progresso, as invenções, as reformas, as ciências.


Netuno: Regente do signo de Peixes. Deus dos oceanos, Netuno é o planeta das águas, das viagens marítimas, dos lugares aquáticos e simboliza o que é vago, impreciso. A sua ação tanto se exerce nas grandes correntes de pensamento, nas reformas, como também no caos e na anarquia.


Plutão: Regente do signo de Escorpião. Descoberto em 1930, Plutão é o planeta mais afastado do nosso sistema solar pelo menos, segundo os conhecimentos atuais. Plutão assinala as metamorfoses profundas e representa as forças psíquicas, misteriosas e violentas. É um fator de destruição e de possível regeneração.


Os signos zodiacais relacionados com o Grau de Aprendiz Maçom são: Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, Leão e Virgem. O signo zodiacal relacionado com o Grau de Companheiro é Libra; e os inerentes ao Grau de Mestre Maçom são os signos de Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes. Acompanhe cada um da sua representatividade:


Coluna nº 1: Áries, localizada junto à coluna do Norte, corresponde à cabeça e ao cérebro do homem e representa Benjamim e como faculdade intelectual, a vontade ativa gerada pelo cérebro. Corresponde ao planeta Marte e ao elemento fogo, representando no aprendiz o fogo interno, o ardor encontrado no Candidato à procura de Luz.


Coluna nº 2: Touro, localizada junto á coluna do Norte, corresponde ao pescoço e à garganta. É Issachar por representar a natureza pronta para fecundação, simboliza que o candidato, depois de ser adequadamente preparado, foi admitido nas provas de iniciação. Corresponde ao planeta Vênus e ao elemento Terra.


Coluna nº 3: Gêmeos, localizada junto á coluna do Norte, corresponde aos braços e às mãos, são os irmãos Simeão e Levi, como faculdade intelectual é a união da intuição com a razão. Corresponde ao planeta Mercúrio e ao elemento Ar. Representa a terra já fecundada pelo fogo, á vitalidade criadora, simboliza o recebimento da luz pelo candidato.


Coluna nº 4: Câncer: localizada junto à coluna do Norte, representa o nascimento da vegetação, a seiva da vida, simboliza a instrução do iniciado e a absorção por parte dele, dos conhecimentos iniciáticos da Maçonaria. Corresponde aos órgãos vitais respiratórios e digestivos. É Zabulão, como faculdade intelectual representa o equilíbrio entre o material e o intelectual. Corresponde a Lua e ao elemento Água.


Coluna nº 5: Leão, localizada junto ao Oriente, corresponde ao coração, centro vital da vida física; é Judá. Como faculdade intelectual, os anelos do coração, pois se pensava ser ele o órgão do intelecto. Corresponde ao Sol e ao elemento fogo, é para o Aprendiz a luz que vem do Oriente, é o calor dos Irmãos dentro da Loja. É o emprego da razão a serviço da crítica, é a seleção de conhecimento.


Coluna nº 6: Virgem, localizada junto ao Oriente; corresponde ao complexo solar que assimila e distribui as funções no organismo. É Ascher. Como faculdade intelectual exprime a realização das esperanças. Corresponde ao planeta Mercúrio e ao elemento Terra. Representa, para o Aprendiz, o aperfeiçoamento, quando já pode se dedicar ao desbastamento da Pedra Bruta.


Coluna nº 7: Libra, localizada junto à coluna do Sul, caracterizada por Vênus corresponde ao elemento ar e se refere ao grau de Companheiro Maçom. Simboliza o equilíbrio entre as forças construtivas e destrutivas.


Coluna nº 8: Escorpião, localizada junto à coluna do Sul, caracterizada por Marte e pelo elemento água. A partir dessa coluna até a coluna de Peixes, todas se referem ao grau de Mestre Maçom. Essa coluna representa as emoções e sentimentos poderosos, rancor e obstinação e a constante batalha contra as imperfeições.


Coluna nº 9: Sagitário, localizada junto à coluna do Sul. Caracterizada por Júpiter e pelo elemento fogo. Representa a mente aberta e o julgamento crítico.


Coluna nº 10: Capricórnio, localizada junto à coluna do Sul, caracterizada por Saturno e pelo elemento Terra. Simboliza a determinação e a perseverança.


Coluna nº 11: Aquário, localizada na coluna do Sul, caracterizada por Saturno e pelo elemento Ar. Representa o sentimento humanitário e prestativo.


Coluna nº 12: Peixes, localizada na coluna do Sul, caracterizada por Júpiter e pela Água. Simboliza o desprendimento das coisas materiais.


A Astrologia e os Símbolos Zodiacais

Rito Adonhiramita


No início da Idade Média, os teólogos enfrentavam o problema de classificar a astrologia como ciência legítima, ou como arte divinatória proibida, cabendo a Santo Alberto Magno (1200-1280) separar a astrologia de suas associações pagãs, percebendo o seu valor teológico e afirmando que, embora as estrelas não pudessem influenciar a alma humana, elas, certamente, poderiam influenciar o corpo e a vontade dos homens. São Tomás de Aquino, considerado o maior dos teólogos cristãos, consolidou a obra de Alberto, tornando-a aceitável como assunto digno de estudo e afirmando que, na sua visão do universo, podia ser tomada como uma complementação da doutrina cristã; foi graças a essa maneira peculiar de encarar as coisas que nenhum astrólogo foi queimado nas fogueiras do “Santo Ofício”, como aconteceu com alquimistas, templários, rosacruzes, maçons, etc.


Pode-se imaginar que tudo começou em tempos imemoriais, quando o homem, em vigília a zelar pelos rebanhos, observava os corpos celestes no firmamento intrigando-se com os seus regulares movimentos. Percebeu então que lenta e regularmente os astros mudavam de posição em relação ao nascer do Sol, e que depois de determinado tempo voltavam com absoluta regularidade ao mesmo ponto no firmamento.


Não pode deixar de observar, outrossim, que o nascimento helíaco de certos grupos de estrelas se repetia em períodos coincidentes com determinados acontecimentos ânuos importantes de sua vida, como o nascimento de crias nos rebanhos, a recorrência regular de épocas de chuva, a germinação de culturas sazonais, e outros fatos de sua vida repetitiva de pastor-agricultor.


Quando um determinado grupo de estrelas precedia o nascer do Sol era hora de plantar, ou era hora de transferir os rebanhos para outras pastagens, ou era hora de tosquia, ou era hora de colher, ou era tempo de cio entre os animais e era preciso acasalá-los, ou vinha o tempo de nascimentos em sua família.


Recorrer ao nascimento helíaco como ponto de referência foi um passo inicial importante, foi a descoberta de um referencial, foi o início da marcação e medição do tempo.


Nascimento helíaco de um astro é o seu aparecimento logo acima do horizonte imediatamente antes do nascer do Sol.


Assim os grupos de estrelas referenciais de tempo foram recebendo nomes tirados da vida quotidiana daqueles primeiros astrônomos. Esses nomes nada tinham a ver com a formação característica dos conjuntos estelares. Eram simples nomes apenas, nada relacionados com poderes mágicos e premonições.


Os Signos e as Construções

Os templos de estilo gótico construídos na Idade Média revelam toda a magia dos ocultistas e sociedades secretas da época.


Se a busca dos idealizadores do gótico ainda permanece um enigma, o estudo da origem da expressão ‘arte gótica’ apenas reforça a ideia de que sua inspiração é totalmente mística.


Estudos etimológicos remetem às palavras gregas goés-goéts, de bruxo, bruxaria, que sugere a ideia de uma arte mágica. O alquimista Fulcanelli prefere associar ‘arte gótica’ a argot, que significa idioma particular, oculto, uma espécie de cabala falada, cujos praticantes seriam os argotiers (ar góticos), descendentes dos argonautas.


No mito grego de Jasão, eles dirigiam o navio Argos, viajando em busca do Tosão de Ouro. Jasão teria sido um grande mestre, que iniciava seus discípulos nos mistérios egípcios, inclusive na geometria sagrada, que é uma das chaves da arquitetura gótica. Prova dessa herança egípcia está no fato de os construtores góticos disporem os símbolos que aparecem nos entalhes, nas estátuas, nos medalhões e vitrais de maneira que obedeçam sempre a uma sequência que torna inevitável a associação de uns com os outros. Trata-se de um recurso egípcio de memorização que permite a apreensão de um grande número de informações, pois somos, sem perceber, levados a relacionar cada coisa ao local onde ela se encontra.


Talvez seja esse o motivo pelo qual muitas vezes o zodíaco está representado dentro das catedrais fora de sua ordem convencional. Longe de ser aleatório, esse desmembramento está relacionado ao sentido mais esotérico de cada signo, como se vê a seguir:


Áries:  Geralmente sua figura é a de um carneiro, que simboliza o início do caminho na buscada elevação espiritual.


Touro: Representado pelo próprio Touro, às vezes está associado ao evangelista Lucas; às vezes a Cristo. Simboliza a vida na matéria.


Gêmeos: Sua representação usual é de duas figuras humanas abraçadas, que expressam a capacidade de elevar espiritualmente o próximo por meio da transmissão de conhecimentos. Em Chartres, este signo aparece junto a uma das portas e mostra dois cavaleiros atrás de um grande escudo.


Câncer: Na forma de um caranguejo ou de um lagostim, costuma estar próximo da pia batismal, junto da imagem do arcanjo Gabriel. Com certeza, trata-se de uma influência da Cabala, que associa a Lua, regente de Câncer, a Gabriel, o emissário do nascimento. A intenção é mostrar que, por meio do batismo (ritual iniciático), o homem pode se religar às esferas espirituais das quais se origina.


Leão: Com a mesma representação de hoje, é emblema do evangelista Marcos, a quem emprestaria seus atributos de persistência e força de vontade na busca da espiritualização.


Virgem: Algumas vezes aparece como uma jovem segurando uma espiga de milho. Mas pode também estar representado por uma estátua da própria Virgem Maria, com uma estrela na cabeça. É um dos signos mais ricos de significados nas igrejas góticas, uma vez que a maioria delas foi dedicada justamente à mãe de Cristo. Em Amiens, por exemplo, ela se encontra em duas árvores. Na iconografia cristã, uma delas representaria a árvore pela qual a humanidade caiu – numa referência ao mito de Eva e da serpente tentadora enroscada numa árvore –  enquanto a outra remete à cruz de Cristo, pela qual a humanidade foi redimida.


Libra: Quase sempre aparece como uma mulher segurando uma balança desproporcionalmente grande, no interior da qual há uma pessoa envolta num halo de luz. Seria um lembrete para o homem de que ele também faz parte do divino.


Escorpião:  Sua imagem pode ser traduzida por uma águia (símbolo de elevação espiritual) e representa o evangelista João. Ou, então, aparece como um escorpião mesmo, já com um sentido de regressão espiritual. Só que, como não havia escorpiões na Europa, muitas das suas representações têm pouquíssimo a ver com a realidade. Em ambas as formas, o signo está localizado aonde a luz do sol chega por último.


Sagitário: Este signo costuma ser representado por um centauro prestes a disparar a sua flecha. Na catedral de Amiens, porém, ele aparece na forma de um sátiro. Mas ambos traduzem a luta que o homem precisa travar para vencer sua natureza material, a fim de ascender a planos mais elevados.


Capricórnio: Meio cabra, meio peixe, este signo indica as posições que o homem tem de enfrentar em busca de espiritualização.


Aquário: Representado por um homem segurando um livro ou um pergaminho, foi adotado como emblema do próprio cristianismo e do evangelho de Mateus. Esotericamente seria o ar cósmico que permeia todas as formas de vida.


Peixes: Rico em significados esotéricos aparece normalmente como dois peixes unidos por um cordão, nadando em direção opostas. O cordão seria o fio de prata que une o corpo e a alma durante a vida, mas que se rompe na morte. Um dos peixes corresponde, portanto, ao espírito, que permanece acima do plano físico, enquanto o outro, a alma, seria um intermediário direto com a matéria.

Os Símbolos Zodiacais e o Desenvolvimento Humano


Os símbolos são instrumentos que resumem o saber e facilitam o acesso ao conhecer. A fé é apenas o saber que se aceitou sem conhecer.


Se considerarmos a evolução do ser humano, muito provavelmente possamos aceitar que primeiramente houve símbolos, antes ainda da língua falada e escrita e, portanto a fé nos antigos símbolos pode ser tomada como a alavanca de todo o conhecimento humano até hoje.


De acordo com os astrônomos, umas 4.000 estrelas podem ser percebidas à vista desarmada, numa noite serena. É de se supor que um bom observador lá nos primórdios da civilização, após associar o aparecimento repetitivo dos astros com acontecimentos ânuos importantes, tenha criado e utilizado símbolos zodiacais como fonte de poder sobre sua comunidade. Desde sempre houve pretensos videntes ou adivinhos que se valiam da ingenuidade humana para utilizá-la a favor de suas artes divinatórias. Criaram-se desta forma, mitos, religiões, submissão, revolta e obviamente curiosidade, o que levou outros seres humanos a estudar o assunto e transformar o saber em conhecimento.


Em seu livro Eram os Deuses Astronautas Erich Von Daniken escreve: “O número aproximado de estrelas, somente em nossa Via Láctea, sobe a trinta bilhões. A suposição de que nossa galáxia contém, pelo menos, dezoito bilhões de sistemas planetários, é admitida pelos astrônomos da atualidade. Se tentarmos reduzir essas cifras, tanto quanto possível, e imaginarmos que as distâncias no interior de sistemas planetários são reguladas de tal modo que somente num caso entre cem existe planeta em órbita na ecosfera (região onde não existe a presença de seres vivos) de seu próprio sol, tudo isso ainda deixará 180 milhões de planetas capazes de manter a vida. Se, em prosseguimento, somente num deles, em cada centena, o potencial vitalizante haja sido aproveitado, ainda teremos 1,8 milhões de planetas com seres vivos. Admitamos, para concluir, que num só planeta, entre cem com seres vivos, existam criaturas com grau de inteligência semelhante ao Homo sapiens. Pois esta última conjectura ainda garante para nossa Via Láctea o enorme número de 18.000 planetas com vida inteligente semelhante à nossa.”


Pode-se dizer, portanto, que o desenvolvimento humano esteve e ainda esta muito ligado ao estudo dos astros e, portanto aos primitivos Símbolos Zodiacais.


Conclusão


Para a realização de sua própria iniciação, que há de levá-lo ao caminho do Conhecimento, o Maçom vale-se de elementos colhidas por toda parte, bebendo nas mesmas fontes que dessedentaram as religiões e as sociedades iniciáticas do passado e alimentando-se de todo o conhecimento científico do presente. E firmando um pé na tradição, que lhe transmite os valores espirituais, e outro na Ciência, que o mantém no caminho do progresso, consegue o Maçom o equilíbrio perfeito, aquele mesmo equilíbrio que sustenta os corpos celestes no cosmos.


Pelo método iniciático, o Maçom distingue-se culturalmente dos outros homens. Não conhece nem pode conhecer a satisfação espiritual e intelectual, pois ele sabe que a verdade de hoje pode não ser a verdade de amanhã. Pesquisador eterno, o Maçom faz jus à denominação de Filho da Luz.


Maçonaria e Astrologia

José Castellani

Introdução


A Astrologia era na antiguidade considerada a chave de todas as ciências humanas e naturais e não é de duvidar que algum dia descubra, inúmeras razões para que volte a ocupar esta posição. A Astrologia teve sua origem, por volta do ano 3000 a.C., provavelmente na cidade de “Ur”, supostamente a pátria de Abraão, fundada no 4º milênio a.C., por um povo do norte da mesopotâmia, os Sumérios. Este povo tinha um grande interesse pela observação do céu. Para os Sumérios, este parecia uma grande abóbada de veludo negro onde as estrelas estavam fixas como enfeites de brilhantes. Notaram, entretanto que além do Sol e da Lua, cinco estrelas apresentavam um movimento mais rápido que as outras; eram os planetas: Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno.


Mais tarde foram os Caldeus que introduziram a astrologia como hoje é conhecida. As estrelas foram agrupadas em constelações, para servirem como marcadores do movimento dos planetas. O Zodíaco, ou o Caminho de Anu, era a rota seguida no céu pelo Sol, Lua e planetas, sempre pela mesma massa de estrelas, as Constelações Zodiacais.


A divisão do Zodíaco em doze partes talvez tenha vindo da divisão em doze partes de duas horas cada uma do dia dos Caldeus.


A maçonaria, com seus templos onde sempre são representados os signos do zodíaco e a abóbada celeste, sempre serviram de veículo para a difusão de ensinamentos da Astrologia e, com certeza, foram em lojas que a Astrologia deve ter primeiro florescido em nosso país, em especial no Rio de Janeiro.


A Interpretação Astrológica


A Igualdade é o símbolo de Libra ou Balança. Este signo é o símbolo universal do equilíbrio, da legalidade e da justiça, concretizado pelo senso da diplomacia e da cortesia. Libra significa, em última análise, um caráter afável, um sentido de justiça, harmonia e sociabilidade, que são todos atributos da igualdade.


A Fraternidade é perfeitamente ilustrada pelo signo de Gêmeos em sua dualidade, que são os míticos Castor e Pólux, cada um desempenhando seu papel sem nenhuma proeminência sobre o outro. O signo de Gêmeos é dual, porque simboliza o momento em que a força criativa de Áries e Touro dividem-se em duas correntes: uma tem sentido ascensional, espiritual, e a outra é descendente, no sentido da multiplicidade das formas e do mundo fenomênico. Considere-se, também que face a Gêmeos está Sagitário, governado por Júpiter Zeus, Deus do qual todos os homens emanam, o que os faz irmãos uns dos outros, com cada um procurando-o, à sua maneira.


A Liberdade é apanágio de Aquário, simbolizado por Ganimedes, pelo anjo derramando sobre a humanidade o cântaro do saber; saber que, se for bem utilizado pode ser um meio de acesso à liberdade, com a condição de que aceite a superioridade do iniciado. Só o iniciado, o sábio, poderá reconhecer os limites além dos quais não poderá ir, pois esta é a maneira dele chegar ao conhecimento dos mistérios divinos. Essa ligação com o divino, da qual Moisés é um símbolo, o respeito às leis divinas, fundamentais para uma existência pacífica e harmoniosa, serão também assinalados pelo signo frontal a Aquário: Leão, cujo símbolo é o Sol, símbolo do UM, símbolo de Deus.


Esses três signos: Libra, Gêmeos e Aquário são os signos do ar do zodíaco. E os signos do ar são símbolos do espírito, são símbolos do cosmos, que o iniciado deve procurar conhecer e compreender.


As Provas dos Quatro Elementos


Uma das primeiras lições que aquele que receberá a Luz recebe é justamente da simbologia e da importância da depuração pessoal ou “limpeza” pelos quatro elementos: terra, água, ar e fogo. Estes são os elementos básicos que formam toda a Criação no estudo da Astrologia. Compreendendo as características destes elementos pode-se compreender tudo, pois tudo o que existe foi criado com esta matéria prima básica.


Muitos IIr.’. restringem os estudos dos elementos às lições e indicações do Ritual e assim deixam de compreender a amplitude deste conhecimento.


Só para ilustrar, nas antigas tradições iniciáticas, aquele que dominava os elementos tornava-se igual e semelhante ao Gr.’. Arq.’. do Un.’. pois dominaria totalmente tudo o que foi criado. O iniciado deveria dominar o elemento em seu universo particular. Deveria dominar a terra e o medo do desmoronamento, a melancolia, a avareza, a falta de horizontes em circunstâncias que elevariam ao máximo estas tendências como, por exemplo, dentro de um buraco ou caverna estreita, úmida e profunda. A água deveria ser dominada, por exemplo, dentro de um rio caudaloso e com correnteza violenta, vencendo-se a incerteza, a insegurança, a sensação de abandono e da falta de apoio. O elemento ar deveria ser dominado nas alturas de um precipício ou montanha (hoje uma montanha russa serviria), vencendo-se a vertigem, o desequilíbrio, a dificuldade de respiração em função da apreensão.


Finalmente o fogo deveria ser dominado dentro de um salão incendiado, ou com o iniciado circundado por três enormes fogueiras. Ele deveria controlar suas reações quanto ao calor, à luz excessiva e à sensação de proximidade com um poder terrível que pode destruir.


Os Cargos em Loja e os Sete Planetas Esotéricos


Ven.’. M.’. – assimilado ao planeta Júpiter, (número 6) que no panteão dos deuses babilônicos, simbolizava a sabedoria. Rege a visão, a prosperidade, a misericórdia, a liturgia, o sacerdócio, o mestre e a felicidade.


Ord.’. – está relacionado com Mercúrio (número 2) o planeta que rege a expressão da Verdade, pois é o “enviado de Deus”. Mercúrio tem asas nos pés e é o porta-voz, aquele que dá as boas vindas e domina os escritos. Associado ao Sol, pois dele emana a Luz, como guarda da lei maçônica que é, além de responsável pelas peças de arquitetura.


1o Vig.’. – associado ao planeta Marte, que era o senhor da guerra, simbolizando a força. Marte rege o início, a coragem, o pioneirismo e o impulso.


2o Vig.’. – assimilado ao planeta Vênus, feminilizado na mitologia babilônica e que, sendo a deusa mágica da fertilidade e do amor, simboliza a beleza. Vênus rege a harmonia, o prazer, a alegria, e a beleza como reflexo da manifestação do Gr.’. Arq.’. do Un.’..


Secr.’. – relaciona-se com o planeta Saturno (número 7). É ele o responsável de gravar para a eternidade os fatos de forma fria e exata. Ele é o controlador rígido da ordem dos processos e cioso pela documentação dentro das normas. Assimilado à Lua, pois reflete as conclusões legais do Orador.


Tes.’. – associado à Cronos (Saturno, para os romanos), pai de Zeus e filho de Urano, um dos deuses primordiais, que, com Gaia (a Terra) estava no início de todas as coisas, simboliza a riqueza. Recebe a simbologia da Lua (número 1) em sua atividade. A atividade de receber os metais e de organizar o movimento financeiro da Loja é considerada —por lidar com a frieza dos números— fria e calculista, além de inflexível. A Lua rege a família, a cidade, o lar e o corpo; portanto rege o Templo.


M.’. de Cer.’. – assimilado ao planeta Mercúrio, o deus veloz e astuto. Está relacionado ao planeta Sol. O Sol (número 4) caminha diariamente pelo Céu, levando e trazendo a existência, a verdade e a justiça. É ele que anima a vida e que circula no oriente e no ocidente.


Notas Sobre Astrologia e Maçonaria

Francisco Cezar de Luca Pucci

A astrologia tradicional, nos ensina Teixeira de Freitas, foi desenvolvida, principalmente, a partir do trabalho do astrólogo francês Jean Baptiste Morin de Villefranche (1583-1656), que serviu ao cardeal de Richelieu e à corte francesa de sua época. Posteriormente, duzentos anos mais tarde, uma nova vertente do pensamento astrológico se desenvolveu a partir da Teosofia, movimento político e espiritualista iniciado em fins do século passado por Helena Petrovna Blavatski, influenciando significativamente o trabalho atual da astrologia através de nomes como Annie Besant e Alice Bailey.


Tanto a posição de Villefranche quanto a visão teosófica, baseada no carma, são fortemente deterministas, deixando ao homem pouca possibilidade de interferir com seu “destino”, já que este ou é obra dos deuses ou é resultado dos pecados de vidas passadas.


Com o trabalho do pintor, músico, escritor e astrólogo norte-americano Dane Rhudyar, a astrologia do século XX, a partir dos anos trintas, vem alternando esse enfoque determinista. Em lugar de uma astrologia “centrada nos ventos, Rhudyar propôs uma centrada na pessoa”, que chamou de astrologia humanística. Entendendo que as ações das pessoas refletem necessidades profundamente arraigadas nelas, mesmo que inconscientes, propunha uma astrologia que visasse descobrir essas razões do agir humano, permitindo a possibilidade de escolhas mais conscientes.


Com essa perspectiva, do ponto de vista desse autor destino passou a ser visto como uma possibilidade predefinida dentro da própria pessoa, vindo a manifestar-se pela seleção, inconsciente, que essa pessoa faz dos eventos ou objetos no mundo fenomênico.


Dentro dessa visão, não há signos bons ou maus, mais fáceis ou mais difíceis. Cada signo é apenas o indicativo de um dos caminhos – estilos, poderíamos dizer – através dos quais a pessoa busca a sua totalidade, a sua individuação.


A astrologia passa assim a ser vista como simbolizando os impulsos inconscientes do comportamento emocional, representando-os através dos signos. Por isso, em seus primórdios, a astrologia só trabalhava cinco planetas, depois sete e posteriormente dez, dependendo, assim da evolução do conhecimento humano.


Adotando essa perspectiva simbólica, para Teixeira de Freitas o Sol representa o centro da consciência humana, o Ego, representando o impulso de auto realização, cujo objetivo é integrar harmoniosamente as várias partes do psiquismo. A Lua, simbolizando o lado feminino, representa a vivência emocional instintiva, com a qual a vivência consciente se combina para permitir a totalidade do psiquismo.


Os doze signos, portanto, são caminhos da vida psíquica e simbolizam, arquetipicamente, as possibilidades tanto do indivíduo quanto da coletividade.


O número doze se apresenta, também, sob outras formas: no número de apóstolos, de filhos de Jacó, de tribos de Israel, de trabalhos de Hércules. Também está representado na figura da abeta sobre o avental e da pirâmide sobre o cubo.


Tomados na sua totalidade, ainda segundo Teixeira de Freitas, os signos podem ser vistos como uma espiral evolutiva de três ciclos de quatro signos cada, representando o ciclo completo do amadurecimento humano: Áries, símbolo cardeal de fogo, positivo, iniciando o impulso da vida que surge do inconsciente indiferenciado no início da primavera no hemisfério norte (equinócio vernal); impulso que tem que ser contido e direcionado pela praticidade de Touro, para poder explorar o mundo exterior com a velocidade e superficialidade de Gêmeos até consolidar possessivamente, em Câncer, as informações assim obtidas. Com isso se cumpre o primeiro ciclo.


Em Leão, a intuição se acentua, marcando mais a autoconsciência, que produz em Virgem uma maior capacidade de discriminação e crítica, exigindo um equilíbrio, em Balança, que integre o outro em si mesmo, o que faz com que se inicie um recesso emocional profundo, em escorpião, preparando a morte do Ego no inverno que se prenunciava nesse outono. Cumpre-se o segundo ciclo.


Saindo de si em busca de princípios coletivos mais universais, em Sagitário, há maior inclinação à comunidade e à fraternidade. Mas o que foi adquirido é posto à prova, exigindo a perseverança e a paciência em Capricórnio. Todas as experiências do coletivo, intelectualmente analisadas em Aquário, devem finalmente se integrar aos traços da personalidade individual, o que exige profundo sentimento, em Peixes. E tudo recomeça em um nível superior. Podemos relacionar esses ciclos aos três graus da Maçonaria Simbólica, visando o desenvolvimento da Intuição, da Análise e da Síntese, como ensina Castellani.


Por esse prisma podemos entender os quatro animais do Evangelho de Mateus: águia, boi, leão e homem, como sendo a representação das quatro funções básicas do processo de individuação: intuição (fogo); sensação (terra); pensamento (ar) e sentimento (água).


Temos a mesma representação no enigma clássico da Esfinge de Gisé que interpelou Édipo na peça de Sófocles. Como coloca muito bem Jorge Adoum – embora com conotação mais mística que simbólica – quem domina esses “elementais” torna-se senhor de si mesmo. Quem não o faz, será “devorado”.


A Harmonia das Esferas


Para entender o que significam os planetas, é preciso olhar para seu movimento enquanto ciclo e onda, enquanto ondas do tempo, e não apenas como corpos no espaço. Esta concepção já havia sido percebida por Kepler quando elaborou o conceito da Harmonia das Esferas.


Este artigo é continuação do anterior: O que os corpos celestes tem a ver comigo.


No começo do século XVIII, um inventor e relojoeiro inglês, juntamente com um especialista em fabricar instrumentos de precisão, criaram a primeira máquina que reproduzia o movimento dos planetas em torno do Sol; primeiro, criaram um mecanismo que reproduzia os movimentos da Terra em torno do Sol, e da Lua em torno da Terra; em seguida, uma máquina mais completa, reproduzindo os movimentos dos planetas em torno do Sol. Esferas representavam os planetas a orbitar em torno de uma esfera central representando o Sol. Por meio de um sistema mecânico engenhoso, cada planeta circundava o ponto central com uma velocidade diferente. Acionadas por engrenagens e uma manivela que colocava todo o mecanismo em funcionamento, esta máquina, mais do que reproduzir o tamanho dos planetas ou as corretas distâncias destes para o Sol, reproduzia a forma e a proporção aproximadas de seus movimentos.


Este planetário mecânico e movente mostrava o sistema solar a partir de uma perspectiva diferente daquela que temos quando olhamos diretamente o céu – ou, ao menos, olhando o céu sem observação mais atenta (olhando-o sem reparar em seus ciclos e movimentos, reparando apenas na impressão espacial estática). Com esta máquina podia-se ver o deslocamento das esferas em suas órbitas, seus diferentes tempos de deslocamento, as proporções entre as órbitas, e assim o aspecto do tempo presente no movimento do sistema solar tornava-se visível aos olhos humanos. Os acordes do tempo observáveis nos corpos do sistema solar tornaram-se evidentes, quase palpáveis.


Foi um relojoeiro quem primeiro idealizou e construiu essa réplica do movimento do sistema solar. O mecanismo utilizado na construção desse planetário em movimento era o mesmo utilizado na construção dos relógios: engrenagens de diferentes tamanhos movendo ponteiros em diferentes velocidades em torno de um mesmo eixo central. O sistema solar se assemelharia, segundo essas máquinas e seus construtores, a um relógio, a um marcador do tempo. Cada ponteiro do relógio tem uma velocidade própria sua, assim como cada planeta tem sua velocidade própria em torno do Sol. Sobre esta analogia se assenta a construção desse tipo de planetário, mas se assenta também uma fronteira sutil e confusa entre os limites da dimensão tempo e da dimensão espaço.

O relógio é reconhecidamente o instrumento utilizado para marcar o tempo, é o instrumento que traz à visualização e, de certo modo, à tangibilidade, essa dimensão tão mais incorpórea do que o espaço, que é o tempo.


O relógio é uma máquina que parece medir a passagem do tempo. Contudo, o que temos no relógio com ponteiros e mostrador, é o deslocamento dos ponteiros pelo espaço; indiretamente, inferimos desse deslocamento uma medida de tempo. Os três ponteiros do relógio clássico deslocam-se a diferentes velocidades e isso é o que faz com que cada ponteiro se desloque pelo mesmo espaço em diferentes tempos; é a diferença entre essas velocidades de deslocamento em um mesmo espaço que acabamos por chamar de “tempos diferentes”: as horas, os minutos e os segundos.


O tempo que reconhecemos a partir do relógio é um tempo espacializado, no dizer de Bergson. Não é tempo realmente, é corpo percorrendo o espaço. Por meio de um artifício de percepção, chamamos isso de “tempo”, e com esse “tempo” organizamos nossa vida prática, ao estabelecermos as divisões do tempo em partes iguais. Contudo, se olharmos um relógio sem os ponteiros, essas divisões do “tempo” em partes iguais permanecem lá como divisões do espaço, mais acuradamente divisões da circunferência em doze partes iguais. Temos aqui um gráfico muito semelhante ao gráfico astrológico.


Não é preciso dizer como as experiências psicológicas, mesmo as mais simples, desmentem ser esse “tempo espacializado” a essência real da dimensão tempo.


O relógio nada sabe de possíveis diferenças de qualidade do tempo, de diferentes modos de atuação do tempo nem de dinâmicas que possam ocorrer em um determinado instante mas não em outro. Em resumo, o relógio nada sabe efetivamente da passagem do tempo; o relógio sabe dividir o tempo em porções equivalente a certos trajetos de ponteiros pelo espaço.


O relógio marca um tempo retirado de sua verdadeira natureza e traduzido para a natureza espacial. O relógio marca o espaço. No dizer de Bergson, “o tempo mensurável é tempo espacializado, tempo que teve sua verdadeira natureza sacrificada”.


Apesar de tudo isso, é por meio do relógio que estabelecemos uma relação organizada para com o tempo. É por meio do tempo espacializado que esta dimensão impalpável se aproxima, não apenas de nossos instrumentos de medição mas também de uma ordem mental capaz de contê-la. Podemos não compreender a natureza do tempo através de um relógio, mas por meio dele organizamos nossa relação com o tempo. A espacialização do tempo parece ser condição para que este se torne palpável aos sentidos e organizável pelo intelecto.


O movimento dos ponteiros dos relógios em torno de seu eixo central tem muita semelhança com o movimento dos planetas em torno do Sol, com os movimentos que definem a posição espacial dos planetas e astros que utilizamos no trabalho astrológico. Não obstante, a Astrologia trabalha, por assim dizer, no sentido contrário ao do relógio.


O tempo como nos é dado pelo movimento dos planetas é um tempo cíclico, é o tempo de um deslocamento que vai até um ponto diametralmente oposto e deste retorna à sua origem – seja qual for o ponto que escolhamos como origem. Completado o ciclo, o movimento do planeta retoma mais uma vez o mesmo ciclo: um planeta está sempre a “ir adiante desde” e a “voltar para” em cada um dos pontos a partir do qual se tome seu ciclo. Não apenas a órbita completa dos planetas em torno do Sol (ou a da Lua em torno da Terra) é um “ir adiante desde” e um “voltar para”, mas cada instante que se tome na órbita contém esse “ir” e esse “voltar”: o conjunto da órbita e cada trecho embora visualmente percebidos um fluxo são mais propriamente uma oscilação entre os pontos percorridos.

Embora visual e espacialmente o astro siga uma trajetória contínua em sua órbita, seu aspecto temporal é melhor compreendido e visualizado como ciclo, como onda. Em termos do tempo, o que se tem é um balanço rítmico, um ir e vir, uma descida desde a crista da onda, uma reversão do movimento no término da onda, um ascender em direção a uma nova crista, o atingimento do cume o qual imediatamente se torna nova descida – com o que outra onda começa. A oscilação rítmica não é visualmente aparente no movimento do astro, entretanto ela é a marca da dinâmica temporal do astro em sua órbita. Em termos de espaço, trajetória contínua; em termos de tempo, oscilação rítmica.


O mesmo acontece com a música. Uma melodia segue como um fluxo em uma direção (as linhas da partitura mostram graficamente esse aspecto da música: a sequência linear de notas). Contudo, a sucessão do tempo na música não é mero fluxo, não é simples passagem linear do tempo, não é um tempo “feito” de uma linha infinita para adiante, mas o tempo ouvido na música é uma combinação de fluxo e ciclo, o tempo musical é mais bem caracterizado como onda.


A métrica e o ritmo da música existem pelo balanço de ida e vinda do tempo, pelo tempo apresentado com acentuações que perfazem uma “ida” e uma “vinda”, da batida “1” de um compasso para sua batida “2”, e de volta para a batida “1” (no caso de um compasso binário, e analogamente para qualquer outro padrão de compasso utilizado). Ou mesmo em uma música onde não há compasso, essa ida e vinda, essa onda do tempo se faz audível, como é o caso do cantochão.


A experiência musical mais simples, o entoar de um acalanto ou de uma marcha infantil, e também toda a estrutura da música mais complexa, contêm este oscilante vai e vem. Não uma ida e vinda entre lugares do espaço, pois que na música não há deslocamento no espaço (a não ser que os músicos se desloquem, como numa banda desfilando; mas aí quem se desloca são os músicos: o movimento interno da música não muda, seja ela tocada com seus músicos andando pelas ruas ou sentados em cadeiras em um palco – o movimento da música é de outra natureza que não o de corpos em trajetória pelo espaço). O deslocamento de “ida” e “vinda” com o qual estamos descrevendo o tempo não corresponde a um trajeto no espaço, e sim a uma mudança ondulante de estados dinâmicos que transcorre no tempo. O tempo na música se revela como sendo primordialmente uma onda cíclica; e esta é uma característica do tempo, e não apenas do “tempo musical”, é uma característica própria do tempo que a música desvela e torna transparente.


“Podemos ainda dispensar as diferenças das notas e deixar nada que não a mesma nota soando sempre por iguais extensões de tempo. Ainda aqui, e na verdade aqui com particular clareza, há ainda o para cá e para lá, o movimento pendular, a onda; nunca – como temos demonstrado suficientemente – há mera sequência. O que produz a onda? O que gera a distinção entre para cá e para lá? A nota é sempre a mesma; a interrupção é sempre a mesma; o intervalo de tempo é sempre o mesmo. Somente uma coisa é diferente: o instante no qual a nota soa. Nada acontece de uma nota a outra nota salvo uma coisa: o tempo transcorre. O mero fato da sucessão temporal das notas, e nada mais, pode produzir a distinção entre para cá e para lá: o movimento pendular, a onda, é o trabalho do mero lapso de tempo. A onda não é um evento no tempo mas um evento do tempo. O tempo acontece; o tempo é um evento.”

À música, costuma-se atribuir a característica de “arte do tempo”. E naturalmente que é assim. A obra musical não nos é dada toda ao mesmo tempo, como um quadro, uma escultura ou uma obra arquitetônica que estão diante de nossa percepção inteiros a um só instante. As notas da música nos são dadas em uma sucessão temporal. Uma nota soa depois da outra; isto é música. Fazer soar todas as notas de uma obra musical ao mesmo tempo é tirar-lhe o sentido. A música ocupa uma certa duração do tempo, e esta é a primeira maneira da música trazer a dimensão tempo à nossa percepção mais direta: ao percebermos música, percebemos com mais proximidade o transcurso do tempo.


Contudo, o tempo musical revela uma outra face do tempo que não é identificada à primeira vista, que não é apenas seu transcurso linear. Assim como os planetas percorrem suas órbitas, as notas musicais se seguem no tempo linear, mas em ambos os fenômenos uma segunda dimensão do tempo se abre à nossa percepção.


Estamos familiarizados com o tempo como sendo apenas o contínuo transcurso passado – presente – futuro. Contudo, a música abre essa outra janela sobre a realidade do tempo, e por esta mesma janela contemplamos também o movimento planetário com outros olhos: olhamos para sua dinâmica e não apenas para a trajetória de seus corpos; olhamos para seu movimento enquanto ciclo e onda, enquanto ondas do tempo, e não apenas como corpos no espaço.


Não à toa, os antigos quando quiseram falar da percepção mais elevada que os astros lhes inspiravam, a impressão do universo como algo vivo, falaram da harmonia das esferas, um termo musical referido aos astros. A música dos astros não está na consonância espacial entre eles, não faria sentido chamar isso de “harmonia”. O simples fato de eles se moverem a diferentes órbitas e velocidades não promove um soar conjunto e internamente ordenado, uma “harmonia”. A ordenação musical e harmoniosa dos astros só é percebida realmente no entendimento de que o cerne movente dos astros, o aspecto temporal de sua natureza, segue proporções cíclicas. Kepler dedicou parte de sua obra para demonstrar a existência de proporções matemáticas entre as órbitas planetárias e a as notas da escala diatônica, chamando de “arquétipos” estas proporções encontradas muito semelhantemente na música e nos planetas.


“A imagem das constelações circulando não-sonoramente não é uma imagem da vida para nós. Não é do movimento das esferas mas de sua harmonia, seu soar conjunto, da qual o homem falou quando pensou no universo como sendo vivo. Pareceu a ele que a vida universal deveria revelar-se como algo audível mais do que visível. Talvez seja levar a antítese muito longe dizermos que o homem atinge a interioridade da vida pela audição e sua exterioridade pela visão.”


O cerne dos seres é feito de tempo; a forma dos seres é feita de espaço. A audição e a música escancaram a natureza do tempo à nossa percepção, e por meio delas podemos compreender ao que se refere aquilo que os astros simbolizam tão empaticamente a ponto de serem aquilo que indicam muito mais do que apenas indicarem (deixando de ser apenas referência espacialmente distante): a qualidade das dinâmicas do tempo no qual vivemos. Não é a posição que o astro ocupa no espaço o que importa para a Astrologia, mas sim a fase da onda cíclica que o astro ocupa no tempo.


A Astrologia nos faz conhecer o que se passa com alguns aspectos do ser humano e da natureza, a partir da correlação entre a fase da onda cíclica do astro no céu e a dinâmica presente no cerne dos seres e da natureza. É o tempo o que compartilhamos com os astros, não o espaço. Afinal, o espaço nos separa dando a cada um o seu lugar: coisas só podem ocupar diferentes lugares do espaço. Não obstante, partilhamos o mesmo tempo com os planetas no céu. O que compartilhamos ou, mais enfaticamente, o que nos une com a disposição planetária não é uma certa disposição dos planetas pelo espaço, mas sim a disposição destes no tempo.


A distância do espaço pouco importa na Astrologia; importa o tempo compartilhado com os astros no instante de um evento ou nascimento, o qual pode ser lido na carta astrológica – que agora sabemos por qual motivo pode ser chamado de um gráfico do tempo. E isso não apenas porque a carta é levantada para um instante do tempo. Já vimos que o aspecto linear do tempo espacializado é o que menos conta aqui. A carta astrológica é um gráfico do tempo pois que nos dá a conhecer a qualidade da dinâmica presente num dado momento do tempo e consequentemente – e esta é a grande afirmação da Astrologia – está correlacionado às qualidades dinâmicas presente em um ser nascido naquele instante ou em um evento que está a ocorrer naquele instante.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

KEPLER, JOHANNES. HARMONIES OF THE WORLD. NEW YORK: PROMETHEUS BOOKS, 1995.

ZUCKERKANDL, VICTOR. SOUND AND SYMBOL: MUSIC AND THE EXTERNAL WORLD. PRINCETON: PRINCETON UNIVERSITY PRESS, 1973.

ZUCKERKANDL, VICTOR. MAN THE MUSICIAN. PRINCETON: PRINCETON UNIVERSITY PRESS, 1976.

A Dialética Simbólica


Vistos da Terra, o Sol e a Lua têm o mesmo diâmetro aparente: meio grau de arco. Em contrapartida, todas as suas demais qualidades sensíveis – cor, temperatura, etc. – cor simetricamente opostas. Isto faz deles o emblema por excelência de todas as oposições máximas e irredutíveis, modeladas pelo esquema de dois pontos divergentes e equidistantes de um terceiro ponto central: por ocasião da Lua cheia, a Lua que se põe e o Sol que se levanta, ou a Lua que se levanta enquanto o Sol se põe, formam a imagem perfeita do equilíbrio dos contrários, com a Terra no meio como fiel da balança.


É uma imagem que nos ocorre naturalmente, quando queremos evocar a ideia de equilíbrio, a propósito, digamos, do ativo e do passivo, do masculino e do feminino, do claro e do escuro, de tudo quanto, enfim, a cultura chinesa resumiu sob os conceitos do yang e do yin. Sendo uma imagem fácil de gravar, e dotada de grande poder evocativo e mnemônico (proveniente, aliás, da homologia estrutural entre a psique humana e a esfera celeste), era natural que, em nosso tempo, os meios de comunicação se apossassem dela, utilizando-a como instrumento para fixar na imaginação do consumidor a mensagem das novas dietas, programas de ginástica e outros gadgets ideológicos que entraram no mercado através do naturismo hippie e das doutrinas pseudo-orientais. O abuso do emblema luni-solar veio junto com a vulgarização do yin e do yang.


Apesar da vulgarização, a imagem e o conceito que evoca são perfeitamente adequados à realidade que pretendem expressar; a lei da mútua compensação dos contrários não é uma pura fantasia, mas algo que efetivamente vigora em muitos planos e setores da experiência, e que, aliás, pode ser observado e deduzido da natureza, por exemplo, no caso dos vasos comunicantes ou do equilíbrio ácido-básico. Dentro dos seus limites, é um princípio explicativo perfeitamente válido, que funciona para um certo numero de casos.


Logo passamos do conceito abstrato de equilíbrio para a tentativa de equilibrar realmente alguma coisa concreta – por exemplo, quando aprendemos a andar de bicicleta –, verificamos que a nossa imagem de perfeita simetria se esboroa ao solavanco de sucessivas desilusões: de fato, não existe equilíbrio perfeitamente estático em parte alguma do mundo sensível. Uma vez atingido o momento de equilíbrio, o ponto central desliza, o conjunto escapa da simetria fugaz e cai; e voltamos a enfrentar a oscilação dos contrários. Notamos assim que, na experiência vivida, o ponto de equilíbrio não e propriamente um ponto, mas uma linha; e não é mesmo uma linha reta, mas uma linha sinuosa, que, gingando aos lados de um eixo meramente ideal, vai compensando as tensões de cá e de lá e compondo com o jogo do desequilíbrio das partes o padrão do equilíbrio instável do todo.


Na homeopatia, por exemplo, raciocina-se frequentemente assim. Um sintoma aparentemente alarmante – febre, sangramentos, supurações – manifesta certamente um desequilíbrio, mas o homeopata poderá não medicá-lo de maneira alguma se julgar que esse desequilíbrio parcial terminará por reconstituir o equilíbrio do organismo total. Inversamente, ele poderá receitar um medicamento que rompa um estado de equilíbrio aparente, para induzir desde o fundo das tendências orgânicas a formação ascensional de um novo e mais arraigado padrão de equilíbrio.


 Convenhamos que esse raciocínio é bem mais sutil e completo do que o anterior. Ele permite ir mais fundo na compreensão do real. Por exemplo, se nossos “naturalistas” pseudo-orientais estudassem um pouco do método hahnetnanniano, acabariam constatando – antes tarde do que nunca – que não existem alimentos yin nem alimentos yang, mas sim alimentos que, num certo quadro preexistente, assumem provisoriamente um papel yin ou yang, o qual também pode inverter-se com a evolução posterior do quadro; aliás, a tradição chinesa é categórica ao afirmar que a dualidade yin–yang é “o extremo limite do cosmos”; que, portanto, um e outro só existem como tais no plano do cosmos total¹; e que os entes individuais não somente são compostos de distintas dosagens desses dois princípios, mas que essa dosagem vai sendo progressivamente mais complexa e indireta a medida que descemos do plano universal para os planos mais particulares; de modo que para avaliar se um ente qualquer – digamos, um nabo – é yin ou yang, seria preciso ponderar uma quantidade praticamente indefinida de variáveis, entre as quais, obviamente, o momento e o lugar. Tais finuras jamais escaparam aos chineses. É somente a tola grosseria da nossa “cultura de massas” que imagina poder exprimir conceitos cosmológicos em quadros e tabelinhas dietéticas de correspondências rasas, lineares e, ademais, puramente fictícias.

Mas, voltando atrás, qual é a diferença precisa entre os dois raciocínios que acabamos de presenciar? No primeiro, os dois termos eram opostos estaticamente pela equidistância a um centro. Mas, se passamos da ideia de equilíbrio estático à de equilíbrio dinâmico, isto é, se passamos do conceito abstrato a experiência concreta e assim verificamos que o equilíbrio não é feito somente de simetria e equidistância, mas também de interação, de conflito e de colaboração entre os dois pólos, então estes já não são opostos, e sim complementares. Já não são apenas as extremidades de um contraste, mas as matrizes de uma harmonia, tão adequadas e complementares entre si quanto o sêmen e o óvulo, o arco e a corda, a vibração sonora e a resistência do tímpano. Já não nos falam somente pela sua equidistância fixa, por assim dizer cristalizada no céu, mas por seu convívio amoroso, grávido de tensões e possibilidades. Aprofundando mais a diferença, verificamos que, ao trocarmos de ponto-de-vista, introduzimos a variável tempo.


Em termos de lógica, podemos dizer que o primeiro raciocínio é um raciocínio de identidade e diferença, enquanto o segundo é um raciocínio dialético (no sentido hegeliano do termo). Os hegelianos sempre acusaram a lógica de identidade de ser puramente estática, de visar antes a abstrações formais do que a coisas concretas, imersas no fio do tempo, submetidas a transformações incessantes. O raciocínio dialético pretende apreender o movimento – por assim dizer, vital – das transformações reais fenomênicas. A verdade, segundo este método, não esta no conceito fixo dos entes isolados, mas no processo lógico-temporal que ao mesmo tempo os revela e os constitui. É o sentido da famosa formula de Hegel: Wesen ist was geworden ist. “A essência (de um ente) é aquilo em que (esse ente) se transformou”. Ou, em outros termos: ser, é devir.


Na astrologia, o símbolo que evoca esse segundo enfoque é o do ciclo lunar. Este projeta na tela dos céus o espetáculo da permanência na mudança, do ser que se revela e se constitui no devir. De fato, são as mutações da face lunar que acabam por mostrar ao homem a unicidade da fonte de luz: o Sol. Ora, o Sol quase nunca pode ser olhado diretamente. Na fórmula preciosa de Chesterton, “a única coisa criada à luz da qual olhamos todas as coisas e a única coisa para a qual não podemos olhar”. O Sol é, assim, uma invisível luminosidade. A lua, por seu lado, pode ser vista com seu claro perfil recortado no céu, mas, para compensar, este perfil não é constante. Assim, cada uma dos luminares aparentes tem algo de esquivo, para não dizer de equívoco: um foge ao olhar direto por seu brilho excessivo, outra foge à cristalização conceituai, por sua forma cambiante. Ora, esta forma atravessa nitidamente três fases, ou faces (a quarta face, a Lua nova, e invisível): na primeira, ela parece crescer como fonte de luz progressivamente independente. Aí atinge uma plenitude: temos a equivalência plena de dois círculos luminosos de meio grau de arco. Se ela se detivesse nesse ponto, diríamos: ha duas fontes de luz no céu. Mas o momento da sua plenitude já anuncia o declínio, já contem o germe da sua supressão; e vem a minguante, e enfim a Lua desaparece: o Sol, que durante todo esse tempo permanecera constante sob a sua capa luminosa, revelou-se – para o intelecto observador: constituiu-se – como fonte única real de luz, expressa e desdobrada temporalmente pelo compasso ternário da sua superfície refletante, a Lua.


Pelo simbolismo astrológico tradicional², o Sol representa à intelecção, a verdade, e a Lua a mente, o raciocínio: na dialética, uma verdade latente se constitui no espirito humano pelo processo do devir que a patenteia, que a verifica.


2 RENÉ GUÉNON, SYMBOLES DE LA SCIENCE SACRÉE, PARIS, GALLIMARD, 1962, PP. 395-405 (CAP. LXX, “COEUR ET CERVEAU”).

Se a balança do Sol e da Lua no horizonte, contemplada estaticamente na ocasião da Lua cheia, figurava o equilíbrio estático dos contrários, e portanto, a lógica de identidade e diferença, o ciclo lunar integral, contemplado na sua sucessão temporal, estampa nos céus a andadura ternária do pensamento dialético e o “sempiterno fluir” das coisas da natureza.


O raciocínio dialético tem um parentesco próximo com o raciocínio de causa e efeito, com a ideia de continuidade da mesma causa latente por sob a processão dos efeitos. O ciclo lunar pode, assim, representar indiferentemente o enfoque dialético ou o enfoque causal. Se o raciocínio de identidade e diferença³ é simples, direto e baseado na constatação de correspondências imediatamente oferecidas aos sentidos ou à inteligência, o raciocínio dialético demanda operações bem mais complexas, e o acompanhamento de todo um ciclo de transformações.


3 ALGO DE BEM PARECIDO COM A SEQÜÊNCIA DE PASSAGENS DO PLANO A PLANO QUE ESTAMOS OFERECENDO PODE SER ENCONTRADO NO LIVRO DE PHILIPPE D’ARCY. LA RÉFLEXION, PARIS, P. U. F. AS QUATRO ETAPAS QUE MOSTRAMOS CORRESPONDEM RESPECTIVAMENTE AO QUE ELE DENOMINA:12, ESTÁGIO DO OBJETO; 2A, ESTÁGIO DO SUJEITO; 32; ESTÁGIO DO EU TRANSCENDENTAL; 48, ESTÁGIO DO SOL OU ESTÁGIO DO MEIO LUMINOSO; ESTES CORRESPONDEM AOS QUATRO TIPOS DE RACIOCÍNIO – IDENTIDADE, CAUSA-E-EFEITO, ANALOGIA, CONVENIÊNCIA – ASSINALADOS POR EUGÈNE CASLANT EM LES BASES ÉLÉMENTAIRES DE L’ASTROLÓGIE, PARIS, ÉDITONS TRADITIONELLES, 1976, VOL. I, CAP. II, PP. 21-22.


Houve, assim, uma passagem de plano, uma subida de nível: ao passarmos da oposição estática à complementaridade dinâmica, do raciocínio estático ao dialético, mudamos de posto de observação e um novo sistema de relações se evidenciou no espetáculo das coisas. Parecemos ter chegado mais perto da realidade efetiva, abandonando os esquemas meramente formais e as armadilhas da nossa própria subjetividade. Parecemos, assim, ter chegado a uma solução para a oposição colocada inicialmente: ao introduzirmos a variável “tempo”, a oposição resolveu-se numa complementação.


Mas, bem examinadas as coisas, verificamos que a dialética só resolveu um problema a custa de criar outro: ao resolver a oposição entre o Sol e a Lua instalou em seu lugar a oposição entre o estático e o dinâmico. Se for uma fatalidade que todas as oposições estáticas possam se resolver pelo raciocínio dinâmico, não e menos verdade que elas só podem se instalar, inicialmente, pela formulação estática e abstrata dos conceitos de seus elementos. Como poderíamos “fluidificar” dialeticamente a oposição entre o Sol e a Lua se não soubéssemos o que é Sol nem o que é Lua, isto é, se os conceitos destes dois astros não fossem estáticos? Doravante estamos condenados a uma dualidade radical, que separa com um biombo de ferro o pensamento e a realidade: nossos conceitos serão sempre estáticos, a realidade será sempre dinâmica. A dialética desemboca no dualismo metodológico de Bérgson4 e Bachelard5.


4 HENRI BERGSON, INTRODUCTION À LA MÉTAPHISIQUE, EM OEUVRES, PARIS, P. U. F. , 1970, PP. 1392 SS.

5 GASTON BACHELARD, LE NOUVEL ESPRIT SCIENTIFIQUE, PARIS, P. U. F.

Para piorar ainda mais as coisas, a própria dialética, para entrar em ação, tem de introduzir novos conceitos, que serão igualmente estáticos, inclusive o próprio conceito de dialética. Estes conceitos poderão ser em seguida dialetizados por sua vez, e assim por diante interminavelmente. Se, na sentença de Heráclito, avô da dialética, “nunca nos banhamos duas vezes no mesmo rio”, podemos perguntar se esta sentença de Heráclito chega a ter duas vezes o mesmo sentido.


A dialética vê-se, desse modo, ante um trágico dilema: optar por um discurso interminável – o qual, não possuindo limites, deixa de ter qualquer conteúdo identificável, como bem o assinalaram os críticos neo-positivistas de Hegel6 – ou determinar arbitrariamente, e irracionalmente portanto, um ponto final qualquer para o processo dialético. Hegel, como se sabe, fez de si mesmo o ponto final da historia da filosofia, e a filosofia teve o desplante de continuar existindo depois dele.


6 COMO, POR EXEMPLO, BERTRAND RUSSEL NA SUA HISTÓRIA DA FILOSOFIA OCIDENTAL, TRAD. BRAS., SÃO PAULO, NACIONAL, T. III.

Urge, portanto, passar acima da dialética, galgar mais um degrau, subir a um enfoque mais vasto e abrangente. E, novamente aqui, será o modelo celeste que vai nos socorrer, seguindo a advertência de Platão de que, sem nos orientarmos pelos lineamentos de inteligência divina cristalizada nos ciclos planetários, nossos pensamentos não cessam de vagar de erro em erro.


Ocorre que os dois polos da nossa oposição inicial só podem ser ditos contrários – ou, em seguida, complementares –, quando vistos no mesmo plano, isto é, quando, medidos pelo mesmo padrão, resultam em grandezas similares. Na passagem do raciocínio estático ao dinâmico, algo certamente se alterou – o modo de representação –, mas algo permaneceu tal e qual: o ponto de vista do observador; em ambos os casos, supusemos que este estava instalado na Terra; primeiro, contemplando o momento do equilíbrio do Sol e da Lua no horizonte; depois, acompanhando o ciclo de transformações durante um mês lunar; mas sempre desde o mesmo lugar.


Todas as oposições (e todas as complementaridades) fundam-se em alguma característica comum, que se polariza inversamente num elemento e no outro; isto é, as oposições são diferenças acidentais que resultam de um fundo de identidade essencial; a complementaridade consiste apenas em reconstituir, em seguida, esse fundo de identidade essencial, que um momento do processo havia velado, e que o acompanhamento do processo todo volta a desvelar, tal como o Sol e a Lua podem velar-se um ao outro no momento do eclipse, voltando depois a mostrar-se como são realmente. Este jogo que vai da identidade à diferença e novamente à identidade só se desenrola perante um observador estático, firmemente instalado no seu posto de observação.


Ora, o homem não pode normalmente abandonar seu posto de observação; não pode transportar-se corporalmente para fora da Terra. Pode apenas viajar mentalmente; mas, deixada a si mesma, a imaginação vaga entre os espaços celestes e cai na fantasia informe. A astronomia (que é a parte descritiva e substancial da qual a astrologia é a parte interpretativa e essencial) é o antídoto de tais errâncias. Pela correta medição, o homem restabelece na sua representação a figura correta dos céus. E já tem o apoio de um novo modelo intelectual calcado, segundo Platão, na inteligência divina, para buscar um ponto de vista que lhe permita ultrapassar a dialética vulgar, penetrando num enfoque que poderíamos denominar a dialética simbólica.


Se, na dialética vulgar, havíamos introduzido o fator “tempo”, aqui lançaremos mão do elemento “espaço”, completando, portanto, o modelo em que se apoiavam nossas representações. Podemos dizer que o ponto de vista dialético correspondia a uma observação meramente “agrícola” dos céus: tudo quanto captava era a ideia de transformação e de ciclo. A dialética simbólica, agora, vai partir de um entendimento propriamente astronômico, e lançar-se à compreensão do entrelaçamento espacial dos vários pontos de vista e dos vários ciclos que eles desvelam.


Ora, se abandonamos o ponto de vista terrestre e levamos em consideração o sistema solar como um todo – isto é, o quadro maior de referências no qual se estatuem e se diferenciam os vários elementos em jogo – verificamos que, na realidade, a Lua não está nem oposta ao Sol, como no raciocínio de identidade estática, nem coordenada a ele, como no raciocínio dialético, mas sim subordinada. Aliás, está até mesmo duplamente subordinada, desde que é o satélite de um satélite. A Terra está para o Sol assim como a Lua esta para a Terra. Formamos assim uma proporção, e aqui pela primeira vez atingimos um enfoque racional de pleno direito, desde que “razão”, ratio, não quer dizer originariamente nada mais que proporção. É a proporção entre nossas representações e a experiência, que assegura a racionalidade dos nossos pensamentos.


Imediatamente a oposição inicial e a complementação que a seguiu revelam-se aspectos parciais – e, portanto, insuficientes – de um conjunto de proporções, que se reabsorve no princípio unitário que as constitui. Porque todas as proporções são variações da igualdade, do mesmo modo que os jogos entre os ângulos e posições dos vários planetas entre si se reabsorvem e resolvem no posicionamento de todos em torno do seu eixo único central, que é o Sol.


Esta terceira modalidade denomina-se raciocínio de analogia. Há muitos equívocos correntes hoje em dia sobre o que seja o raciocínio analógico. Por exemplo, muitos autores acreditam que se trate da constatação da mera semelhança de formas7. Outros supõem que seja uma forma primitiva e vagamente “poética” de assimilação da realidade, distinguindo-se radicalmente da apreensão racional e lógica8. Na verdade, nenhum dos filósofos modernos jamais demonstrou possuir um domínio do raciocínio analógico tal como o praticava a antiguidade; por isto, nenhum deles é autoridade para dizer o que ele seja. O raciocínio analógico sintetiza numa visão integrada o raciocínio de identidade e o de causa e efeito, e é, portanto, superior a estes.


7 SUSANNE K LANGER, AN INTRODUCTION TO SYMBOLIC LOGIC, NEW YORK, DOVER, 1967, P. 21 SS.

8 GASTON BACHELARD, A POÉTICA DO ESPAÇO, TRAD. BRAS. , SÃO PAULO, ABRIL.

Se os filósofos acadêmicos fazem confusões a esse respeito, não as fazem em menor quantidade seus adversários, isto é, os astrólogos profissionais. Só que a fazem com a intenção contrária, enfatizando a superioridade do raciocínio analógico. De fato, eles usam e abusam de uma famosa “lei de analogia”, chamada a justificar sua arte, e que deve unir, em pulsação síncrona, o todo e a parte, o universo e o indivíduo, o distante e o próximo, tudo, enfim, o que cabe na fórmula clássica do micro e do macro.


Não é aqui o lugar de criticar os astrólogos profissionais, mas o fato é que eles interpretam essa “lei” em modo plano, raso, linear, como se entre o macro e o micro não existisse uma relação de analogia apenas, mas de identidade; por exemplo, ao lerem horóscopos individuais, a correspondência que eles veem entre as configurações celestes e os eventos da vida individual humana é praticamente direta, sem as modulações e mediações que o bom-senso requer, e sem as inversões de significado que a própria regra do raciocínio analógico, quando bem compreendida, exige. Tendo estabelecido, por exemplo, uma ligação simbólica entre Saturno e a paternidade, e entre a Lua e a maternidade, interpretarão diretamente um ângulo inarmônico entre Saturno e a Lua, no mapa natal, como indicação de um conflito entre a mãe e o pai do consulente. Essa forma de raciocínio grosseiro foi muito bem caricaturada num “silogismo” inventado pelo astrólogo espanhol Rodolfo Hinostroza:


“Saturno = pedra. Sagitário = fígado. Portanto, Saturno em Sagitário = pedra no fígado. Ou, se quiserem, pedrada no fígado”. Rodolfo Hinostroza.


α


CONSIDERAR COMO UM ASTRÓLOGO PROFISSIONAL A PESSOA QUE FAZ ESTE TIPO DE ANALOGIA É COMO CONFUNDIR O OPERÁRIO QUE TRABALHA EM UMA CONSTRUÇÃO COM O ENGENHEIRO RESPONSÁVEL. RODOLFO HINOSTROZA NASCEU NA CIDADE DE LIMA, CAPITAL DO PERU.

CÉSAR AUGUSTO – ASTRÓLOGO


Do mesmo modo, estabelecem correspondências diretas entre Libra, como símbolo do equilíbrio cósmico, e a justiça comum e a corrente dos nossos tribunais; e muitas outras no mesmo sentido. Ora, a astrologia e uma ciência cosmológica, e não psicológica: o plano onde se desenrolam os fenômenos, o cenário onde se representa o seu drama, é o cosmos total, e não apenas a mente do indivíduo. Entre esses dois planos, separados por muitos “mundos”, deve haver necessariamente muitas transições e atenuações; explicaremos isso mais adiante. O que interessa assimilar e que o raciocínio analógico e uma ferramenta sutil, de precisão: não resiste a um achatamento que comprima o macro no micro e os empastele.


Que significa, de fato, analogia? Em primeiro lugar, qualquer dicionário grego assinalará, no verbete αμαλωγος, análogos, a acepção de “proporcionalidade”, no sentido da fórmula ou no sentido das harmonias entre os distintos comprimentos das cordas de um instrumento musical e os sons que respectivamente emitem quando vibradas. Tais proporcionalidades, como qualquer um pode perceber, consistem precisamente na razão das diferenças entre os distintos valores. Portanto se não há diferenças, não ha analogia, ha pura e simplesmente identidade, no sentido da fórmula ou, para resumir, 1=1. Isto deveria revelar, desde logo, que um símbolo astrológico qualquer – planeta ou signo, angulo ou casa – não pode jamais ter o mesmo significado quando- considerado em dois planos diferentes de realidade, por exemplo no plano do cosmos total e no da psicologia individual. Em segundo lugar, o prefixo aná, αμα, que constitui essa palavra, designa um movimento ascensional:


μελανες αμα βοτρμες ησαν

Mélane aná botrües esan


 “No alto, estavam os cachos de negra uva”


ILÍADA, 18:562

Traduz-se como “sobre”, “acima”, “a montante”, “para cima”, como em αμαγωγη, anagogê, “elevação” “ação de elevar, de arrebatar para o alto”, ou ainda como em anabásis, anaforá, etc. O termo “analogia”, portanto, da a entender que se trata de uma relação em sentido ascendente. Melhor dito: os dois objetos unidos por uma relação de analogia estão conectados por cima: é em seus aspectos superiores, e por eles, que os entes podem estar “em analogia”. Uma analogia é tanto mais evidente quanto mais nos afastamos da particularidade sensível para considerar os entes sob o aspecto da sua maior universalidade. Correlativamente, essa relação se desvanece quanto mais encaramos os entes por seus aspectos inferiores, isto e, pela sua fenomenalidade sensível.


O que estabelece uma analogia entre dois entes, portanto, não são as similitudes que apresentem no mesmo plano, mas o fato de que emanam de um mesmo princípio, que cada qual representa simbolicamente a seu próprio modo e nível de ser, e que, contendo em si um e outro, é forçosamente superior a ambos. É nesse nível de universalidade que se celebra no céu o liame de analogia que vai unindo, numa cadeia de símbolos, o ouro ao mel, o mel ao leão, o leão ao rei, o rei ao Sol, o Sol ao anjo, o anjo ao Logos. Visto desde cima, desde o princípio que os constitui, eles revelam a proporcionalidade entre as funções simbólicas que desempenham para a manifestação desse princípio, cada qual no nível cosmológico que lhe corresponde, e é essa proporcionalidade que constitui a analogia. Visto desde baixo, desde a fenomenalidade sensível, ao contrário, eles se desmembram na multilateralidade das diferenças. Assim, a analogia e simultaneamente evidente e inapreensível; óbvia para uns, inconcebível para outros.


Utilizamo-nos, portanto, das analogias, para subir da percepção sensível à apreensão da essência espiritual, para ir do visível ao invisível, ou, nos termos de Hugo de São Vítor9, para ir da natureza à graça: a natureza, o mundo sensível, “significa” o invisível; a graça espiritual o “exibe”, no topo da escada. A escada das analogias – evocada, por exemplo, na escada de Jacó, nos degraus do Paraíso em Dante, e em todas as hierarquias de conhecimentos espirituais – é um meio de acesso ao princípio e, por outro lado, vem abaixo se este lhe é retirado do topo.


9 EDGARD DE BRUYNE, ESTÚDIOS, OP. CIT. , VOL. II, P. 216.

Sendo, então, um liame vertical e ascensional, a analogia é diferente das simples relações de similitude – complementaridade, contiguidade, contraste, etc. – que relacionam, juntam, separam e ordenam os entes no mesmo plano horizontal. Esta distinção, por elementar que seja, escapa tão facilmente ao observador de hoje, que mesmo um historiador competente como Michel Foucault se equivoca, ao classificar a analogia como uma das formas da similitude na ciência medieval. Na realidade, a diferença de planos entre essas duas relações não permite enfocá-las como espécies do mesmo gênero, tal como as classificações hierárquicas em geral se distinguem das classificações tipológicas: a distinção entre capitão, major e coronel não e do mesmo tipo da distinção entre infantaria, artilharia e cavalaria.10  E muito menos se poderia, então, submeter à analogia a similitude, como a espécie ao gênero, tal como não se poderia dizer que a classificação das patentes militares fosse uma espécie da qual a divisão das três armas constituísse o gênero. Isso deveria bastar para evidenciar que certas relações de semelhança que os astrólogos apontam entre planetas (ou mitos planetários) e entes e eventos do mundo terrestre – como, por exemplo, o fato de que Marte e o sangue são igualmente vermelhos – não são analogias, porque não remetem ao princípio que constitui esses dois entes e que é a razão comum das suas semelhanças e diferenças. Trata-se, portanto, de meras similitudes, discernidas no mesmo plano (no caso, o das qualidades sensíveis cromáticas). E como, no sentido plano ou descendente, a relação de proporcionalidade se dilui progressivamente na multiplicação das diferenças, as meras similitudes podem ser bem pouco significativas, e ate mesmo inteiramente casuais; e ninguém pensaria que um conhecimento sério se pudesse obter mediante a coleta de curiosas coincidências.


10 MICHEL FOUCAULT, LES MOTS ET LES CHOSES, PARIS, GALLIMARD, 1966, PP. 32-59.

No esquema simbólico que estamos estudando, a passagem do particular ao universal é simbolizada pela passagem do ponto de vista geocêntrico ao ponto de vista heliocêntrico. Este último, por sua maior abrangência, permite captar relações – analogias – que o particularismo da visão terrestre ocultava. Resumindo as fases percorridas, atravessamos: 1ª fase. Ponto de vista: aparência sensível momentânea. Raciocínio: identidade e diferença. 2ª fase. Ponto de vista: temporal e cíclico. Raciocínio: casual ou dialético. 3ª fase. Ponto de vista: espaço-temporal, abrangente, universalizante, ascensional. Raciocínio: analogia.


Por outro lado, se as analogias levam ao conhecimento do princípio, é que este já residia em nós de modo virtual. Esta presença latente, este guia invisível que com mão segura nos conduz pela “via reta” das analogias em meio à floresta das similitudes, é simbolizado por Virgílio, Beatriz e São Bernardo nas três etapas da ascensão do poeta na Divina Comédia de Dante.


Ora, os princípios universais geralmente chegam ao nosso conhecimento unicamente através de fórmulas abstratas, de modo que nos encontramos sempre divididos entre uma verdade universal e abstrata e uma experiência concreta destituída de verdade, destituída de sentido. A escalada das analogias visa justamente a transpor esse hiato, levando, na medida do possível, a um conhecimento vivido e concreto do universal. Através da analogia e do simbolismo, bem como das muitas artes, ciências e técnicas tradicionais que objetivam cristalizar e condensar esse simbolismo na psique do estudante, o que se procura é justamente transformar e alargar essa psique de modo que ela mesma assuma uma envergadura universal, à imagem do Homem universal11 que é compêndio e modelo do cosmos inteiro.


11 O HOMEM UNIVERSAL É O PROTÓTIPO DA HUMANIDADE, O MODELO PELO QUAL, SEGUNDO TODAS AS TRADIÇÕES, FOI ESTRUTURADO O UNIVERSO. NO CRISTIANISMO, ELE É TANTO O VELHO ADÃO QUANTO O “NOVO ADÃO”, JESUS CRISTO. A PROPÓSITO, RENÉ GUÉNON, LE SYMBOLISME DE LA CROIX, PARIS, VÉGA, E, DO PONTO DE VISTA DAS DOUTRINAS ISLÂMICAS EXCLUSIVAMENTE, ‘ABD AK-KARIM EL-JÍLI, DE L’HOMME UNIVERSEL, TRAD, E COMENTÁRIOS DE TITUS BURCKHARDT, PARIS, DERVY-LIVRES, 1975.

No simbolismo numérico, todas as proporções são, em última análise, formas e variantes da identidade. A identidade é uma formula única, simples e abstrata, 1=1, que contém em si, sinteticamente, todas as proporções do universo, isto e, todas as “dosagens” que compõem todas as coisas e seres. Ao conhecer o princípio de identidade, conhecemos, de certo modo, a razão de todas as razões; é o conhecimento universal, mas ainda em modo virtual, como a semente que, potencialmente, contém em si uma floresta inteira. A escala das analogias da concreção vivida a esse princípio, recapitula, por assim dizer, em modo abreviado, o orbe todo das possibilidades contidas no princípio de identidade e, no topo da escada, reencontramos esse princípio, já não como fórmula abstrata, mas como realidade plena, como sentido da verdade e verdade do sentido. É o que a escolástica denominava o universal concreto, a síntese da universalidade lógica e da plenitude existencial.


Esse reencontro, esta re-ligação, ressoa como a efetivação plena da felicidade. É a reunificação do homem consigo mesmo, preliminar ao reencontro com Deus. Na filosofia de Hugo de São Vítor, é o reencontro do homem exterior, ou carnal, com o homem interior, ou espiritual. Hugo, seguindo uma tradição mas traduzindo-a com gênio e originalidade, distingue no homem, primeiramente, quatro faixas: na parte corporal, sensus (sentidos) e imaginatio (imaginação); na parte espiritual, ratio (razão) e intelligentia (inteligência). Então pergunta: não haverá um faixa intermediária, um vínculo entre o espírito e o corpo? A essa faixa intermediária, Hugo denomina affectio imaginaria, e seu discípulo Ricardo de São Vítor, imaginatio mediatrix; “afecção imaginária” e “imaginação mediadora”. É nesta faixa intermediária que se dá o conhecimento das analogias e do simbolismo em geral, e é nela que se dá o reencontro da verdade universal com e na experiência concreta. A contrapartida ontológica dessa faixa psicológica é o denominado mundus imaginalis, o mundo das formas imaginais, que não se confundem com o imaginário (Hugo atribui o imaginário à parte corporal) e que constituem o elo perdido entre o mundo dos sentidos e as “formas puras (ou abstratas) do entendimento”; e aí que se celebra a reunificação do homem consigo mesmo, e é para aí que devemos voltar nossa atenção se queremos romper o divorcio alma-espírito a que nos acostumaram quatro séculos de cartesianismo. Se o raciocínio de analogia é tão incompreensível para o homem moderno, é porque este perdeu a visão desse mundo intermediário, acostumando-se a entender como “abstração” tudo o que escape do orbe dos sentidos. Mas esse mundo intermediário e não só o mundo dos símbolos, e sim também de entes imaginais simbolizados por eles, pois não se poderia conceber uma faculdade cognoscitiva que não tivesse uma contrapartida objetiva, seu objetivo de conhecimento próprio e independente. E é no mundo imaginário que reencontramos então os anjos e os personagens todos das narrativas bíblicas e mitológicas, como formas de realidade que não se reduzem nem ao nosso psiquismo subjetivo, nem a uma objetividade meramente exterior.


* * *


A escalada termina aí. Tendo encontrado o princípio superior que organiza os vários planos de uma sequência analógica, parece que nada mais há a conhecer, ao menos dentro desse domínio em particular. No entanto, quanto mais nos aproximamos de um princípio universal, mais vão ficando para trás e cada vez mais longe as realidades concretas cuja explicação buscávamos. E, ao voltarmos do topo, às vezes parecemos ter perdido de vista o propósito da viagem. O momento do reencontro passa, e nada nos resta nas mãos senão o enunciado abstrato e sem vida de um princípio lógico, que e a recordação melancólica de uma universalidade perdida. É preciso, portanto, descer novamente do princípio às suas manifestações particulares, e depois subir de novo, e assim por diante. De modo que a alternância sim-não, verdade-erro, que constitui para nos o início da investigação, é finalmente substituída pela alternância alto-baixo, universal-particular. Passamos, assim, da oscilação horizontal para a vertical. E é justamente o despertar da capacidade de realizar em modo constante esta subida e descida, que constitui o objetivo de toda educação tradicional.


Mas a última etapa, que absolverá o raciocínio analógico do seu ultimo ranço de abstracionismo, é precisamente a forma suprema de raciocínio, forma essa superior a todas as outras, que já representa praticamente uma entrada no mundo da intuição e do conhecimento imediato. A essa forma de raciocínio, denominamos convenientia, “conveniência”, pois designa aquilo que convém, o ponto central para onde convergem todos os raios de um círculo e de onde eles partem novamente em todas as direções, representando o movimento duplo de contração-expansão do particular ao universal e deste ao particular. Quando nosso intelecto chega a essa forma de raciocínio, podemos então começar a compreender a doutrina hindu dos “dias e noites de Brahma”, ou a doutrina islâmica da “inspiração e expiração de Deus”, como retroação de todos os mundos ao seu princípio, seguida de nova expansão multilateral de manifestação universal. Estamos, assim, às portas da metafísica pura, mas isto será assunto para uma outra ocasião.


Jacques Bergier - Melquisedeque

  Melquisedeque aparece pela primeira vez no livro Gênese, na Bíblia. Lá está escrito: “E Melquisedeque, rei de Salem, trouxe pão e vinho. E...