sábado, 14 de agosto de 2021

Hipótese de Gaia

A hipótese de Gaia, também denominada hipótese biogeoquímica, é uma hipótese da ecologia profunda que propõe que a biosfera e os componentes físicos da Terra (atmosfera, criosfera, hidrosfera e litosfera) são intimamente integrados de modo a formar um complexo sistema interagente que mantém as condições climáticas e biogeoquímicas preferivelmente em homeostase.


Originalmente proposta pelo investigador britânico James E. Lovelock em 1972 como "Hipótese de resposta da Terra", ela foi renomeada conforme sugestão de seu colega, William Golding, como Hipótese de Gaia, em referência à mitológica titã que personificava a Terra: Gaia. A hipótese é frequentemente descrita como a Terra sendo um único organismo vivo, mas é uma definição inexata. Lovelock e outros pesquisadores que apoiam a ideia atualmente consideram-na como uma teoria científica, não apenas uma hipótese, uma vez que ela passou por testes de previsão.


A ideia geral de que a vida e seu substrato inorgânico são interdependentes não era nova. À parte as concepções teológicas e filosóficas existentes desde a Antiguidade sobre a natureza divina da Criação e de uma consciência e uma vida superiores imanentes tanto no seres vivos como nos objetos inanimados, cientistas alemães e britânicos vinham trabalhando objetivamente nesta área desde o século XVIII. A partir do fim do século XIX, alguns russos levaram adiante essas ideias, mas, devido a barreiras linguísticas e culturais, e ao posterior fechamento do bloco comunista, elas tiveram repercussão praticamente nula na comunidade científica internacional.


A hipótese como é hoje conhecida foi desenvolvida nos anos 1960 pelo cientista britânico James Lovelock, após ele participar de uma equipe da NASA que analisou a possibilidade de existir vida em Marte. Ele publicou seus primeiros textos em 1972, e logo passou a contar com a colaboração decisiva da microbióloga norte-americana Lynn Margulis, que se manteve por décadas. Seu ponto de partida foi o estudo da composição da atmosfera terrestre, que, segundo eles, seria muito diferente da esperada para um planeta situado na posição entre Vênus e Marte (a chamada zona habitável do Sistema Solar), por conter, em sua composição, grandes quantidades de certos gases como o oxigênio, óxido nitroso e metano. Segundo sua proposição, essa composição só poderia ser explicada pela interferência dos organismos vivos sobre o ambiente inorgânico. A partir disso, analisando outras evidências, foi postulado que, após surgir em um planeta deserto, a vida assume o controle do ambiente inorgânico e passa a modificá-lo em seu próprio benefício, a fim de que a vida possa se perpetuar, formando, nesse processo, um sistema complexo e autorregulante, que chamou de Gaia. Na sua visão, os componentes inorgânicos como a atmosfera são considerados parte da biosfera, porque são integrados intimamente ao processo evolutivo da vida. Ao mesmo tempo, eles questionavam a própria definição do que é vida e do que é um organismo vivo.


Apesar de reconhecer que ainda havia um longo caminho a ser percorrido antes de que a existência de um sistema terrestre autorregulante como o descrito fosse provada, esses questionamentos criaram uma zona difusa na definição clássica da vida, e levaram muitos a acreditar que estava sendo postulada a ideia de que a Terra seria ela própria um ser vivo dotado de alguma forma de inteligência e propósito, o que não corresponde à hipótese como ela foi articulada originalmente. O batismo da hipótese com o nome de uma deusa grega — uma sugestão de seu amigo, o escritor William Golding — junto com outras opiniões heterodoxas de Lovelock, só fizeram aumentar a confusão e a rejeição de toda a hipótese pelos cientistas alinhados ao darwinismo, embora ela fosse abraçada com entusiasmo pelos ambientalistas da época.


É importante distinguir entre essa impressão e a proposição original, a de que a vida assume o controle da Terra e a modifica, passando a formar um sistema ampliado e dinâmico que se comporta "como se fosse" um todo vivo. Segundo Lovelock, essa "entidade viva" é apenas uma metáfora para os processos biológicos atuantes no planeta, onde as criaturas concorrem para controlar uma variedade de componentes do sistema inorgânico, como a temperatura do globo, a composição do solo e da atmosfera, da salinidade dos mares, e outros, que podem ser comparados aos processos internos de um ser vivo, como a regulação da temperatura corporal, da composição do sangue e outros. Mais tarde ele esclareceu esses enganos interpretativos em palestra na Universidade das Nações Unidas:


"Nossa primeira definição do conceito foi: 'A vida regula o clima e a composição da atmosfera mantendo-os em um estado ótimo para si mesma". Mais tarde percebi que a definição era errônea. O que devíamos ter dito é: 'O sistema como um todo — a vida e seu ambiente material — regula a si mesmo em um estado confortável para os organismos". Isso pode lhes parecer uma boa definição, mas nos tornou vulneráveis à crítica de que havíamos proposto uma Gaia consciente e capaz de controlar a Terra conscientemente. Nada está mais longe de nossa ideia do que isso. Desde o início, entendemos Gaia como uma interpretação dos sistemas da Terra, como a ciência dura de um químico que se interessa por teorias de controle. Jamais imaginamos qualquer tipo de corrente New Age de pseudociência.


Em 1979, ele publicou um livro que se tornou popular no movimento ambientalista, Gaia: Um Novo Olhar sobre a Vida na Terra, atraindo também a atenção de vários cientistas, que passaram a dar mais atenção ao que ele propunha. Rene Dubos elogiou a teoria em artigo aprovado pela prestigiosa revista Nature, o físico Philip Morrison, escrevendo para a revista Scientific American, a considerou uma excitante e inovadora forma de interpretação do sistemas da Terra, e Stephen Schneider, diretor de Estudos Avançados do National Center for Atmospheric Research, disse que "a Hipótese de Gaia é um brilhante princípio organizador que reúne pessoas que normalmente não falavam entre si, como os biólogos, os geoquímicos e os cientistas da atmosfera, e os leva a fazer perguntas do tipo 'como chegamos até aqui?' e 'como funciona o mecanismo?' Em seu nível mais essencial, a teoria de Lovelock força os geólogos e biólogos a enfrentarem a pergunta: 'Quão importante é a vida para a evolução e funcionamento da Terra?" Em breve a hipótese estava sendo largamente debatida na comunidade científica. Uma conferência organizada em 1985 pela National Audubon Society gerou mais de 1 300 páginas de artigos e comentários, mas a polêmica continuava grande, porque o conhecimento da época sobre os fenômenos naturais era muito menor do que o de hoje, havendo muito mais incertezas em vários níveis, mas também porque seus conceitos foram apropriados de maneira indiscriminada e equivocada por movimentos populares e pseudo-científicos, dando-lhes mesmo contornos místicos. Porém, é fato que suas concepções tinham implicações transcendentais. Stephan Harding, seu colaborador, assim as descreveu:


"Uma abordagem [da vida] na perspectiva de Gaia abre novas portas para a percepção e amplia nossa visão da interdependência de todas as coisas do mundo natural. Há, nesse relacionamento, uma qualidade sinfônica, uma qualidade que transmite uma magnificência indizível. Quando você se coloca em um penhasco à beira do mar, durante o inverno, observando as massas de nuvens cinzentas rolando, uma visão Gaia ajuda a entender a nuvem em seu contexto global. Ela se forma devido a imensas forças climáticas e se manifesta em um pequeno ponto do todo — o ponto em que você está. A água da nuvem circulou ao longo do ciclo da água, desde a chuva até o rio, do rio para o mar, do mar para os cocolitóforos, e de lá de volta para a nuvem. À medida que você experimenta esta realidade dinâmica e sempre mutante, você pode subitamente se encontrar em um estado de meditação, um estado em que você perde o senso de ser uma entidade separada, e é totalmente envolvido pelo processo vital que contempla. O contemplado e o contemplador se tornam um só. Desta unidade surge uma apreciação profunda da realidade da interdependência, e disso nasce a urgência de se envolver no combate a todo tipo de abuso da natureza. Disso nasce o sentimento de que o que acontece na evolução tem um grande valor e um significado impossível de articular ou descobrir através do reducionismo da metodologia científica. Esta sensibilidade altamente desenvolvida, essa experiência de conectividade radical, é a marca dos apoiadores da ecologia profunda, e é a base para a elaboração de qualquer filosofia ecológica".


Legado

Ainda existe bastante controvérsia na questão semântica de se atribuir a denominação de "ser vivo" a um conjunto interdependente de populações biológicas em seu planeta físico, e algumas de suas proposições ainda não foram provadas, mas outras foram ratificadas com sólidas evidências. O ponto mais debatido é até que nível a vida é capaz de modificar seu ambiente em seu favor e mantê-lo em homeostase, mesmo a despeito de ameaças catastróficas e das diferentes necessidades que os seres têm para viver, que muitas vezes são mutuamente excludentes. Há casos em que os organismos podem modificar o ambiente de maneira tal que o resultado final do processo é nocivo para eles mesmos ou para outros seres, o que para alguns críticos inviabiliza uma aplicação geral da teoria. Também questiona-se se os feedbacks entre organismos e ambiente seguem as leis do darwinismo, como foi sugerido por Lovelock, e contesta-se que a evolução das espécies tenha ocorrido de forma mais cooperativa do que competitiva.


As dificuldades aumentam na medida em que Lovelock fez declarações que parecem se contradizer em aspectos essenciais, como pensam Nunes Neto & El-Hani: "A análise [...] de passagens importantes de sua obra permite que concluamos que Lovelock explica o funcionamento de Gaia proposto por sua teoria de maneira teleológica, apelando repetidamente para as idéias de propósito, homeostase, otimização ou função. A despeito disso, ele rejeita a ideia de teleologia de maneira peremptória, como ilustra a seguinte afirmação a respeito dele e de Margulis: 'Em nenhuma parte de nossos escritos, nós expressamos a ideia de que a autorregulação planetária tem um propósito, ou envolve previsão ou planejamento pela biota'." Apesar dessas aparentes incongruências, apoiados na opinião de outros, Nunes Neto & El-Hani reconhecem que as explicações teleológicas e funcionais de alguma forma podem ser necessárias para uma compreensão mais ampla e precisa dos sistemas terrestres. De qualquer maneira, a existência de uma influência mútua entre ambiente e seres vivos, e a capacidade dos seres vivos de modificar o ambiente pelo menos em alguma medida, afim de que sua sobrevivência seja assegurada, são hoje largamente aceitas. É incontroversa a ação da biosfera na manutenção dos ciclos biogeoquímicos de elementos essenciais como o carbono, nitrogênio, fósforo, enxofre, oxigênio, cálcio, magnésio e outros, sem os quais a preservação da vida na Terra seria impossível.


Mais do que isso, a hipótese abriu todo um novo campo de estudos nas Ciências da Terra, e contribuiu para abalar a concepção mecanicista da vida e do universo, favorecendo uma visão holística em que fica evidente a estreita dependência de todos os seres vivos entre si e com o mundo em que vivem. Também foi importante para a formação de uma mentalidade mais ética em relação à natureza, em uma época em que a destruição do ambiente é vasta e disseminada, e se torna perigosa para a sobrevivência da própria humanidade. Em 2006 Lovelock foi distinguido com a Medalha Wollaston da Sociedade Geológica de Londres pelos avanços introduzidos no campo científico principalmente com esta teoria. O juri de premiação assim justificou:


"Mesmo na ilustre história da mais antiga medalha da Sociedade, concedida pela primeira vez a William Smith em 1831, é raro que se possa dizer que o recipiente abriu todo um novo campo no estudo nas Ciências da Terra. Mas este é o caso do vencedor deste ano, James Lovelock. Em sua longa e distinta carreira na ciência, o que não faltam são premiações. [...] Mas Lovelock ganhou uma proeminência realmente alta com um conceito que capturou a imaginação tanto dos cientistas da Terra e dos biólogos como do público leigo — o conceito pelo qual os geólogos o homenageiam hoje — a Hipótese e Teoria de Gaia. Esta visão do planeta e da vida que ele sustenta como um sistema unificado e complexo, de certas maneiras análogo a um organismo autorregulado homeostaticamente, deu nascimento ao domínio científico que hoje conhecemos como Ciência do Sistema Terrestre [...]

"É difícil enfatizar demais a natureza unificante desta visão holística do mundo, que derrubou barreiras disciplinares artificiais que existiam desde o fim do século XVIII e o início do século XIX, quando Sociedades como a nossa foram fundadas, e a maravilhosa riqueza de compreensão que emanou da multidisciplinaridade que surgiu a partir dela. Isso vale especialmente para o entendimento dos feedbacks entre a vida e seu ambiente, especialmente a hipótese CLAW, e em toda a ideia de que a vida, interagindo com seu ambiente material, regula a temperatura planetária e sua composição química ao longo de extensos períodos geológicos através de processos de decomposição de silicatos".


A hipótese continua popular em meios extracientíficos, tendo sido expandida e transformada de múltiplas maneiras. Tem sido um motivo originador de obras de arte, literatura, filmes, quadrinhos, e exerce um efeito importante na ficção científica; foi incorporada a cultos religiosos e correntes místicas, filosóficas e ambientalistas, e está presente de maneira ampla na cultura de massa.

Pampsiquismo

 


Na filosofia, pampsiquismo, em algumas formas correntes, mas fora do Novo Acordo Ortográfico, panpsiquismo, é a visão de que a mente ou um aspecto semelhante à mente é uma característica fundamental e onipresente da realidade. Ele assumiu uma ampla variedade de formas. Os proponentes acadêmicos contemporâneos sustentam que a senciência ou a experiência subjetiva é onipresente, embora distanciam essas qualidades dos complexos atributos mentais humanos; atribuem uma forma primitiva de mentalidade a entidades no nível fundamental da física, mas não a atribuem à maioria dos agregados, como rochas ou edifícios (como defendido em algumas crenças de animismo e xamanismo). Por outro lado, alguns teóricos históricos imputaram atributos como vida ou espírito a todas as entidades.


O panpsiquismo é uma das teorias filosóficas mais antigas, e tem sido atribuída aos filósofos incluindo Tales, Platão, Spinoza, Leibniz, William James, Alfred North Whitehead, e Galen Strawson. Durante o século XIX, o panpsiquismo era a teoria padrão da filosofia da mente, mas viu um declínio durante os anos intermediários do século XX, com o surgimento do positivismo lógico. O interesse recente no problema difícil da consciência reavivou o interesse no panpsiquismo.


Etimologia

O termo "pampsiquismo" tem origem no termo grego pan (πᾶν: "tudo, todo") e psique (ψυχή: "alma, mente") como o centro unificador da vida mental de nós, seres humanos, e de outras criaturas vivas.": Psique vem da palavra grega ψύχω (psukhō, "sopro") e pode significar vida, alma, mente, espírito, coração e 'sopro da vida'. O uso de psique é controverso por ser sinônimo de alma, um termo geralmente tomado como tendo algum tipo de sobrenatural qualidade; termos mais comuns agora encontrados na literatura incluem mente, propriedades mentais, aspecto mental e experiência.


Terminologia

O filósofo David Chalmers, que explorou o pampsiquismo como uma teoria viável, distingue entre experiências micro fenomenais (as experiências de entidades microfísicas) e experiências macro fenomenais (experiências de entidades maiores, como seres humanos).


História

Antiguidade


As visões pampsíquicas são um tema básico da filosofia grega pré-socrática. Segundo Aristóteles, Tales (c. 624 - 545 A.E.C.), o primeiro filósofo grego, postulou uma teoria que sustentava "que tudo está cheio de deuses". Tales acreditava que tal era demonstrado por ímãs. Isso foi interpretado como uma doutrina pampsiquista. Outros pensadores gregos que foram associados ao pampsiquismo incluem Anaxágoras (que via o princípio subjacente ou arqué como Nous ou Mente), Anaxímenes (que via a arché como pneuma ou espírito) e a doutrina do Logos de Heráclito (que dizia "A faculdade de pensar é comum a todos").


Platão defende o pampsiquismo em seu Sofista, no qual ele escreve que todas as coisas participam da forma do Ser e que ela deve ter um aspecto psíquico da mente e alma (psique). No Filebo e Timeu, Platão defende a ideia de uma alma do mundo ou anima mundi. De acordo com Platão:


Este mundo é de fato um ser vivo dotado de alma e inteligência ... uma única entidade viva visível contendo todas as outras entidades vivas, que por sua natureza são todas relacionadas.


O estoicismo desenvolveu uma cosmologia que sustentava que o mundo natural era infundido com uma essência de fogo divina chamada pneuma, que era dirigida por uma inteligência universal chamada logos. A relação dos logos individuais dos seres com o logos universal era uma preocupação central do estoico romano Marco Aurélio. A metafísica do estoicismo baseou-se em filosofias helenísticas como o neoplatonismo e o gnosticismo, que também utilizavam a ideia platônica da anima mundi.


Renascimento

Após o fechamento da Academia de Platão pelo imperador Justiniano em 529 E.C., o neoplatonismo declinou. Embora houvesse pensadores cristãos medievais que se aventuraram no que poderia ser chamado de ideias pampsiquistas (como John Escoto Erígena, um cristão platonista), não era uma linha dominante no pensamento cristão. No Renascimento italiano, no entanto, o pampsiquismo desfrutou algo de um reavivamento intelectual, no pensamento de figuras como Gerolamo Cardano, Bernardino Telesio, Francesco Patrizi, Giordano Bruno e Tommaso Campanella. Cardano defendeu a visão de que alma ou anima era uma parte fundamental do mundo e Patrizi introduziu o termo atual pampsiquismo no vocabulário filosófico. Segundo Giordano Bruno: "Não há nada que não possua alma e que não tenha princípio vital". Ideias platonistas como a anima mundi também ressurgiram no trabalho de pensadores esotéricos como Paracelso, Robert Fludd e Cornelius Agrippa.


Período moderno adiantado

No século XVII, pode-se dizer que dois racionalistas eram pampsiquistas, Baruch Spinoza e Gottfried Leibniz. No monismo de Spinoza, a única substância infinita e eterna é "Deus ou Natureza" (Deus sive Natura), que possui os aspectos da mente (pensamento) e matéria (extensão). A visão de Leibniz é de que existe um número infinito de substâncias mentais absolutamente simples chamadas mônadas, que compõem a estrutura fundamental do universo. Embora tenha sido dito que a filosofia idealista de George Berkeley também é uma forma de puro panpsiquismo e que "os idealistas são panpsiquistas por padrão", também foi argumentado que tais argumentos confundem fenômenos mentalmente construídos com as próprias mentes. Berkeley rejeitou o panpsiquismo e postulou que o mundo físico existe apenas nas experiências que as mentes têm dele, enquanto restringe as mentes aos seres humanos e a certos outros agentes específicos.


Século XIX

No século XIX, o pampsiquismo estava no auge. Filósofos como Arthur Schopenhauer, C. S. Peirce, Josiah Royce, William James, Eduard von Hartmann, F. C. S. Schiller, Ernst Haeckel e William Kingdon Clifford, bem como psicólogos como Gustav Fechner, Wilhelm Wundt e Rudolf Hermann Lotze, todos promoveram ideias pampsiquistas.


Arthur Schopenhauer defendeu uma visão bilateral da realidade que era ao mesmo tempo Vontade e Representação (Vorstellung). Segundo Schopenhauer: "Toda mente ostensiva pode ser atribuída à matéria, mas toda a matéria também pode ser atribuída à mente".


Josiah Royce, o principal idealista absoluto americano, sustentou que a realidade era um "eu do mundo", um ser consciente que compreendia tudo, embora ele não necessariamente atribuísse propriedades mentais aos menores constituintes dos "sistemas" mentalistas. O filósofo pragmatista americano Charles Sanders Peirce adotou uma espécie de monismo psicofísico no qual o universo estava impregnado de mente, que ele associou à espontaneidade e à liberdade. Após Pierce, William James também adotou uma forma de pampsiquismo. Em suas notas de aula, James escreveu:


Nossa única noção inteligível de um objeto em si é que ele deve ser um objeto para si, e isso nos leva ao panpsiquismo e à crença de que nossas percepções físicas são efeitos sobre nós das realidades "psíquicas"


Em 1893, Paul Carus propôs sua própria filosofia semelhante ao panpsiquismo conhecida como 'panbiotismo', que ele definiu como "tudo é repleto de vida; contém vida; tem a capacidade de viver".


Século XX

No século XX, o proponente mais significativo da visão pampsiquista é, sem dúvida, Alfred North Whitehead (1861-1947). A ontologia de Whitehead viu a natureza básica do mundo como composto de eventos e o processo de suas criações e extinções. Esses eventos elementares (que ele chamou de ocasiões) são em parte mentais. Segundo Whitehead: "devemos conceber as operações mentais como um dos fatores que compõem a constituição da natureza".


As visões monistas neutras de Bertrand Russell tendiam ao pampsiquismo. O físico Arthur Eddington também defendeu uma forma de pampsiquismo.


O psicólogo Carl Jung, conhecido por sua ideia do inconsciente coletivo, escreveu que "a psique e a matéria estão contidas em um e mesmo mundo e, além disso, estão em contato contínuo entre si" e que é provável que "a psique e matéria são dois aspectos diferentes de uma e a mesma coisa". Os psicólogos James Ward e Charles Augustus Strong também endossaram variantes do pampsiquismo.


O geneticista Sewall Wright endossou uma versão do pampsiquismo. Ele acreditava que o nascimento da consciência não se devia a uma propriedade misteriosa de complexidade crescente, mas a uma propriedade inerente, implicando que essas propriedades estavam nas partículas mais elementares.


Contemporâneo

A doutrina pampsiquista recentemente viu um ressurgimento da filosofia da mente, desencadeado pelo artigo "Panpsychism" de Thomas Nagel em 1979 e ainda mais estimulada pelo artigo de Galen Strawson em 2006 "Realistic Monism: Why Physicalism Entails Panpsychism". Seus principais defensores nos Estados Unidos incluem Christian de Quincey, Leopold Stubenberg, David Ray Griffin, e David Skrbina. No Reino Unido, o caso do panpsiquismo foi apresentado nas últimas décadas por Galen Strawson, Gregg Rosenberg, Timothy Sprigge, e Philip Goff. O filósofo britânico David Papineau, embora se distancie dos panpsiquistas ortodoxos, escreveu que sua visão "não é diferente do panpsiquismo", na medida em que rejeita uma linha na natureza entre "eventos iluminados pela fenomenologia [e] aqueles que são meras trevas" O filósofo canadense William Seager também defendeu o panpsiquismo.

Em 1990, o físico David Bohm publicou "Uma nova teoria da relação entre mente e matéria", um artigo que propõe uma teoria panpsiquista da consciência baseada na interpretação de Bohm da mecânica quântica. Bohm tem um número de seguidores entre os filósofos da mente, tanto nos Estados Unidos (por exemplo, Quentin Smith) quanto internacionalmente (por exemplo, Paavo Pylkkänen). A doutrina também foi aplicada na filosofia ambiental pela filósofa australiana Freya Mathews. A editora de ciência Annaka Harris explora o pampsiquismo como uma teoria viável em seu livro Conscious, embora ela pare antes de endossar completamente a visão.

A teoria da informação integrada da consciência (TII), proposta pelo neurocientista e psiquiatra Giulio Tononi em 2004 e adotada por outros neurocientistas como Christof Koch, postula que a consciência é generalizada e pode ser encontrada mesmo em alguns sistemas simples. No entanto, não sustenta que todos os sistemas estejam conscientes, levando Tononi e Koch a afirmar que a TII incorpora alguns elementos do panpsiquismo, mas outros não. Koch se referiu à TII como uma "versão cientificamente refinada" do panpsiquismo.


Argumentos a favor

Problema difícil de consciência

Na filosofia da mente, o panpsiquismo é uma solução possível para o chamado problema difícil da consciência. David Chalmers, que formulou o problema difícil da consciência, argumentou que o panpsiquismo é uma das múltiplas teorias viáveis da consciência em The Conscious Mind (1996) e em trabalhos subsequentes. Chalmers argumenta contra qualquer solução redutiva para o problema difícil da consciência, apresentando três argumentos relacionados: o argumento explicativo, o argumento da concebilidade e o argumento do conhecimento. Ele então discute três possíveis explicações não redutivas da consciência, mas deixa em aberto a solução correta.


Argumento hegeliano

Num artigo subsequente, Chalmers baseou-se em sua exploração anterior do panpsiquismo e disse que um argumento "hegeliano" é o argumento mais convincente para o panpsiquismo, embora ele admita que não é definitivo. O argumento é hegeliano porque está centrado na dialética hegeliana e nos conceitos de tese, antítese e síntese.

Chalmers usa o argumento materialista do fechamento causal como sua tese e o argumento da concebilidade do dualismo mente-corpo como sua antítese. Chalmers argumenta que cada argumento é persuasivo e que a maneira mais persuasiva de resolver os dois simultaneamente é adotar uma forma de panpsiquismo, que é a síntese dos dois argumentos.

Chalmers, no entanto, leva seu argumento adiante e argumenta que, para a tese do panpsiquismo, existe uma antítese separada do panprotopsiquismo - a proposição de que tudo o que existe é protoconsciente, em oposição ao consciente. Chalmers propõe provisoriamente o monismo russeliano como uma síntese, mas ele não abraça completamente essa opção e, em vez disso, vê o panpsiquismo e o panprotopsiquismo como opções mais plausíveis.


Não-emergentismo

Problemas alegados com o emergentismo são frequentemente citados pelos panpsiquistas como bases para rejeitar teorias redutivas da consciência. Esse argumento pode ser rastreado até o psicólogo Wilhelm Wundt, que aplicou a frase ex nihilo nihil fit ("nada vem do nada") nesse contexto - dizendo que o mental não pode surgir do não mental.


Thomas Nagel

No artigo "Panpsychism" em seu livro Mortal Questions, de 1979, Thomas Nagel define o pampsiquismo como "a visão de que os constituintes físicos básicos do universo têm propriedades mentais",:181 que ele afirma serem propriedades não-físicas. Nagel argumenta que o pampsiquismo segue de quatro premissas:


(1) "Composição material", ou compromisso com o materialismo;

(2) "Não-reducionismo", ou a visão de que propriedades mentais não podem ser reduzidas a propriedades físicas;

(3) "Realismo" sobre propriedades mentais;

(4) "Não-emergência" ou a visão de que "não existem propriedades realmente emergentes de sistemas complexos".


Nagel observa que novas propriedades físicas são descobertas através de inferência explicativa de propriedades físicas conhecidas; seguindo um processo semelhante, as propriedades mentais parecem derivar de propriedades da matéria não incluídas no rótulo de "propriedades físicas" e, portanto, devem ser propriedades adicionais da matéria. Ele também argumenta que "a demanda por uma explicação de como os estados mentais necessariamente aparecem nos organismos físicos não pode ser atendida pela descoberta de correlações uniformes entre os estados mentais e os estados físicos do cérebro".:187 Além disso, Nagel argumenta que os estados mentais são reais, apelando à inexplicabilidade da experiência subjetiva, ou qualia, por meios físicos. Nagel vincula o panpsiquismo ao fracasso do emergentismo em lidar com a relação metafísica: "Não existem propriedades realmente emergentes de sistemas complexos. Todas as propriedades de sistemas complexos que não são relações entre ele e algo mais derivam das propriedades de seus constituintes e de seus efeitos sobre uns aos outros quando combinados". Assim, ele nega que as propriedades mentais possam surgir de relações complexas entre a matéria física.


Evolucionário

O argumento empiricamente mais popular para o panpsiquismo deriva do darwinismo e é uma forma do argumento da não-emergência. Esse argumento começa com a suposição de que a evolução é um processo que cria sistemas complexos a partir de propriedades preexistentes, mas que no entanto não pode criar propriedades "inteiramente novas". William Kingdon Clifford argumentou que:

[...] não podemos supor que um salto tão grande de uma criatura para outra deva ter ocorrido em qualquer ponto do processo de evolução como a introdução de um fato inteiramente diferente e absolutamente separado do fato físico. É impossível alguém apontar o local específico na linha de descendência onde esse evento pode ter ocorrido. A única coisa a que podemos chegar, se aceitarmos a doutrina da evolução, é que mesmo no organismo mais baixo, mesmo na ameba que nada em nosso próprio sangue, há algo ou outro, inconcebivelmente simples para nós, que é da mesma natureza com nossa própria consciência [...]


Física quântica

Filósofos como Alfred North Whitehead se basearam na indeterminação observada pela física quântica para defender o panpsiquismo. Uma linha de argumento semelhante foi repetida posteriormente por vários pensadores, incluindo o físico David Bohm, o anestesiologista Stuart Hameroff e filósofos como Quentin Smith, Paavo Pylkkänen e Shan Gao. Os defensores das teorias panpsiquistas de consciência quântica veem a indeterminação quântica e as relações informacionais, mas não causais, entre elementos quânticos como a chave para explicar a consciência. Essa abordagem também foi adotada por Michael Lockwood (1991).


Natureza intrínseca

Esses argumentos são baseados na ideia de que tudo deve ter uma natureza intrínseca. Eles argumentam que, embora os objetos estudados pela física sejam descritos de maneira disposicional, essas disposições devem se basear em alguns atributos intrínsecos não disposicionais, que Whitehead chamou de "realidade misteriosa em segundo plano, intrinsecamente incognoscível". Embora não tenhamos como saber como são esses atributos intrínsecos, podemos conhecer a natureza intrínseca da experiência consciente que possui características irredutíveis e intrínsecas. Arthur Schopenhauer argumentou que, embora o mundo nos pareça representação, deve haver 'um objeto que fundamenta' a representação, que ele chamou de 'essência interior' (das innere Wesen) e 'força natural' (Naturkraft), que fica fora daquilo que nossa compreensão percebe como lei natural.


Galen Strawson chamou sua forma de panpsiquismo de "fisicalismo realista", argumentando que "o experiencial é considerado especificamente como tal - a parte da realidade com a qual temos a ver quando consideramos experiências específica e unicamente em relação ao caráter experiencial que elas têm para aqueles que as têm conforme as tenham - tal 'apenas é' físico".:7


Acadêmicos como Roger Penrose (1989), John Searle (1991), Thomas Nagel (1979, 1986, 1999) e Noam Chomsky (1999), embora nem todos sejam defensores do panpsiquismo, disseram que uma mudança revolucionária na física pode ser necessária para resolver o problema da consciência.


Argumentos contra

Uma crítica ao panpsiquismo é que ele não pode ser empiricamente testado. Uma crítica relacionada é o que parece para muitos a natureza bizarra da teoria. John Searle afirma que o panpsiquismo é uma "visão absurda" e que termostatos carecem de "estrutura suficiente mesmo para serem um candidato remoto à consciência".


Alguns argumentaram que as únicas propriedades compartilhadas por todos os qualia são de que eles não são precisamente descritíveis e, portanto, têm significado indeterminado em qualquer filosofia que se baseia em definições precisas de acordo com esses críticos (isto é, tende-se a pressupor uma definição para mentalidade sem descrevê-la em qualquer detalhe real). A necessidade de definir melhor os termos usados na tese do panpsiquismo é reconhecida pelo panpsiquista David Skrbina,:15 e ele recorre a afirmar algum tipo de hierarquia de termos mentais a serem usados. Assim, diz-se que apenas um aspecto fundamental da mente está presente em toda a matéria, a saber, a experiência subjetiva. Outra resposta panpsiquista foi de que já sabemos o que são os qualia através da apreensão direta e introspectiva; e também sabemos o que é mentalidade consciente em virtude de sermos conscientes. Para alguém como Alfred North Whitehead, a descrição em terceira pessoa ocupa o segundo lugar na conexão íntima entre cada entidade e qualquer outra que é, diz ele, o próprio tecido da realidade. Tomar uma mera descrição como tendo realidade primária é cometer a "falácia da concretude extraviada".  


Os panpsiquistas contemporâneos separam os aspectos fenomenais e não cognitivos da consciência - qualia ou experiência subjetiva, a essência do problema difícil da consciência - da cognição. No entanto, ao colocar a experiência subjetiva como a natureza intrínseca do mundo físico, eles esperam evitar o problema da causação mental. No entanto, Robert Howell argumentou que todas as funções causais ainda são consideradas disposicionalmente (isto é, em termos dos comportamentos descritos pela ciência), deixando a fenomenalidade causalmente inerte. Ele conclui: "Isso nos deixa mais uma vez com qualia epifenomenais, apenas em um posto muito surpreendente".


O problema da combinação é frequentemente discutido como uma objeção ao panpsiquismo. Ele pode ser atribuída aos escritos de William James, mas recebeu seu nome atual por William Seager em 1995. Embora inúmeras soluções tenham sido propostas, elas ainda precisam obter ampla aceitação.


Em relação a outras teorias

Idealismo


O panpsiquismo concorda com o idealismo de que, em certo sentido, tudo é mental, mas, embora o idealismo trate a maioria das coisas como conteúdo mental ou ideias, o panpsiquismo as trata como semelhantes à mente, em certo sentido, e como tendo sua própria realidade. Além disso, em contraste com muitas formas de idealismo, sustenta que para todas as mentes existe um mundo único, externo, espaço-temporal, que não é apenas ideias em uma mente divina. O panpsiquismo é, portanto, uma forma de realismo.


Dualismo e teoria do duplo aspecto

Panpsiquistas e dualistas concordam que as propriedades mentais não podem ser reduzidas às propriedades físicas. A diferença é que os dualistas consideram as propriedades mentais e físicas pertencentes a categorias diferentes, praticamente sem nada em comum (por exemplo, a caracterização de Descartes da matéria e da mente como "extensão" e "pensamento", respectivamente), enquanto os panpsiquistas veem as propriedades físicas como a descrição quantitativa externa de propriedades mentais. Essa distinção também separa a teoria dos dois aspectos do panpsiquismo: embora os teóricos dos dois aspectos possam concordar com os panpsiquistas de que tudo tem algumas propriedades mentais, eles também sustentam que tudo tem algumas propriedades físicas, enquanto os panpsiquistas sustentam que as propriedades físicas são propriedades mentais.


Monismo neutro

O monismo neutro, introduzido pela primeira vez por Spinoza e depois proposto por William James e Bertrand Russell, não pressupõe (como o materialismo e idealismo) que mente e matéria são fundamentalmente separáveis. O monismo neutro é frequentemente associado à teoria de duplo aspecto, que sustenta que mental e físico são duas perspectivas de uma realidade que não é nem mental nem física. O panpsiquismo, por outro lado, sustenta que o físico é simplesmente o mental.


Fisicalismo e materialismo

O panpsiquismo abrange muitas teorias, unidas pela noção de que a consciência é onipresente; estes podem, em princípio, ser materialistas redutivas, dualistas ou alguma outra. Galen Strawson sustenta que o panpsiquismo é uma forma de fisicalismo, na sua opinião a única forma viável. Por outro lado, David Chalmers descreve o panpsiquismo como uma alternativa ao materialismo e ao dualismo. Philip Goff também descreve o panpsiquismo como uma alternativa ao fisicalismo e ao dualismo de substância.


Emergentismo

O panpsiquismo é incompatível com o emergentismo. Em geral, todas as teorias da consciência devem cair sob um ou outro guarda-chuva; elas devem sustentar que a consciência está presente em um nível fundamental da realidade (panpsiquismo) ou que emerge mais acima (emergentismo).


Animismo e hilozoísmo

O panpsiquismo é distinto do animismo ou hilozoísmo, que sustentam que todas as coisas têm alma ou estão vivas, respectivamente. Gustav Theodor Fechner afirmou em "Nanna" e "Zendavestá" que a Terra é um organismo vivo cujas partes são as pessoas, os animais e as plantas. Nem o animismo nem o hilozoísmo atraíram o interesse acadêmico contemporâneo.


Holismo

O panpsiquismo está relacionado, mas distinto da visão holística, de que todo o universo é um organismo que possui uma mente ("consciência cósmica" ou "consciência universal"). Essa última visão é compartilhada por algumas formas de pensamento religioso, como teosofia, panteísmo, cosmoteísmo, não-dualismo, pensamento da nova era e panenteísmo. O efeito do centésimo macaco exemplifica o limiar para essa consciência cósmica aplicada. A visão budista Tiantai é de que "quando alguém a alcança, todos a alcançam".:38  


Hilopatismo

O hilopatismo defende uma atribuição igualmente universal de senciência à matéria. Poucos escritores defenderiam um materialismo hilopático, embora a ideia não seja nova; foi formulado como "o que quer que esteja subjacente à consciência em um sentido material, isto é, o que quer que seja o cérebro que dá origem à consciência, deve necessariamente estar presente em algum grau em qualquer outra coisa material". Um estado mental composto não consiste em átomos psíquicos compostos. O conceito da consciência "ser em si" permite a ideia de matéria autoconsciente. Tentativas foram feitas para conceituar esse nível primitivo de existência antes da aprendizagem e da memória associativas. Como a coleção de matéria autoconsciente constitui um ser cognitivo, a coleção de seres cognitivos como uma entidade conglomerada reflete o panpsiquismo. A consciência não seria "nascente", mas emergente devido a uma falta de abandono durante a evolução da senciência material.


Ideias semelhantes foram atribuídas ao filósofo australiano David Chalmers, que argumenta que a consciência é uma característica fundamental do universo, e à qual ele também se refere como o Primeiro Datum no estudo da mente.


Na prática do não-reducionismo, essa característica pode não ser atribuível a nenhuma mônada base, mas radicalmente emergente no nível de complexidade física em que ela se demonstra. Elegância complexa é o desenvolvimento adicional da senciência que é autoconsciente. Podemos chamar isso de "pós-inteligência", onde "inteligência" é um processamento simples. O elemento de superioridade pode ser o fato de a pós-inteligência ser proto-experiencial. Essas propriedades fenomênicas são chamadas de "aspectos internos da informação".:162–170


Variantes

Panexperiencialismo

A forma de panpsiquismo em discussão na literatura contemporânea é mais especificamente conhecida como panexperiencialismo, a visão de que a experiência consciente está presente em todo lugar, em um nível fundamental. O panexperiencialismo pode ser contrastado com o pancognitivismo, a visão de que o pensamento está presente em todos os lugares em um nível fundamental, uma visão que teve alguns defensores históricos, mas que não conquistou adeptos acadêmicos atuais; como tal, panpsiquistas contemporâneos não acreditam que entidades microfísicas possuam estados mentais complexos como crenças, desejos, medos e assim por diante.


O panexperiencialismo está associado às filosofias de Charles Hartshorne e Alfred North Whitehead, entre outras, embora o termo em si tenha sido inventado por David Ray Griffin para distinguir a visão filosófica do processo de outras variedades de panpsiquismo. A fenomenologia ecológica desenvolvida nos escritos do ecologista e filósofo cultural americano David Abram é frequentemente descrita como uma forma de panexperiencialismo, como é a "biologia poética" desenvolvida pelo associado próximo de Abram, o biólogo alemão Andreas Weber.


A metafísica de Whitehead incorporou uma visão científica do mundo semelhante à teoria da relatividade de Einstein para o desenvolvimento de seu sistema filosófico. Sua filosofia de processo argumenta que os elementos fundamentais do universo são "ocasiões de experiência", que juntos podem criar algo tão complexo quanto um ser humano. Essa experiência não é consciência; não há dualidade mente-corpo nesse sistema, uma vez que a mente é vista como um tipo de experiência particularmente desenvolvido. Whitehead não era um idealista subjetivo e, embora suas ocasiões de experiência (ou "ocasiões reais") se assemelhem às mônadas de Leibniz, elas são descritas como constitutivamente inter-relacionadas. Ele abraçou o panenteísmo, com Deus abrangendo todas as ocasiões de experiência e ainda assim transcendendo-as. Whitehead acreditava que essas ocasiões de experiência são o menor elemento do universo - ainda menor que as partículas subatômicas. Construindo o trabalho de Whitehead, o filósofo do processo Michel Weber defende um pancriacionismo.


Panprotopsiquismo

Panprotopsiquismo é uma teoria relacionada ao panpsiquismo. Ele é discutido como uma teoria da consciência viável nos trabalhos de David Chalmers.


Cosmopsiquismo

Cosmopsiquismo é a teoria que o cosmos é um todo apropriado, um objeto unificado que é ontologicamente anterior a suas partes. Os defensores do cosmopsiquismo afirmam que o cosmos como um todo é o nível fundamental da realidade e instancia a consciência, e é assim que a visão difere do panpsiquismo, onde a alegação é geralmente de que o menor nível de realidade é fundamental e instancia a consciência. Por conseguinte, a consciência humana, por exemplo, é meramente derivada da consciência cósmica.


Panpsiquismo ativo

O panpsiquismo ativo é uma variante proposta recentemente por Eric Lindell, que considera que a consciência ativa foi negligenciada inadequadamente. Para remediar isso, o panpsiquismo ativo (ou do processo) postula que gastos de energia são inerentemente volitivos, mantendo que a matéria inerentemente possui senciência subjetiva.


Na filosofia oriental

Segundo Graham Parkes: "A maior parte da filosofia tradicional chinesa, japonesa e coreana se qualificaria como panpsiquista por natureza. Para as escolas filosóficas mais conhecidas no oeste - neoconfucionismo e budismo japonês - o mundo é um campo de força dinâmico de energias conhecido como qi ou bussho (natureza de Buda) e classificável em termos ocidentais como psicofísico". Segundo o Advaita Vedanta, a escola não dualista do hinduísmo, Brahman é a consciência subjacente que é o fundamento de toda a realidade.


Budismo do Leste Asiático

Segundo D. S. Clarke, aspectos panpsiquistas e panexperiencialistas podem ser encontrados nas doutrinas budistas Huayan e Tiantai (no Japão, Tendai) da Natureza de Buda, que eram frequentemente atribuídos a objetos inanimados, como flores de lótus e montanhas.:39 O patriarca do Tiantai, Zhanran, argumentou que "mesmo seres não sencientes têm a natureza de Buda".


Quem, então, é "animado" e quem "inanimado"? Dentro da assembléia do Lotus, todos estão presentes sem divisão. No caso de grama, árvores e solo ... se eles simplesmente levantam seus pedúnculos ou atravessam energicamente o longo caminho, todos alcançarão o Nirvana.


A escola Tiantai foi transmitida ao Japão por Saicho, que falou da "natureza búdica de árvores e rochas".


De acordo com o pensador budista Shingon do século IX, Kukai, o Dharmakaya nada mais é do que o universo físico e objetos naturais como rochas e pedras são incluídos como parte da suprema corporificação do Buda. O mestre Zen Soto Dogen também defendeu a universalidade da Natureza de Buda. Segundo Dogen, "cercas, paredes, azulejos e pedras" também são "mentes" (心, shin). Dogen também argumentou que "seres insencientes expõem os ensinamentos" e que as palavras do eterno Buda "estão gravadas nas árvores e nas rochas ... nos campos e nas aldeias". Esta é a mensagem do seu "Sutra das Montanhas e das Águas" (Sansui kyô).


Dzogchen

De acordo com um mal-entendido comum, na tradição budista Dzogchen, particularmente o Semde Dzogchen ou "série mental", cujo texto principal é o Kulayarāja Tantra, não há nada que não seja senciente, ou seja, tudo é senciente. Além disso, dois dos estudiosos ingleses que abriram o discurso da literatura Bardo da tradição Nyingma Dzogchen, Evans-Wentz & Jung (1954, 2000: p. 10) especificamente com sua tradução parcial e comentários do Bardo Thodol para o idioma inglês, escreveram da "Uma Mente" (tibetano: sems nyid gcig; sânscrito: *ekacittatva; *ekacittata; onde * denota uma possível formação reversa do sânscrito) assim:


A Uma Mente, como Realidade, é o Coração que pulsa para sempre, lançando purificadas as correntes sanguíneas da existência e tomando-as novamente; a Grande Respiração, o Inescrutável Brahman, o Mistério Eternamente Desvendado dos Mistérios da Antiguidade, o Objetivo de todas as Peregrinações, o Fim de toda Existência.


Deve-se ter em mente que Evans-Wentz nunca estudou a língua tibetana e que o lama que fez a principal obra de tradução para ele era da seita Gelukpa e não é conhecido por ter realmente estudado ou praticado Dzogchen.


De acordo com a tradução com comentários, "Autoliberação através da Visão com Consciência Nua", de John Myrdhin Reynolds, a frase "É a natureza única da mente que abrange todo o Samsara e o Nirvana" ocorre apenas uma vez no texto e não se refere a "algum tipo de hipóstase neoplatônica, um Nous universal , do qual todas as mentes individuais são apenas fragmentos ou apêndices", mas ao ensinamento de que "se alguém se encontra no estado de Samsara ou no estado de Nirvana, é a natureza da mente que reflete com consciência todas as experiências, não importa qual seja sua natureza." Isso pode ser encontrado no Apêndice I, nas páginas 80–81. Reynolds elucida ainda mais com a analogia de um espelho. Dizer que um único espelho pode refletir feiúra ou beleza não constitui uma alegação de que toda feiúra e beleza é um único espelho.

Hipóstase

 


Hipóstase (em grego clássico: ὑπόστᾰσις - hypostasis, "substância") é um termo grego que pode se referir à natureza de algo, ou a uma instância em particular daquela natureza. Durante as controvérsias cristológicas e trinitárias nos séculos III e IV, o segundo significado prevaleceu no uso da doutrina. O termo passou a ser um sinônimo da palavra latina persona, o indivíduo de uma natureza racional. A partir do século IV passou a ser contrastado com o termo ousia como significando 'realidade individual' nos contextos cristológicos e trinitários. 


O termo ainda é utilizado em grego moderno com o significado de "existência", juntamente com o termo ὕπαρξις (hýparxis) e τρόπος ὑπάρξεως (tropos hypárxeos), este último significando "existência individual".


Teologia Cristã

Nos concílios ecumênicos, a terminologia do termo foi clarificada e padronizada para que a fórmula "Três hipóstases em uma ousia (essência)" fosse aceita como a epítome da doutrina ortodoxa sobre a Trindade: de que o Pai, o Filho e o Espírito Santo são três diferentes hipóstases em uma única divindade. A palavra também é utilizada para se referir à divindade de Cristo, na chamada união hipostática de suas naturezas - divina e humana - em uma única hipóstase.


A palavra em si foi tema de grande controvérsia e confusão ao longo dos anos, especialmente no debate entre os críticos da doutrina da Trindade e seus defensores.


Cristianismo Primitivo

Nas obras do cristianismo primitivo, o termo é utilizado para denotar o "ser" ou a "realidade substantiva" e nem sempre é possível distinguir seu significado da palavras ousia (essência). Ele foi utilizado desta forma por Tatiano, Orígenes e no anátema anexo ao Credo de Niceia (325).


Concílios ecumênicos

Foi principalmente sob a influência dos Padres Capadócios que a terminologia foi padronizada para ser utilizada na definição ortodoxa da Trindade. Este consenso, porém, não foi conquistado facilmente. Os teólogos no ocidente traduziam "hypo-stasis" como "sub-stantia" (substância) e entendiam que os teólogos orientais, quando falavam em "três hipóstases" na divindade estariam falando de três "substâncias", gerando confusão e acusações de triteísmo. A partir de meados do século IV em diante, a palavra passou a ser contrastada com ousia e utilizada para significar "realidade individual", especialmente nos contextos trinitários e cristológicos.


Filosofia

Na filosofia de Plotino, Deus se deriva em três hipóstases - uno, nous (inteligência) e alma -, que ele comparava, respectivamente, à luz, ao sol e à lua. Mas o termo foi utilizada por diferentes tradições filosóficas com significados totalmente diferentes daquele adotado por Plotino. Também é encontrado entre os gnósticos. Um dos livros da biblioteca de Nag Hammadi se chama "A Hipóstase dos Arcontes".


No artigo Questões de Método, que serve de Introdução ao livro Crítica da Razão Dialética, do filósofo francês Jean-Paul Sartre, podemos obter um bom exemplo do emprego contemporâneo do termo hipóstase:


Para alguns, a Filosofia aparece como um meio homogêneo: os pensamentos nascem e morrem nele, os sistemas nele se edificam para nele desmoronar. Outros consideram-na como uma certa atitude cuja adoção estaria sempre ao alcance de nossa liberdade. Ainda para outros, é vista como determinado setor da cultura. Em nossa opinião, a Filosofia não existe; sob qualquer forma que seja considerada, essa sombra da ciência, essa eminência parada da humanidade não passa de uma abstração hipostasiada. De fato, existem várias filosofias. Ou melhor - porque nunca encontrareis, em determinado momento mais do que uma que seja viva -, em certas circunstâncias bem definidas, uma filosofia se constitui para dar expressão ao movimento geral da sociedade; e, enquanto vive, é ela que serve de meio cultural aos contemporâneos. Esse objeto desconcertante apresenta-se, simultaneamente sob aspectos profundamente distintos, cuja unificação opera constantemente.

 

— Crítica da Razão Dialética, Jean-Paul Sartre.


Nesse parágrafo, Sartre demonstra como a ideia de uma Filosofia, normalmente designada por nós como a Filosofia, na verdade, só existe em nossa mente. O que a história demonstra é que cada período possui a sua filosofia, não podendo unificar tudo isso ao nome de a Filosofia.

Nous

 


Nous (em grego antigo, νοῦς: 'intelecto', 'mente', 'razão'), termo filosófico grego que não possui uma tradução direta para a língua portuguesa, significa atividade do intelecto ou da razão, em oposição à atividade dos sentidos. Muitos autores consideram o termo como sinônimo de "inteligência" ou "pensamento".


A palavra é também utilizada para descrever uma forma de percepção que opera dentro da mente (o "olho da mente") e não apenas através dos sentidos.


O significado ambíguo do termo é resultado de sua constante apropriação por diversos filósofos, para denominar diferentes conceitos e ideias. Nous pode referir-se, a depender do filósofo e do contexto, a uma faculdade mental ou característica; outras vezes, a uma correspondente qualidade do Universo ou de Deus.


Homero usou o termo nous significando atividade mental em termos gerais, mas, entre os pré-socráticos, o termo foi sendo gradualmente ligado ao saber da razão, em contraste com o conhecimento derivado dos sentidos.

Anaxágoras descreveu nous como a divina razão universal que ordenou o mundo a partir do caos original, iniciando o desenvolvimento do cosmo. Anterior a ele, Hermótimo de Clazômenas foi atribuído por Aristóteles como proponente dessa noção. Diógenes de Apolônia também adotou nous como atributo à sua arché "ar".

Platão define nous como a parte racional e imortal da alma e também herda o conceito cósmico de mente universal. É o divino e atemporal pensamento no qual as grandes verdades e conclusões emergem imediatamente, sem necessidade de linguagem ou premissas.

Aristóteles, na Metafísica (XII, 7, 1072 b) identifica o nous divino como o primeiro motor das coisas, aquilo que move o todo na qualidade de causa final, distinguindo entre nous ativo e passivo: o passivo é afetado pelo conhecimento, enquanto o ativo (Da Alma, III, 5, 430 a) é a eterna causa primeira de todas as subsequentes causas do mundo. Também a Aristóteles se deve a noção de nous como a faculdade da alma de intuir os princípios indemonstráveis, o que é traduzido por intelecto (Ética a Nicômaco, VI, 6, 1440 a 31 e seguintes). Aristóteles considerava o intelecto como a parte imortal e perpétua da alma.

Plotino (Enéadas, V, 9, 2-4; VI, 8, 17) descreveu nous como sendo umas das emanações do ser divino.


Platão

Platão usou a palavra nous de muitas maneiras que não eram incomuns no grego cotidiano da época, e frequentemente significava simplesmente "bom senso" ou "consciência". Por outro lado, em alguns de seus diálogos platônicos, é descrito por personagens-chave em um sentido mais alto, o que aparentemente já era comum. Em seu Filebo 28c, Sócrates diz que "todos os filósofos concordam - com o que realmente se exaltam - que a mente (nous) é rei do céu e da terra. Talvez eles estejam certos." E depois afirma que a discussão que se segue "confirma as declarações daqueles que declararam antigamente que a mente (nous) sempre governa o universo".


Em seu Crátilo, Platão dá a etimologia do nome de Atena, a deusa da sabedoria, de Atheonóa (Ἀθεονόα) que significa "mente de Deus (theos) (nous)". Em seu Fédon, Sócrates, professor de Platão, é dito antes de morrer que sua descoberta do conceito de Anaxágoras de um nous cósmico como causa da ordem das coisas foi um ponto de virada importante para ele. Mas ele também expressou desacordo com o entendimento de Anaxágoras sobre as implicações de sua própria doutrina, devido ao entendimento materialista de causalidade de Anaxágoras. Sócrates disse que Anaxágoras "daria voz, ar e audição e inúmeras outras coisas desse tipo como causas para conversarmos uns com os outros, e falharia em mencionar as causas reais, ou seja, que os atenienses decidiram que era melhor condenar a mim". Por outro lado, Sócrates parece sugerir que ele também falhou em desenvolver uma compreensão teleológica e dualística totalmente satisfatória de uma mente da natureza, cujos objetivos representam o Bem, ao qual todas as partes da natureza visam.


No que diz respeito ao nous que é a fonte de entendimento dos indivíduos, Platão é amplamente conhecido por ter usado ideias de Parmênides, além de Anaxágoras. Como Parmênides, Platão argumentou que confiar na percepção sensorial nunca pode levar ao conhecimento verdadeiro (episteme), apenas à opinião (doxa). Em vez disso, os personagens mais filosóficos de Platão argumentam que nous deve de alguma forma perceber a verdade diretamente da maneira que os deuses e daimons percebem. O que nossa mente vê diretamente para realmente entender as coisas não deve ser as coisas materiais em constante mudança, mas as entidades imutáveis que existem de maneira diferente, as chamadas "formas" ou "ideias". No entanto, ele sabia que os filósofos contemporâneos frequentemente argumentavam (como na ciência moderna) que nous e percepção são apenas dois aspectos de uma atividade física, e essa percepção é a fonte de conhecimento e compreensão (e não o contrário).


Exatamente como Platão acreditava que o nous de pessoas permite que eles venham a entender as coisas de qualquer maneira que melhora a percepção sensorial e o tipo de pensamento que os animais têm, é um tema de discussão de longa duração e debate. Por um lado, na República de Platão, Sócrates na Analogia do Sol e Alegoria da Caverna, descreve as pessoas como capazes de perceber mais claramente por causa de algo externo, algo como quando o sol brilha, ajudando a visão. A fonte dessa iluminação para o intelecto é chamada de Forma do Bem. Por outro lado, no Meno, por exemplo, o Sócrates de Platão explica a teoria da anamnese pela qual as pessoas nascem com ideias já em suas almas, das quais, de alguma forma, se lembram de vidas anteriores. Ambas as teorias tornar-se-iam altamente influentes.


Como em Xenofonte, o Sócrates de Platão frequentemente descreve a alma de uma maneira política, com partes dominantes e partes que, por natureza, devem ser governadas (ver teoria tripartite da alma de Platão). Nous está associado à parte racional (logistikon) da alma humana individual, que por natureza deve governar. Em sua República, na chamada "analogia da linha dividida", ela tem uma função especial nessa parte racional. Platão tendia a tratar nous como a única parte imortal da alma.


No que diz respeito ao cosmos, no Timeu, o personagem-título também conta uma "história provável", na qual nous é responsável pelo trabalho criativo do demiurgo ou criador que trouxe ordem racional ao nosso universo. Este artesão imitou o que percebeu no mundo das Formas eternas. No Filebo, Sócrates argumenta que nous em humanos individuais deve compartilhar uma nous cósmica, da mesma maneira que os corpos humanos são constituídos por pequenas partes dos elementos encontrados no resto do universo. E esse nous deve estar no genos de ser uma causa de todas as coisas particulares como coisas particulares.

Cogito ergo sum

Cogito, ergo sum é uma frase de autoria do filósofo e matemático francês René Descartes (1596-1650). Em geral, é traduzida para o português como "penso, logo existo"; embora seja mais correto traduzi-la como "penso, portanto sou". Na quarta parte da versão francesa de Discurso sobre o Método (1637), essa frase é formulada como je pense, donc je suis; nesse sentido, cogito ergo sum é a sua versão latina.

Descartes alcança essa conclusão após duvidar da verdade de todas as coisas. A seu ver, mesmo que ele duvidasse de tudo, não poderia duvidar de que ele mesmo existe pelo menos enquanto "coisa que pensa" (res cogitans). Entretanto, na meditação segunda de Meditações Metafísicas (1641), essa conclusão aparece como "Eu sou, eu existo" ("Je suis, j’existe").


A Demonstração do Cogito

A demonstração do Cogito dá-se de maneira bastante breve no Discurso do Método, mas é muito mais extensa e detalhada nas Meditações Metafísicas. Para chegar ao “cogito, ergo sum”, Descartes estabelece dois movimentos: primeiro, demonstrar as razões que o levam à dúvida hiperbólica; e segundo, demonstrar como a dúvida hiperbólica leva à certeza indubitável de que ele mesmo existe enquanto coisa que pensa. Delineemos, a seguir, esses dois movimentos meditativos que o levam ao cogito.


Meditação Primeira

Descartes deixa claro que o propósito de suas meditações é estabelecer o conhecimento sob bases sólidas e seguras. Nesse sentido, ele rejeita – como se fosse totalmente falso – tudo aquilo que pudesse supor a menor dúvida.


Em seguida, ele estabelece três pontos para especificar como esse processo de rejeição ocorrerá, que são:


I. Negação daquilo que se baseia nos sentidos, já que é claro que os sentidos às vezes nos enganam e que não é prudente confiar naqueles que um dia nos enganaram.


II. Negação das coisas que se apresenta em um sonho, já que não há indícios concludentes de que podemos distinguir a vigília do sono e, portanto, não podemos saber se estamos sonhando agora ou se estamos acordados.


III. Negação dos paradigmas matemáticos. Esse é um ponto mais complicado, pois parece que, acordando ou dormindo, 2 + 3 = 5; que, mesmo em sonho, 2 + 3 nunca será igual a 7. Para negar essa objeção, Descartes apontará para o fato de que raciocinamos errado em relação às demonstrações mais simples da matemática. Entretanto, ele irá se concentrar principalmente no apontamento da possível existência de um “gênio maligno” que poderia fazê-lo crer que 1 + 1 = 2, mesmo que isso não fosse verdadeiro. Nesse sentido, a suposição do gênio maligno parece promover a negação não só de suas crenças matemáticas, mas também de o restante de suas opiniões.


Diante desses pontos, Descartes conclui que deve rejeitar tudo aquilo que recebera em sua crença como verdadeiro e considerar todas as suas antigas opiniões como falsas. Esse é momento em que ele assume a suspensão do juízo e a dúvida hiperbólica.


Meditação Segunda

Descartes percebe que, ao duvidar de tudo, ele não poderia negar que há a própria dúvida. Então ele admite que “penso, logo sou” deve ser o seu primeiro princípio firme e indubitável que sustentará o fundamento do conhecimento. Em outras palavras, tentando negar tudo como falso, acabava-se afirmando a existência do pensamento. Descartes duvidava e isso era indubitável, i. é, que Descartes duvidava era aquilo que conseguia resistir ao gênio maligno, pois o próprio Descartes precisaria, para ser enganado pelo gênio maligno, existir enquanto aquele que é enganado (ou aquele que pensa).


Assim, “cogito ergo sum” se torna o primeiro princípio firme e indubitável de sua jornada meditativa. Ele é o ponto arquimediano de sua filosofia. De sua própria existência enquanto coisa que pensa, então, Descartes não pode duvidar, já que, enquanto pode pensar, ele próprio é uma coisa que pensa. Essa “coisa que pensa” é aquilo “que duvida, que concebe, que afirma, que nega, que quer, que não quer, que imagina também e que sente”. Em contrapartida, ele só pode afirmar que é uma coisa que pensa enquanto pensa. Se cessar o seu pensar, cessasse simultaneamente o seu existir.


As Objeções ao Cogito

Ao longo da história do pensamento, diversos filósofos se enveredaram na tentativa de objetar o argumento cartesiano.


Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716)

A objeção de Leibniz consiste em apelar que haveria na demonstração do cogito uma circularidade. Isto é, o “eu” que existe já está pressuposto ao assumir “eu penso”.


Friedrich Nietzsche (1844-1900)

Embora Nietzsche, em Além do bem e do mal, §16, não chegue a se referir diretamente a Descartes, fica claro que ele está se referindo ao pensamento cartesiano e estabelecendo uma crítica ao “cogito ergo sum”.

Ele coloca que, ao decompor o processo lógico que leva Descartes ao “penso, logo sou”, é possível detectar algumas pressuposições por trás da frase, tais como:


Eu sou aquilo que pensa;

Deve existir algo que pensa;

O pensamento não pode existir sem algo para efetivá-lo;

“Pensar” é a atividade de um ente que é;

“Pensar” é o efeito de um ente que é;

Um ente é a causa do pensar;

O “eu” sabe o que significa “pensar”;

O “eu” difere o pensar de outros fenômenos que ocorrem nele;

Existe um “eu”; etc.


A crítica de Nietzsche se norteia aqui no sentido de que haveria uma dificuldade – ou quem sabe impossibilidade – de fundamentar esses pressupostos sobre um suporte inabalável. Desse modo, por meio da demonstração do cogito, Descartes não construiria um conhecimento sem pressupostos e nem o firmaria em bases sólidas e seguras, como pretendia.


Bertrand Russell (1872-1970)

Russell objetará que, no máximo, Descartes poderia inferir que há o pensamento, e não que “eu penso”.

Asseidade

Asseidade (do latim a se, "por si") ou aseidade (forma não-preferível) é atributo divino essencial e fundamental, que consiste precisamente em derivar sua existência de si mesmo, ou, identicamente, existir por si próprio, sem qualquer nexo exigível ou necessário de causalidade e efetividade, e vem a ser, na compreensão teológica, prerrogativa exclusiva de Deus, em razão do que é um dos atributos incomunicáveis.

Gnosiologia

 


A gnosiologia (também grafado gnoseologia; do grego gnosis, 'conhecimento', e logos, 'discurso'), é um termo proveniente da filosofia estética do século XVIII. Na antiga União Soviética e período subsequente à sua dissolução, foi utilizado como sinónimo de epistemologia. O termo é utilizado no Cristianismo Ortodoxo e no Brasil foi associado à teoria do conhecimento, ramo da filosofia que se ocupa do estudo do conhecimento, a sua origem, natureza, limites do ato cognitivo e da validade do conhecimento em função do sujeito cognoscente, ou seja, daquele que conhece o objeto.


No Brasil o termo gnoseologia não se confunde com a epistemologia, que refere-se apenas ao conhecimento científico. A metafísica é área que poderá entrar em contato com a gnoseologia e diferencia-se da ontologia: ambas se preocupam com o ser; porém a metafísica põe em questão a própria essência e existência do ser. Em outras palavras, grosso modo, a ontologia insere-se na teoria geral do conhecimento, que se preocupa com a validade do pensamento, das condições do objeto e sua relação com o sujeito cognoscente, enquanto que a metafísica procura a verdadeira essência e condições de existência do ser humano.


Teoria do Conhecimento


A Teoria do conhecimento tem por objetivo buscar a origem, a natureza, o valor e os limites do conhecimento, da faculdade de conhecer. Os principais problemas da teoria do conhecimento são:


A possibilidade do conhecimento

A origem do conhecimento

O limite do conhecimento

A essência do conhecimento

As formas do conhecimento

O valor do conhecimento (o problema da verdade)


Segundo a filosofia arcaica, se há conhecimento humano, existe a verdade, porque esta nada mais é do que a adequação da inteligência com a coisa (segundo a concepção aristotélico-tomista). Com o conhecimento da verdade, há consequentemente a certeza, que surge mediante a passagem da inteligência à verdade conhecida. A inteligência humana tende a fixar-se na verdade conhecida. Metodologicamente, há primeiramente o conhecimento, depois a verdade, e finalmente a certeza. Tal tomada de posição perante o primeiro problema da crítica, é chamado de dogmatismo, sendo defendida por filósofos ditos realistas, como por exemplo, Aristóteles e Tomás de Aquino. Tais conceitos afastam-se do método científico como o conhecemos.


Se, ao contrário, se sustentar que a inteligência permanece, em tudo e sempre, sem nada afirmar e sem nada negar, i.é, sem admitir nenhuma verdade e nenhuma certeza, sendo a dúvida universal e permanente o resultado normal da inteligência humana, está se defendendo o ceticismo.


O problema crítico representa um passo além do dogmatismo e do ceticismo. Uma vez que admite-se a existência da verdade (valor do conhecimento), e da certeza, pergunta-se então onde estão as coisas: só na inteligência, como querem Platão, Hegel (idealismo), só na matéria, como ensina Marx (materialismo), no intelecto humano e na matéria, como dizem Aristóteles, Tomás de Aquino (realismo), ou só na razão, como diz Descartes (racionalismo).


Investigando os fundamentos de todo o conhecimento, pois critica o conhecimento do ente transcendente, a Crítica é a base necessária de todo o saber científico e filosófico, inclusive da própria Ontologia.


Na gnosiologia existe o conceito de apriorismo kantiano, que se utiliza do racionalismo e do empirismo: primeiro, o sujeito conhece nada a partir dos sentidos; depois, a razão organiza o conhecimento empírico.

Jacques Bergier - Melquisedeque

  Melquisedeque aparece pela primeira vez no livro Gênese, na Bíblia. Lá está escrito: “E Melquisedeque, rei de Salem, trouxe pão e vinho. E...