sexta-feira, 1 de abril de 2022

O Esoterismo e o Caminho da Mao Esquerda - Thomas Karlsson

A Dragon Rouge costuma se descrever como uma ordem esotérica que explora o conhecimento esotérico, mas o que é o esoterismo e como ele está conectado ao Caminho da Mão Esquerda? Antoine Faivre, um destacado acadêmico em pesquisa oculta, disse em seu livro “L'ésotérisme” que não se trata de uma área de estudo como a arte, a filosofia ou a química, é mais uma maneira de pensar. Faivre explica:

“A derivação etimológica difusa da palavra indica que um indivíduo somente pode encontrar as chaves para os símbolos, mitos e realidade através da progressão individual que o conduz gradativamente à iluminação de maneira hermenêutica. Não há segredo extremo se o indivíduo acredita que tudo é basicamente secreto.”

O termo esoterismo denota algo interior e misterioso, ao contrário do termo exotérico que denota algo exterior. O cristianismo com seus dogmas e cerimônias poderia ser chamado de exotérico, enquanto o gnosticismo poderia ser visto como esotérico. Da mesma forma, o Satanismo poderia ser descrito como exotérico e o Caminho da Mão Esquerda como esotérico. Faivre apresenta sua explicação:

“A palavra esoterismo deriva de ‘eso’ que significa ‘dentro de’ e ‘ter’ que conduz à palavra oposição. A etimologia difusa da palavra a tornou elástica e aberta.”

Mas Faivre acredita que seis critérios deveriam ser preenchidos caso queira-se discutir algo especificamente esotérico de maneira positiva (para distinguir de uma iniciação não-esotérica), das quais quatro são preliminares. Tais critérios são:

1) Correspondências;

2) A natureza viva;

3) Conceituação e intermediação;

4) A experiência de transmutação;

5) Concordância

6) Transferência

1) As correspondências são como a ideia das conexões ocultas entre as partes visíveis e invisíveis do universo, conforme o axioma hermético “Aquilo que está abaixo é como aquilo que está acima”. Existem conexões entre os minerais, o corpo humano e os planetas, etc.

2) A natureza viva se baseia na visão do cosmos como uma unidade múltipla e hierárquica onde a natureza tem uma posição importante próxima de Deus e do Homem. A natureza é permeada por uma luz ou fogo e é rica em experiências potenciais e deveria ser lida como um livro. Mas Faivre frisa que desde o início do século XX o espiritualismo monístico ascendeu inspirado pelo misticismo oriental, onde a natureza é omitida ou até mesmo negada.

3) Conceituação e Intermediação. O Esoterismo se distingue do misticismo por enfatizar regiões entre o plano terrestre e o plano divino. Ensinamentos sobre anjos e outras entidades dessas regiões intermediárias se tornam importantes nesse contexto, da mesma maneira que ideias sobre gurus e iniciadores. Onde o misticismo vê a fantasia como um obstáculo, o esoterismo vê uma possibilidade. Faivre descreve isso de maneira interessante:

“Entendido dessa maneira, a fantasia é uma ferramenta para aqueles que desejam alcançar conhecimentos sobre si mesmos, sobre o mundo e sobre o mito. Esse é o olho de fogo que penetra a casca da aparência exterior e faz o significado aparecer e descobrir as “conexões” que tornam visível o invisível e expandem nossa visão mundana; o “mundus imaginalis”, inacessível aos olhos carnais mundanos.”.

4) A experiência de transmutação. O esoterismo poderia ser confundido com alguma forma de espiritualidade especulativa sem a experiência de transmutação. A palavra transmutação pode ser encontrada na alquimia e refere-se à transcendência ou passagem de um nível para outro, a metamorfose de algo para níveis superiores.

A esses quatro componentes básicos do esoterismo podemos acrescentar dois componentes relativos:

5) Existem concordâncias entre diferentes religiões e ensinamentos e é possível encontrar denominadores comuns para uni-los.

6) Transferência. O conhecimento pode ou deve ser transferido do professor para o estudante através de certos padrões, frequentemente através de iniciações. As condições desse “segundo nascimento” são que: a) os ensinamentos são respeitados e não questionados, desde que a pessoa deseje fazer parte dessa tradição, e b) a iniciação é supervisionada por um professor ou mestre.

A definição de esoterismo de Faivre corresponde à filosofia draconiana da Dragon Rouge. As correspondências são as bases do ritual mágico e da prática do Caminho da Mão Esquerda. O primeiro dos “cinco princípios draconianos elementares” é: Tudo é um. Trata-se de uma fórmula alquímica cujo símbolo é similar a Ouroboros: imagens de dragões ou serpentes mordendo a própria cauda. A fórmula é escrita em grego com as palavras EN TO PAN e é de grande importância na alquimia e na filosofia hermética. No sistema do Caminho da Mão Esquerda essa fórmula é interpretada como o fogo divino encontrado no homem como um reflexo da força divina fora de nós. Em ternos draconianos dizemos Dragão Externo e Dragão Interno.

Isso corresponde ao pensamento tântrico de brahman/parakundalini que existe dentro do homem como o atman/shaktikundalini. Isso também corresponde à Luz Luciferiana ou Chama de Prometeu que pode transformar os homens em deuses se for encontrada dentro do próprio indivíduo. O homem e sua alma correspondem a princípios universais externos a nós.

Na filosofia draconiana a ideia da natureza viva é importante já que esta filosofia contraria a visão atomística e materialista do homem e da natureza. Especialmente na antiga magia escandinava e céltica onde encontramos o Dragão como um símbolo do espírito da natureza. Também encontramos esse símbolo na tradição chinesa do Feng Shui. Todo o conhecimento esotérico está presente na natureza, mas está escondido do moderno homem civilizado. A árvore do conhecimento é mais do que uma metáfora.

Os níveis intermediários que Faivre menciona representam os mundos astrais e os diferentes níveis pelos quais o magista passa durante sua iniciação alquímica. O sistema mágico da Dragon Rouge é um sistema iniciatório onde o magista gradualmente avança por determinados níveis. Já que a meta não é se tornar um com Deus, o caminho para o divino é um processo importante para aprender como controlar o fogo divino.

O último critério de Faivre é talvez o mais importante aspecto do processo de iniciação alquímica da Dragon Rouge. A transformação da natureza humana para a forma divina é a meta do Caminho da Mão Esquerda. Ao contrário do que muitos satanistas ou teóricos da Nova Era, a Dragon Rouge não acredita que o homem já é um ser divino e que simplesmente tem que reconhecer isso. Nós devemos usar as forças negras e os princípios qliphóticos para demolir e nos construir novamente, até termos a habilidade de darmos à luz nós mesmos como deuses. Nós nos transmutamos de seres criados do passado para nos tornarmos criadores do futuro.

Os dois critérios posteriores de Faivre correspondem em certo grau à filosofia da Dragon Rouge. Existem princípios em diferentes tradições negras que se correspondem e que tornam os estudos ecléticos frutíferos. Pode-se comparar Odin, Shiva, Hermes e Lúcifer e encontrar aspectos correspondentes. O último critério de Faivre sobre a iniciação e transferência possui expressões mais dinâmicas e individualistas na Dragon Rouge.