terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

Dra. Anna Kingsford - “Revelação daquele Abominável”, o Espírito que Controla o Sacerdotalismo

 

Os dois eventos, a revelação “daquele abominável”, o “homem do pecado”, “o filho da perdição” e “mistério da iniquidade”, o inspirador gênio maligno do Sacerdotalismo, e a nova manifestação que deve constituir a segunda vinda do Cristo – esses dois eventos estão representados na Bíblia como estando imediatamente próximos e dependentes um do outro. E, em numerosas passagens, a Bíblia aponta, inequivocamente, para o advento de um “novo evangelho da interpretação” como o agente de ambos os eventos, e também para a restauração da Intuição como a faculdade através da qual isso será realizado. As seguintes estão entre as alusões em questão: –

            Em seu sentido esotérico, todo o livro de Ester é uma profecia da libertação da Igreja do poder do Sacerdotalismo por meio da “Mulher” Intuição, o nome Ester sendo o mesmo que “Easther” [Páscoa, em inglês], e denota o nascimento e ascensão de uma estrela e fonte de luz espiritual, sob a forma da nova revelação da interpretação verdadeira. Já o intelecto, pelo qual Ester, como a intuição, é treinado e sustentado, é representado por Mordecai, o qual – nesse aspecto – está para Ester assim como José está para Maria nos Evangelhos, ou seja, o guardião da alma.

            A destruição da imagem que aparece na visão Nabucodonossor, por uma pedra cortada de uma montanha sem a utilização de mãos, indica a destruição das civilizações sacrificiais do mundo, pela perfeita doutrina que virá da Intuição restaurada, a montanha sendo o “monte da regeneração” e “montanha do Senhor”, para a qual o único acesso é por meio de uma intuição pura.

            Também a anunciação feita para Daniel de que as palavras seriam abertas e os selos quebrados, com o reconhecimento da abominação da desolação ocupando os lugares sagrados, o que, na revelação que lhe foi transmitida, se daria sob o comando de Miguel, tem o mesmo significado: a saber, a restauração das faculdades de percepção espiritual através do equilíbrio dos dois fatores da mente, o intelecto e a intuição, e a revelação de um “novo evangelho da interpretação” como o sinal e prova disso.

            Além disso, tanto o período assinalado, como as condições descritas como sendo aquelas desse evento, correspondem precisamente com aquelas da nossa época, e a anunciação para Daniel é confirmada e reiterada por Jesus, e reforçada ainda por outro sinal de igual significado. Esse é o florescer da figueira: o figo sendo sempre, desde os tempos mais remotos, o emblema da “Mulher”, Intuição, como a faculdade da interpretação.

            E é por essa razão que o galho da figueira foi designado para Hermes – que também é Rafael – como o Anjo do Entendimento e “instrutor dos Cristos”, cujo nome significa tanto Rocha como Intérprete, em sinal de que o Entendimento é a rocha da verdadeira Igreja, e que tão somente é uma verdadeira Igreja aquela que está fundada sobre isso.

            Daí a execração da figueira estéril feita por Jesus, que significa a perda total da intuição pela Igreja, a qual de fato ocorreu, e sua consequente desastrosa perversão de si mesma e de seu evangelho. Enquanto que o florescer da figueira implica a chegada do tempo quando, através da restauração e da intuição e do advento de um “novo evangelho da interpretação”, os homens deverão uma vez mais sentar sob a vinha de um puro espírito e sob a figueira de uma intuição verdadeira, e “comer os frutos preciosos de Deus”.

            De igual modo, a predição de Jesus sobre o tempo quando “muitos virão do leste e do oeste e do norte e do sul, e sentar-se-ão com Abraão, Isaac e Jacó no “Reino de Deus” refere-se ao mesmo evento. Pois, em um aspecto, esses nomes são os equivalentes do povo hebreu para significar os mistérios sagrados de Bhrama, Ísis e Iacchos [o nome místico de Baco], da Índia, Egito e Grécia respectivamente, e, portanto, do Espírito, da Alma e do Corpo, cujos mistérios unidos compõem a Gnosis, ou perfeito sistema de doutrina do qual o Cristo e o “Reino de Deus” são os produtos.

            É a ampla abrangência dessa doutrina, conforme demonstrado por seu poder de atrair e reconciliar todos os tipos de mente e de caráter psicológico, que está representada pela enumeração dos quatro pontos cardeais; esses significando respectivamente o intuicional, o tradicional, o intelectual, e o emocional.

            Lida do ponto de vista esotérico, a narrativa das “Bodas [casamento] de Canaã na Galiléia” contém uma referência semelhante a um “novo evangelho da interpretação”, o qual deve suplementar e complementar o velho evangelho da manifestação: “Ele é revelado em primeiro lugar, pois ele é o Verbo [Palavra]; depois chega a hora de sua interpretação”. Jesus é a vinha, Maria é a figueira. Mas até que a hora do Homem seja realizada e completada, a hora da Mulher deve ser postergada. Por esse motivo disse o Senhor para ela: “Mulher, o que há entre eu e vós? Mesmo minha hora ainda não chegou”.

            Pendurado na cruz, Ele entrega nossa Senhora aos fiéis. Pois como o Cristo é “o filho da Mulher”, Intuição, assim Ela é “a Mãe do Cristo”. E que João fosse desse modo especialmente encarregado de cultivar [cuidar] da intuição, “e que a partir daquele momento a tenha tomado como sua própria mãe”, foi para que ele pudesse estar qualificado para ser, ele próprio, um manifestador e intérprete do Cristo para os demais, quer seja naquela época, ou em alguma época futura.

            Daí o significado daquela frase: “E se eu quiser que ele espere até que eu venha?” Foram os ricos dotes de João quanto a essa faculdade que o qualificaram para ser o porta-voz de Jesus depois de sua “Ascensão“. E a “nova interpretação” agora transmitida tem as características do espirito pelo qual ele conquistou os qualificativos de “Amado” e “divino”. A expressão “esperar” não necessariamente implica que seja na carne, mas significa dentro do alcance do plano físico, de tal modo que esteja disponível como o agente de futuras revelações. Daniel, também um “homem muito amado”, recebeu designações semelhantes.

            E, como já foi indicado, não é outra coisa senão um “novo evangelho da interpretação” o que está implícito na descrição da segunda vinda do Cristo. Que essa vinda deva ser espiritual e não pessoal está expressamente afirmado no alerta contra dar ouvidos àqueles que dizem: “Oh, aqui está Cristo, ou, oh, Ele está lá”. E de forma semelhante na afirmação que: “como o raio vindo do leste [oriente], e brilhando mesmo até o oeste [ocidente], assim deve também ser a vinda do Filho do Homem”. O significado disso é que a verdade, da qual o Cristo é a demonstração pessoal, deve ser tão vividamente apresentada ao mundo de modo que possa assegurar instantâneo e amplo reconhecimento.

            E não é outra coisa senão a potência dessa doutrina, e a luminosidade de sua exposição que estão significadas pelo “Espírito de Sua boca” e o “fulgor de Sua vinda”, por meio de cuja doutrina “aquele abominável” e “mistério da iniqüidade”, o espírito do Sacerdotalismo e sua prole caída devem ser consumidos e destruídos.

            Na aproximação para breve dessa consumação desejável, e em vista dos meios para tal realização, a “Nova Interpretação” assim expressa a si mesma: –

            Evoi Iacchos: (1) pois o dia chegou quando teus filhos comerão dos frutos da figueira: sim, a vinha deverá produzir novas uvas; e a figueira não será mais estéril.

            Pois a interpretação das coisas ocultas está ao dispor; e os homens comerão dos preciosos frutos de Deus.

            Eles comerão o maná dos céus; e beberão do rio de Salém.

            O Senhor faz novas todas as coisas: Ele leva embora a Letra para estabelecer o Espírito.

            Então falastes com a face velada, em parábolas e frases obscuras: pois o tempo dos figos ainda não havia chegado.

            E aqueles que se aproximaram da árvore da vida lá buscaram frutos e não encontraram.

            E daquele dia em diante, devido à maldição de Eva, nenhum homem comeu fruto da figueira.

            Pois o entendimento interior definhou, não há mais discernimento nos homens. Eles crucificaram o Senhor por causa de sua ignorância; não sabendo o que fizeram.

            Mas agora o Evangelho da Interpretação chegou, e o reinado da Mãe de Deus. (2)

NOTAS

(1) [Evoi: grito de invocação dos Mistérios de Baco.] O místico Bacchus ou Divino Espírito do planeta, chamado na Bíblia – sendo corretamente traduzido – “o poderoso deus Jacó [Iacchos]”; a história de Jacó sendo, em um aspecto, uma alegoria da evolução do princípio espiritual no homem, individual ou coletivo.

(2) Clothed with the Sun (Vestida com o Sol), I: xi, e II: xiii (2).

Dra. Anna Kingsford - As Expressões “Nascido da Virgem”, “Nascido Novamente”, “Filhos de Deus”, Todas Implicam no Homem Regenerado Por Meio de uma Intuição Pura

 

Ainda que sempre seja “uma coisa nova na Terra” que uma “mulher deva ir além de um homem” – devido às mentes que foram cegadas para as realidades do Espírito pelo Sacerdotalismo – para as mentes espiritualmente capazes de percepção, e de discernir o espírito através da letra, trata-se de uma verdade eterna no perpétuo curso da realização humana.

            Pois aquilo que a expressão significa é aquele processo de regeneração no qual a intuição desempenha um papel tão essencial. É por essa razão que aqueles espiritualmente regenerados da antiguidade eram chamados de nascidos de uma virgem, duas vezes nascidos, semideuses e Filhos de Deus; e que a Bíblia descreve o processo da restauração da Igreja de seu declínio para o cativeiro e as trevas do Sacerdotalismo, como o renascimento de uma mulher – mulher significando sempre a intuição. Pois o processo é o mesmo tanto no individual quanto no coletivo.

            Já fizemos menção a respeito da salvação que se processou para Israel através de “Ester”. De natureza semelhante são as narrativas do Dilúvio, do Êxodo, do Cativeiro e outras. Relatadas exotericamente como fenômenos naturais ou acontecimentos de uma nação, em seu sentido esotérico elas descrevem a queda da Igreja na materialidade, por meio de sua submissão aos sacerdotes, e seu resgate por meio de ouvir o profeta, o “filho da Mulher”, a Intuição.

            É em razão de uma torrente de águas da Alma que a Igreja – sempre a arca da humanidade – é soerguida às alturas da realização espiritual, o “monte do Senhor”, sendo essa condição essencial de ascensão o propósito do lavar pelas águas da regeneração. Nessas mesmas águas é que a Igreja – erguendo-se na noite de sua escuridão espiritual, e fugindo do Egito da materialidade onde ela tem sido mantida em tão doloroso cativeiro por um Sacerdotalismo que se tornou totalmente corrupto – deve ser purificada antes de poder conquistar o caminho para a Terra Prometida de sua devida perfeição. (1)

            Ouvindo à intuição, portanto, é que a Igreja alcança seu verdadeiro ser, se ergue e retorna à casa do Pai – como a Filha Pródiga de Deus, quando saciada dos restos da materialidade que lhe são oferecidos pelo rebanho de porcos do Sacerdotalismo, descobrindo que ela não pertence àqueles aos quais tal descrição é devida. E ao chegar à casa do Pai ela descobre aquilo que, não fosse por seus sacerdotes, ela nunca teria duvidado: – que esse lugar é também a casa de sua Mãe, e que o Pai e a Mãe são unos. Enquanto que aqueles que lhe dão uma recepção rude, ainda não são nascidos novamente, porque ainda não são como então ela será, nascidos uma segunda vez.

            Agora, todas as coisas apontam para o tempo que se aproxima como sendo aquele em que as “duas testemunhas de Deus” no homem, o Intelecto e a Intuição, após ficarem por tanto tempo “mortos nas ruas da grande cidade” – uma civilização moldada e controlada por um Sacerdotalismo revestido por seus três véus: “sangue, idolatria, e a maldição de Eva” – na qual o Senhor, a Divindade no homem, é sistematicamente crucificada, se erguerão e ficarão de pé, e ascenderão ao céu de sua devida supremacia, no lugar de Lúcifer, que será deposto.

            Quando assim estabelecidos, eles ministrarão ao mundo a doutrina perfeita, a qual deve dissipar e destruir toda a prole de falsidades e desatinos que até então foram dominantes. Desse modo, o pandemônio pelo qual o mundo tem passado será substituído pelo “novo céu e nova terra na qual habita a Equidade”; a equidade que consiste e que vem do perfeito equilíbrio de Intelecto e Intuição no homem, como rei e rainha de seu sistema mental, na falta do que ele não é um homem, mas um demente, como a situação do mundo em nossos dias jamais tão claramente demonstrou.

            Já foi referido que é precisamente tal equilíbrio no sistema do homem que a Bíblia simboliza por “Miguel” e “Melquisedeque”. E é em referência a esse mesmo mistério que, no Zodíaco, o signo de Libra, a Balança, se interpõe entre Escorpião e Virgem. Apenas quando o “homem”, o Intelecto, é equilibrado pela “mulher”, a Intuição, há como escapar da serpente da Natureza dos Sentidos.

NOTA

(1) No que se refere ao ritual resgatado que celebra o Êxodo da Alma, vide Clothed with the Sun (Vestida com o Sol), II, xiii (6), “Hymn to the Planet-God (Hino ao Deus-Planeta)”.

Dra. Anna Kingsford - O Zodíaco, a Grande Pirâmide, a Esfinge e o Obelisco

 

     O signo Zodiacal da dispensação que agora chega contém um presságio apropriado aos propósitos desta exposição. Vejamos a citação que segue, onde é a própria “Nova Interpretação” que nos fala:

            “Pois quando o Senhor ia entrar na cidade sagrada para celebrar sua Última Ceia com seus discípulos, ele enviou antes o pescador Pedro para encontrar o homem do signo vindouro.

            “‘Lá encontra um homem portando um cântaro de água’.

            “É sua Páscoa; pois a partir dali o Sol deve passar para um novo signo.

            “Depois do Peixe, o Carregador de Água; mas o Cordeiro de Deus permanece sempre no lugar da vitória, sendo sacrificado desde a fundação do mundo.

            “Pois seu lugar é o lugar do triunfo do Sol”.

            O símbolo, então, da dispensação vindoura e, por conseguinte, o símbolo dessa Associação, é o signo da constelação de Aquário; o qual, sendo interpretado, é o “signo da vinda do Filho do Homem nas nuvens do céu” – o entendimento regenerado do homem – “com poder e grande glória”, portando consigo as águas da mulher – agora reconhecida como também divina – a qual, quando purificada da materialidade, é a “Mãe de Deus” no homem, a alma e sua intuição do Espírito.

            Razão pela qual a Bíblia do Zodíaco – aquela “palavra escrita para sempre nos céus” acima do homem, assim como no céu dentro dele que é sua própria alma e seu espírito – também dá testemunho simultaneamente da Dualidade na Unidade, e da necessidade do igual reconhecimento de seus dois fatores.

            Já no símbolo de Peixes, que são dois em número, há o mesmo mistério representado. Porém somente ocultamente, pois embora o significado esteja ali contido, não é expressado ou compreendido. Daí sua representação como encoberto pelas águas do mar do Astral, durante a dispensação que agora está passando, para ser representado no Celestial por aquela que agora se inicia.

            E ainda há mais do que isso. A descida do Senhor vindo do céu conforme representada nesse signo, também é a ascensão do homem até lá. Pois, por meio do seu reconhecimento da divindade essencial da alma, ele pode alcançar a realização de sua própria divindade. Em tal simultânea descida e ascensão é cumprida a antecipação feita por “Paulo o Místico”, quando ele diz: “Porque o Senhor Mesmo descerá do céu com grande brado, com a voz do Arcanjo, ao som da trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles, nas nuvens, ao encontro do Senhor nos ares”. [NT: 1 Tessalonicenses 4:16-17]

            Dessa maneira a Igreja celestial se reunirá – ou melhor, para alguns, já se reuniu – com a Igreja terrena nas alturas sublimes de seus pensamentos puros, para trocar alegres saudações a respeito da ressurreição terrena que se aproxima. Pois a segunda vinda de Cristo, a qual é o novo nascimento ou regeneração da Igreja, é aquela “vinda do Senhor ao seus”, pelos quais, antes, seguindo a orientação do Sacerdotalismo, Ele foi rejeitado em troca do “ladrão”, Barrabás – o qual foi assim chamado porque era “filho do Pai deles, o Diabo”, o qual sempre roubou do homem a sua herança divina.

            Tal é o significado do evento denominado de “a consumação da era profética” e “o fim do mundo”. Ele encerra o período profético, e é o fim do mundo na Igreja por meio da abolição da materialidade mundana da Igreja, significando a materialidade no entendimento das coisas espirituais, e suas três características [ou véus] inseparáveis: “sangue, idolatria, e a maldição de Eva”.

            O Zodíaco tem duas Bíblias companheiras nas quais o mesmo evento é profetizado. Essas são as Bíblias “escritas em pedra” como o Zodíaco é escrito nas estrelas, que são as Bíblias da grande Pirâmide e da Esfinge. Pois é sempre “desde o Egito” que Deus “chama Seu Filho”, em um ou outro de seus aspectos, quer seja como o indicado depositário da doutrina celestial, ou como o emblema da materialidade.

            Como pode ser lido com à luz da “Nova Interpretação”, esses símbolos denotam a ascensão do homem por meio de sua evolução, em virtude da divindade de seus princípios constituintes; o primeiro deles pela elevação desde a “poeira do solo”, e o segundo desde o “tronco da criatura predadora”. Sua perfeição sendo simbolizada e alcançada, no primeiro caso, por meio das câmeras do rei e da rainha e por meio da tumba. E, no segundo caso, pela cabeça e peito da mulher. Pois em cada caso o dualismo significado é aquele do Intelecto e da Intuição: a tumba é a medida padrão da humanidade aperfeiçoada; a “pedra angular principal no topo” da Pirâmide é “Cristo”, o ponto de união com a divindade, onde a materialidade termina e o celestial é alcançado; e o olhar da Esfinge – “olhando bem para a frente com olhos de calma eternidade” sobre o deserto do Tempo – significa a paciente espera da alma em calma segurança pela realização de sua destinada divindade. O Obelisco é um símbolo irmão denotando a descida do Espírito até a condição de matéria, e sua ascensão desde a matéria por meio da individuação e da divinização.

            E assim, através da “Nova Interpretação”, a profecia de Isaias encontra literal realização, e há agora um “altar para o Senhor em meio à terra do Egito, e um pilar em sua fronteira devotado ao Senhor”; os quais são “como um símbolo e uma testemunha do Senhor das Hostes na terra do Egito”. Pois somente quando interpretados eles de fato se tornam um símbolo e uma testemunha. E aquilo do qual eles dão testemunho é a natureza espiritual e a Dualidade na Unidade do Ser, e a equilibrada cooperação de seus dois fatores como a condição da realização da própria divindade do homem.

            Pode evitar confusão para alguns afirmar-se explicitamente que não há aqui nenhuma questão de qualquer equilíbrio entre Espírito e Matéria. Nenhum equilíbrio é possível entre esses, assim como não é possível entre Substância e Sombra, Luz e Escuridão, Realidade e Aparência, Eternidade e Tempo. O equilíbrio simbolizado é entre as duas modalidades do próprio Espírito, os dois constituintes do próprio Ser: Força e Substância. E entre esses e suas várias manifestações, como vontade e amor, mente e consciência moral, intelecto e intuição, cabeça e coração, homem e mulher, pai e mãe, concebidos como subsistindo na única e mesma entidade cósmica.

            Espírito e matéria não são dois conceitos de uma e mesma coisa que podem estar dispostos balanceadamente um em relação ao outro; isso porque a Matéria é em si mesma Espírito, sendo substância espiritual sob manifestação – primeiro como o éter astral, e, por fim, como matéria – por meio da Força ou Vontade operando sob o impulso do Amor. A concepção de dois princípios auto-subsistentes, originais e antagonísticos é algo absurdo. Um absurdo que envolveria o início da tábua dos números com um dois. A única real oposição é entre Ser e Não-Ser. Tudo aquilo que é, deve existir como modalidades do anterior. E as diferenças entre esses somente podem ser de grau e condição. Daí a definição do Panteísmo: – Todas as coisas são Deus quanto a seus princípios constituintes; porém não quanto à condição, devido à Criação.

            Deus deve ser concebido como subsistindo sob duas modalidades, o Imanifestado e o Manifestado, e em cada uma delas há, de forma análoga, uma Dualidade na Unidade. Pois, sem Força e Substância não há ser. Esses dois são os pilares do templo de Deus cuja Igreja é o Universo, ao mesmo tempo “o Jachin e o Boaz” (1) e “os pilares de Hércules”, os quais sustentam de igual modo o macrocosmo e o microcosmo.

            A desintegração de qualquer entidade não envolve nenhuma perda para eles, mas a perda apenas da individualidade deles resultante; e isso somente no plano no qual tal desintegração ocorre. Não há nenhuma morte real exceto a morte espiritual. E essa depende da vontade do indivíduo relacionado. “Por que vós morreis? Não tenho nenhum prazer na morte daquele que morre”.

NOTA

(1) NT: São duas colunas que ficavam à frente do Templo de Salomão, em Jerusalém. A igreja românica de Santa Maria Maggiore no povoado de Tuscânia (na região do Lácio, comuna de Viterbo), tem uma entrada ladeada por um par de colunas destinadas a invocar Jachin e Boaz. Em alguns templos maçônicos há réplicas das colunas de Jachin e Boaz, em que se faz referência com as letras J e B, nas respectivas colunas.

 

Dra. Anna Kingsford - Sacerdotalismo Negou a Dualidade Divina e, Suprimiu o Entendimento

 

A mesma negação constitui uma blasfêmia também contra o Logos. Pois, como a expressão ou “Palavra” de Deus como Pai-Mãe, o Logos necessariamente representa ambos os progenitores e, como eles, e o Espírito Santo que procede desses progenitores através dele, o Logos é dual.

            Daí a dualidade implícita nos nomes Jeová, Shaddai, Adonai, e outros dados Hebreus e outros povos para o “Filho” como “terceira pessoa” na Trindade celestial – em distinção à Trindade eclesiástica. Na experiência beatífica conhecida dos videntes como a visão de Adonai, quer sejam aqueles videntes da Bíblia ou outros, ambas as formas [da dualidade] estão sempre presentes, sendo manifestadas alternadamente de acordo com a função exercida, segundo ela denote Vontade ou Amor, Projeção ou Recolhimento. Que esse fato esteja implícito mais do que expresso nos relatos da Bíblia acerca dessa experiência, deve-se às mesmas causas que têm dominado o Sacerdotalismo em sua supressão da própria doutrina.

            No “Mistério” agora recuperado, do qual os versos iniciais do Evangelho de São João são derivados, essa suprema doutrina do Logos está assim expressa: –

            “Então, do seio da Dualidade Divina, o Filho Unigênito de Deus surge do recôndito:

            Adonai, a Palavra, a Voz invisível.

            Ele estava no princípio, e por meio Dele todas as coisas foram manifestadas.

            Sem Ele, nada do que é visível foi feito. Pois Ele é o Manifestador, e Nele estava a vida do mundo. (...)

            Ele é de Seu Pai o Espírito, e a Sua Mãe a Grande Profundeza.

            Possuindo a potência de ambos em Si Mesmo, bem como o poder sobre as coisas materiais.

            Sendo, no entanto, Ele Mesmo invisível, pois Ele é a causa e não o efeito.

            Ele é o Manifestador, e não aquilo que é manifestado.

            Aquilo que é manifestado é a Divina Substância”. (1)

            O termo “manifestado”, contudo, não é absoluto mas relativo. Embora não manifestado para a parte fenomênica do homem, a Terceira Pessoa na Trindade celestial –. O “Filho”, “Logus”, ou Adonai – é manifestado para sua parte substancial. Desse modo, temos que a contradição entre as afirmações da Bíblia acerca dessa visão de Deus pelo homem, e as negações de sua possibilidade, trata-se apenas de uma aparente contradição. A parte “homem” do homem – os sentidos externos e o intelecto – não pode “ver Deus”: mas, há aquilo no homem que pode ver Deus, a saber, a “mulher”, sua alma. E é para ela que a visão é concedida, e é dela que o Cristo no homem tem nascimento.

            Constituindo-se numa mutilação do Logus, ou Razão de Deus, a negação, quer explicita ou implícita, da divindade da substância, constitui uma mutilação da própria Razão, desde a própria fonte do Ser até as mais longínquas manifestações do Ser. Na medida em que é aplicado ao homem, esse pecado envolve a negação da alma, a intuição, a consciência moral e o entendimento; bem como da percepção do verdadeiro e do falso, certo e errado, bem e mal e, portanto, de Deus e do diabo, e a distinção entre eles. Pois, como aquilo no homem que sofre e dá à luz, relembra, reflete e apreende – enquanto o Espírito, como força e vontade, anima, impele e impõe – ela, a Alma, é aquilo em virtude do que ele conhece e alcança o entendimento. E se não for pelo dualismo constituído pela Alma em conjunção com o Espírito, ele não possui qualquer órgão de conhecimento, nenhuma faculdade de compreensão, mas fica sendo capaz, como o Sacerdotalismo tem insistido em torná-lo, de ser apenas um instrumento incapaz de razão a serviço do próprio Sacerdotalismo e de seus mestres.

            Tendo, por meio de tal mutilação da razão, abolido a Razão como um fator do Ser, seja divino ou humano, e tendo estabelecido sua independência de qualquer obrigação para com a razão, o Sacerdotalismo tem sistematicamente convertido toda a doutrina da Igreja de perfeita razão, que ela realmente é, em algo destituído da razão, até a completa deterioração de seu caráter divino, e até uma desesperante confusão do homem. Daí sua substituição do que possui sentido pelo sem sentido, chamando-o de mistério; da justiça pelos caprichos, chamando-os de graça; do amor pela vontade, chamando-a de Deus; da verdade pela falsidade, chamando-a de ortodoxia, e ao mesmo tempo anatemisando a verdade como heresia, perseguindo seus porta-vozes até a morte; substituindo a inteligência pela aceitação mecânica, chamando-a de fé; o serviço razoável pela subserviência ignorante, chamando-a de devoção; a redenção da inclinação ao pecado pela imunidade das consequências do pecado, chamando-a de salvação; a purificação do coração pelo derramamento de sangue, e esse dos inocentes, chamando-o de expiação e uma satisfação da justiça divina, um atributo de outro modo dispensado em favor da graça; e o espírito puro simbolizado pelo “sangue de Deus” pelo sangue físico de um deus, e o Cristo interior e Suas obras internas, assim como a verdade que Jesus veio para ilustrar e comunicar, pelo homem Jesus e seus sofrimentos corporais. Enquanto que, exaltando a virgindade como sendo aquela do corpo em lugar daquela que é da alma, e saturando-a com a própria materialidade cuja liberdade dessa mesma materialidade é aquilo que tal virgindade consiste, o Sacerdotalismo tem ao mesmo tempo incapacitado almas para a percepção do espírito e atribuído um estigma à divina, uma vez que natural, relação dos sexos, desse modo tachando-a de impura. E ao invés de tornar-se o lider de ações tendo como finalidade a regeneração do mundo por meio de puros e elevados ideais de vida, envolvendo a abolição de práticas grosseiras e cruéis, o Sacerdolismo tem persistentemente apoiado os poderes constituídos, tendo como objetivo os interesses materiais de sua própria ordem.

            Dessa maneira, sistematicamente afastando o homem da condição de perfeição de coração e mente que o aproxima de Deus, o Sacerdotalismo tem se interposto entre o homem e Deus, não como um mediador para uní-los, mas como alguém que os divide, os coloca em direções opostas e os mantém afastados. Fazendo o que, além de separar o homem de Deus, ele tem dividido o homem em si mesmo. Pois ele tem divorciado entre si, em todos os planos de seu sistema, aqueles que Deus uniu: Razão e Verdade, Conhecimento e Religião, Convicção e Ensinamento. E, assim dividindo para que possa imperar, ele tornou a si mesmo o separador e desintegrador do homem, até o completo desfazer da obra de Cristo, o qual, como o reconciliador e unificador, disse, “Aquele que não se une a mim, se dissipa”. E, desse modo, vendo toda a Razão de Deus apenas para exclamar: “Esse é o Herdeiro, vamos matá-lo, a fim de que a herança seja nossa”, o Sacedotalismo tornou-se ao mesmo tempo Anti-Cristo e blasfemador contra o Espírito Santo.

Dra. Anna Kingsford - Atual Restauração de Faculdade e de Conhecimento Predita na Bíblia

 

É a verdadeira ocorrência na presente época de uma restauração de faculdade e conhecimento, da natureza que aqui foi descrita, o que constitui a razão de ser da presente exposição da “Nova Interpretação”. Ela é o resultado do desejo de estudantes devotados e seguidores, ao mesmo tempo, da religião espiritual e da ciência espiritual para tornar universalmente acessível e conhecido aquilo que eles reconheceram como sendo, acima de qualquer questão, o “Novo Evangelho da Interpretação” por tanto tempo e tão positivamente prometido, e tão dolorosamente necessário.

            Não se trata de nenhum novo evangelho propriamente dito aquele que desse modo se busca transmitir. Ele nem adiciona nem subtrai do velho evangelho que é familiar à Cristandade. Trata-se de um novo evangelho somente na interpretação. E, assim sendo, trata-se de um evangelho no qual – ao mesmo tempo em que nada de novo é dito – aquilo que é interpretado é algo tão antigo que é como se tivesse sido esquecido e perdido; algo que, no entanto, é tão novo que parece ter eterna juventude e nunca se tornar obsoleto; tão puro e, além disso, tão profundo de modo a ter transcendido a compreensão e o reconhecimento de parte daquela “geração” – por tanto tempo dominante, mas cujo domínio agora se aproxima do fim – a qual, por causa de sua grosseira materialização das coisas espirituais, foi qualificada por Jesus de “adúltera”.

            E, contudo, um evangelho tão simples e direto que possa ser lido sem problemas, e que, do mesmo modo, possa ser compreendido e observado; e, também, tão único, elevado e poderoso a respeito dos mais altos interesses do homem, que sua supressão sempre foi o primeiro objetivo daqueles que buscam por meio da degradação e perdição do homem os seus próprios ganhos e promoção.

            Seu apelo e sua exortação é ao critério todo abarcante da Experiência, da Razão e da Revelação, e esses em suas modalidades mais plenas e elevadas. Pois, afirmando – como ele de fato afirma – representar Toda a Humanidade de Intelecto e Intuição purificados, desenvolvidos, equilibrados, fundidos em uma unidade e polarizados em direção ao Supremo, esse “novo evangelho da interpretação” não se contenta com nada menos do que o Mais Elevado, e – desse modo – realmente alcançando o Mais Elevado, ele apela com plena confiança ao Mais Elevado, antecipando o mais amplo reconhecimento por parte daqueles que tenham mais plenamente alcançado o Mais Elevado.

            E tudo isso sem restringir o número dos participantes da Igreja visível e militante aqui na terra; mas também incluindo aqueles que, quer estejam encarnados ou fora do corpo, transcenderam tanto o terreno quanto o astral e se tornaram membros da Igreja celestial. Pois, verdadeiramente, é dessa Igreja celestial que o “novo evangelho da interpretação” é diretamente derivado, suas comprovações, tanto intrínsecas quanto extrínsecas, são tamanhas que não admitem qualquer possibilidade de questionamentos por parte daqueles que, tendo conhecimento dessas provas, estão qualificados para a sua apreciação.

            Isso porque aquilo que sua doutrina promulga não se trata de opinião ou conjectura, porém de conhecimento positivo obtido por meio da experiência e em primeira mão, “confirmada cada palavra, pela boca de duas testemunhas” – seus diretos recebedores e formuladores. Esses recebedores foram encarregados, treinados e iniciados não por quaisquer mãos terrenas, e o que foi por meio deles transmitido foi como algo que eles próprios de fato “ouviram e viram, e suas mãos trabalharam do Verbo da vida” – nenhuma experiência necessária lhes sendo negada no sentido de qualificá-los para a sua tarefa – não fazendo, contudo, qualquer apelo a autoridade ou pessoa, instituição ou livro, porém ao Entendimento.

            E se for perguntado como, ou sob quais circunstâncias precisamente, um evento tão relevante aconteceu, e que sinal, se houver algum, existe para mostrar que o Salvador que ele afirma restaurar é de fato o mesmo que Aquele de quem, segundo se diz, o homem tem sido tão cruelmente defraudado, e que o Cristo do transmitido “Evangelho da Interpretação” é idêntico Àquele do aceito Evangelho da Manifestação – isto deveria seguramente ser suficiente: Ele teve seu nascimento entre os animais.

            Pois os terríveis maus tratos aos animais, culminando nas mãos dos torturadores científicos, foram as últimas gotas que fizeram derramar com angústia, indignação e ira, corações que já estavam saturados com sentir a degradação e sofrimento do mundo causado pelo Sacerdotalismo, arrancando deles o grito que clama aos céus para Sua descida, e em resposta direta e imediata ao que Ele veio.

            Pois o “Novo Evangelho da Interpretação” foi transmitido em expresso reconhecimento do esforço determinado, por meio de um pensamento absolutamente corajoso e livre, para alcançar às alturas mais elevadas, para perscrutar os mais profundos abismos, e penetrar os mais íntimos recessos da Consciência, em busca da solução do problema da Existência, com a segura convicção de que, quando encontrada, ela se provaria ser uma solução que tornaria, acima de todas as coisas, a Vivissecção algo impossível, se não por outras razões, por demonstrar que a constituição das coisas é de tal modo que, por mais terrível que seja a situação das vítimas agora, a situação dos seus torturadores será indescritivelmente pior no futuro; como tem se provado, com absoluta certeza ser verdade, para a plena afirmação, ao mesmo tempo, da Justiça Divina e do Divino Amor.

            Tal é o espírito no qual o trabalho da “Nova Interpretação” foi concebido e executado; e tal foi a maneira da Vinda – a Segunda Vinda – Dele, o Exemplar Típico do divino, devido à Plena e Equilibrada Humanidade, de quem se disse que “quando vier, Ele restaurará todas as coisas, e salvará tanto aos homens quanto aos animais”; posto que Ele é, em Si mesmo, a demonstração pessoal da presença “do mesmo espírito incorruptível em todas as coisas”.

            Assim, que o Cristo tenha tido Seu nascimento em uma caverna, num estábulo e entre os animais, não foi só porque não havia “lugar nas hospedarias” de um mundo repleto de falsidades, futilidades e positivas insanidades, em relação à humanidade da qual Ele é o representante; mas também porque a divindade da qual Ele é a realização é a herança comum de todas as individuações da Consciência Universal, por mais insipiente que possa ser o seu grau de desenvolvimento. Razão pela qual os menores são seus irmãos, não menos do que os mais avançados. E de forma análoga tanto para seus amigos como para seus torturadores – mas com que tremenda diferença de significância! – Ele agora dirige, como o fez antes, as veementes palavras: “Em verdade vos digo que, aquilo que o fizestes a um destes Meus irmãos, mesmo dos mais pequeninos, a MIM o fizestes”! [Mateus 25:40] Pois, “assim vem Ele, trazendo a recompensa, para dar a cada homem de acordo com o que forem suas obras” [Apocalipse 22:12]; e, “para julgar os vivos e os mortos”; – os vivos, ou seja, aqueles que estão vivos com um espírito vivo porque amoroso; e os mortos, aqueles que estão “mortos em transgressões e pecados” por meio de sua determinada supressão, neles mesmos, de tudo aquilo que está significado por Ela, a “Mulher”, a Intuição, cujo Filho Ele é, e a consequente máxima insensibilidade para tudo o que não seja “o terreno, o sensual, o demoníaco”.

            A função declarada do Cristo é redimir ao máximo. E é por essa razão que o “Novo Evangelho da Interpretação” soa bem alto e em bom som a sua nota chave – “A terra não pode ser redimida no homem apenas; mas todas as criaturas devem compartilhar dos benefícios da sua redenção”. Pois todos são Um: e o “Amor é o reconhecimento do Ser Onipresente; o conhecimento de Deus nos outros”.

            Até mesmo o próprio inferno não está fora do alcance dos benefícios de uma terra redimida. Pois “Ele desceu aos infernos”: – não como o Sacerdotalismo tem impiedosamente alegado, ou seja, para exemplificar a implacabilidade da Natureza Divina, por suportar em sua própria pessoa os tormentos devidos aos pecados do mundo, mas sim para demonstrar a infinitude do amor divino a fim de que, desse modo, Ele possa salvar aqueles que desejam ser salvos.

 

Dra. Anna Kingsford - Cristo, a Realização no Homem de Suas Próprias Potencialidades Divinas

 

 Do que vimos nos capítulos anteriores, o Cristo da Bíblia, o Cristo de Deus, o Cristo da Natureza e o da Gnose não é nenhum personagem único, anormal, inconcebível, de constituição híbrida e desordenada, tal como é aquele Cristo apresentado pelo Sacerdotalismo.

            Sendo o equivalente, no homem, do Logos na Deidade, Ele é a Perfeita Razão de Deus na manifestação. Ele é o cumprimento, e não a subversão, da ordem natural-divina, a realização, tanto para o indivíduo quanto para o universal, das divinas potencialidades próprias e comuns a todos, em virtude de sua origem e constituição, pela lei imutável da Hereditariedade; o fruto maduro da semente implantada em todo homem, a semente de sua própria regeneração; a demonstração da “jóia preciosa” da divindade “nascida na fronte do sapo”, símbolo alquímico da matéria. E Nele, definido dessa forma, é devolvido ao homem o Salvador, o qual lhe foi privado pelos seus sacerdotes.

            Geração, degeneração, regeneração – esses são os três termos da história espiritual do homem. O primeiro e o último são obras de Deus; o segundo é obra do próprio homem. Pois todas as coisas se dão pela geração, a qual é o produto da interação entre a Força e a Substância, Pai e Mãe, respectivamente, o resultado dependendo da vontade do gerador.

            Uma vez gerado, o homem é livre para se degenerar, até que chegue seu tempo de ser regenerado. Suas possibilidades de regeneração dependem do uso que fez de seu período de liberdade. A evolução se dá por meio da geração; mas a escada da mesma pode ser descida até que se alcance uma condição na qual a regeneração é impossível, e a extinção, inevitável. O período da Graça subentendido na expressão “setenta vezes sete” expirou para ele.

            As assim chamadas expressões “denunciatórias” da Bíblia e do Credo, são simplesmente afirmações da necessidade da observância das leis do ser para a salvação. Isso tanto para a vida espiritual como para a vida física. As condições essenciais à vida devem, em ambos os casos, ser respeitadas. E do mesmo modo que o fisiologista, se expressando na linguagem técnica de sua ciência, fala de forma afirmativa quando declara que se não for pelo cumprimento de certas funções pelo sistema físico do homem, ele sem dúvida perecerá; assim também falam de forma afirmativa aqueles que dizem o mesmo a respeito do sistema espiritual do homem. As condições da vida eterna, assim como as da vida passageira, estão fundamentadas na natureza das coisas; e não há nada de arbitrário na afirmação dessas condições por aqueles que as conhecem, mesmo que a linguagem usada seja técnica e não compreendida pelos ignorantes. O dogmatismo consiste tão somente na afirmação positiva daquilo que a própria pessoa que afirma não conhece positivamente.

            A Bíblia especifica dois pecados como tendo um caráter especialmente hediondo e fatal, cuja natureza seus expositores oficiais falharam em compreender, ou pelo menos em tornar conhecido. Eles são chamados de “Anti-Cristo” e de “Blasfêmia contra o Espírito Santo.” Eles são essencialmente de uma mesma espécie, ainda que suas manifestações sejam diversas.

            A chave agora restaurada acusa o Sacerdotalismo, desde seu começo, de representar o cometimento sistemático desses pecados em todas as suas manifestações.

            “É Anti-Cristo aquele que nega o Pai e o Filho.” [1 João 2:22] O Pai e o Filho são negados quando se nega a Mãe. Pois excluir, da forma que o Sacerdotalismo excluiu, o princípio feminino da divindade – a Substância – é tornar impossível a relação simbolizada pelos termos Pai e Filho, tendo em vista que eles implicam e envolvem Esposa e Mãe.

            Algo semelhante ocorre em relação ao pecado contra o Espírito Santo. Tanto em repouso como em atividade, na Divindade e na manifestação, a unidade divina deve compreender a dualidade, Força e Substância, Pai e Mãe, para tornar possível aquela eterna geração por meio da qual se dão a criação e a redenção, e nisso a manifestação de Deus em Cristo.

            Que o pecado dessa negação com respeito ao Espírito Santo “jamais será perdoado, nem no mundo de hoje, quer naquele que está por vir” [Marcos 3:29], é porque, sendo um pecado contra o princípio essencial, tanto da Existência Atual como Daquilo que Será, ele carrega sua própria punição consigo. Ao negar que o Universo é gerado por Deus, e constituído pela própria força e substância de Deus, nega-se que o Universo seja uma manifestação de Deus; nega-se, portanto, aquela correspondência entre Deus e a criação em virtude da qual “coisas invisíveis de Deus são claramente vistas, sendo compreendidas pelas coisas de que são feitas” [Romanos 1:20].

            E isso nega a regeneração como o processo da manifestação de Deus através da individuação do homem, e negar isso é negar Cristo como o coroamento da evolução e, portanto, da criação.

            Postulando como o material da existência algo que – não sendo essencialmente Deus – é irreal e não relacionado a Deus, tal negação constitui a negação de qualquer relação vital entre Deus e o Universo, tal como a de paternidade e filiação, ao ponto da exclusão da idéia do dever de um para com o outro, em ambas as direções. E considerar Deus apenas como Força, e não Substância; Vontade apenas, e não Amor; coloca no lugar de um Deus vivo e de um Universo vivo tão somente causa e efeito mecânicos e inconscientes.

            A frase de Jesus: “meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus” [João 20:17], é uma afirmação da divindade da substância e, consequentemente, da consubstancialidade de Deus e do homem. Foi tão somente o Sacerdotalismo que transformou o homem em um “filho do diabo”. Ao fazer isso o Sacerdotalismo atribuiu ao homem precisamente a paternidade que Jesus atribui ao próprio Sacerdotalismo, como quando dirigindo-se aos seus perseguidores e assassinos sacerdotais, ele diz: “Vós sois do vosso pai, o diabo”. [João 8:44]

Dra. Anna Kingsford - Homem, a Expressão Individualizada de Princípios Existentes em Deus

 

     Seria um erro censurar essa doutrina como antropomorfismo supondo que ela atribua limitações humanas a Deus. Não se trata de antropomorfismo uma doutrina que reconheça Deus como os princípios dos quais o homem é expressão e manifestação individualizada. E quando a Bíblia diz, como ela o diz através de São Paulo, que as “coisas invisíveis de Deus, desde a criação do mundo, são claramente vistas, sendo compreendidas pelas coisas que estão feitas, até mesmo Seu poder eterno e Divindade” [Romanos 1:19-21], e acrescenta que aqueles que falham em assim discernir a natureza de Deus a partir de Suas obras “não tem desculpa”, censurando aqueles que, ao negarem a correspondência entre Deus na Seidade de Deus e Deus na criação, fazem de Deus algo essencialmente distinto e diferente do homem, ao ponto de negarem qualquer relacionamento e semelhança entre eles.

            Que a doutrina da Dualidade na Unidade tem sido, sob a denominação de “biunidade”, gravemente desfigurada por alguns que, dizendo reconhecê-la, visam apenas apresentá-la de uma maneira calculada para desacreditá-la, muito longe de ser uma razão para rejeitar essa doutrina, é uma razão para uma mais enfática afirmação e mais exata definição da mesma. Pois isso prova a importância atribuída a ela, como meio de redenção do homem, por aqueles – os reais autores da perversão – que buscam desse modo servir, não ao homem, porém seus próprios propósitos maléficos.

            Aquilo que no plano físico é chamado sexo, é a manifestação em última instância do dualismo que, subsistindo na Divindade como Força e Substância originais, constitue Deus o Pai-Mãe universal. E ao invés dessa correspondência implicar qualquer menosprezo à Divindade, ela deve servir para a redenção do sexo da baixa consideração comumente atribuída a ele, ao elevar o exercício de suas funções ao nível de um sacramento. Não é pelo repúdio do natural que o homem eleva a si mesmo em direção ao divino, mas pela purificação. E para o cumprimento desse objetivo não há método mais eficaz do que o reconhecimento do natural como a expressão do divino, conforme sugerido na prescrição Paulina de tudo realizarmos “para o Senhor”. [p. ex: Romanos 14:8]

            O dualismo representado pelos termos masculino e feminino, nem se origina no material, nem termina com o material; ele é derivado por meio do material a partir do substancial e divino. Pois ele representa a potência dual do espírito, tão somente em virtude da qual Deus encontra manifestação na Criação. Pois Criação é manifestação, e a manifestação se dá por geração, e a geração não é de um, mas de dois; embora, como na humanidade, os dois subsistem no um. E que tal dualismo constitua o homem pai e mãe no derivado e no individual, é somente porque ele constitui Deus Pai e Mãe no original e no universal.

            Dá-se o mesmo em todos os planos da existência. Pois “há uma lei, e Aquele que opera é Um”. O método de Deus é invariável assim como a natureza de Deus, e em todos os lugares a dualidade na Unidade de Deus encontra expressão. Unicamente é a palavra de Deus aquilo que “penetra até o que separa alma e espírito, juntas e medulas, e discerne as disposições e intenções do coração” [Hebreus 4:12] e distingue entre os dois fatores, o dual, na unidade divina. Vontade e Amor, Sabedoria e Compreensão, Espírito e Alma, Mente e Consciência Moral, Intelecto e Intuição – cada dualismo representa a conjunção das duas potências representadas pelos termos masculino e feminino, e seus fatores são masculinos e femininos um para o outro. E precisamente à medida que, e somente à medida que, como o produto de qualquer um deles representa sua mútua interação, e isso exercido em um espírito puro, é tal produto “nascido de Deus”, e é divino. “No celestial todas as coisas são pessoas”; e o método divino, da mesma forma para a criação como para a redenção, é por geração. E que a última seja chamada regeneração, é porque consiste na nova geração do indivíduo a partir do dualismo espiritual de seu sistema, sua Força e Substância, Espírito e Alma, os quais são divinos porque sendo puros são Espírito Santo e Virgem Maria, Pai e Mãe do Cristo-Jesus dentro dele. E sem tal regeneração não há qualquer salvação; porque “Vós deveis nascer de novo, da água e do Espírito”. “O Espírito de Deus se move sobre a face das águas” de Deus como individualizado na alma do homem, dando origem à Palavra – “Deus disse” – onde Deus encontra expressão e manifestação, como tão somente assim pode se dar, através da dualidade na unidade do Espírito.

            De onde segue-se que, sendo capazes como são todas as coisas, não importa quão puras em si mesmas, de serem degradadas, e certo como são de serem degradadas, por mentes que são elas mesmas degradadas; e excelentes como podem ser, e às vezes o são, os indivíduos que rejeitam – e os motivos que os impelem a rejeitar – a doutrina que está sendo exposta, a real fonte da objeção não se origina do que é elevado, mas sim do que é inferior. Pois ela é induzida pelo desejo de criar entre Deus e o homem uma tão absoluta diferenciação, tanto quanto à substância como quanto à constituição, de tal modo que essa diferenciação efetivamente afaste o homem do reconhecimento e, consequentemente, da realização das potencialidades divinas as quais, como sua inalienável herança, lhes chegam inevitavelmente a partir da relação que, em virtude de tal identidade, subsiste entre ele e Deus.

            É com referência, precisamente, a essa insidiosa introdução de erro fatal, sob o plausível véu dos excelentes motivos, que “Satã” é mencionado como sendo “transformado em um anjo de luz”. E é exatamente a negação da substância, e da divindade dessa, que se constitui, em sua modalidade mais flagrante, a “blasfêmia contra o Espírito Santo”; aquele pecado de caráter odioso e imperdoável, do qual as condições atuais do mundo são a demonstração; a responsabilidade disso recaindo sobre o Sacerdotalismo como o agente e o perpetuador da Queda.

Invocações e Evocações: Vozes Entre os Véus

Desde as eras mais remotas da humanidade, o ser humano buscou estabelecer contato com o invisível. As fogueiras dos xamãs, os altares dos ma...